Capítulo 224 - Gratidão, Positividade...
— Então…
— Você falhou! — A voz de Alum ressoa, fria e afiada como a lâmina que, de repente, surge à frente, pressionada contra a garganta da marquesa. A tal lâmina brilha em um tom vermelho-sangue, pulsando o fervor de mil sóis. E a pulsação que vibra no ar, pesada e ameaçadora, clama pela vida diante de si. — Quais serão suas últimas palavras?
O silêncio se instala entre eles por um instante, denso e impenetrável como uma cortina de ferro… Enquanto uma lágrima solitária desliza pelo canto do olho esquerdo dela, lenta, como se buscasse adiar o inevitável. Ela traça um caminho amargo pela pele marcada pelo peso de batalhas que tivera, mas que agora encontram seu derradeiro e definitivo limite.
O seu fim é inevitável. E será agora!
“Então… Assim é o meu fim?”
A pergunta ressoa em sua mente, mas não como um lamento. É uma aceitação fria e racional que vem gradualmente, uma clareza amarga que dói mais do que o corte que nunca chega.
Final, acabar… ninguém realmente espera que o fim se anuncie com tamanha crueldade.
Mas, como digo, é devagar… Ela cerra os punhos, cravando as unhas na carne com força suficiente para fazê-las sangrar. Veias saltam em suas mãos, como rios ferventes de raiva, vergonha e algo que não consegue nomear. Seu corpo é uma tempestade condensada, cada fibra em tensão, gritando contra a ideia de ceder.
Mas é inevitável. O peso da lâmina não permite ilusões…
— Não vai dizer nada? — A voz dele corta o silêncio, gélida e repleta de desprezo. Ele se inclina ligeiramente, seus olhos parecem perfurar sua alma. — Nada antes de acabar? Antes de se tornar nada mais do que uma lembrança de sua própria fraqueza?
Ela ergue o olhar, seus olhos brilhando com algo mais profundo do que simples frustração… Eles queimam, não de ódio, mas de um tipo peculiar de força. Uma força que Alum, apesar de toda a sua superioridade, não parece compreender.
— Eu… — Sua voz treme, mas não de medo.
É algo mais visceral, como se palavras fossem insuficientes para o que quer dizer.
— Você? — ele zomba, arqueando uma sobrancelha.
— Sou grata! — A palavra escapa de seus lábios, surpreendendo até a si mesma. Não é um grito nem um sussurro, mas algo entre ambos, carregado de emoção crua. Ela respira fundo, sua voz ganha firmeza a cada sílaba. — Sou grata pela vida que me deu… pelo tempo que me permitiu lutar, errar, amar, e até mesmo por este momento. Sou grata por viver, meu senhor!
A confissão ilumina o espaço entre eles…
Não é uma tentativa de justificar suas falhas ou implorar misericórdia. É apenas a essência de quem ela é, reduzida à sua mais pura forma diante do inevitável.
E diante disso, Alum permanece imóvel, seus olhos fixos nela. Ele não recua, mas também não avança. Não há empatia em seu semblante, mas algo muda. Um reconhecimento sutil, como se estivesse diante de algo que não consegue entender plenamente.
— Gratidão… — ele murmura, quase inaudível.
Ela sorri, um sorriso leve e sereno, carregado de uma paz que ele jamais poderia destruir. Então, a lâmina, como se movida por uma vontade própria, avança lentamente. Não contra ela, mas contra o próprio peito da marquesa. O impacto é silencioso, quase poético, e com ele, sua figura começa a desaparecer, absorvida pela força escarlate.
De Jahiel, não resta nada além de um vazio impregnado pela última verdade que deixa para trás.
— Gratidão… — E que Alum repete, desta vez como uma pergunta. Ele se senta lentamente, um sorriso quase imperceptível curvando seus lábios. — E isso existe?
Apenas o silêncio a envolve…
Zuri está ajoelhada no centro do caos, os lábios entreabertos em respirações arfantes, desfazendo lentamente os dedos cruzados que conduziram sua técnica magistral.
Ao seu redor, o cenário é uma pintura distorcida de destruição — o chão rachado, o ar impregnado de um calor sufocante, resquícios da batalha que chega ao fim, mas não sem um custo avassalador.
A manobra que desfere é um golpe de mestre, uma obra-prima forjada na urgência. Ela usa sua técnica extensiva para criar uma simulação de expansão em uma fração de segundo, manipulando os conceitos bilineares de vida e morte. Um ato de precisão absurda que oblitera a entidade instantaneamente, negando-lhe qualquer chance de resistência. Contudo, o preço desse feito supera o que qualquer um poderia suportar.
Seu olho esquerdo… perdido, arrancado como moeda de troca para ampliar o alcance da extensão. A energia vital que flui em suas veias é sugada quase completamente. Seu cérebro, forçado a operar além dos limites humanos, queima em dor intensa, um sacrifício que a deixa à beira da morte.
“Funcionou… então… eu venci?”, murmura.
Seu corpo está destroçado: ossos trincados, músculos estirados ao limite, a carne marcada pelas garras do esforço extremo e das trevas que conseguem feri-la. Seu braço direito, outrora instrumento de sua força, agora não passa de uma sombra perdida…
Mas ela não age sem estratégia. Zuri evita a complexidade de uma expansão direta, que exigiria mais tempo — tempo que não possui. Aposta tudo nessa solução relâmpago, confiando na certeza de que pode derrotar a criatura antes que ela se adapte ou reaja.
É um plano suicida, mas funcionou!
E agora, mesmo mutilada, cega de um olho, com a dor latejando como uma sinfonia cruel em cada fibra de seu ser, Zuri sorri. Um sorriso amargo, torto, que sangra tanto quanto as feridas que adornam seu corpo. Mas há algo mais ali — uma satisfação visceral. A criatura está morta. Ela a manda para o inferno com as próprias mãos, e isso é o suficiente.
O vento assobia ao seu redor, levantando a poeira da batalha. Mas à sua esquerda, ela não ouve o vento soprar… será que também perdeu a audição?
Ela prefere não saber.
Fecha os olhos, deixando o peso de sua cabeça cair para trás, permitindo-se, por um momento, sentir o alívio de estar ali em Crea — ainda que pela metade.
“Valeu a pena!”
Pensa, pois mesmo chegando a um estado deplorável, para alguns, até mortal, ela está viva.
Muitos exorcistas entram de cabeça e esquecem que têm uma vida. Mesmo que esta se esgote da mesma forma, ainda é sua. E ela deve usufruí-la. Desistir? Não… Isso não é uma opção para Zuri… e não deveria ser para você!
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