Capítulo 249 - Obrigado Elum
Mas, como ele muda as regras do jogo?
O que faz com que lhe custe tão alto assim?
Um pacto… O maior dos problemas que um exorcista pode enfrentar quando está à beira da morte e da derrota. Esse tipo de decisão, uma escolha que jamais deveria ser feita, mas que, diante da iminente queda, se torna a única opção possível.
E ele pagou com a própria vida, trocando um ano a mais de existência, energia e uma cura parcial para seu corpo por algo ainda mais valioso: todos os anos que iria viver.
Claro, não é uma troca tão ruim assim…
Não se comparando ao peso da morte sem ter feito algo. Ele estava enfraquecido, sua energia drenada pelos obstáculos enfrentados até ali, seu corpo, em frangalhos, precisando de um milagre para resistir mais um pouco.
Ele sabia que sua resistência não seria suficiente contra o traidor à sua frente.
Mas a vida, como sempre, tem um modo de compensar, não?
O pacto garante um tempo extra, mas, ao custo de perder parte de sua alma, resta-lhe apenas uma tênue chama de vitalidade para cumprir seu destino.
E o traidor, claro, nunca imaginou que alguém fosse tão longe. Os loucos, afinal, só são loucos até encontrarem alguém mais insano que eles. E ele, na beira do abismo, se torna um reflexo de seu próprio desespero, a verdadeira medida do que é capaz quando tudo está perdido.
Mas, ao ver-se preso na expansão de energia, Rasen sente a gravidade da situação.
— Trapaceou? Ah, entendo… Então, foi desesperado o suficiente para fazer um pacto? Mas está ótimo… Sua cara não está nada boa! — Com sua postura despreocupada, parece sorrir diante da aflição alheia, mas suas palavras só acentuam o peso.
Ele cruza os dedos…
Mas, com uma consciência clara, percebe o erro que está prestes a cometer. Já não tem mais técnica. Mesmo com a energia adquirida, sabe que não pode manter a expansão por muito mais tempo em uma disputa.
Estará liquidando sua própria remessa de energia e, se for até o fim, entregará a vitória ao seu inimigo!
“Espera… Mesmo com mais energia, não posso garantir a estabilidade da expansão, com esse espaço já suspenso, estarei liquidando minha remessa e dando vantagem a ele… Merda!”
Sabe que é tarde demais…
E é nesse exato momento que, em um suspiro de desespero, desiste.
Emquanto Kryntt, com um movimento rápido, suspende os dedos no ar, como se estivesse puxando algo invisível. Uma linha invisível estica-se, dando a impressão de que alcançou o limite. E o braço de Rasen, contra sua vontade, se estende, cederia à força que não pode controlar.
Mesmo com apenas um braço disponível, não se daria por vencido tão facilmente. Seu feitiço, ativo e preciso, é sua última esperança.
A Dança Teatral do Marionetista.
Mesmo assim…
“Não estará em vantagem!”
Pensa o híbrido.
Com uma voz arrastada e pesada, murmura as palavras de seu feitiço, tentando o aniquilar antes que faça outra jogada!
— Reversio incantationis: Disrumpe!
A magia ressoa como um eco maligno. Kryntt, por instinto, se agacha rapidamente, evitando ser destruído pela espiral de energia que está prestes a devorá-lo.
Mas há algo curioso nessa ação… que ele logo percebe…
— O que foi, Rasen? Por que está usando a reversão de sua técnica e não a expansão em si? — Zomba enquanto empurra o braço dele contra o chão, forçando-o a se agachar.
Ele ri com desprezo…
— Entendi, você não pode liberar toda a energia que absorveu, não é? Merda, como pode ter se colocado em uma situação tão burra?
— Ehr… E o que acha? — Ele solta um suspiro e, então, toma a única opção viável. Com uma expressão de pura insanidade, agarra o próprio braço com os dentes.
O som do osso quebrando ecoa pelo ambiente. Sangue espirra, manchando o chão com uma força tão visceral que o ar fica denso de sua dor. Mas ele não hesita, com um movimento selvagem, o parte como se fosse nada.
A dor é insuportável, uma ondulação de fogo e gelo por todo o seu corpo. Ele quase desmaia, mas seus olhos, ferozes, estão fixos no exorcista diante de si, como os de um animal selvagem, disposto a lutar até o fim.
— Maldição… O que você está fazendo? — O exorcista flexiona bem suas pernas, preparando-se para um contra-ataque, incredulidade estampada em seu rosto. — Você é um maluco…
— Miserável… Só agora percebeu? — A risada que escapa dos lábios dele é carregada de amargor, e um sorriso ácido toma sua face. O braço, que agora cresce novamente, não é mais o mesmo: escamoso, quase negro, tomado por trevas.
Ele sabe, se arrancar a pele, sua essência se converterá em algo imaterial, uma entidade que transcende o corpo físico. E avança, determinado, mas sua perna fica presa a uma nova corda, e, com um rápido movimento, seus dedos raspam o queixo do inimigo…
“Entendi…”
— Expansio energiae, vibratio explosiva!
Ele conjura com uma força renovada e, com sua mão, aperta o fio que liga a perna do demônio. Uma onda vibracional reverbera através do fio, como uma tempestade de energia concentrada, até explodir o membro em inúmeros pedaços.
O som da explosão é ensurdecedor, mas o exorcista não perde tempo, contornando rapidamente a situação. A perna do inimigo, já convertida, o impulsiona para cima, e ele não hesita.
— Idiota… Você só está me dando vantagem! — grita Rasen, tentando reagir.
“Ele deve achar que me fazer transformar em algo assim vai me fazer gastar toda minha energia…”
Pensa com um sorriso sombrio.
“Idiota, mal sabe ele que tenho reservas para lutar por dias!”
Ele também salta, indo parar nas costas do exorcista. Seus pés colidem com o palco de madeira, e enquanto ele entoa um feitiço, uma explosão faz o braço dele se despedaçar. É arriscado, muito arriscado, e a energia negra raspa em seu ombro, um disparo desesperado de seu inimigo, dando-lhe uma sensação de que está se colocando ainda mais em desvantagem.
O fluxo das trevas aumenta, e ele sabe que não terá muito mais tempo.
Com pressa, ele corre para a esquerda, agachando-se e dominando o fio agora ligado à perna esquerda. O feitiço está pronto e, no mesmo instante, seus cabelos loiros voam ao vento. Algo corta o ar e outro disparo de energia negra o atinge por um triz, arrancando um grito de dor e frustração.
Raspa sua cabeça, deixando-a sem cabelos e sem a orelha esquerda.
“Merda… A intensidade com que ele conjura as trevas é impressionante. Se não fosse por ele, eu já teria morrido muito antes!”
— Fica parado!!! — Rasen brada, a mão erguida, mirando com fúria, enquanto reverte sua queda. Seus chifres, enormes como os de um antílope, se erguem, sua nova forma está vindo…
Mas o momento é decisivo…
Em milissegundos, as trevas vêm na direção do homem, uma esfera de pura destruição, e ele precisa ser criativo, ousado. Usa o fio que os liga como uma corda, tentando segurar como se fosse uma bola de basquete. Mas não é uma bola qualquer. Ela pode explodir a qualquer instante, pesando toneladas.
— Grr…
Ele abaixa a corda o suficiente, e, agora, ligada ao peito do exorcista, a escolha é simples: ou a corda se torna fatal, ou ele mesmo estará se condenando à morte.
Mas com um sorriso confiante, ele entoa as palavras finais de seu feitiço.
É a última vez que ousa usar aquela técnica. Soltando a esfera, que continua sua trajetória, rasga sua perna esquerda em dois pedaços e, em um instante, explode, destruindo suas costas.
A dor é insuportável, cada centímetro de sua pele queima como fogo. Mas, antes que possa cair completamente, ele troca chumbo. Rasen é explodido inteiramente, do coração ao resto de seu peito, quadris e cabeça…
Mas o pior ocorre e ele se refaz, como uma entidade demoníaca completa. Seu corpo, agora uma massa de energia negra, renasce em sua nova forma.
— HAHAHAHAHAHAHAHAHA!
Sua gargalhada ecoa no ar, causando um arrepio no exorcista, que está agora no chão, sentado, a perna direita sangrando e sem um braço. Ele observa, exausto, enquanto a corda agora está ligada à mão direita, a ligação entre ele e a entidade demoníaca à sua frente foi renovada, mas…
— Por que está rindo, hein, Rasen? — Soa como um eco sombrio, suas palavras carregadas de desdém.
Ele levanta o olhar, olhos penetrantes, como se quisesse arrancar a alma do oponente com um único gesto.
Mas ele apenas ri ainda mais, o som se espalhando pelo ar como uma risada insana que ecoa no vazio da cena.
Ele não parece se importar com a ameaça. O sorriso, distorcido e grotesco, é um reflexo de uma mente que se perdeu há muito tempo.
— Por quê? — se vira lentamente, perfurando seu próprio peito com uma mão, enquanto o sangue escorre como se fosse líquido fervente. Então, com um gesto, retira seu coração e o atira para frente, direto ao exorcista. — Agora eu sou perfeito! Nem um coração de sangue, nem um cérebro que conecta minha existência física… Nenhuma dessas fraquezas me prende. Minha consciência… é cada fragmento de mim! E você, Kryntt, só me ajudou a acelerar esse processo.
A última palavra com um tom de zombaria, como se ele tivesse superado algo que o mundo ainda não conseguira compreender.
Mas ele observa, em silêncio, seu sorriso nunca falhando.
Ele não se apressa em responder, mas, em vez disso, cruza os dedos diante de si, seus olhos se estreitando enquanto mantém o olhar fixo em Rasen. Ele pode sentir a arrogância do demônio emanando, a crença cega na própria supremacia.
— Sério? Perfeito? — continua, a voz doce como um veneno. Ele parece quase delirante de prazer. O som de gemidos escapa de seus lábios, como se aquele momento fosse um espetáculo que ele não quer perder. — Você não muda, não é? Sempre preso à sua própria ignorância. Me diga, Rasen… qual foi a sensação de perder uma luta?
Pergunta, a insanidade claramente visível em seu olhar. Parece encontrar algum tipo de satisfação, até prazer, na provocação.
“Esse olhar…”
Rasen fica momentaneamente paralisado, o olhar perdido.
— Que foi? Não somos iguais?
Ele não entende o que está acontecendo, até que, quando seu corpo dá um passo em direção ao exorcista, uma onda de energia, pesada como a morte, o envolve. A sensação é insuportável, uma dor que atravessa a alma.
— Ehr… eu não perdi… — tenta justificar, a voz fraca, mas o desespero começa a crescer dentro dele.
Mas o exorcista dá outra risada, mais baixa, sombria, quase irônica.
— Não? — A voz dele é cortante, como uma lâmina afiada. — Ah, então demônios não são afetados por energia espiritual, com mais eficácia, não é?
A provocação está em seu tom, uma chama que aumenta a cada palavra. O outro, tenta reagir, mas já é tarde demais…
— Incantatio divina, Transmutatio in puppam ligni! — o exorcista grita com uma força imensa.
Sua magia, poderosa e irreversível, transforma Rasen diante de seus olhos.
“Cacete… o-o quê?”
O demônio é reduzido a nada mais que um boneco de ventríloquo, selado na forma inanimada de um objeto. A expansão de sua existência é cortada, interrompida pela precisão de um feitiço que domina até as entidades mais poderosas.
Quando a realidade retorna ao seu curso, o boneco cai no chão mórbido, seus olhos vazios fixos em um ponto distante, incapazes de entender o que está acontecendo. O exorcista olha para ele com um misto de triunfo e tristeza. Ele vence, mas não da maneira que esperava.
Gracas ao inimigo, consumido pela própria ambição. Mas não é uma vitória limpa, nem algo que lhe traga paz.
Ele sente o peso do que fez, a dor de um ser que, mesmo derrotado, não morre.
— Jurei que teria que colocar minha vida em pacto para te prender no boneco… — murmura, sua voz baixa e cansada.
Ele se deita lentamente, olhando para o céu escuro e carregado, enquanto a chuva começa a cair. A água fria toca seu rosto, como se fosse uma bênção amarga.
— Seres físicos… possuem corpos inteiramente materiais, feitos de matéria neutra. Mas, ter se tornado um ser negativo… você foi bom nisso, ao menos!
Ele até sorri, mas o sorriso não é de alegria. É uma aceitação melancólica, uma forma de se despedir de algo que nunca deveria ter existido.
A chuva cai incessante, o som das gotas batendo na terra parece selar aquele destino. Vira a cabeça para o céu, seus olhos se fechando por um momento, como se estivesse em gratidão.
— Elum… Obrigado! — Mas em sua voz há mais uma carga de pesar do que de gratidão genuína.
Sabe que a vitória não é algo puro ou simples. Ele jogou com forças além da compreensão, e agora, ele está apenas tentando entender as consequências.
Não seria mais exorcista, sem um braço, sem uma mão e sem a orelha, não poderia mais lutar, e assim, estaria condenado a apenas um ano de vida normal. Afinal, escolhas têm consequências até para os melhores!
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