Dica para leitura: aspas simples são para pensamentos internos, que é esse símbolo: ’
Aspas duplas para conversa mental: “
Travessão para falas em voz alta: —
Capítulo 90 — O Segundo Teste da Armadura
A rampa subiu, silenciosa e firme, carregando Flügel e Nytheris em um movimento circular que os afastava cada vez mais da calorosa forja de Timur.
Assim que eles estavam de frente para a porta do escritório de Siegmeyer, Flügel levantou a mão direita e bateu três vezes na porta com uma força moderada, o ferro da armadura causando um barulho mais alto do que o normal.
Ele esperou por alguns segundos antes de bater novamente, mas não obteve nada além do silêncio como resposta. Ele olhou para Nytheris, como se esperasse uma resposta, mas também não obteve nenhuma.
— É… eu acho que ele não está — murmurou, antes de ordenar para a rampa flutuante: — Chão, térreo. — Ele mentalmente torceu para que esse comando funcionasse, não lembrava qual tinha sido o comando que Thalion havia usado para ir para o chão.
Para seu alívio,a rampa estremeceu suavemente e começou a descer, levando-os de volta. Em poucos segundos, eles estavam no térreo novamente, ao lado do enorme pilar de luz que subia até o topo da torre. Agora, que Flügel o observou com mais calma, ele percebeu que o pilar estava um pouco menor do que a primeira vez que o vira. A visão o fez pensar que, talvez, aquela fosse a reserva de mana da torre.
Uma “pulga atrás da orelha” começou a incomodá-lo. Como era possível estocar mana de forma tão eficiente? Se ele conseguisse replicar esse processo, poderia criar para Nytheris seu próprio núcleo de mana, tornando-o autossustentável e independente de sua mana. Seria o maior presente que ele poderia dar ao seu familiar. O pensamento era ambicioso, quase impossível, mas a ideia plantou-se firmemente em sua mente.
A pesada porta de pedra se abriu sozinha, revelando a luz do dia do lado de fora.
Flügel e Nytheris saíram da Torre dos Magos, deixando o silêncio e o calor da forja para trás. A imponente estrutura se erguia atrás deles, um monumento à magia e ao mistério. Flügel olhou para a porta se fechando novamente, acompanhando o movimento dela com os olhos.
— E agora? — ele perguntou, virando-se para Nytheris. Seu rosto, escondido sob o elmo de Aço Dracônico, parecia ainda mais pensativo.
Nytheris olhou para a rua movimentada e, depois, para o amigo. — O quartel-general. Lá você poderá testar a resistência da armadura e se acostumar com ela.
Com a nova armadura e um novo propósito em mente, Flügel e Nytheris começaram a seguir para o quartel-general de Tournand. A armadura parecia ter um peso sutil que fazia cada passo de Flügel reverberar com um som suave, o metal escuro refletindo a luz do sol de uma forma quase assustadora. Sua jornada acabara de começar.
A jornada até o quartel-general de Tournand foi tranquila. A Torre dos Magos ficava próxima do centro da cidade, o que fez com que a caminhada não demorasse mais de dez minutos. Enquanto caminhavam, Flügel sentia os olhares dos moradores sobre si. A armadura, com sua cor de obsidiana e as rachaduras escuras, contrastava com o movimento alegre da cidade. Era como se ele estivesse vestindo um pedaço de outro mundo, algo antigo e perigoso.
Ao chegarem, a familiaridade do quartel-general trouxe uma sensação de conforto. As paredes de pedra polida, o cheiro de cera e pergaminho e o murmúrio constante de soldados e magos eram uma realidade bem-vinda após o silêncio pesado da forja. Os corredores largos pareciam ainda mais vastos e imponentes com Flügel em sua nova armadura. Alguns soldados o cumprimentaram com acenos de cabeça, acostumados a vê-lo por ali, mas seus olhares se fixavam na armadura incomum, um misto de curiosidade e respeito.
Nytheris andava ao seu lado, calado, mas sua presença era um lembrete constante de que Flügel nunca estava sozinho. Eles caminharam diretamente para o pátio central, o campo de treinamento, o lugar perfeito para o que Flügel tinha em mente.
O pátio estava quase vazio, com apenas alguns guardas praticando. Os bonecos de treinamento, reforçados com aço, ainda carregavam marcas de batalhas recentes. O ar exalava disciplina e suor. Flügel se posicionou no centro, sentindo a terra batida sob as botas pesadas da armadura.
— Fique atento, Nytheris. — ele disse, com a voz abafada pelo elmo. — Primeiro, vou testar a resistência dela.
Flügel conjurou uma pequena esfera de fogo na palma de sua mão, do tamanho de uma bola de tênis. Ele a mirou em seu próprio peitoral e a lançou. O impacto foi forte, mas a armadura não cedeu. Em vez de queimar ou derreter, a chama foi absorvida pelo metal, que pareceu brilhar por um breve instante antes de voltar à sua opacidade natural. Um raio de calor sutil emanou da armadura, espalhando-se pelo corpo de Flügel.
Nytheris o encarou, com os olhos arregalados. — Ela absorveu a magia…
— Não só absorveu, como também a dissipou. — Flügel murmurou, impressionado. Ele sentiu a energia da magia em seu interior, mas a armadura havia impedido o dano. — É como se ela estivesse se alimentando.
Flügel levantou a mão, tocando o ponto do impacto no peitoral. O calor sutil que emanava da armadura era reconfortante. Ele olhou para Nytheris com uma ideia clara em mente, a voz abafada pelo elmo. — Nytheris, eu preciso que você use o mesmo ataque de lança de mana que usou em mim na loja de Vark.
Nytheris estremeceu, seus olhos se estreitando em descrença. A memória do impacto na velha armadura era vívida. — Você enlouqueceu? Aquilo quase te… — ele parou, a lembrança do som do metal se contorcendo era palpável. Ele jamais se perdoaria se algo acontecesse com o seu criador.
— Não. — Flügel respondeu com firmeza, balançando a cabeça. — Aquele dia, eu estava com uma sucata. Agora, estou com essa obra-prima. Eu preciso saber o quanto essa armadura aguenta. Confie em mim.
Nytheris hesitou, mas a determinação na voz de Flügel era inegável. Ele sabia que o amigo não estava fazendo isso por imprudência, mas para entender a verdadeira natureza da armadura. Com um suspiro pesado, ele assentiu. Uma lança de mana negra se materializou em sua mão, mais densa e ameaçadora do que na memória de Flügel. A ponta afiada parecia sugar a luz ao redor.
Flügel se posicionou, perfeitamente ereto. Ele não se encolheu, não se preparou para o choque. Apenas o encarou, confiante na armadura que vestia.
Nytheris lançou a lança. Ela voou pelo ar com uma velocidade aterrorizante, uma linha preta e reluzente em direção ao peito de Flügel. O golpe foi direto, no mesmo lugar do ataque anterior. No entanto, em vez de um estrondo metálico, houve um som abafado, quase um sussurro de vento. O metal não tremeu. Ele brilhou com uma luz negra intensa por um instante, e a lança de mana de Nytheris se desfez em partículas, completamente consumida.
Flügel levantou a mão, tocando o ponto do impacto. Não sentiu dor, nem sequer um arranhão. A superfície do elmo estava perfeitamente lisa e fria. Flügel sentiu a armadura vibrar, não por um golpe, mas em resposta a sua mana. Ela permaneceu intacta, como se o ataque de Nytheris nunca tivesse existido, confirmando que a armadura era mais do que ele imaginava.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.