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    Por fim. A última entidade do conselho se desvelou…

    E eu mesmo direi seu nome.

    Yeel.

    O lorde solitário.

    Como a baleia de 52 Hz, sua existência era um lamento inaudível — uma frequência que ninguém mais ouvia. Nem mesmo os próprios demônios.

    Nem a disforia de Beel, nem a insanidade de Bezeel poderiam ser comparadas à sua essência solitária.

    Pois era mais que uma entidade… era a personificação rejeitada dos sentimentos indesejados. Um espelho sombrio de tudo que os outros demônios se recusaram a sentir.

    A dor, o medo, a solidão… todos esquecidos.

    Tal qual era — indesejável.

    Uma presença que não se impunha… brotava.

    Silenciosa como o crescer de uma erva-daninha no coração da terra. Inevitável, porém nunca notada até que já era tarde demais.

    Como uma flor pálida nascida entre ossos.

    Seus cabelos longos e opacos tocavam o chão como raízes de algo antigo e triste.

    Seus olhos cinzentos — quase apagados — não refletiam luz alguma.

    Eram buracos fundos, cheios de tudo que já foi perdido. Sua pele, igualmente cinza, parecia desprovida de calor.

    Dois chifres cresciam em direções opostas: um apontava aos céus, distorcido e longo como uma torre torta, enquanto o outro curvava-se para o chão, flutuando a milímetros da superfície, como se hesitasse em tocá-la.

    Não possuía cauda, nem asas — símbolos comuns dos outros de sua espécie. E seu nível de poder demoníaco?

    Apenas dentes serrilhados em uma boca eternamente entreaberta… e garras longas, finas, que se curvavam como galhos secos de uma árvore. Seu corpo era esguio, retorcido em ângulos desconfortáveis, quase como se ele mesmo não compreendesse o próprio corpo.

    E quem fazia seus oponentes?

    Seu instinto, silencioso como a maré, o guiou até a frente do celeste do tapa-olho e sua dama.

    Gabriel e Elizabeth.

    — Sério? Mais um embate!? — suspirou, exausto de um destino que parecia rir na sua cara. — O destino está lado a lado desse velho! — lançou um olhar irônico para a mulher ao seu lado.

    Não marcharam para Yokohama hoje…

    O destino, caprichoso e cruel, traçou outro caminho.

    — Esse parece… forte — comentou a dama, estreitando os olhos. Não havia intenção assassina. Nenhum sinal de ódio, fúria ou prazer. — Não há nada. Se não fosse sua forma… não perceberíamos que ele estava chegando!

    Os dois permaneciam firmes, à frente dos demais exorcistas — que outrora foram o problema a se enfrentar, os inimigos da vez. Agora, eram apenas coadjuvantes diante da presença que se erguia.

    E apesar dos dois serem como muralhas vivas… até muralhas tremem. E mesmo eles hesitaram.

    — Depois lidamos com vocês… — ele murmurou, a voz baixa, sem pressa, como um pensamento que escapou antes de ser filtrado. Seus olhos se voltaram para a entidade à frente. — Vamos… lidar com esse invasor.

    Ele deu um passo à frente.

    — Foi você que fez isso tudo?

    Indagou, não por necessidade, mas por desencargo. A resposta já dançava no ar, como o cheiro de um incêndio há muito iniciado.

    Se não fosse o mandante, era, no mínimo, o mandado.

    E mesmo isso bastava para temê-lo.

    Então, seus olhos se estreitaram.

    E o ar… mudou.

    Como se o mundo segurasse o fôlego, uma muralha invisível se ergueu em um instante, autodefesa que o celeste selou como pacto.

    E do que protegia?

    Ventanias brutais nasceram ao redor da entidade, rodopiando com a fúria de uma tempestade. O chão rangeu, protestando sob a pressão — não apenas física, mas espiritual — como se o próprio espaço se dobrasse em reverência ou pavor.

    A atmosfera ficou espessa. Densa.

    Pesada como chumbo.

    — Não? Hm… — sua voz cortou o silêncio como uma lâmina mergulhada em melancolia, tão arrastada e lenta. — Desculpe… eu esqueci de levantar minha aura…

    Sua resposta veio atrasada. Como tudo nele. Como se o tempo o obedecesse em outro ritmo.

    Mas a ameaça… essa era imediata.

    O que era vazio, agora se tornava insuportavelmente cheio.

    Como se todas as emoções reprimidas, todos os horrores esquecidos, todas as dores ignoradas — ganhassem forma naquele corpo retorcido.

    O espaço ao redor parecia implodir.

    A gravidade cedia.

    As almas se retraíram.

    E ambos se entreolharam. Pela primeira vez, em muito tempo… estavam genuinamente preocupados.

    Enfim, seis membros do conselho postos.

    Seis demônios — nível dos príncipes e princesas… ou piores.

    E no fim de tudo. Onde todos os mundos encontravam sua ligação, Asmael observava o último fragmento se desfazer, como um grão de areia escapando entre dedos fatigados de tanto segurar a esperança.

    Todos os outros tempos, todas as linhas de destino possíveis, haviam se esvaído. Como fumaça ao vento.

    Restara apenas este presente, intocado pelas mãos do destruidor.

    E ele… logo, logo… anunciaria sua vinda.

    — O que ele pretende? — murmurou Gallael, a voz embargada, olhando para o vazio à frente, onde a escuridão dominava. Apenas o tênue brilho do tempo presente iluminava seu rosto cansado de fardos. — Não… acho que seja só desmotivar os humanos que restam — arrastando as palavras como quem luta contra a descrença. — Você deve… saber ou imaginar, não?

    — Talvez… — a mente girando em círculos, — Só talvez… ele queira matar dois coelhos numa cajadada só. Sete enviados. Sete presenças. Sete trovões… talvez tudo esteja costurado, mas quando? Quando percebeu?

    O príncipe franziu o cenho, intrigado.

    — Percebeu o quê?

    — Que dependia mais de mim, do que dele mesmo… não percebe? — Ergueu o olhar, pesado de revelações. — Agora ele me colocou no tabuleiro. Não como sua rainha, como seu peão… sendo menos franco, como seu bispo!

    O outro soltou uma risada amarga, quase um soluço.

    — Mas você que é… o verdadeiro adversário… — balançou a cabeça, inconformado. — Acha que ele percebeu isso mas não percebeu, que estamos jogando contra ele?

    — Sim… e não. — respirou fundo. — Ele sabe que não estou feliz pela morte de minha filha… Liliel… — seu nome pairou pesado no ar. — Mas também sabe que não sou tolo de o trair diretamente. Afinal, fui o primeiro a garantir que tudo saísse como esperado. Do triunfo ao fracasso… — seus olhos brilharam de amargura — Até o final desse jogo. Devo perecer como fiel. E só após minha morte, perceberemos… que foi assim que o derrotamos. É a condição!

    — Condição? — repetiu, surpreso e confuso, o peito apertado.

    — Agora ele está fraco, mas se eu e ele lutarmos diretamente, ainda teríamos Alum ao seu lado! — como se cada palavra invocasse antigos presságios. — Por isso precisamos de Azaael. Ele é o único que pode resistir a uma luta final… é a última peça.

    — Droga… — mordeu os lábios até sentir o gosto do sangue púrpura, doce de pecados, a tensão o corroendo. — E como faremos os dois lutarem? Vingança pela Liliel?

    — Sim…

    — Mas… e depois?

    — Mudamos duas coisas. Não haverá mais apocalipse. Essa tal virada de existência, essa reescrita nos papéis, não existirá mais. Vamos impedir. Mas… — baixou o olhar — não sabemos o que restará. Nem quem!

    — Só podemos dar uma nova chance aos humanos… — murmurou, quase para si, — e esperar que algo surja… algo bom.

    — Surgirá!

    — Haverá um grande trauma…

    — Haverá… — sussurrou, — mas ainda haverá quem curar. Ainda haverá o vale da morte… a terra disforme… e será nossa vitória se eles conseguirem reconstruir algo. Se não… — seus olhos se fecharam por um instante — então Luciel vencerá, mesmo perdendo.

    Ehr… que caos, né?

    — Que caos…

    Por fim, Gallael relaxou os ombros, aceitando o inevitável. Havia dor, havia dúvida, mas também havia decisão.

    — É pagar para ver… — disse, — já chegamos longe demais para desistir agora. E… eu prefiro ver ele cair morto do que viver sob seu triunfo.

    Esse era o primeiro de três atos finais.

    A contagem final havia começado.

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