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    Dica para leitura: aspas simples são para pensamentos internos, que é esse símbolo: ’
    Aspas duplas para conversa mental: “
    Travessão para falas em voz alta: —

    — Ela… ela está incrível. — As palavras de Flügel saíram em um sussurro, enquanto seus dedos hesitavam em tocar a superfície fria do metal.

    Com a frustração evidente na voz, Timur cruzou os braços sobre o peito, os lábios ásperos curvados em uma expressão insatisfeita. — Ela ainda não está cem por cento. Foi o que consegui fazer. Não tenho materiais de qualidade o suficiente para restaurá-la ao máximo, então ela terá que ficar assim. — Sua voz carregava a frustração de um artesão que não conseguiu atingir a perfeição.

    Flügel sentiu uma ponta de desapontamento, mas a admiração ainda dominava. A armadura, mesmo incompleta, era uma obra de arte.

    — Mesmo assim, é incrível, Timur — Flügel respondeu, a gratidão em sua voz superando qualquer frustração. — Eu não poderia pedir por mais.

    Timur bufou, seu olhar passando pela armadura. — O metal… é especial. Precisa de algo que não se encontra mais tão facilmente. — Ele fez uma pausa, os olhos fixos na peça. — Isso é Aço Dracônico. Feito com os ossos dos dragões mortos no continente Celestra, mas não é puro. Misturaram com outro material de alta patente. Usei meus melhores materiais para repará-la, mas o metal dela exige algo do nível raro. Usar qualquer coisa abaixo disso seria um desserviço ao material e um desrespeito com o ferreiro que a criou. — Timur parou de falar, soltando um som do fundo de sua garganta que poderia ser confundido com um rosnado. — O que eu estou falando? Você nem ao menos conhece esse material. — A voz dele soava como a de um mestre frustrado.

    Com um gesto displicente, Timur se afastou do balcão. — Use-a com sabedoria, garoto. Do jeito que ela está, não aguenta nem metade do que aguentaria em seu auge. E não se preocupe com o pagamento. O prazer de trabalhar nela já foi a minha recompensa.

    Flügel assentiu, um nó na garganta pela generosidade inesperada. A armadura não parecia ter sido apenas reparada, mas sim imbuída de uma nova vida. Ele sabia que, com ela, estaria mais preparado para enfrentar os desafios que o aguardavam.

    Nytheris, que observava de longe, se aproximou lentamente. Seus olhos negros e intensos perscrutavam a armadura. — A aura… Ela está diferente. Mais… completa. — Nytheris murmurou, a ponta dos dedos roçando a superfície do peitoral com cuidado.

    — Bom, Timur falou que foi feita com um material muito bom. Com certeza ela deve ser melhor do que qualquer armadura que poderíamos encontrar no reino de Tournand… pelo menos eu espero que sim… — Um sorriso se abriu no rosto de Flügel, que vinha pensando em algo há um tempo. 

    — Você acha que ela poderia causar alguma perturbação com mana? Não sei, tipo… não deixar usar corretamente ou dissipar? — Sua pergunta foi confusa, mas Timur entendeu o que ele queria dizer.

    — Está perguntando se ela causa alguma interferência na mana, certo? A resposta é não. Não vi nada nela que pudesse mexer com a mana de quem a porta ou algo assim. Vá em frente e use-a sem se preocupar. — O anão tinha um tom impaciente, como se quisesse vê-la logo em seu corpo.

    — Bom, então eu acho que não tem problema… — Flügel pegou o elmo da armadura, o analisou e se virou para Nytheris, estendendo o capacete para seu familiar. — Pegue, ela será sua. Deve ser melhor do que a sua armadura prateada. Eu te disse que iria encontrar uma maneira de te proteger, certo? — Seu sorriso quase chegava de orelha a orelha, e o carinho em seus olhos estava direcionado ao seu familiar à sua frente.

    — Você a comprou para si, não posso tirá-la de você. A armadura prateada que você me deu já está de bom tamanho, não preciso de outra. — Ele deu um passo para trás, se afastando um pouco do capacete estendido em um movimento de recusa.

    — Eu fico com a armadura prateada e você fica com essa. Tenho um corpo mais resistente que o seu e será melhor para mim se você estiver bem protegido, conseguirei lutar com mais foco nos inimigos. — Seu sorriso quase vacilou quando Nytheris se afastou, mas ele não recuou.

    — Hm… não, não quero. Eu não vou aceitá-la… — Sua voz desapareceu, e ele olhou de canto de olho para Timur, que estava com uma carranca, esperando que qualquer um dos dois usasse logo a armadura. Nytheris se inclinou levemente para Flügel e sussurrou: 

    — Eu gosto da armadura prateada… ela meio que brilha um pouco, e eu gosto disso. Não quero vestir essa daí e desaparecer nas sombras. — Suas bochechas estavam levemente avermelhadas, assim como as pontas de suas orelhas. Ele estava quase morrendo de vergonha em admitir que não queria usar a armadura porque queria brilhar no campo de batalha.

    — Que? — Flügel não conseguiu segurar a voz, confuso. O motivo era tão trivial que o chocou. Nytheris estava recusando a melhor proteção por pura vaidade. 

    — Sério isso? — Vendo o balançar de cabeça envergonhado de Nytheris, Flügel decidiu não insistir. Seu familiar era uma criatura diferente dele. Ao contrário de Flügel, familiares não tinham uma expectativa de vida, não morriam e eram eternos enquanto seu criador estivesse vivo e possuísse mana para curá-los. Nytheris nunca nem mesmo sentiu o gelado da morte, e todo ferimento que tivera se curou em instantes. 

    Mesmo que doesse, jamais pensou que nunca iria parar de existir. Talvez fosse por isso que ele poderia se dar ao luxo de pensar em sua aparência durante uma luta, em vez de pensar em se proteger mais. 

    — Oh, bom… se é assim, tudo bem. — Ele deu um último olhar para o rosto de Nytheris, vendo se ele iria sustentar a sua decisão.

    Vendo que Nytheris não iria aceitar a nova armadura, seus ombros caíram, pesados, e ele soltou um longo suspiro. Seu sorriso se desfez enquanto ele tentava aceitar que teria que continuar vendo seu familiar correr riscos mais do que necessários e não poderia fazer nada.

    — Vai usar essa armadura ainda hoje? — Timur perguntou, com a sua impaciência transbordando em seus olhos.

    Flügel soltou o ar que nem sabia que estava prendendo. Seus ombros se endireitaram e a expressão em seu rosto se tornou séria, como se estivesse tomando uma decisão de alto escalão. Ele se virou de costas para o anão, ignorando-o por completo.

    Flügel vestiu as peças da armadura uma a uma, sentindo o peso familiar, mas agora com um ajuste perfeito, como se o metal tivesse sido forjado para se tornar uma segunda pele. A manopla se encaixou com precisão cirúrgica, os dedos se movendo com liberdade e controle. A sensação era diferente de antes. O metal não estava frio, ele pulsava com um calor sutil, quase como se o material e a mana de Flügel tivessem se unido. Ao vestir o elmo, que agora tinha as rachaduras magicamente reparadas, o mundo não parecia mais tão abafado. 

    Quando a última peça foi posta, uma aura negra e suave emanou da armadura, pairando levemente sobre si mesma. A fumaça rapidamente se dissipou, mas a sensação de poder e controle permaneceu. Nytheris, de olhos arregalados, o encarava com uma admiração silenciosa.

    — Parece que a armadura se… ligou a você. — Nytheris disse, ainda pasmo.

    Flügel moveu os braços e as pernas, sentindo a armadura se mover com ele de forma fluida. Era leve, mais do que aparentava, e a cada movimento, a mana dentro dele parecia responder, como se a armadura o estivesse protegendo.

    — Incrível. — Foi tudo o que Flügel conseguiu dizer.

    Com um último aceno de cabeça para o anão, que já estava de volta à sua bigorna, Flügel e Nytheris subiram na rampa novamente. Flügel ordenou: — Topo, sala do Mestre da Torre.

    E a rampa obedeceu, subindo suavemente em círculos pela parede, desviando das alcovas que a torre possuía.

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