Capítulo 273 – Uma nova cruzada
Mais cedo… ou mais tarde.
O fim era inevitável. Um desfecho que se desdobrava em mil, milhões de instantes, cada um se esvaindo como grãos de areia caindo em um relógio cósmico. Não importava a grandeza das eras, nem o esplendor das civilizações que ergueram suas catedrais ao céu e seus impérios sobre as cinzas de outros. Tudo, absolutamente tudo, terminaria.
E então, em três segundos… incontáveis ciclos de existência foram reduzidos a um único movimento.
O embate final não foi equilibrado. O demônio perdia — em força, em intelecto, em pura energia cósmica. A luz do anjo era avassaladora, esmagadora, e, por um instante, parecia que a eternidade respiraria aliviada. Mas… a sombra sempre encontra uma brecha.
Na beira do precipício, o demônio sorriu. Sua última cartada não era força, nem intelecto, mas corrupção.
Usando a mais terrível das propriedades das trevas, ele infectou a luz. Fez dela um instrumento de sua própria ruína. O anjo, outrora um farol imaculado, tornou-se algo… diferente. E naquele instante, a balança da existência se rompeu.
Tudo o que havia naquele mundo… desapareceu. Um clarão? Um colapso? Um grito sufocado pelo vácuo? Ninguém saberia dizer. Mas o que existia já não existia mais.
E então… ele foi enviado a outro.
Não uma vez. Não dez. Não cem.
Milhões. Bilhões.
10.561.320.000 mundos.
Apagados. Um por um.
A cada nova realidade que se dobrava sob sua mão, repetia o mesmo ciclo. Seus irmãos, os outros, nunca ousaram fazer o que ele fez. Talvez por medo. Talvez por esperança. Talvez por covardia.
Ele, no entanto, não hesitou.
Foi o único disposto a se tornar aquilo que ninguém mais teve coragem de ser.
O destruidor de mundos.
E agora?
Agora ele está em algum lugar entre os ecos do tempo e o vazio da criação.
Para o bem de todos… ninguém sabe onde.
Mas, no mundo agora conhecido como a Origem, no presente, Seiji Watanabe observava o horizonte do sexto andar do palácio, um sorriso satisfeito curvando seus lábios. O vento cortante soprava através das janelas abertas, carregando consigo o cheiro acre da destruição. Ele inspirou profundamente, sentindo o gosto da fumaça e do ferro no ar.
Mas sua paz e solidão duraram pouco. O silêncio, antes quase solene, foi interrompido pelo peso da realidade que avançava sem piedade.
— Pai… A voz de seu filho emergiu das sombras do portão dourado. Seus passos eram silenciosos, mas sua presença pairava no parapeito ao lado do patriarca. Seu olhar perscrutava a paisagem devastada diante deles. Quilômetros e quilômetros de escombros. Estruturas colapsadas e vigas retorcidas despontavam como ossos à mostra de uma carcaça gigante. A cidade não existia mais; o que restava era apenas um vestígio carbonizado da civilização. Nuvens espessas de fuligem turvavam o céu, e pequenos focos de incêndio dançavam em meio ao entulho. O cheiro pútrido da carne queimada e da morte impregnava o ar. O caos já havia se dissipado, deixando apenas o eco de sua obra.
— Fale… — murmurou, os olhos ainda fixos na paisagem morta.
— Os homens… — começou, cruzando os braços enquanto refletia sobre as palavras — estão se perguntando… entre si… o que será do mundo após… este genocídio…
Ele não se importava com os questionamentos daqueles homens. Sua lealdade pertencia apenas a Seiji. Ele confiava sua vida ao pai e, mais do que isso, dependia emocionalmente dele.
— O que falará a eles?
O homem riu, um som baixo, quase paternal.
— O que será? — repetiu a pergunta, como se brincasse com a ideia. — 41 bilhões de habitantes… e agora, não mais do que 820 milhões vivos.
Sua voz carregava um fascínio quase religioso, como se estivesse narrando uma passagem histórica. Ele finalmente desviou o olhar das ruínas para encarar o filho.
— Bem, eu já sei o que será. Um futuro livre deste império falido e da máquina opressora que reduz as pessoas à insignificância. Creio que, nesse momento, devem estar enganados sobre nossas intenções… Pensam que vamos assumir papéis… Mas não…
Seu sorriso se alargou, os olhos cintilando com uma centelha de algo perigoso.
— Vamos criá-los.
Até refletiu por um instante, mas a expressão inalterada.
— E acha que ficarão satisfeitos?
Seiji bufou, descrente com a pergunta.
— E quem precisa disso?
Deu um passo adiante, apoiando-se no parapeito. O vento soprou contra seu rosto, jogando seus cabelos para trás, carregando consigo o cheiro da destruição.
— Eh… não, eu só… — hesitou, como se sua pergunta tivesse sido um deslize.
E ele? Ergueu uma sobrancelha, um meio sorriso cortando seus lábios.
— Temos uma narrativa. Apagamos uma cidade inteira de testemunhas. E quem vence… é quem conta a história. Não se esqueça disso, tá?
— Certo… desculpa…
Desviou o olhar, fixando-o no horizonte, enquanto apertava os lábios. Naquele momento, era seu próprio orgulho ferido que pesava mais.
E por mais uma vez, levara uma lição. Mais uma vez, seu pecado era arrancado à força. Sempre achava que faria melhor, que enxergaria além, que sua mente ágil captaria nuances que os outros ignoravam. Mas ali, diante do pai, suas certezas desmoronavam como os prédios em ruínas abaixo.
Inspirou fundo, deixando o gosto metálico do ar poluído impregnar sua garganta. Engoliu em seco, forçando-se a aceitar — não era ele quem ditava as regras daquele jogo. Ainda não.
Os dois permaneceram ali, em silêncio, observando as cinzas do velho mundo, enquanto o futuro se erguia, sombrio e inevitável, diante deles.
E sob seus olhares, dois rapazes marchavam.
O destino? A contínua e implacável missão de extermínio. Nenhum traço de piedade os acompanhava. Eram dois aijianos puros, filhos da doutrina, forjados na crença absoluta de que estavam erradicando a praga da corrupção. Parasitas, como eram chamados aqueles que ameaçavam A Ideia, deveriam ser extirpados sem hesitação.
A ordem viera de esferas veladas, oculta nos sussurros dos que conspiravam nas sombras, um decreto inquestionável. E Seiji, com seu sorriso afiado como lâmina, ostentava seu narcisismo sem pudor. Críticas? Para ele, eram meros ecos de fraqueza.
Não era como Kyotaka, que aceitava o julgamento dos outros. Ele impunha sua verdade acima do livre-arbítrio dos homens.
O primeiro deles vestia seu fardo como uma declaração de caos. Suas roupas eram um mosaico de desgaste e rebeldia, rasgadas, como se as marcas de batalha fossem um acessório de estilo. Seu cabelo, desgrenhado em um corte punk, enquanto sua maquiagem desbotada denunciava as incontáveis noites sem descanso. Magro — demais para ser um guerreiro, diriam os tolos —, mas a verdade era outra. Ele era um.
Já o outro… era uma muralha de carne e disciplina. Alto, imponente, com músculos esculpidos pelo seu treinamento, seu simples caminhar exalava a ameaça de um predador. Nas costas, carregava uma arma espiritual — uma raridade entre os exorcistas. E não qualquer arma. Uma foice.
Um monstro de metal e maldição, negra como a noite sem estrelas, tão pesada que poderia esmagar um homem com um único golpe.
E assim, os dois marchavam, os primeiros de muitos, cavaleiros da morte convocados para a próxima cruzada.
Homens contra homens.
Demônios contra homens.
Demônios contra demônios.
A guerra recomeçava. Novamente.
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