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    Quando mergulhou, despencou nas profundezas das águas, que pareciam infinitas — uma dimensão acessível apenas para si.

    Era um de seus muitos feitiços expansivos. Uma qualidade quase exclusiva de seu domínio sobre suas técnicas inatas. Normalmente, um exorcista experiente dominava de quatro a cinco variações — não por limitação real, mas porque era difícil não ser limitado pela própria imaginação.

    E lá de baixo, viu os pés de seu jurado assassino movendo-se sobre a fina parede que separava os cenários. Caminhava atentamente pelo deserto de sal, enquanto os olhos dele eram lentamente preenchidos pelo azul profundo. Seus cabelos ondulavam ao seu redor, como se dançassem nas correntes invisíveis da água.

    A dor tomava-lhe o peito…

    O sangue de seus ferimentos dançava no ritmo das águas, até que sua aura preencheu cada centímetro de seu corpo, brilhando tão intensamente quanto a luz da manhã, selando-os.

    Foi como o despertar de sua vontade, sobrepondo-se à angústia.

    E, em questão de instantes, como uma explosão, irrompeu das águas, lançando gotas para o alto, ofegante e com o olhar determinado voltado adiante, chamando a atenção de seu prometido.

    Suas feridas mal haviam se regenerado — fora apenas possível estancar o sangue… Recuperar membros era impossível, até mesmo para alguém capaz de simular matéria e reestruturar tecido.

    — Você não morre de jeito nenhum! — exclamou, arrastando a lâmina ao redor e girando-a entre os dedos. — Fez pacto com o diabo, é?

    Romero respondeu com um sorriso sem jeito diante da afirmação e, determinado a encerrar aquele embate, encarou da ponta do cabo à lâmina.

    — Será você e essa lança… — erguendo a mão esquerda próxima ao rosto, emanando uma aura levemente esverdeada. — É frustrante tentar te surpreender quando você confia somente em uma lâmina presa a um cabo… Ehr…

    — É, ela será minha única companheira de combate! Assim, consequentemente, sua técnica restritiva não se ativa! — afirmou, apontando a lâmina como uma flecha sobre a palma da mão, de forma direta.

    — Como!? Maldito! — Então, em um movimento brusco, chutou as águas cristalinas e envolveu o braço restante nelas. — Reflexio, Pulsatio Continua! — sua voz ecoou, e, em seguida, um pulsar atingiu as gotas de água e se intensificou, como uma onda de choque, alcançando-o no mesmo instante.

    — Sorte, no final. Só sorte.

    Cada reflexo aumentava a potência do feitiço — mera expansão de seu domínio. E, como um disparo sônico, o golpe criou ondas concêntricas ao seu redor.

    A ideia de refletir uma concepção utópica, como a perfeição, consistia em se amplificar a cada reluzir, tornando-se mais intensa e vívida a cada manifestação, em vez de enfraquecer ou se dissipar com o tempo.

    — Merda! — resmungou no instante em que foi atingido, sentindo uma pressão tão esmagadora que, se não fosse pela rigidez de seus músculos, teria todos os ossos quebrados.

    Sangue escorreu de seus ouvidos e lábios.

    — No próximo movimento, você será morto! — prometeu, começando a correr em sua direção. Em um piscar de olhos, já estava diante dele.

    Hideki tentou acertá-lo em linha reta, mas desviou, antecipando seu próximo movimento. Que agachou-se com a lança e a lançou para o lado, à esquerda.

    O jogo estava prestes a virar?

    Não! Aproveitando o desvio, escapou de dois ou três arcos laterais — giros insanamente rápidos da arma — e se abaixou.

    Num instante, agarrou as águas com as mãos e as arremessou para cima, atingindo-o — pegando-o completamente de surpresa.

    — Reflexio, Pulsatio Continua! — proferiu novamente, desferindo mais um ataque.

    Mas dessa vez, não haveria escapatória.

    Outro pulsar invisível atingiu o rosto dele, e sua cabeça explodiu instantaneamente, espalhando sangue e massa encefálica pelo ar, manchando as águas cristalinas. Os ossos de seu crânio foram esmagados pela pressão, pulverizados no mesmo instante; seus órgãos se romperam, e os vasos sanguíneos explodiram de dentro para fora.

    Foi tão frio, a forma como fez aquilo… e tão real.

    Assim era a morte — vinha do nada.

    Sem descanso, colocou as mãos sobre o corpo decapitado, segurando-o para que não caísse. Em um movimento calculado, cristalizou a metade superior do cadáver. E, com um chute frontal envolto em sua aura, destruiu a figura como se fosse feita de gelo fino.

    Finalizado…

    Metade do corpo se converteu em uma chuva de carne moída congelada. Da cintura para cima, os restos caíram com um baque nas águas — agora imundas e tingidas de vermelho.

    Como o último suspiro de seu ser, a lança caiu aos pés dele e desapareceu no ar, desfazendo-se em fragmentos roxos e negros.

    O confronto, enfim, terminara…

    Não.

    O silêncio tomou conta do ambiente, interrompido apenas pelo som das águas agitadas, agora contaminadas pelo sangue. O iluminado respirava pesadamente, sentindo o peso da batalha recém-terminada.

    Seus olhos, fixos no espaço onde o outro jazia, refletiam uma mistura de alívio e exaustão.

    Pensei que daria mais trabalho…

    Para que tanta confiança?

    — Enfim… — murmurou, cruzando os dedos e encerrando seu domínio inato. O véu dimensional que separava aquele mundo do real caiu, e o resto do corpo jazia no terreno devastado do embate.

    O sangue jorrava, perfeitamente separado das águas, escorrendo aos pés do moribundo. Ele suspirou, suas pernas trêmulas pela iminência da morte. Mas esse alívio foi breve…

    O ar ao redor parecia vibrar com a energia residual. O véu entre os mundos oscilava, enfraquecido, dissolvendo-se lentamente como névoa. A realidade, fragmentada por instantes, começava a se reconstituir, trazendo consigo uma estranha, quase desconcertante, sensação de calma após a tempestade. As sombras que haviam dançado, gritado e se contorcido durante a batalha agora recuavam, sendo engolidas pela luz crescente do amanhecer.

    Então, ajoelhou-se. Os joelhos cederam sem resistência, e a palma da mão encontrou a superfície do chão ainda tingido de sangue. Os dedos trêmulos deixaram rastros nas areias avermelhadas, sentindo o calor e a umidade. A mente, ainda imersa na névoa da luta, vagava pelos ecos dos momentos que haviam passado.

    Quase… Quase morri…

    O cenário ao redor, outrora um caos opressor de escuridão e destruição, começava a revelar sua beleza escondida. A luz da aurora nascente pintava com um gradiente de cores intensas e etéreas, enquanto a névoa remanescente da batalha se dissipava, como se o mundo respirasse aliviado por ter sobrevivido à noite.

    E o celeste, convencido de que havia escapado por um fio tênue do destino, levanta-se lentamente, sentindo o peso da vida retornar ao corpo, a solidez da terra sob seus pés como um lembrete silencioso de que ainda está ali. Sua mão, ainda manchada de sangue e suor, treme sutilmente — não apenas pelo cansaço, mas pela descarga de tudo o que foi — e, ainda assim, há uma centelha renovada em seu olhar.

    Ergue o rosto para o céu, permitindo que a brisa fresca lave os vestígios da batalha de sua pele, como se a própria aurora o redimisse.

    Passos lentos o conduzem ao redor do cadáver, agora inerte, privado de toda ameaça. O silêncio ao redor é absoluto, quase reverente.

    — Enfim… — Um suspiro do espírito que se recusa a ceder.

    As sombras, já tênues, dissolvem-se na luz do futuro — uma alvorada não apenas do mundo, mas da alma. E avança, com o fardo e a força de mil batalhas às costas, e a promessa silenciosa de perseverar, aconteça o que acontecer.

    Mesmo que lhe faltasse um braço, mesmo que sua mão restante estivesse partida ao meio, rasgada até os ossos. Ele morde o lábio com força, tentando conter o grito que teima em subir pela garganta. A dor é lancinante, cada passo uma afronta ao corpo dilacerado — mas ainda assim, ele segue.

    Seria quase heróico, por mais trágico. Um fim digno após tamanha luta. Mas o destino, cruel e incansável, ainda não havia encerrado sua farsa.

    Diante de seus olhos exaustos, o impossível se desenrola.

    Sombras serpenteiam o que resta do corpo de Hideki. Primeiro sutis, depois vorazes, envolvem os pedaços partidos com um apetite. Uma aura negra, pulsante, brota do solo rachado — viva, faminta. E então, o horror toma forma: fragmentos de carne e ossos estalam, se arrastam e se fundem em espasmos violentos. Órgãos se moldam novamente, guiados por mãos invisíveis de trevas.

    O que era pó torna-se estrutura, o que era lama torna-se vida.

    Ele ressurge. Sem camisa, coberto de sangue seco e sombras que ainda escorrem como névoa ao redor de seu corpo reconstruído. Um pesadelo renascido, moldado no limite entre mundos.

    E então, sorri.

    Um sorriso torto, psicótico, como se algo lá dentro tivesse se quebrado para sempre — ou talvez algo novo tivesse tomado seu lugar. Não havia sanidade que resistisse à travessia. Um minuto morto… um minuto no abismo entre os mundos. Lá, o tempo se curva. A realidade não é lei. Lá, horrores sem nome sussurram segredos que nenhuma alma deveria ouvir.

    O celeste sente o ar se tornar pesado novamente. A esperança se desfaz em sua garganta. Mas desta vez, algo nele não vacila.

    Porque se voltou do inferno… também pode ser enviado de volta.

    O iluminado, de pé, ferido e vacilante, observa com olhos arregalados o terror que se revela por completo.

    Das costas, formas sombrias se erguem. Chifres, retorcidos e afiados como lâminas, emergem da carne reconstruída, como se fossem entalhados à mão por alguma entidade. Cada centímetro pulsa com energia demoníaca. E então, como um escultor das trevas, ele estende a palma da mão — a sombra em seu entorno se curva à sua vontade, girando em espirais negras até se solidificar em adagas com o formato de luas crescentes, com gumes irregulares como dentes de uma besta.

    Não é mais humano. Não é mais apenas um guerreiro. Ele é um terror encarnado.

    E avança.

    O tempo desacelera — o espanto, a inevitabilidade congelam o instante como uma fotografia.

    Seus pés esmagam o solo como martelos, rachando a terra a cada passo. A atmosfera ondula ao redor dele, distorcida por uma força tão brutal que até a luz hesita em tocá-lo.

    O som se curva. O mundo prende a respiração.

    Sentindo o peso esmagador do destino à sua frente, crava os pés no chão e firma sua postura. O mundo inteiro parece comprimir-se ao redor dele, esperando o impacto final. Tudo pulsa — não em vida, mas em suspense.

    A morte já estava decidida. Ou assim parecia.

    Seria o fim dele… se ELE não tivesse intervindo.

    — Quem é você!? — rosna o recém ressuscitado, a voz reverberando como trovão, rouco e gutural. Seus olhos, outrora chamas negras devoradoras, vacilam, perdendo brevemente o brilho sombrio. Um grito de dor escapa de seus lábios quando seu braço, pronto para o golpe fatal, é subitamente contido.

    Como se a própria escuridão hesitasse.

    Entre eles, uma presença. Silenciosa. Absoluta.

    — Um… demônio? — sussurra o iluminado, o coração batendo como um tambor de guerra dentro do peito. A lâmina de trevas roça sua garganta, deixando um traço de calor queimado, mas não corta.

    A sombra morre ali. Dissolve-se. Desaparece.

    — Já basta, Bezeel! — diz a voz. Não é um grito. Não é um sussurro. É uma ordem, envolta em uma calma inegociável.

    Hideki — ou aquilo que restava de seu nome — fica paralisado. Os músculos contraem. A sombra que o envolvia treme. Por um momento, parece que o próprio mundo recua.

    E então aparece.

    Asmael.

    Emergindo da penumbra como se fizesse parte dela. Traços finos, elegantes, olhos tão antigos quanto o primeiro amanhecer deste mundo. Seus cabelos vermelhos — como sangue sob a luz do crepúsculo — caem como chamas silenciosas ao redor do rosto impassível. Uma beleza fatal, quase etérea, que não pertence a nenhuma ordem conhecida.

    O homem o encara, e nesse breve contato de olhares, algo o atravessa. Um fio de lembrança? Uma revelação? Ele não saberia dizer. Mas sente.

    — Per benedictionem abyssi, concede mihi potentiam mutandi realitatem, tempus! — ressoa a voz da entidade, firme como o sino de uma catedral.

    As palavras — malditas, arcanas, impossíveis — reverberam no tecido da realidade como lâminas atravessando véus sutis do que separava mente e alma.

    Sílabas que o tempo teme pronunciar. A terra treme. O ar se rasga.

    A Chronocracia Infernal havia sido convocada. Revelando, aquele teatro… não era encenado apenas entre homens

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