Capítulo 243 - Reencontro
Ele está em um espaço que parece suspenso entre o vazio e a eternidade, moldado por um único instante em que seu coração aflito ousa criar algo além da dor. Liliel surge ali, como uma visão que irradia tanto luz quanto tormento, sua presença preenchendo cada partícula daquele lugar imaginário.
— Então, aqui você se esconde? — A voz dela soa doce, mas cheia de firmeza, enquanto seus dedos delicados tocam sua face. — Não desvie o olhar de mim, meu amor! Não há por que ter medo ou vergonha…
Ele tenta resistir, mas suas lágrimas escorrem como rios, mesmo que o ranger de seus dentes tente sufocar sua vulnerabilidade.
— Um grande covarde que se chama de rei! — A força nas palavras dela o atinge, mas ele finalmente encontra coragem para encará-la. Os olhos, que por tanto tempo evitaram os dela, agora estão fixos, como se aquela conexão fosse tudo que ainda o mantém. — Só… deixa-me dizer algo… algo que talvez seja a única coisa que eu possa te dar!
Ela sente o coração apertar, mas, ao mesmo tempo, algo dentro dela se aquece. Suas mãos, mesmo etéreas, seguram com força o rosto dele, como se quisesse ancorá-lo naquele momento.
— Você já me deu tanto! — Seus olhos brilham, refletindo uma dor mista de amor e despedida. — Diga!
— Meu amor… — Ele hesita, o ar saindo como um suspiro rasgado. Sua mão, trêmula, encontra o rosto dela, num gesto de profunda reverência. — Espero por ti, na eternidade… comigo. Mesmo que vá primeiro, irei logo em seguida. Só… saiba que o único fragmento bom ou feliz que existe em mim vai contigo. É só por você que eu o demonstro!
Ela sente um tremor na alma.
Mas…
Quando os lábios dele encontram os seus, é como se todo o tempo e o espaço desaparecessem. Um beijo que carrega milênios de amor reprimido…
— Amor… onde quer que eu esteja, estarei te esperando — então um sorriso melancólico surge, mas carregado de esperança.
— Liliel… — Ele fecha os olhos, tentando reprimir a onda de dor que o atravessa. — Você vai mesmo me fazer suportar o tempo? A angústia? A esperança de te reencontrar quando tudo isso acabar?
A saudade escapa de seus lábios…
— E já não fizemos isso antes? — Sua mão pousa sobre o peito dele com um gesto afetuoso, mas firme. — Não me diga que o grande rei, que suportou tanta dor, trevas e sofrimento, está hesitando agora!
Ela bate levemente em seu peito, num gesto quase provocador, enquanto um sorriso frouxo brinca em seus lábios.
— Ou será que o demônio durão é mais frágil do que imaginei?
Esse instante faz o sorriso dele aparecer, pequeno, mas carregado de tristeza e devoção. Ele sabe que, não importa quantos ciclos passem, aquele instante será eterno em sua alma.
— Quando falamos de nós… — ele começa, com a voz melancólica — é diferente. Os problemas pífios, a vida, até mesmo a certeza dela… tudo se esvai. Por maior que eu seja, não sou tão forte quanto a dor!
Ele desvia o olhar, tentando esconder a vulnerabilidade que tanto o corrói, mas a figura diante dele parece enxergar além da máscara de força.
— Ninguém é! — ela indaga com uma voz gentil, mas cheia de convicção. — Infelizmente… ou talvez felizmente… há coisas que são maiores que nós. Essa é a beleza, não? Por isso não somos como Luciel… meu pai.
O nome reverbera entre eles como um eco distante e indigesto. A menção a Luciel traz um peso, uma sombra impossível de ignorar. Ele, porém, apenas sorri, amargo.
— Eles almejam algo impossível: eternidade, certeza, verdade. Mas nós? Somos espíritos indomáveis! — Ele vira o rosto para o lado, como se encarasse algo invisível na penumbra. — Ou tentamos ser. Achei que tinha o destino em minhas mãos… pensei estar no controle, manipulando o moleque como um peão. Mas não! — Sua risada escapa, seca e resignada.
— O destino não, é algo que se possa agarrar… por mais que tentemos! — A figura à sua frente começa a mudar, sua forma se dissolvendo como névoa diante dele. As bordas de sua existência começam a desvanecer, um pedaço após o outro.
— Eh… — Ele tenta se aproximar, desesperado. — Acho que nosso tempo está acabando…
— Chegou a hora… — Ele estende a mão, tentando tocá-la, mas ela já está intangível, uma lembrança evanescente. — Entendi… isso é apenas… consciência? Um espírito?
Ela sorri, serena, mesmo enquanto sua presença desaparece como poeira ao vento.
— Minha essência… — responde, a voz cada vez mais distante. — Só… me prometa. Não deixe o ódio consumir o que você é, o que sente. Está bem? Se algo maior que o nosso amor tomar o seu coração, então tudo isso… tudo terá sido inútil!
Ele sente o peso das palavras cravadas fundo em sua alma.
— Eu… prometo!
A promessa escapa de seus lábios como uma flecha disparada contra a vastidão da escuridão, certeira e desesperada. Ele sabe que aquelas palavras são mais do que uma declaração. São uma tentativa de acalmar sua alma, de encontrar consolo naquele último instante.
Mas a pergunta ecoa em sua mente: será ele capaz de cumprir tal promessa?
Promessas… ele reflete enquanto a figura desaparece. Elas são como ouro: guardam o brilho e o peso no coração, mas, como o ouro, podem se perder, corroer ou esvair-se. No fim, tudo depende de quem as carrega… e da força de sua vontade em não se trair.
E, de repente… como um estalo, sua consciência é arrastada para um ponto de vista que não é mais o seu. Sua visão agora é a de Yamasaki, o terreno ao redor se revelando árido, infértil, como se a própria vida tivesse sido arrancada daquele lugar. Chamas negras dançam irregularmente, consumindo tudo e, ao mesmo tempo nada.
O ar é pesado, sufocante, carregado de uma energia que parece corroer a alma.
No topo de uma elevação, exorcistas observam a cena, suas expressões marcadas por preocupação e confusão. No centro daquele cenário de destruição, o corpo de um jovem jaz no chão, de joelhos na terra…
“Ah… oh, garoto? Estou aqui!”
A voz ressoa em sua mente como uma onda, uma tristeza tão profunda que o acompanha até o fim de sua existência.
— Azaael? — murmura, a voz trêmula e rouca.
Seu corpo parece estar em convulsão. As veias em suas mãos se destacam, inchadas e pulsantes, estendendo-se até o rosto, que parece prestes a explodir. Seus olhos estão vermelhos, irritados, como se queimassem por dentro, incapazes de suportar a pressão.
“Estou aqui! Caramba… espera…”
A tentativa de Azaael de acalmá-lo é em vão; não o ouve… Ele solta um último suspiro exausto antes de seu corpo ceder. Ele desmaia, seu corpo ficando mole como uma marionete cujos fios foram cortados.
Os exorcistas ao redor se entreolham…
— Ele teve uma sobrecarga cerebral… — um deles murmura.
É óbvio. O corpo e a mente dele chegaram ao limite!
Isso não foi causado apenas pelo estresse físico, mas principalmente pela tempestade emocional que vem se acumulando nos últimos dias. O coração aflito de Azaael, refletido na conexão profunda que dividem, mistura-se aos próprios medos e dores de Yamasaki, criando uma pressão insustentável.
E o estopim, o gatilho que transforma essa carga emocional em um colapso fatal, é o uso descontrolado de sua técnica inata. Ele força seu poder além do limite, estendendo-o de maneira imprudente, e o preço é, por isso, alto.
Agora ele é uma bomba que explodiu, não em destruição física, mas em uma devastação mental. E enquanto o corpo dele repousa inconsciente no solo infértil, uma pergunta paira no ar entre os exorcistas: ele ainda conseguirá se erguer… ou esse é o fim?
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