Capítulo 199 - Conto Passado: Romeu e Julieta — Part III
É o momento em que Azaael se ergue contra o destino que lhe foi imposto, entregando-se à rebeldia em nome de um amor que queima mais do que os próprios infernos. Sua voz ecoa como trovão, carregada de fúria, mesmo que mascarada pela calma que ele, a ira, exibe.
— Terá que tentar mais do que um golpe direto para me parar!
O ar ao seu redor se parte, como vidro sob imensa pressão.
Então, de suas costas, dois braços monstruosos irrompem, rasgando carne e realidade. Sua forma Berserk emerge como uma obra de caos e glória, o ápice de seu poder demoníaco. A aura que o envolve é tão densa, tão abrasadora, que até mesmo os mais antigos e temidos estremecem.
“Ele está em pleno poder!”
Pensa Asmael, com olhos arregalados.
A percepção da aura negra que se impõe como um desafio deixa tanto a luxúria quanto a gula inquietos.
O jarro, que mede os limites, transborda…
Num instante, a gula personificada dispara em direção ao titã. O que se segue é um espetáculo aterrador, uma dança caótica entre predador e presa.
Mas o predador é Azaael, e o que deveria ser uma ameaça torna-se apenas uma mosca diante do leviatã em que ele se transforma. Um único golpe, seco e avassalador, lança Bezeel como uma estrela-cadente contra o horizonte infernal, fazendo-o voar e rasgar o teto do palácio…
“Merda… tudo está pior do que imaginei. Liliel, se eu não fizer teu nome brilhar, apenas a escuridão me acolherá… Serei só eu punido!”
Esse pensamento é um mantra desesperado na mente dele, enquanto a realidade de sua rebelião se consolida. Ele sabe que a punição será a morte. Não uma morte comum, mas o esquecimento, o apagamento absoluto… ele já sabe, e por isso, tanto tempo para pensar, mas, de que adianta? Viver à beira de uma ameaça ou enfrentá-la? Ele está a enfrentando.
E diferente de seus irmãos, que também seguiram o mesmo caminho, ele não apenas desafia o trono de Luciel; ele tenta o derrubar com o peso do impossível: o amor.
Só esse: O amor, aquele sentimento proibido, tão humano… é uma afronta ao Império. Como ousa alguém amar quando o único desejo permitido é o poder? Luciel, o Imperador, não é cego ao que isso significa. Como os outros, ignorantes, julgam, o amor não é uma fraqueza; é um desafio, uma declaração de que a vontade de um coração pode superar a ordem estabelecida.
O misto de emoções no Imperador é um redemoinho corrosivo: ciúme, raiva, ódio… inveja. Daquele que ousa sentir o que ele nunca permitirá a si.
— Você está fora de si, Azaael! — brada, mas sua voz carrega mais do que autoridade.
Há um tremor. Não de medo, mas de desconforto.
Azaael responde, não com palavras, mas com ação. Num instante, ele atravessa o espaço entre eles. O golpe quase esmaga a entidade de cabelos loiros, que é obrigado a se jogar para a direita de seu trono, desviando por um fio. Pela primeira vez em eras, e com uma rajada de vento, o grande Imperador sente algo semelhante ao incômodo… dor tocar sua pele.
“Estou? Não seria… você?”
Pensa, escapando do campo de visão como um borrão, enquanto desvia de rajadas negras, que se lançam como o balançar de um chicote, conjuradas por Asmael.
Esse golpe não é para ser eficaz fisicamente, mas para ferir o ego.
— O que é poder sem liberdade, Luciel? O que é um trono sem um coração? — provoca.
— Maldição… você… como ousa? — brada a entidade, sua voz carregada de incredulidade e cólera, como trovões ecoando no abismo. — Há bem mais que um coração em jogo, meus punhos de ferro estão a todo vapor!
Com um gesto quase imperceptível, como se o próprio ar fosse sua serva, o breu começa a emanar de seu ser. É um mar de trevas, um abismo em expansão, que carrega o peso da destruição. Sem erguer as mãos, sem precisar de palavras malditas, ele convoca uma barragem de escuridão. É uma chuva de sombras cortantes, implacáveis, que se lançam contra o desertor com a fúria de mil tempestades.
Mas, quando a negritude se dissipa, revela-se um cenário que desafia toda lógica: Azaael está lá, ainda inabalável, sem um único arranhão. De sua postura emana um desprezo quase divino, como se a escuridão inimiga fosse nada mais do que uma brisa insignificante.
No braço esquerdo inferior, algo começa a ganhar forma. Um dragão, pequeno e sinistro, materializa-se, suas escamas refletindo um brilho carmesim que contrasta com o vazio ao redor. Em sua forma completa, ele se enrola em torno do braço do rebelde e, com um movimento lento, abre a boca, deixando entrever a energia pulsante que carrega.
O piso do palácio, capaz de resistir a mil apocalipses, começa a rachar. O poder libertado ali é radioativo para os demais demônios, que estão abaixo dos quatro.
“São três…”
Ele pensa, sentindo a urgência se transformar em pânico. Por mais poderosa que seja sua técnica, ela tem uma fraqueza… ele não pode negar os efeitos de múltiplos alvos.
“Tenho que eliminá-los o mais rápido possível!”
Antes que possam contra-atacar, a energia negra no ambiente se torna ainda mais densa. O ar arranha e a criatura demoníaca enrolada em seu braço está pronta para acabar com tudo…
É uma força tão massiva que parece sufocar tudo ao redor, dobrando o próprio espaço. Em seguida, a escuridão disparada pelo dragão não é apenas destrutiva; é monumental. O impacto promete consumir tudo, desabar os céus e obliterar os alicerces daquele domínio de escuridão… digna de ser chamada de exterminadora de luz!
Mas, num instante que parece uma afronta ao próprio tempo, algo inesperado ocorre. Um portal se abre, voraz e faminto, consumindo a torrente de energia negra. Como uma boca de proporções infinitas, ele suga o caos, deixando o espaço ao redor silencioso e quase estéril.
A entidade fica estática por um momento, sua mente fervilhando de perguntas. Quem ousaria intervir naquela batalha titânica? Mas Azaael, com o dragão ainda preso ao braço e um olhar que desafia até o destino, não parece surpreso.
— Grr… quanto… poder! — resmungou Asmael, o ar escapando de seus pulmões como se cada palavra pesasse uma tonelada. Suas mãos estavam erguidas, como se sustentassem o próprio céu, e seu peito arfava com a intensidade de mil batalhas. Mas era o tremor em seus pés que denunciava o que sua voz tentava esconder: medo.
Sente a morte, tendo projetado tantas camadas de tempos diferentes, que mantém aquele ataque distante de seus olhos.
— Não importa onde tentem me levar. O caos que carrego não é uma força que pode ser contida!
O chão abaixo dele parece ceder, vibrando com uma força que vai além do físico, um abalo primordial que ecoa nas almas dos que ali estão. E o demônio luta para compreender o impossível.
— Não pode ser… — murmura, a incredulidade rasgando sua voz. — Mandei esse ataque para outro mundo, para outra dimensão… como chegou a abalar aqui?
— Esse dragão… ele exagera na dose! — Azaael declara com um sorriso frio, quase convencido de sua própria supremacia.
Mas há algo mais. Outra fraqueza que ele não pode ignorar. A energia que consumiu para o dragão moldar aquele ataque não é pouca; quase um quarto de sua força é drenada.
E diante dele, os três adversários permanecem, mais determinados do que nunca.
Luciel, o imperador que sempre carregara um semblante de controle absoluto, agora despia seu manto branco. É um gesto que transcende palavras, um rito silencioso que anuncia o despertar de seu verdadeiro poder. À medida que o tecido cai ao chão, a aura ao seu redor cresce, tornando o ar denso e quase irrespirável.
O dourado se une ao negro, o branco de suas asas ao breu de sua aura. A criatura mais bela de Maladomus, a flor mais perfeita, está diante dele. Esse é seu novo estágio, seu poder total, que será mais tarde apenas mais uma etapa de sua evolução infinita.
A gula, por sua vez, ergue-se entre rugidos selvagens, a fome personificada em carne e fúria. Ele cai como um meteorito entre os três…
Suas garras tremulam no ar como lâminas ansiosas por destruição, como tentáculos que cortam a poeira que o ocultava dos demais. Sua armadura, pesada e reluzente, despenca aos seus pés… é o último som que seu corpo projeta, antes que a voz retorne à sua garganta!
— Você é forte… mas não adiantará nada contra nós! — vociferou, sua voz ressoando como mil vozes em uníssono, quando liberava sua aura total, já se podia sentir seus milhões de personalidades se unindo, ou buscando…
E o dragão que antes envolvia o braço de desfez-se em uma fumaça densa e brilhante, o tomando uma feição de surpresa. Algo estava errado, ele sentiu a ausência da criatura sem que sua mente a mandasse recuar, e, em um instante, compreendeu o que havia acontecido.
— Nós também temos nossos truques! — Zomba Bezeel, suas asas se expandem e, nasce de suas costas de forma não natural. Ele roubou a essência do dragão enquanto o foco estava nos demais, absorvendo a invocação maldita de Azaael, tomando em partes sua forma, como manda sua dádiva do abismo.
— Nem sua forma Berserk pode te salvar!
Aquele tempo, quando a gula não sucumbia à demência e autodestruição, ele até lembra o jeito durão e sem dizer o que se pensa sem receio de Azaael, o mesmo de quando era apenas um titã de batalha.
E diante dele, os três estão prontos, suas formas transcendentais irradiando o tipo de poder capaz de rasgar dimensões e obliterar mundos. E o rei demônio, não recua. Seus olhos, brilhando com fervor, encaram seus inimigos.
— Truques são para aqueles que temem. E eu não temo vocês!
É ele capaz de vencer?
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