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    Chegando próximo à sede de seu clã, Amai foi surpreendida por um cenário de devastação que lhe roubava o fôlego. As árvores, outrora majestosas, estavam reduzidas a troncos partidos; o cheiro acre de fumaça impregnava o ar, enquanto chamas consumiam as casas destruídas.

    O solo estava revolvido, como se tivesse sido rasgado por forças sobrenaturais, e os restos das pontes e das fontes de pedra jaziam em pedaços espalhados, como um quebra-cabeça.

    — Mãe!? Naoto!? — sua voz rompeu o silêncio cortante, carregada de desespero.

    Seus gritos ecoaram pela ruína, mas não houve resposta, apenas o som abafado da madeira crepitando nas chamas. Mas, alguns passos adiante, seus olhos captaram a cena mais brutal e triste de toda a sua vida: manchas de sangue salpicavam o chão; corpos inertes de monges e descendentes do clã espalhavam-se como testemunhas da tragédia.

    Até que, no centro daquele inferno, avistou o pior. Seu coração quase parou ao encontrar o corpo de Naoto, seu irmão, com o peito aberto e o coração arrancado. Sua expressão estava congelada em um espanto eterno.

    Próximo a ele, estava sua mãe. Não de pé, como sempre a vira, mas caída, jogada como uma boneca quebrada. A única força restante em Lylian era suficiente apenas para movê-la levemente de um lado para o outro, movida pelo vento ou pela própria inércia.

    — Mãe… — murmurou, a voz quase falhando enquanto lágrimas desciam sem controle.

    Arrastando-se até o cadáver, deixou os braços caírem ao lado do corpo da mãe. Sua figura, antes imponente, agora parecia tão frágil. Dos lábios ressecados da mulher escapava um sussurro quase inaudível, repetindo o nome do filho perdido, Naoto.

    Ela, paralisada pelo choque, viu sua mente se afogar em perguntas incessantes: O que aconteceu aqui? Como tudo desandou tão rápido? Por quê?

    Não era para o caos chegar ali. Não era para sua família se desfazer assim.

    O eco das perguntas se misturava ao som do fogo, enquanto permanecia ajoelhada, incapaz de se mover ou compreender o horror que desabava sobre si.

    O choque fora quase tão intenso quanto o que Satoshi sentira ao se deparar com o imponente prédio. Era diferente. Ele mal podia acreditar no que via. Encarando Seiji, que se acomodava arrogantemente na poltrona que outrora pertencera a seu pai, Satoshi não conseguiu conter as lágrimas que começaram a escorrer. A indignação queimava em seus olhos.

    — Quem você acha que é para assumir o cargo? — protestou, a voz trêmula entre a raiva e o luto.

    Aquele que, por tanto tempo, esteve ali, regendo os exorcistas, já não estava mais. Suas ideias, dois pilares de convivência e paz, agora pareciam meros sonhos que dificilmente se manteriam.

    Seiji, por outro lado, mantinha o olhar frio e cínico, como se a cena diante dele fosse apenas mais um capítulo previsível em sua longa história. Ele parecia desconfortavelmente à vontade naquela poltrona de couro.

    — Sou o exorcista mais velho vivo! — declarou com um tom gélido e carregado de desprezo. — Criança insolente, discordar disso não trará seu pai de volta!

    As palavras, proferidas com tanta certeza, fizeram-no estremecer, como se uma corrente elétrica percorresse sua espinha.

    — Não se trata disso! — gritou, mas logo sua voz falhou, engasgada pela emoção. Respirou fundo, tentando recuperar a compostura, antes de continuar: — Você sabe muito bem… meu pai… Ele era um homem cujos ideais sempre estiveram atrelados à paz e à convivência harmoniosa entre humanos e exorcistas! E você? Não vejo como alguém como você poderá continuar esse legado!

    — E quem disse que pretendo? — perguntou, coçando a barba, quase desdenhoso. — Acha que os métodos de seu pai eram a única verdade?

    — Mas o que fará de bom? Iniciar mais conflitos?

    Isso o fez arquear uma sobrancelha, como se achasse o discurso ingênuo. Um sorriso quase imperceptível curvou seus lábios, mais próximo do escárnio que do humor.

    — Vocês jovens… sempre o mesmo problema. Acham mesmo que o mundo é tão preto no branco assim?

    Jogou algo em direção a Satoshi. O crucifixo que pertencia ao pai dele reluziu no ar antes de ser agarrado firmemente por suas mãos.

    — Não quero a inimizade de seu clã, pirralho. Por mais que discorde das visões de seu falecido pai, estou aqui para aprender tanto quanto para ensinar. O que acha disso?

    — Sei… — respondeu entre dentes, apertando o crucifixo com tanta força que seus dedos ficaram brancos, como se aquele objeto fosse sua única âncora. — Mas não é essa a questão. Tanto eu quanto outros membros sabemos de suas intenções! Você não vai ceder à pressão do governo e, quando o caos aumentar, com certeza acabará comprando uma briga ainda maior. Estou errado?

    O velho soltou uma risada seca e vazia, que ecoou pela sala como uma sentença.

    — Não me entenda mal, mas… acha que devo ceder? — Inclinou-se para frente, seus olhos perfurando os dele. — Se eu fizer isso, acha que tudo será como num conto de fadas? Nova Tóquio está em ruínas, garoto! Acorda! Não temos mais moedas de troca.

    Isso o fez hesitar por um instante, a mandíbula travada, mas…

    — Então você simplesmente deixará outro conflito começar?

    A nova indagação fez o velho levantar-se lentamente. A atmosfera na sala tornou-se sufocante; ele parecia maior que o espaço ao seu redor, sua presença tão esmagadora quanto sua arrogância.

    — E… você acha mesmo que o Império tem algum poder contra nós? — Questionou, sua voz impregnada de desprezo. — Se eu mandasse apenas Masaru, Crea seria afundada em questão de dias. Os continentes? Apagados do mapa! Ou estou errado?

    Por mais fora do tom que fosse, suas indagações tinham um peso irrefutável. Afinal, o que era um exército de homens perante aquele que fazia o mundo sacudir?

    E por isso Satoshi permaneceu em silêncio, suas palavras presas.

    Seu coração estava cheio de indignação, repulsa e tristeza. Um mar de dúvidas atropelava sua razão, aquela que deveria ser sua única arma para conquistar espaço naquela mesa… mas não o foi.

    — Não… — Por fim, sua voz mal passava de um sussurro.

    Isso fez o velho cruzar os braços, o olhar frio e cortante, analisando a derrota do rapaz. Para o velho, era como assistir à chuva molhar terras secas, trazendo águas férteis para o florescimento de seu poder.

    Era a resposta que ele esperava, a que o movia. Um sorriso de orelha a orelha surgiu em seu rosto, repleto de satisfação.

    — Então, até que me traga mais que meros sonhos, sugiro que se concentre no enterro de seu pai… — Sua voz era de pura autoridade. — Amanhã farei o discurso e, em seguida, tomarei posse, junto com as rédeas desta casa! Você terá… longos dois dias para se posicionar. Está bem?

    Foi quando o garoto se levantou por fim, deixando-o para trás; queria ficar sozinho com sua frustração.

    Ele cerrava os punhos, contendo o ódio que fervilhava dentro de si. Para onde iria? O peso da derrota esmagava seu espírito, confirmando aquilo que todos naquele ambiente haviam apostado desde o início: que ele perderia. Sem exceção.

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