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    Sentido é só outro nome para prisão.

    A frase caiu dentro dele como uma pedra lançada num poço infinito.

    Desceu. Ruiu. Estilhaçou as últimas certezas que ainda resistiam. Os vales da mente se distorceram ao redor de si, como se toda a topografia interna se curvasse para expulsá-lo do que antes chamava de realidade.

    O chão sob seus pés? Um conceito frágil.

    O ar? Um silêncio viscoso, difícil de atravessar.

    E ele… uma presença deslocada dentro do próprio corpo.

    A realidade que o englobava agora não passa de um pensamento pífio — uma estrutura quase patética, que sustenta seus vícios de tentar existir.

    Um simulacro de mundo onde ele se apoiava só para não desabar de vez.

    — Arthur?

    O chamado veio como um fio puxado de muito longe, tênue, balançando no breu. Não tinha dono. Não tinha direção.

    Vibrava e desaparecia como um erro de memória.

    — Arthur…

    A repetição parecia mais um soluço da Intercessão do que uma voz.

    — Quem…?

    A resposta saiu sem dono também. Nem soava como ele.

    — A-ar… th-hur?

    As sílabas tropeçaram umas nas outras, arrastando-se em um sussurro.

    A cada piscada, figuras de névoa surgiam na lateral de sua visão — contornos bizarros, humanos e não humanos, como reflexos malformados tentando existir. Cada rosto evaporava antes de completar a pergunta que carregava.

    O ar tremeu. Algo cedeu dentro dele.

    — Cacete!

    O grito não encontrou espaço para se espalhar; bateu contra o vazio e morreu, abafado.

    O peito subiu rápido, depois despencou.

    Seu coração era metafísico.

    Pulsava em algum lugar além da carne, além da lógica, além da própria memória.

    Batia como um conceito, não órgão, insistindo em existir mesmo quando tudo o mais já havia sido destituído de forma.

    Mas… o que restava de seu eu material?

    Nem ele sabia.

    — O que… é isso!? O que significa?

    Mas a pergunta não ecoou. Nada ecoava ali.

    — Uff…

    Ele desistiu por fim.

    O ar saiu por entre os lábios num sopro cansado, quase um pedido de pausa. A cabeça pesava como se o mundo estivesse apoiado nela.

    Os dedos tremeram.

    As unhas arranharam a própria palma.

    — Eu devo estar… no purgatório…

    O ambiente não ajudava a negar: sombras achatadas, luz nenhuma, o horizonte dobrado como papel molhado.

    As mãos se fecharam até doer.

    Dor também era ilusão.

    Por que eu…?

    O pensamento veio carregado de ferrugem, arrastado.

    — Foi tão errado assim o que fiz…?

    Ele não lembrava do erro.

    E, no entanto, a ausência da lembrança pesava mais do que a culpa em si, como se o vazio fosse a verdadeira sentença.

    Talvez fosse essa lacuna, essa falha luminosa no tecido da memória, a chave de sua libertação.

    Talvez só se escape quando não se sabe mais de onde se fugiu.

    A dúvida respirava dentro com a suavidez de um sussurro : e se remoer fosse o primeiro passo para finalmente existir?

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