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    — Não! — Gabriel surge entre as árvores, sua silhueta iluminada como se fosse parte da paisagem, os olhos brilhando com um conhecimento ancestral e um pesar escondido nas profundezas de seu coração. Um suspiro escapa de seus lábios antes de continuar: — Está em meus domínios. O reino da fantasia que minha mente projeta e recria incessantemente… ou seja, na materialização de meus pensamentos e anseios!

    Saindo das águas, o jovem tropeça, seus ferimentos sendo gentilmente lavados pela correnteza. A exaustão toma conta de seu corpo, obrigando-o a cair sobre a relva verde e viva.

    “Seu domínio inato…”

    O cheiro de terra molhada mistura-se ao ar fresco da floresta, um contraste com a dor que ainda lateja em seu corpo.

    — E… os demônios? — pergunta, sua voz meio rouca, enquanto levanta o olhar para o homem.

    — Eles? — Ergue uma sobrancelha, lembrando-se de repente, como se considerasse a pergunta uma formalidade desnecessária. Sentando-se sobre uma pedra coberta de musgo, sua postura está tão firme que nem parece o mesmo. — Estão em outra parte do meu inconsciente. Meu domínio é expansivo, uma teia infinita de realidades sobrepostas. É o mundo dos sonhos, onde milhares de cenários coexistem: pesadelos, fantasias, memórias!

    De repente, ele abre a palma da mão. Ali, dançando em um espaço impossível, um microverso brilha. Pequenos fragmentos de luz pulsam como estrelas, cada um contendo infinitas realidades em miniatura, vibrando em perfeita harmonia.

    — Cacete… — o rapaz engasga, hipnotizado pela vastidão contida em algo tão pequeno.

    — Descanse — ordena Gabriel, sem desviar o olhar do microverso em sua mão. — Você e Sofie… eu deveria ter ficado com vocês. Essas entidades estão misturadas de forma caótica. Há seres frágeis e outros que são terrivelmente poderosos. Não há filtros aqui…

    Ele fecha os olhos por um instante, como se carregasse um fardo que ninguém mais poderia compreender. O que repousa em sua mão é sua técnica suprema: Deitas Somniorum. Essa habilidade lhe permite controlar, manipular e separar cada sonho, pesadelo ou pensamento que cruza seus domínios, aprisionando aqueles que ousam desafiá-lo em uma realidade feita sob medida para suas fraquezas.

    — Aqui, você está seguro. Mas fora daqui… — de repente o olha. — Lembre-se: o mundo real não perdoa!

    — Não… eu e Sofie agimos mal… — A voz dele vacila, o peso de suas palavras caindo como uma rocha sobre seu peito. Ele fecha os olhos, sentindo o calor da vergonha se espalhar por seu corpo. — Kryntt já é experiente, nós dois… achávamos que poderíamos lidar da mesma forma. Você nos desculpa?

    Ele fecha os punhos, a aura ao redor dele pulsa, vacilando entre uma luz e a sombra do arrependimento. Ela se move como uma chama prestes a se apagar, refletindo a turbulência interna.

    — Jovens… achamos que salvaríamos o mundo, não é? — Gabriel ri sem graça, um riso baixo que não alcança seus olhos. Mas, por um momento, há algo mais profundo ali, uma tristeza ou uma compreensão silenciosa que se esconde atrás da fachada de humor forçado. Ele não parece cobrar nada, mas a dor que carrega é evidente. — Não se culpe… Enfim, deixa eu lidar com isso. Quando isso passar, teremos uma conversa. Uma conversa real, dessa vez…

    Ele desaparece antes que o rapaz possa responder, deixando para trás o eco de suas palavras como uma sombra que persiste no ar. Em um piscar de olhos, o jovem é novamente puxado para o vazio, o túnel frio e vazio que o engole sem misericórdia. O mundo gira e se distorce, até que, de repente, ele é projetado de volta para a realidade.

    Ele se encontra novamente diante de Sofie, que o encara com uma expressão desconfortável, evitando seu olhar. Ela hesita por um momento, como se o peso da situação a tivesse atordoado, antes de colocar a mão suavemente sobre seu ombro.

    — Desculpa… — murmura, sua voz baixa e incerta, os olhos voltados para o lado, como se fosse incapaz de suportar a intensidade do momento.

    Ele não pode evitar um sorriso triste, tentando aliviar a tensão com um pouco de leveza.

    — Você, que me desculpa? — ele pergunta, sua voz com uma ponta de humor disfarçado, tentando encontrar algum alicerce de normalidade no caos que os rodeia.

    Mas o celeste ainda está em seu domínio expandido…

    E de repente, o ar se distorce, e a entidade da guilhotina, finalmente percebe sua localização. Ele está em meio a uma rua deserta, envolto em uma escuridão opressiva. Seus movimentos são abruptamente restringidos por forças invisíveis, como se a própria realidade estivesse tentando sufocá-lo, pressionando-o contra os limites do que pode ou não pode fazer.

    “Esse lugar…”

    O silêncio na rua é absoluto, uma quietude sombria, como se o próprio ar tivesse sido paralisado. O único som que se destaca é o eco da respiração da entidade, que, pela primeira vez em sua existência, parece vacilar.

    O peso da incerteza esmagando sua confiança inabalável, sua presença normalmente imponente agora diluída pela sensação de que está… fora de lugar.

    “Gr… onde estou?”

    A mente luta para se orientar, tentando entender o vazio ao seu redor, o ambiente desconcertante. Mas antes que possa concluir seu pensamento, uma figura aparece diante de seus olhos, surgindo como uma sombra que corta o silêncio. Gabriel.

    — Maldição… o que você fez? — Rosna, mais por medo do que por raiva.

    O celeste suspira, um gesto que parece desarmado, quase desinteressado, como se já estivesse cansado de respostas para perguntas que sabe que não serão compreendidas.

    “Heróis… um herói não deixa matarem em sua frente, por isso eu não deveria ser chamado de um…”

    Inquieto, a fala da entidade de certa forma o golpeia, mesmo que ele se mantenha confiante externamente, internamente é outra coisa.

    — O quê? — Sua voz carrega uma ironia calma, tentando disfarçar sua fragilidade. — Acredito que… você, besta, nunca esteve em um domínio inato, não é?

    Com uma leveza incomum para alguém que parece carregar o peso de um poder imensurável, olha para suas próprias mãos, com um gesto quase entediado. Ele as ergue e, em um movimento preciso, materializa uma ampulheta diante dele, que flutua no ar como se desafiasse as leis do espaço e do tempo.

    Horologium Incubi. A entidade sente a tensão crescer e sua pele se arrepiar por inteiro.

    “Que diabos é isso? Técnica inata?”

    — Você terá… 1 minuto. — diz, sua voz calma.

    O tempo que se materializa diante da entidade é mais do que apenas um limite; é uma sentença. A ampulheta lentamente, derrama seu primeiro grão de areia, desenhando o inevitável destino que se aproxima.

    E de repente, a besta, após sentir as garras incríveis largá-la, como uma sombra que salta do abismo, desaparece e reaparece na frente do exorcista com uma velocidade impressionante. Sua presença agora é de um monstro faminto, lidando com a barreira translúcida que se ergue diante dele, com uma força brutal e implacável.

    O impacto é tão forte que o som da colisão ecoa pela rua deserta, reverberando como um trovão, mas o exorcista permanece imperturbável, seus olhos observando calmamente o caos à sua frente.

    — Como?

    A pergunta ecoa, mas não há resposta, apenas a amarga constatação de que ele foi jogado para trás. O impacto é tão forte que a terra abaixo de seus pés parece se dissolver sob ele, sua visão turvada. Mas, ao mesmo tempo, uma sensação estranha de repelir o mundo ao seu redor começa a se formar, como se uma força invisível o afastasse.

    — Você é tolo… — Ele sabe, e sente a verdade em cada palavra. Ele respira o poder de um celeste, de alguém capaz de fazer o impossível parecer simples, até mesmo as barreiras que surgem como uma extensão de sua própria vontade.

    A entidade tenta reagir, tentando entender o que está acontecendo.

    Barreiras, ele pensa, uma defesa impenetrável que parece criar com o mínimo esforço, como se apenas o ato de respirar fosse o suficiente para construir uma prisão ao seu redor. Mas então, em suas costas, algo se agita. Algo… luta.

    — Guillotina Mortis! — A entidade invoca, sua voz um rosnado de desespero, uma última tentativa de usar sua maldição. É um feitiço final, uma arma devastadora que corta tudo em seu caminho, uma morte definitiva que irá decapitar e está além das garras de uma defesa.

    Mas antes que a maldição tenha a chance de se concretizar, a entidade é interrompida abruptamente.

    O som de um caminhão a atinge com força descomunal. O impacto é avassalador, como um trovão cortando o ar, despedaçando a entidade em pedaços que caem como fragmentos de uma construção desmoronando. A dor é instantânea, mas não há tempo para senti-la. O exorcista desaparece em um piscar de olhos, sumindo da realidade como se nunca tivesse existido.

    — Um simples atropelamento… — ele ironiza, mas a verdade é que sua habilidade inata, vasta e expansiva, transforma sonhos tolos, pesadelos que jamais seriam mais do que um passeio no parque para as entidades, em verdadeiras salas de execução.

    Não há escapatória. Não há forma de evitar o inevitável. Mas o verdadeiro terror reside no fato de que tudo aquilo acontece dentro de seu próprio domínio, um reino onde ele detém o controle absoluto sobre o espaço e o tempo. Então, como poderia ser derrotado? Como poderia ele, com tamanha força, ser parado por um Demônio?

    Se os mais fracos são incapazes de até mesmo tocá-lo…

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