Capítulo 65 - Tipos áuricos
— Primeiramente, Aburaya, não pude deixar de achar intrigante o fato de você ter despertado uma aura após um acidente em uma usina hidrelétrica, mas para que eu possa me informar melhor, diga-me explicitamente o que realmente aconteceu naquela instalação.
Akemi explicou detalhadamente sobre como foi a sua trajetória até a sala das máquinas, contando inclusive a proibição de seu avô sobre acessar tal área. — … Daí, acabei sendo surpreendido por um estrondo, claramente um raio. A sala começou a piscar em vermelho, e então percebi o estado crítico de um dos protótipos… Achei que poderia fazer algo heroico puxando a alavanca, mas-
— Mas você completou um circuito de dissipação forçada e fez a máquina liberar uma carga de milhares de volts? — Masaru ergueu a sobrancelha, como se a conclusão fosse óbvia.
Porém, Akemi, mesmo que chateado, pensava o mesmo. — Correto… Em condições de sobrecarga, máquinas experimentais tendem a acumular energia em compartimentos de contenção. Quando você tenta puxar a alavanca, ao invés de interromper o fluxo de outra forma, você acaba abrindo um canal instantâneo de escape…
— Ha ha ha, acredito que o ponto mais condutivo naquele ambiente deveria ser um jovem bem inocente, ou quem sabe corajoso. Aliás, parece que você sabia muito bem o que estava acontecendo, então, por que agiu daquela forma ao invés de chamar alguém? Insolência? Pressa? Inaceitação? Raiva?
— Um pouco de tudo.
— E o que você sentiu quando foi atingido? Conseguiu ficar consciente?
— Por segundos, pude ver tudo. O brilho, as correntes elétricas, o calor… tudo isso corria nas minhas veias como se fizessem parte de mim.
— Hm, depois?
— A energia dentro de mim, simplesmente… explodiu. Depois disso, só me lembro da sala ficando escura e do socorro de alguns operários — Akemi se lembrava de mais. “O rosto do meu avô então, com certeza é uma imagem que não sairá tão fácil da minha cabeça.”
— Uhum… Bom, quanto a esses seus relatos, é quase inegável que você seja um áurico do tipo retrator.
“Retrator… Essa palavra não me é estranha, mas não faço ideia do que ela significa direito.”
— O que exatamente é ser um áurico retrator?
— … Parece que você realmente não tem conhecimento o suficiente do básico do mundo áurico, não é mesmo, Aburaya?
Akemi sorriu singelo. — Isso já não é mais nenhum segredo, o senhor já sabe por onde eu passei antes de chegar aqui.
“Já vi alguns livros e artigos conterem essa palavra, mas nunca tive a oportunidade de entendê-la por completo no contexto áurico.”
Masaru ajustou os óculos, e seu olhar se tornou ainda mais técnico, como se um quadro-negro imaginário surgisse atrás dele. — Ahém! Muito bem, então permita-me elucidar. No mundo áurico, todos os usuários de aura são classificados por tipos que definem não só como você utiliza seu poder, mas também os custos, limitações e potencial do seu uso.
Akemi concordou com a cabeça, interessado.
— Existem três principais tipos de áuricos. — Masaru estalou os dedos, fazendo pequenas chamas piscarem entre eles como marcadores didáticos. — Os Emanadores, os Dobradores, e os Retratores.
“Os nomes parecem se auto-explicar, mas ainda não entendi o que um retrator pode fazer.”
— Vamos começar pelo grupo mais comum entre os áuricos, os Emanadores. Esses são aqueles que criam ou geram seus poderes diretamente do próprio corpo. No seu DNA há algo que permite essa manifestação natural da aura. Em contrapartida, por gerarem sua própria aura, eles gastam mais energia.
— Gastam energia?
— Nenhum emanador possui um uso totalmente ilimitado de aura, para que possam usar suas habilidades, eles gastam a própria energia do corpo até a exaustão. Alguns têm a energia tão baixa que não passam mais de dois minutos utilizando os poderes, entretanto, existem aqueles tão bem treinados que até parecem ter adquirido uma energia infinita. Esses em questão, normalmente são os áuricos mais fortes do planeta.
— Pode soar meio contraditório, mas apesar das desvantagens, parece muito vantajoso ser um emanador.
— E é. Um emanador de aura aquática, até mesmo no deserto, poderá lutar. É um tipo flexível, versátil, mas exige muito mais controle e preparo físico, já que a energia usada vem toda de si.
— E os Dobradores?
— Ah, os Dobradores… — Masaru alegrou-se como se apreciasse um bom vinho antigo. — Não são raros, mas definitivamente não se comparam aos emanadores em números. Aliás, o uso de sua aura não interfere drasticamente em seus vigores, porém, há uma condição: precisam estar próximos de seu elemento ou do terreno correspondente. Eles não criam o poder, apenas o conduzem, dobram ou estendem, ou seja, controlam o que já existe.
— Um dobrador de fogo, por exemplo, não poderia fazer nada em alto-mar?
— Exatamente. Estariam limitados. Em compensação, se estiverem cercados pelo seu elemento, tornam-se mestres absolutos da manipulação. Um verdadeiro dobrador é como um dançarino experiente que move o mundo com seus movimentos. Exigem técnica, leitura de ambiente e experiência.
— Tá, entendi. E sobre esse tal de “Retrator”? O senhor disse que acha que eu sou um deles…
Masaru recolheu as chamas e dirigiu-se para a lareira; lá, agachou-se. — Sim, esse é um tipo… peculiar. Retratores são raros. Eles precisam retrair ou contrair seus poderes para utilizá-los — ele estendeu as mãos para perto do calor. — Pense como um elástico: para liberar energia, primeiro precisam puxar para dentro.
Sorrateiramente, a brasa da lareira começou a ser transferida para dentro das palmas do instrutor.
Akemi observava encantado. — Você é um retrator.
— Armazeno minha aura a partir do calor do fogo. Passar um tempo nessa sala aquecida e retrair o seu ambiente é um passatempo que tanto me relaxa quanto fortalece.
— Retrair… isso parece… complicado.
— Pode-se dizer que sim. A retração do respectivo elemento é uma exigência fundamental, é nela que se dá a condensação gradual da aura, cuja potência pode ser amplificada no instante da liberação. Trata-se portanto de um ciclo refinado, um vai e vem entre contenção e desfecho. Naturalmente, é um processo mais complicado, tanto no treino quanto na compreensão, mas aqueles que o dominam, transcendem a força bruta e se tornam verdadeiramente formidáveis.
“Contenção, e desfecho… Recolher… e explodir… foi exatamente o que senti!” Akemi começava a ligar os pontos. — Passei por um hospital áurico após o meu acidente, mas fui liberado pelos médicos no mesmo dia em que acordei. Até que me ensinaram algumas coisas lá, porém nada foi o suficiente para que eu entendesse tudo. Foi como se eles quisessem esconder algo de mim ou sei lá. Mas sinto que aqui posso aprender de verdade!
Com a seriedade atrás dos óculos, Masaru levantou-se e voltou para perto do garoto. — Instalações áuricas hospitalares não foram criadas para potencializar a aura dos pacientes, e sim, mantê-los saudáveis e prontos para usar suas habilidades novamente. Mas agora que você entende mais sobre os tipos áuricos, está pronto para entender melhor sobre si mesmo.
— Minha aura pode ser armazenada com energia elétrica, né?!
— Vamos com calma. Para que prossigamos, serão necessários equipamentos adequados, entretanto, nesta sala, não possuo quase nada que seja útil para nós. Com apenas as suas sensações e os meus olhares, não somos capazes de descobrir suas capacidades com a precisão desejada… Para agilizar as nossas pesquisas, serão necessários olhos que enxergam muito além do físico.
“Estranho, ele está se referindo a alguém?”
— É… o que o senhor quis dizer com-
— Ora ora, parece que os rapazes estão desesperados pelos meus serviços — disse uma voz feminina, madura e de tendência atrativa.
Akemi quase encolheu-se pelo comentário repentino, e quando procurou por todos os lados, preocupou-se ao não encontrar nada. — O-o-o que é isso!? Tem alguém invisível aqui!?
— Não sou invisível. Sou apenas além do que você entende por realidade.
Atraído pela fala que veio justo do canto mais sombrio da sala, o garoto virou o rosto.
Dali, pôde-se ver.
Após materializar-se de cima a baixo, surgindo da sombra espessa como se deixasse de ser totalmente parte dela, a voz misteriosa finalmente deu as caras.
“Uma… mulher?”

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