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    — Então, você acredita no destino? — A voz rouca do jovem ecoa de repente, fazendo Yami desviar o olhar, sem sequer girar a cabeça.

    Ele o avista pelo reflexo no chão brilhante do supermercado. O rapaz tem um visual um tanto rebelde: calça rasgada, camiseta surrada e cabelos espetados que mais parecem desafiar a gravidade. Ele segura uma cesta abarrotada de latas de cerveja, cada uma mais barata que a outra, como se estivesse se preparando para uma noite despreocupada.

    — Ahn? — murmura Yami, erguendo uma sobrancelha com o típico ar indiferente. Ele nunca viu aquele sujeito, mas o jovem fala com a comodidade de quem já o conhece.

    — Falei contigo mesmo! — insiste o jovem, colocando a cesta no chão enquanto se aproxima dois a três passos com um sorriso largo. — Não deve me conhecer… Sou Miyazaki Watanabe. Um amigo da Shirasaki!

    Yami o analisa por mais um segundo, seus olhos percorrendo as bebidas na cesta e as roupas desgastadas do rapaz. Ele parece um tipo folgado e casual demais para estar ali falando com ele. Finalmente, Yami se volta, lançando um olhar desinteressado.

    — E o que tenho a ver com isso? — retruca friamente. — Ela te mandou me dizer alguma coisa?

    Yami carrega um ar intimidador, quase como um muro de espinhos que afasta qualquer um que tenta se aproximar. Amai, de alguma forma, é uma das únicas que consegue ultrapassar essa barreira. Mas com Miyazaki, ele não planeja ser nem um pouco amigável.

    — Ehr… não, nada disso. Só…

    — Olha, cara, sinceramente, eu não estou afim de papo. Vim aqui para fazer minhas compras e mais nada. Se puder… faz o favor de dar meia volta e cuidar da sua cerveja — interrompe Yami com sua habitual falta de empatia, deixando claro que a conversa está encerrada.

    O rosto de Miyazaki se contrai em uma expressão de desconforto, e, após um silêncio constrangedor, ele dá de ombros.

    — Certo, cara…

    — Ótimo, tenha uma boa tarde — Yami se vira e continua a empurrar o carrinho, dirigindo-se em direção ao caixa, deixando Miyazaki para trás, atônito e visivelmente embaraçado.

    Enquanto observa Yami se afastar, Miyazaki murmura para si, com um toque de ironia:

    — E depois eu é que sou o mal-educado…

    Ele solta uma risada baixa e um sorriso de canto surge em seu rosto, como se achasse graça na situação.

    — Menos mal… bem… — sussurra, enquanto um pensamento intrusivo surge, tirando-o daquele desconforto. — Sorte dele que estou ocupado… maldito Yami Yamasaki…

    Ele suspira, lançando um último olhar para Yami, que já está longe, e sacode a cabeça, pegando novamente sua cesta cheia de cervejas.

    “Que cara… Esquisito!”

    E suspira de novo, agora na seção dos repelentes, olhando para os frascos alinhados.

    “Não existe um repelente para humanos, não? AFF…”

    Pensa, revirando os olhos.

    Seu carrinho está quase cheio e, por sorte, ele encontra um caixa vazio, onde rapidamente inicia a fila. O plano é simples: comprar tudo e sumir o mais rápido possível.

    Enquanto isso, em outro ponto da cidade, a atmosfera é completamente diferente. Amai estaciona seu carro em frente a uma escola abandonada, o asfalto em volta já foi quase engolido pelo mato que cresce nas rachaduras do chão. A estrutura, desolada e pálida, é como uma sombra do que um dia foi, agora tomada por ervas daninhas e cercada por um silêncio inquietante.

    Ao sair do carro, finaliza uma chamada em seu celular:

    — Alô, é a Amai… Estou tentando falar com você e com o Arthur, mas vocês sumiram, hein? Enfim, deixei um endereço no chat. É um hospital abandonado… sabe, aquele que o império fechou por conta dos incidentes? Mortes, agressões, sequestros… enfim, o dono quer reabrir o lugar, então teremos trabalho pela frente. Certo?

    Ela desliga o telefone, deixando-o escorregar devagar entre os dedos, enquanto seus olhos permanecem fixos no hospital abandonado à frente. A pintura desbotada das paredes parece guardar segredos que há muito se recusam a morrer, histórias que, para muitos, deveriam permanecer enterradas. A estrutura se ergue como um monumento de tragédias, e em cada andar, Amai quase pode ouvir os sussurros das vidas perdidas, ecos amargos que flutuam pelas paredes frias e vazias…

    Mesmo estando do lado de fora ainda.

    Ela olha para as laterais da estrada deserta. Nenhum carro, nem mesmo uma bicicleta. Em outros tempos, aquela rua foi uma das mais movimentadas de Nova Tóquio, mas não por boas razões. O medo se infiltrou nas esquinas, nas calçadas quebradas, nas sombras daquele hospital que, outrora, recebia filas de desesperados. Até os necessitados passaram a evitá-lo, como se temessem que ao entrar ali jamais sairiam.

    As histórias são abundantes e macabras.

    Dizem que uma jovem grávida foi morta no hospital, seu corpo explorado para o tráfico de órgãos, enquanto seu bebê, cruelmente separado dela, foi entregue a uma mulher rica que pagou para suprir a própria esterilidade. É a história de um crime que todos suspeitam, mas que jamais foi provado, um entre tantos casos onde as barreiras sociais se mostram mais cruéis que qualquer cadeia. A jovem, pobre e vulnerável, não tinha família que a amparasse, e o pai da criança era uma figura ausente — ou talvez, um obstáculo silenciosamente eliminado por ousar se opor.

    Outros rumores falam de uma máfia que sequestrava crianças, e como muitas mães durante os partos, eram dadas como mortas em circunstâncias “lamentáveis”. Os doentes entravam vivos e, misteriosamente, saíam apenas em sacos pretos. Nenhuma denúncia parecia sobreviver tempo suficiente para ser julgada. Nenhuma investigação chegava aos tribunais. Os médicos, chamados de “anjos da morte” pelos poucos que sobreviviam, eram tão temidos quanto a própria morte. E mesmo após seu fechamento, o hospital continua a carregar sua aura decadente e suspeita, um cemitério de escândalos que jamais verão a luz do dia.

    Apressada, Amai cruza a entrada, indo ao encontro da frente do hospital, sentindo um arrepio profundo. Não há como evitar o peso daquela atmosfera. Um passo em direção à calçada e uma sensação visceral a atinge — uma sombra espessa que parece comprimir sua pele e arrepiar cada fibra de seu ser.

    Ela, uma exorcista experiente, acostumada à presença de espíritos sombrios, sente o coração apertar, como se uma força avassaladora lhe roubasse o fôlego.

    “Caramba…”

    Sussurra, tentando manter a calma.

    Por um instante, ela ergue sua aura protetora, tentando escanear o ambiente. Mas, estranhamente, a escuridão parece impenetrável, uma densidade opressiva que distorce tudo. Sua percepção — capaz de encontrar uma agulha no oceano — parece incapaz de atravessar aquele véu sombrio. Ela sente como se dezenas de demônios a rondassem, sombras famintas aguardando o menor deslize para emergirem do abismo e devorá-la.

    Essa missão não será fácil, e sua própria confiança, misturada à impaciência, acaba por traí-la…

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