Índice de Capítulo

    No Vale da Morte, quando seu espírito se ergueu… lá estava ele, bravo contra a escuridão, mesmo sem saber em que enrascada, de fato, havia se metido.

    Era como perceber que a realidade não era tão real assim. Pisava firme, respirava o ar, mas o que estava atrás da névoa não se revelava. Ele nem podia voltar, pois não existia bússola que funcionasse ali.

    Sabe o que ouvia?

    Apenas uma risada…

    Não humana. Sussurrada, como o escárnio de uma entidade louca — a própria definição de insanidade.

    Eu… já vi aquela figura… Pensou. Melhor do que murmurar — já o fizera há dias. Apenas Elum sabe o que foi revelado em seu íntimo. Então, era melhor blindar sua mente contra os espasmos de insanidade.

    Mas quem, de fato, era?

    Os Kenariras, vagantes da terra prometida, chamavam uma criatura com as mesmas características de Zaar-Bael — aquele que estava cercado de moscas, que vivia entre sete cadáveres. Eram os pecadores que devoraram uma de suas sete bestas. Diziam que ele se deliciava com as almas dos perdidos. Os homens, nunca sábios… E, ao provar o sabor, distinguia: almas sujas iriam para o reino de fogo; as boas, para a casa dos prazeres.

    Uma deidade reflexo de seu tempo… que poderia ser uma entidade demoníaca. Como muitas ao longo da história, anjos e demônios foram cultuados e interpretados conforme a percepção do povo — ou como eles próprios se declaravam. Mas um Deus pleno e todo-poderoso não panfleta, pois a fé é a resposta à necessidade natural e íntima do ser.

    — Zaar-Bael?

    Lembrou-se. Claro, ele havia lido vários livros. A História era sua matéria favorita, principalmente pelas raízes que precisou compreender sobre seu próprio povo — quase apagado da história. Hoje, eram considerados invasores de sua própria terra, vítimas da retórica bélica e expansionista do império racista de Shamo.

    — Por que me chamas de pecador? — sussurrou.

    As vozes vinham de todas as direções.

    — O que quer comigo? Por que me prendeu há dois dias e não terminou?

    — Por quê…? Quero entender… Do que se trata isso! Fui despertado após anos de prisão… por quê? — sussurrou novamente.

    Era evidente: ele era um dos demônios libertos da caixa. No entanto, este em particular era poderoso demais para ser controlado.

    Mais estranho do que sua aparição era o fato de não ter sido uma vítima na grande batalha que ocorreu. Foi um dos poucos que conseguiu escapar.

    — Uma guerra…

    — Guerra? Entre demônios e humanos? Por favor… Isso nem arranha a superfície do que uma entidade como Luciel pode fazer. Para mim, foi apenas uma mera batalha… Mas esta nova era está interessante… Será que este é o tão falado apocalipse? O começo dele…

    — O que uma entidade como ele é capaz de fazer?

    Queria mais tempo… Mas o tempo não era algo que lhe pertencia.

    Por que ele não aparece?

    Enquanto perguntava, seus olhos varriam o ambiente, buscando desesperadamente qualquer pista sobre a direção a seguir. Mas a voz ainda ecoava de todos os lados, reverberando como se o próprio espaço fosse sua origem, sem um ponto fixo, sem fonte discernível.

    — Está curioso? Mas é você quem deveria me responder…

    O exorcista franziu a testa, sua paciência esgotando-se como rio seco pela estiagem.

    — Você sabe mais do que eu… Então, pare de mentir. Quais são suas intenções? — A firmeza em sua voz cortava o ar. Seus músculos estavam tensos, prontos para reagir. — Se não for falar… vamos acabar logo com isso!

    Seu grito ressoou com a ferocidade de um animal encurralado, um cão selvagem rosnando antes do ataque.

    Está me analisando? Mil e um pensamentos ecoavam em sua mente, sobrepondo-se como ondas quebrando contra rochas afiadas.

    — Intenção? Oras… você que me atacou! Não?

    A figura invisível riu, um som tão distorcido, que oscilava entre um sussurro zombeteiro e um rugido abafado.

    — Você é um demônio…

    — Quem disse!? Julgou pelo que viu? Sou o reflexo de vocês… então, você seria um demônio?

    Seu olhar faiscou em confusão.

    — Meu? — Sem jeito, como se a ideia fosse absurda demais para ser considerada. — Não fale besteira! Você é um demônio de anos atrás…

    O riso voltou, mas desta vez carregado de uma sombra de algo mais profundo, mais sombrio.

    — Você entendeu. Falo da sua raça… até mesmo de ti. Acha que nunca cometeu nenhum pecado enquanto ungido de sua religião?

    Sua voz, antes amarga, agora se distorcia em um lamento lancinante, como se uma garganta estivesse sendo rasgada em pranto e desespero. O ar ao redor pareceu esfriar, e um arrepio percorreu a espinha do garoto.

    Ele quer jogar comigo… A constatação atravessou sua mente como uma lâmina. Ele sabia — ou ao menos imaginava — o que aquela entidade queria. Ele era sua vítima, um animal encurralado, forçado a dançar conforme as regras de um predador.

    — Nenhum homem está a salvo disso… e sinto em ti… tanto pecado!

    Era uma acusação, um julgamento que se infiltrava como veneno na mente daquele que o ouvia.

    Isso o fez mover-se após instantes atônito, seu olhar se fixando na ameaça iminente. Com um movimento rápido e preciso, lançou a arma espiritual para o alto. A lâmina giratória tomou forma em suas mãos, sua superfície reluzente refletindo o caos ao redor. Sua arma, forjada para domar os ventos mais ferozes, naquele momento, provou sua supremacia.

    O ar tremeu quando uma rajada negra se formou, densa como uma tempestade prestes a consumir tudo. A pressão esmagadora ameaçava engoli-lo, mas ele girou sua lâmina em um arco devastador, criando uma barreira de vento afiado como navalhas. As correntes de ar rugiram, colidindo contra a energia negra que avançava como um tsunami sombrio. O impacto sacudiu o chão, levantando poeira e destroços, mas os ventos gerados por sua lâmina o envolveram como um escudo, dilacerando qualquer força que tentasse atravessá-lo.

    — Você pediu isso, demônio…

    A resposta veio no mesmo instante, carregada de desprezo.

    — Grr… é?

    De repente, algo cortou a névoa densa: uma corrente surgiu, rasgando o ar em alta velocidade, vinda de sua direita. Reflexos aguçados o fizeram abaixar instintivamente, sentindo o vento cortante passar rente ao seu rosto.

    Mas então, as correntes explodiram em chamas negras, brasas ardentes saltando no ar como fagulhas de uma forja infernal. O calor era sufocante. Sem escolha, girou a lâmina para trás, aparando o golpe com precisão; o impacto reverberou por todo o seu braço.

    — Ehr…

    Seus olhos então captaram um detalhe aterrador: na ponta da corrente, havia a cabeça do dragão.

    O chão sob seus pés estremeceu com o poder bruto contido naquela arma. A força era absurda, capaz de reduzir um ônibus a uma latinha de cerveja amassada. A constatação veio junto com a dor. O calor da corrente incendiada era tão intenso que a ponta de seus dedos começou a queimar, mesmo através de sua defesa. Não seria fácil.

    O oponente riu, a voz carregada de escárnio.

    — Que foi? Eu não pedi?

    O confronto apenas começou.

    A cada contribuição de R$10,00, você desbloqueia um capítulo extra!

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota