Capítulo 5 – O impuro
De olhos fechados, ele ergueu o rosto para o céu, absorvendo por um breve momento a serenidade que seguia à tempestade.
A energia do embate ainda se dissipa ao seu redor, purificando o local da presença maligna, mas também da sua própria. O ciclo havia sido quebrado, e na ausência de heróis ou vilões, a paz enfim prevalecia. O único som que restava era o crepitar das chamas se extinguindo lentamente, suas faíscas ecoando no silêncio, antes de sucumbirem ao peso do tempo.
Não demorou até que o diretor-geral aparecesse. Ele surgiu pela porta metálica – a saída de emergência nos fundos do colégio, ironicamente a única estrutura que havia resistido ao espetáculo caótico.
Abanando o rosto com as mãos para afastar a fumaça densa no ar, sua expressão oscilava entre a incredulidade e a fúria ao contemplar o estado do lugar.
— YAMASAKI?! O QUE ESTÁ ACONTECENDO AQUI? O QUE DIABOS ACONTECEU COM A MINHA SALA? MINHA ACADEMIA?! ESTÁ TUDO DESABANDO! — bradou, enquanto o ginásio, diante de seus olhos, desmoronava lentamente.
Irreconhecível, o espaço agora não passava de fragmentos dispersos, um pálido reflexo do que um dia fora.
Uma barra de ferro despencou à sua frente, erguendo uma cortina de poeira. O exorcista, arrancado de seu transe, lançou um olhar de desprezo para a cena. A ventania gerada pelo impacto varreu suas costas.
— Ah… o meu ginásio! — murmurou o diretor, quase desfalecendo, sua voz carregada de lamento.
Do lado de fora, os empregados, ainda atordoados, observavam em silêncio o caos, incapazes de processar o que acabara de acontecer.
— O que aconteceu? Ué, exorcizei o demônio! — respondei, com uma indiferença quase insultante. — Que cara é essa? Está passando mal? — completou, elevando a voz em um tom irônico e impaciente.
O diretor permaneceu em silêncio por um instante, incrédulo, antes de explodir:
— Maldição! QUE CARA É ESSA? PASSANDO MAL?! — gritou, sua voz ressoando. — Ah, esse ginásio… SEU PIRRALHO! Você tem ideia de quanto gastei nele?!
Com cada palavra impregnada de fúria e frustração, ele finalmente desabou, caindo de joelhos. As mãos tocaram o chão destruído enquanto um lamento amargo escapava de seus lábios:
— Todo aquele dinheiro… jogado no lixo! Por que fez isso comigo? Por quê?!
Enquanto seus funcionários o amparam, segurando-lhe as costas e murmurando palavras de conforto. Evitavam olhar para o exorcista, cuja postura cruel e arrogante os deixa desconfortáveis.
— Como os alunos vão treinar agora?! — exclamou, socando os escombros com as mãos trêmulas.
— E o que você queria que eu fizesse? — retrucou, sua voz carregada de irritação. Ele cerrou os punhos antes de continuar, sem hesitar: — Considere isso como parte do débito que você tem com as vítimas da sua ganância. Pelo menos tenha a decência de dar os pêsames aos pais delas!
O tom ácido e cínico das palavras foi um golpe direto. Os falsos lamentos cessaram imediatamente, enquanto ele erguia o rosto, incrédulo, encarando-o como se tivesse sido atingido por um soco invisível.
— O quê? — indagou, a voz oscilando entre raiva e descrença. — O que disse, Yamasaki Yami? Está me acusando sem provas?
Ele parou por um instante, sem se virar.
— Você ouviu. Afinal, não houve vítimas, certo? Considere isso uma brincadeira. Não que eu me importe; já fiz o meu trabalho — Sua voz era fria, quase desinteressada, como se falasse mais para si do que para o diretor.
Com passos firmes, ele começou a caminhar, relaxando os punhos e focando apenas no caminho à frente.
— Você mesmo causou isso… Sua sorte é que fui bem pago.
Ao ultrapassar a porta, sentiu um alívio inesperado, como se estivesse deixando para trás o peso do caos. Nem mesmo os gritos desesperados do homem foram capazes de apagá-lo.
— Mas, enfim, diretor-geral… é um adeus!
— Maldito! Maldito exorcista! Vou manchar o seu nome! Que desgraçado! — vociferava, cheio de ódio, enquanto atirava pedras que rolavam pelos escombros ao redor dos pés do garoto. Este, no entanto, sequer se deu ao trabalho de reagir.
— Manchar o nome de um impuro? Interessante… — murmurou, sem se virar, enquanto continuava seu caminho. Agora, tinha dinheiro no bolso e uma meta clara em mente: comprar um novo smartphone.
No trajeto de volta, revisitou mentalmente o percurso pela avenida Ie até retornar ao bairro de Katakana.
Como sempre, optou por subir as escadarias, uma rotina que ele seguia quase mecanicamente, até alcançar o santuário que era seu pequeno recinto.
Ao entrar no apartamento, o fez com pesar. Jogou o sobretudo sobre o sofá enquanto segurava o cheque com firmeza, o peso da exaustão evidente em seus movimentos.
Decidiu, sem hesitar, que não faria mais nada naquele dia.
Seu uniforme, impregnado pelo odor das trevas e do suor, estava imundo, mas o cansaço era maior do que qualquer preocupação com limpeza. Com pressa, atirou o cheque sobre a mesa que dividia a sala e a cozinha, alinhada a uma bancada de mármore polido.
Sem pensar duas vezes, correu para o quarto e se jogou na cama, o corpo afundando no colchão como se procurasse um refúgio. Ainda de sapatos, sentiu a maciez das cobertas e o calor reconfortante que o envolvia.
A dispersão cessa, os olhos se fecham, refletindo toda a exaustão e cansaço que o envolvem.
Adormece, experimentando o primeiro sono real após mais de duas semanas de apagões. Uma paz tão rara que parecia rivalizar com os raios dourados de um entardecer pintado por Aurora.
À medida que mergulha, é conduzido às profundezas de sua mente. Ultrapassando as barreiras do subconsciente, uma nuvem negra se dissipa diante dele, flutuando na escuridão e revelando um cenário envolto por um negro abissal.
Gradualmente, a escuridão se desfaz, revelando um fragmento de sua memória:
Novamente, estava no terceiro dia da primeira passagem do ciclo 381, um dia memorável marcado pela primeira queda de neve sobre a cidade montanhosa de Nagoya, após os ciclos de dias chuvosos e ventanias apocalípticas.
O frio do inverno toca sua face, e o aroma daquele lugar é palpável.
— Esse lugar… — murmurou, enquanto o vapor de sua respiração se dissipava no ar. Flocos de neve pousaram suavemente sobre seus ombros, derretendo ao toque de sua pele.
Diante de seus olhos, erguia-se a casa nas colinas, pertencente à sua família. Uma lembrança tanto acolhedora quanto dolorosa o atravessou, fazendo uma lágrima solitária escorrer pelo seu rosto. A construção, isolada da impiedosa metrópole, parecia adormecer sob a proteção das montanhas.
As luzes estavam acesas, e o carro de seu pai repousava na garagem improvisada ao lado da casa. A visão trouxe à tona memórias muito soterradas, uma mistura de alegria e pesar. Por um instante, um calor nostálgico percorreu seu peito — um raro vislumbre de felicidade em meio ao frio da realidade.
O som de pratos se quebrando trouxe-o de volta à realidade. Gritos femininos ecoaram, seguidos pelo retinir de uma lâmina. O torpor foi substituído por um arrepio que percorreu todo o seu corpo. Não era medo, mas uma angústia que o paralisava.
— Mãe? Pai? — murmurou, enquanto a cena se desenrolava diante de seus olhos, como um pesadelo vivido.
Seu pai, Sasaki Yamasaki, emergiu da casa com um salto desesperado. Escorregou na neve, a camisa de lã encharcada de sangue. Faltava-lhe um braço, e o líquido escarlate pingava, misturando-se com o branco.
— Yami? Filho? Se estiver ouvindo, corra! — gritou, os olhos carregados de medo mas também determinação.
Mal teve tempo de reagir antes de perceber a presença do inimigo: Gallael. A figura se materializou na entrada da casa, com os pés sujos de sangue. Um sorriso cruel adornava seu rosto, e a lâmina que empunhava cintilava, ensanguentada e gravada com runas misteriosas.
O príncipe das trevas, filho de Luciel, avançou com uma tranquilidade sinistra, seus olhos vermelhos brilhando como brasas vivas. Com um único golpe de sua espada maldita, decapitou Sasaki; e o corpo do homem foi imediatamente consumido pelas trevas, transformando-se em uma massa irreconhecível.
Mais sangue escorreu pela neve, tingindo-a de vermelho, enquanto a cruz prateada que usava voou para as mãos do filho, agora banhadas de sangue. Ele tentou engolir a avalanche de emoções, mas sua mente estava em frangalhos.
De novo, sua cruz em minhas mãos…
Recuperando a compostura, preparou-se para encarar, mais uma vez, a face demoníaca da entidade, assim como ela fizera.
A besta, erguendo sua lâmina, fixou-o com a ferocidade de um leão, finalmente ciente de sua presença.
— Prometo exorcizar-te, maldito, mesmo que a eternidade se desenrole diante dos meus olhos e eu mergulhe nas profundezas do abismo! — declarou, mais uma vez em sua vida, com os olhos arregalados, como o olhar de um assassino despertando de seus próprios anseios.
Então, viu tudo se desfazer como fumaça no ar e caiu em um abismo infinito. Enquanto a cruz que carregava desaparecia, ele novamente escolheu seguir pela escuridão de sua ira.
Caiu, rasgando-a como se fosse uma bolha de água, aterrissando na neve, que se desdobrava como o tecido de sua cama diante do impacto.
A intensidade do momento transparecia em suas mãos, que apertavam a própria garganta. De repente, sobressaltado, acordou suado, com os cabelos grudados nas costas.
Seus olhos estavam completamente negros, algo incomum, assim como suas veias roxas, pulsando na pele, refletindo sua aura sombria.
Seus lábios estavam secos e, na cama, o crucifixo estava jogado, como se tivesse sido arrancado de seu pescoço.
— Gallael… Onde está você, seu desgraçado? — Sentindo o peso da maldição que carregava, ele sabia que sua noite mais uma vez fora tomada por tormentos incessantes, um ciclo que parecia não ter fim.
Dia após dia, essa era a sua sina
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.