Capítulo 52 – Passos sobre o abismo
Ao fim das escadas, a nova área onde os alunos encontravam-se era um espetáculo da engenharia glacial: plataformas de diferentes distâncias e formas erguiam-se, conectadas por passarelas finas de gelo com saliências traiçoeiras que levavam às alturas. Quem escorregasse teria uma queda feia, e quem optasse pelo medo poderia ficar preso em um “destino congelado” — vulgo, o chão.
— Gente! Tem uma porta lá no topo, na última plataforma! O nosso destino deve ser lá!
— Pelo menos parece que não iremos lutar contra nada… Mesmo assim, não sou o melhor dos equilibristas, então isso pode ser um problema.
— Pode ser, cara. Mas acho que temos problemas maiores a lidar — Minoru inclinou levemente a cabeça para trás, um gesto discreto que capturou imediatamente a atenção dos outros dois.
Lá, estava Mayumi, com certeza a menos confiante. Massageando o braço esquerdo com a espada de gelo apertada em mãos, ela olhava tudo com receio. — Bom, eu… por aqui ficarei bem. Podem ir na frente.
Nikko foi a primeira a se mover, aproximando-se com um sorriso descontraído. — Relaxa, ruivinha! — ela envolveu um braço amigavelmente nos ombros da colega — vamos achar um jeito de você seguir com a gente. E se não acharmos, nada que uma ventania não resolva. Pode perguntar pro Akemi, ele aprova!
A resposta foi o silêncio, mas um olhar, fazendo jus ao estilo espadachim, tornou-se afiado como o gume de uma katana; uma encarada de canto de olho deu um aviso claro.
Nikko sentiu o peso e recuou, soltando Mayumi e levantando as mãos em sinal de rendição. — É-é, talvez não seja uma boa ideia… — brincou ela, com um sorriso nervoso enquanto se afastava.
Distante da conversa, Akemi buscava entender por onde começar. — Quantas formas estranhas. Quadrados, retângulos, triângulos… tudo interligado por caminhos extremamente estreitos e congelados. Como escala uma coisa dessas?!
Minoru também analisava o cenário, apesar de não poder usar sua aura de terra, ironicamente, parecia estar em seu elemento. O desafio era apenas mais uma brincadeira para o mais alto. — Isso vai ser moleza — disse ele, estalando os dedos — chego lá em um minuto — ele flexionou os joelhos, pronto para disparar, mas…
— Opa, opa! Nem vem! Você pode ser ágil, garoto, porém não mais do que eu! — proclamou Nikko, girando os ombros para se aquecer.
— Rá! Quer apostar?
A garota chegou mais perto e inclinou o tronco com as mãos na cintura. — Sou uma mulher de desafios, colega.
— Sei… Mas nada de aura! Só a pura habilidade.
— Fechado!
Ambos apertaram as mãos e se preparam para correr.
— No três! Um… dois-
Antes do fim da própria contagem, Minoru disparou, ganhando impulso a cada passo.
— Ei, seu trapaceiro! — gritou Nikko, começando sua corrida logo atrás.
Minoru nem se dava ao luxo de olhar para trás. Juntamente de uma energia confiante, ele saltava entre as plataformas como um nativo em uma selva de gelo, seus dedos dos pés incrivelmente encontravam pontos de apoio em meio a cada forma escorregadia e errônea, principalmente nas passarelas azuis usadas como conexões que poderiam derrubar qualquer despreparado.
Mas para o de número 10 no peito, cada obstáculo era parte de uma coreografia aparentemente já conhecida por ele…
Nos últimos obstáculos, apenas o muro da arena poderia levar à plataforma final. O garoto cravou as pontas dos dedos nas fissuras à sua esquerda, usou os pés na parede vertical para impulsionar o corpo, e agarrando-se na borda da plataforma, conseguiu subir e chegar ao topo.
O ato de erguer os braços o fez sentir um grande vitorioso.
— Eu sou uma lenda! — anunciou Minoru, com um sorriso largo e olhos fechados. — A Ichikawa que lute pra-
Mas quando os olhos abriram-se, um mundo desabou.
Bem diante do rapaz, Nikko estava com as mãos na cintura, cabeça inclinada de lado e um sorriso superior. — Oooi — ela acenou com uma mão.
— … Hã…? M-mas como…?!
— Eu tenho meus segredooos — cantarolou a garota, jogando uma mecha das marias chiquinhas quando virou-se — mas, se serve de consolo, você quase chegou primeiro.
Minoru abriu os braços. — Você só pode ter roubado! Não era pra usar aura!
Nikko agachou-se na borda da plataforma para observar o solo distante, mas não deixou de responder. — Roubar? Eu não faria isso. Pode confiar, não sou como você — seu comentário fez um vexame formar-se pelas suas costas.
— Ah… Aquilo foi pra ver se você estava esperta! E fique sabendo que não costumo fazer esse tipo de coisa! Enfim, não posso fazer nada além de reconhecer o seu talento.
— Entendi, entendi. Mas agora, um detalhe importante. O que a gente faz com aqueles dois lá embaixo?
No solo inicial, os atrasados simplesmente aceitavam o “destino congelado”.
Em silêncio, Akemi olhava para cima, onde Nikko e Minoru o observavam, e sentia um frio na barriga, mas não por causa do ambiente congelado. “Eles estão lá em cima como se fosse um passeio no parque, e eu aqui, tentando não escorregar, bater a cabeça e morrer de vergonha.”
E Mayumi? Uma estátua de gelo. Seus dedos apertavam a espada com uma força que ameaçava quebrar o cabo indestrutível, e seus olhos fixos no chão denunciavam que olhar para cima era convidar o pânico a tomar conta. “Eu não consigo… Não consigo subir lá. Não importa o que aconteça, eu não vou!” pensou ela, uma onda de náusea subiu em sua garganta. Mesmo normalmente sendo uma pessoa culta e de palavras bonitas, naquele momento, ela chegava a lembrar a personalidade do rapaz ao lado.
Akemi notou o comportamento da companheira e aproximou-se com cuidado, remetendo a alguém chegando perto de um animal selvagem e assustado. — S-Sanada… Eu sei que isso não é fácil para você, mas não podemos ficar aqui. Eles já estão lá em cima, e nós… bem, nós precisamos encontrar um jeito de nos juntar a eles.
Ombros delicados de uma dama tremiam e lutavam contra uma tempestade interna.
Era preciso escolher palavras com cuidado, estava claro que a afetada não era do tipo que se deixava convencer facilmente, especialmente quando o medo a comandava.
— Olha, eu entendo o que você está sentindo. Altura não é brincadeira. Mas você não está sozinha. Eu… eu estou aqui, e juntos, podemos fazer isso. Passo a passo, sem pressa. E se você escorregar, eu… te seguro? É-é! Eu te seguro…! Prometo.
— Eu agradeço o convite — respondia a garota de olhar retraído — mas não consigo. Meu corpo não obedece. É como estar presa, e cada vez que penso em subir, sinto que vou cair. Consigo somente aceitar este trauma.
Akemi sorriu, um sorriso pequeno, mas cheio de confiança. — Então não pense em subir. Pense em dar um passo. Só um. Depois, outro. E outro. Não precisa ser rápido, nem perfeito. Só precisa ser possível.
Mayumi ainda não se movia, mas algo na voz do companheiro parecia acalmar o turbilhão em sua cabeça. — Um passo… — murmurou ela, testando a ideia na cabeça.
— Isso! Um passo de cada vez — Akemi estendeu a mão — vamos?
Mayumi olhou para a mão amiga, suas pupilas dilataram-se, eventos inesquecíveis pareciam estar sendo lembrados. O coração dela batia forte, mas algo por dentro começou a ceder. — Um passo… de cada vez…?
Durante aquilo, lá em cima, Nikko e Minoru observavam a cena; uma era a curiosidade, o outro, a impaciência.
— Haaah — ao suspirar profundamente, Minoru cruzou os braços, virou-se e afastou-se um pouco, visivelmente agoniado. — Eles vão demorar uma eternidade. Devíamos ter ido todos juntos. Que bola fora.
Nikko continuava agachada. — Temos que ajudá-los.
— E você quer mesmo descer até lá?
— Claro que não. Não sei se aqueles dois conseguiriam subir até aqui praticamente por conta própria.
— Então qual o plano?
— Vai me dizer que não viu essa alavanca debaixo do seu pé?
Minoru olhou para baixo, e quando viu a alavanca de gelo rente ao chão da plataforma, colocou uma mão no queixo. — Hmm, isso é altamente suspeito, e considerando que estamos em um lugar cheio de armadilhas, tem certeza que essa é a melhor opção?
— Olha… — Nikko levantou-se e começou a caminhar. — Só tem um jeito de descobrir — ela repousou um joelho no chão e agarrou a alavanca, pronta para o que quer que viesse.
— Espera! — Minoru segurou o pulso da garota — e se for uma armadilha? A gente pode acabar liberando outro monstro de gelo ou algo pior.
— Aaah, então você tem medo? — Um sorriso malicioso desafiava.
— Eh? Eu não tenho medo! É apenas cautela! Seja consciente, poxa.
— Qual ééé? Ter cautela é chato. Vamos lá, Suzumura! Vivência! — Nikko puxou a alavanca.
Tudo estremeceu por um breve instante, acompanhado de um ruído súbito, como se algo vindo de baixo tivesse colidido com a base da plataforma.
E, de repente…
— Olha, garota. Eu não tô com um bom pressentime-
Vup! A estrutura começou a despencar em queda livre, tão rápida que o vento uivava nos ouvidos dos jovens, que agarravam-se com todas as forças na alavanca para não saírem voando.
— AAAAAAH!!! OLHA AÍ O QUE VOCÊ FEZ, SUA LOUCA!!!
— EU NÃO SABIA QUE IA SER ASSIM, DESCULPAAAA!!! MAS Ó!!! PELOS MENOS ESTAMOS DESCENDO, NÉ???!!!
— DESCENDO???!!! ISSO É UM ELEVADOR PRO INFERNO!!!
Cabelos voavam em todas as direções enquanto a plataforma descia vertiginosamente. Akemi e Mayumi, ainda no chão, viam a cena se desenrolar de olhos arregalados.
Até que a plataforma finalmente atingiu o chão.
BANG!!!
O gelo rachou ao redor e levantou uma névoa de cristais congelados. Nikko e Minoru, ainda agarrados à alavanca, soltarem-se e rolaram para lados opostos.
— Minha coluna… — gemeu Minoru, de barriga pra cima e mãos nas costas, olhando para o teto distante. — Vou processar você, Ichikawa. Juro que vou.
De costas para o grupo, Nikko estava deitada de lado, com um dos braços estendido, mas soltou uma risada ao reclamar com a voz abafada: — Ei, para com isso, Suzumura. Pelo menos a gente tá vivo, hehe… Ai.
Akemi prontificou ajuda. — Vocês estão bem?! — perguntou ele, ajudando Minoru a se levantar.
— Bem? Eu acho que vou precisar de uma massagem depois disso.
— Para de chorar, garoto! — Nikko levantou-se com um salto acrobático, como se nada tivesse acontecido. — Olha só, a gente veio buscar vocês. Provavelmente essa alavanca também pode nos levar pra cima de novo.
Mayumi, que até então estava em silêncio… — Subir? Nem pensar — a voz chegou a tremer.
— Qual foi, ruivinha, não seja assim… — Nikko deu um passo à frente, mas parou ao novamente ver aquele olhar tenebroso da espadachim. — Ok, ok, sem tocar. Mas olha, a gente não tem escolha. A porta está lá em cima, e vocês não vão ficar congelados aqui, né?
Mayumi, antes uma líder elegante e confiante que inspirou outros com sua postura impecável, suava frio e desviava olhares; ela não sabia mais o que responder, e naquele momento, lutava contra uma fobia debilitante que a paralisava; falar em público era tão difícil quanto, estava impossível articular palavras sem sentir pânico.
A fobia nunca foi algo que se diminuísse, uma condição que poderia afetar até os indivíduos mais qualificados na elegância. Cabe ao grupo descobrir um meio de vencê-la e avançar no desafio principal: chegar ao topo do castelo…
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