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    “Pessoas. Temem o silêncio, pois ele fala demais.

    — Yamasaki Yami

    ✧ ✞ ✧

    Às 20h, a luz de Aurora já se esvaíra, dissolvendo-se gradualmente do amarelo quente ao azul frio no céu, anúncio silencioso do fim das atividades na Academia Esportiva de Hiragana e da chegada da noite.

    A chuva, antes leve, engrossara; com violência, ressoando no solo como uma sinfonia melancólica.

    Essa mudança climática era uma constante em Crea: com a ascensão de Nox aos céus, a escuridão, o frio e a chuva se espalhavam por todos os cantos, envolvendo o mundo em sua presença opressiva.

    A penumbra desvelava o pesar humano, intensificado pelas escolhas de quem bebera do pecado e se banhara no mal. Frutos estéreis se erguiam apenas para abortar a luz e devorar os prazeres da carne.

    O peso do arrependimento pairava, enquanto as sombras se adensavam… Mas ninguém ousava abrir mão da comodidade.

    Diante disso, o exorcista, senhor de uma familiaridade inabalável com o tempo, já se encontrava à entrada, fitando o lugar com a expressão de quem despreza colmeias do saber.

    Era o único a desafiar os porquês, pois, por graça de Elum, lhe fora dado ver além do que é visível e coexistir entre os dois lados.

    Já não era mais uma abelha; do néctar bebera e se tornara apenas um transeunte social.

    Permanecia imóvel diante de uma passagem marcada por um portão amplo e imponente, ladeado por um piso de concreto onde atletas e alunos costumavam se reunir antes das aulas e treinos.

    Mesas e bancos de alvenaria compunham o ambiente que detestava.

    E ao erguer o olhar, contemplou o prédio principal: uma arquitetura sóbria, o nome da instituição gravado em destaque. Cores frias dominavam as grades junto ao portão metálico, tingido agora de um preto profundo, enquanto o cinza reinava absoluto sobre o muro e todo o edifício.

    À sua volta, estendiam-se duas alas destinadas a mestres, professores e treinadores, todas ligadas ao edifício central por corredores — formando um complexo que parecia ocultar, em suas paredes, os segredos mais obscuros que lugares como aquele insistem em cultivar.

    Enquanto os educadores seguiam para o estacionamento nos fundos, os alunos tomavam o caminho oposto, deixando o lugar às pressas, imersos no clima colegial, entre risos apressados e fofocas sussurradas.

    A maioria tinha entre catorze e dezessete anos. E ele certo de que seus dezenove o brindavam da juventude, se manteve solitário, imerso na multidão. Olhares estranhos se voltavam em sua direção, alguns carregados de curiosidade, outros de um discreto alívio.

    Mas enfrentar essas reações era uma rotina constante para ele; afinal, ser um exorcista não era exatamente bem-visto pela sociedade. Mesmo que o sobrenatural fosse real, lidar com coisas que só você via podia ser um gatilho para a ignorância alheia.

    Sem hesitar, deu os primeiros passos, ultrapassando os que estavam de saída e atravessando a porta dupla de vidro. Sua determinação refletia-se no olhar, embora evitasse cruzar os olhos dos que o observavam pelo caminho.

    Estava ali para cumprir… mas engana-se quem pensava que fosse apenas por dever.

    E apesar da presença, detestava as multidões; preferia fixar-se apenas no entorno imediato para conseguir avançar.

    Quando seus pés tocaram a escada que dividia o prédio em dois corredores imensos, um arrepio lhe percorreu a espinha, serpenteando do pescoço até a ponta dos dedos.

    Seu instinto sobrenatural estava aguçado, sussurrando-lhe sobre algo incomum ao redor.

    Energia negativa… mas densa, sufocante… hm…

    Ao esfregar os dedos, sentiu a textura da treva, viscosa, como se estivesse mergulhado em óleo.

    Bem, o primeiro passo é ver o velhote.

    Ignorando por um instante a urgência de seu pressentimento, começou a subir os degraus em direção ao segundo andar. O trajeto até a sala do diretor já se formava em sua mente, e seus passos seguiam medidos, sempre atentos às salas que se alinhavam pelo caminho.

    Embora nenhuma sala mostrasse sinais de presença, todas as portas permaneceram abertas, sugerindo que, pelo horário, a equipe de limpeza logo entraria em ação.

    Sorte que não havia risco de interação social: cada um estava absorto em suas próprias tarefas.

    Para ele, isso era um alívio, afinal, iniciar uma conversa com alguém era mais desconfortável do que enfrentar uma entidade em conflito.

    Ao alcançar a curva do corredor, virou sem hesitar e lançou um olhar por uma das muitas janelas à esquerda. Do lado de fora, restavam apenas alguns alunos, dispersos como pingos de chuva em uma poça, quase esgotando o pátio.

    Ótimo…

    Então seus olhos se fixaram adiante, na porta de madeira que encerrava o corredor, ostentando uma placa indicativa: Sala do Diretor-Geral.

    Ele anunciou mentalmente o próximo passo enquanto se aproximava para bater três vezes na madeira da porta, deixando sua mente mergulhar na expectativa do momento. Após o gesto, aguardou, distraído, ouvindo apenas o eco de sapatos sobre o piso laminado.

    Observava o entorno com uma mescla de ansiedade e curiosidade.

    Mas nenhuma era expectativa…

    Nada mudou…

    Quando a porta se abriu, revelou-se um homem de sorriso radiante, mas os olhos, estes carregavam pura corrupção. Os lábios esticavam-se de orelha a orelha em saudação. Continuava o mesmo: gordo, agora mais velho, cabelos escassos e um terno que mal conseguia fechar ao redor do corpo.

    — Você não mudou nada, rapaz! Ainda me lembro dessa careta emburrada… — brincou, afastando-se da entrada para fitá-lo com mais clareza — …Por favor, entre!

    Era como contemplar um anjo, mas vestido de negro e trazendo no rosto a feição do diabo.

    Ele soltou uma risada sem graça e entrou na sala, movido pela força do ódio.

    — Bem, você também não, né? Senhor Diretor…

    — Ah, não seja modesto, a idade não me fez bem! — Acomodando-se em sua poltrona atrás da mesa.

    A sala lembrava um escritório corporativo: móveis industriais emolduravam o ambiente, e na estante repousavam os prêmios conquistados ao longo do tempo por sua gerência e administração.

    Modesto?

    Mas nada chamava mais atenção do que a falta de senso do gordo.

    — Enfim… — Ao ajustar as mãos sobre a mesa, o lançou um olhar firme — Tirando o bom humor de dois cavalheiros que somos… vamos falar de negócios. Por favor, sente-se.

    — Ah, claro… cavalheiro…

    Afastou a cadeira à frente e sentou-se, forçando-se a encarar o diretor diretamente nos olhos.

    Era como se o silêncio pedisse que ele tomasse a palavra antes.

    — Bem, sobre os negócios… por ser um trabalho de exorcista de grau menor, dois graus ainda, obviamente não irei cobrar o valor cheio…

    Estava prestes a continuar quando o som seco de uma gaveta interrompeu suas palavras. O homem a abrira com a calma calculada de quem comprava caráter, retirando de dentro um cheque. Entre os dedos gordos, sacudiu-o miseravelmente, estampando no rosto um sorriso de pura ganância.

    — Por favor, eu o chamei pela sua graduação e fama… Já estava ciente dos valores. Veja por si mesmo.

    Entregou-lhe o cheque, e o montante estampado fez seus olhos brilharem.

    — Cinquenta e cinco mil ienes! Isso é sério?

    — Óbvio. A verdade é que já lidava com esse problema há algum tempo, mas esperei até receber a notícia de sua volta. Bem… algo que traria benefícios para a academia no futuro. Pense: quão imponente seria? Contratar um exorcista tão caro apenas para demonstrar o quão elevado é o nível desta instituição?

    Até mesmo ele se surpreendeu com o que acabara de ouvir.

    — Gastos justificam a qualidade e proclamam poder! E poder, jovemzinho… é influência!

    Quase suspirou diante do podre monólogo.

    — Ah, é… sem dúvidas…

    Franzindo a testa e desviando o olhar de imediato.

    Não era do tipo que se importava com o caráter de seus contratantes, mas toda aquela conversa o desanimava profundamente.

    Esse cara quase matou os próprios alunos por causa disso? Porra!

    Seus dedos, impacientes, deslizavam pela perna, tomados por uma inquietação avassaladora que o consumia por completo.

    — Então, acredita que resolverá isso rapidamente? Quero dizer… vou ter que esperar até o final, certo? E a que horas posso ir embora daqui

    O bombardeava de perguntas, o deixando visivelmente sem jeito.

    Mas era comum… parecia que seu trabalho não passava do de um exterminador de pragas, só que, no caso dele, não eram ratos e baratas.

    — Sabe… tenho um jantar, uma social…

    Mas, em sua mente, as palavras do diretor já se entrelaçavam e se perdiam.

    Imerso em seus próprios pensamentos, manteve os olhos fixos no relógio preso à parede: 20h28.

    — Yamasaki? — chamou-o, percebendo sua distração, arrancando-o da inquietação que o consumia.

    Trazendo-lhe devolta a monotonia.

    — Ah? Eu… bem, sim!

    — Sim?

    — Pelo que entendi, há duas possibilidades: se a entidade estiver espalhada por todo o lugar, será rápido. Mas, se estiver concentrada, levará mais tempo… o suficiente até que eu alcance o horizonte dos eventos sobrenaturais e aí ele me conduzirá ao centro. É como procurar uma ratoeira: mesmo cego, o cheiro do queijo sempre me leva ao fim — Respondeu com confiança, deixando-o com os olhos em faíscas.

    Após, levantou-se instantaneamente e, virando-se em direção à porta, o despediu com entusiasmo.

    Sua resposta? Apenas um suspiro profundo, como se estivesse pronto para escapar, enquanto o velho o aplaudia com um sorriso ganancioso estampado no rosto.

    E, quando já se aproximava da saída, veio o último comentário:

    — Sabia que devia ter contratado você desde o início! Bem, estarei esperando!

    — Certo… — respondeu friamente, saindo e fechando a porta atrás de si com grande alívio.

    Pelo menos ele pagou bem…

    Seus lábios se curvaram em um leve sorriso de desdém, logo recolhido quando voltou a se concentrar no que importava. Ao longe, observou uma das portas se fechar, acompanhada pelo suave som das trancas sendo acionadas.

    A equipe de limpeza chegou.

    Bom… preciso entender o fluxo de energia na escada. Senti o fio, mas se perdeu quando subi a este andar… ou em algum ponto do trajeto.

    Quase que a solução lhe escapava, de tanto queimar neurônios.

    Mas…

    Levou um susto quando um grito ganhou forma ao seu redor, fazendo vibrar cada centímetro daquele corredor.

    Um ser humano pode gritar assim?

    Até mesmo suas vestes, encharcadas de água, estremeceram sob a onda sonora.

    E será? foi a única coisa que conseguiu imaginar.

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