Capítulo 61 de 20 — Me esperem destemidos, estou ficando mais forte!
O nascer do sol estava prestes a se manifestar. Normalmente, já estaria me dedicando aos meus treinos, mas após o que ocorreu comigo ontem, optei por ficar mais um pouco sob o aconchego da cama, permitindo-me sentir a energia fluir pelo meu corpo.
As coisas pareciam estar em sua habitual normalidade, no entanto, uma sensação estranha de vigor pulsava dentro de mim. Não saberia explicar, mas era como se cada célula do meu ser estivesse impregnada por uma força renovada, uma energia vital que crescia a cada instante.
Decidi não pensar muito nisso. Não costumava me gabar, mas comecei ultimamente a duvidar de minha própria inteligência. Mesmo assim, mantinha a convicção de ser o ser mais forte do mundo. Naquele momento, não sentia que poderia ser superado por ninguém.
As manhãs permaneciam quase as mesmas, exceto por Ui, que hoje decidiu acordar mais cedo. Ela saiu sorrateiramente, sem dizer uma palavra. Normalmente, ela costumava trocar algumas palavras comigo, mas desta vez foi diferente. Bem, talvez ela tenha desistido, já que geralmente a ignoro.
Duas horas depois, decidi me levantar. Após me preparar, vesti o collant que Max insistiu em me dar. Pelo menos ele conhecia meus gostos. Era de um amarelo vibrante e ajustava-se bem ao corpo, realçando meus músculos. No entanto, sentia-me desconfortável assim, então coloquei uma camisa e calção por cima.
Ao terminar de vestir, percebi o aroma de alguém se aproximando. O cheiro era muito familiar. A pessoa bateu na porta e eu me aproximei lentamente para abrir.
— O que quer? — perguntei enquanto franzia a testa.
— Me desculpe por aparecer assim, mas eu precisava falar com você.
O rosto dessa mulher permanecia sério, completamente diferente da mulher que eu conhecia, aquela que sempre me encarava com desprezo e repulsa. No entanto, essa versão dela me deixava intrigado. Não conseguia identificar exatamente o que ela queria transmitir com sua expressão facial, mas conseguia sentir algo. Não era o ódio que costumava emanar de suas atitudes em relação a mim; era algo mais acolhedor.
Como alguém que sempre foi alvo do desprezo alheio, eu conseguia distinguir esse sentimento, mas algo contrário era difícil de discernir. Mesmo que talvez não fosse a mesma pessoa, aquele rosto vermelho e os cabelos cor de sangue jamais seriam esquecidos, principalmente o sorriso cruel que ela exibiu enquanto envenenava minha mãe.
— Suma.
— Castiel me disse tudo o que aconteceu, eu sei que não é muita coisa, mas… — Ela abaixou a cabeça e exclamou: — Me perdoe.
A raiva começou a tomar conta de mim, um turbilhão de emoções que me envolveu em sua voracidade. Minhas mãos tremiam enquanto eu empunhava minhas espadas, prontas para o confronto final. Cada fibra do meu ser clamava por justiça, e vingança, mas uma voz interior sussurrava que não era culpa dela.
Ela, aquela figura diante de mim, não passava de uma vítima dos demônios que habitavam este mundo sombrio. Manipulada por forças além de sua compreensão, ela tornou-se um instrumento do mal. No entanto, essa verdade não dissipava a fúria que fervilhava em meu peito. Eu ainda ansiava por seu sangue, por uma retribuição que parecia justa em minha mente obscurecida pela dor.
Os lábios pressionados até sangrar eram reflexo da batalha interna que travava. Cada gota de sangue era um lembrete da minha humanidade lutando contra a selvageria que ameaçava consumir-me. Com esforço sobre-humano, consegui conter a ânsia de violência que pulsava em minhas veias.
Guardando minhas espadas com mãos trêmulas, forcei-me a acalmar-me. A respiração irregular começou a se estabilizar enquanto eu buscava algum semblante de paz interior. Finalmente, dirigindo-me a ela, minhas palavras foram proferidas em meio ao silêncio tenso que nos cercava, carregadas de uma mistura de dor e resignação:
— Eu sei que não é culpa sua, só nunca mostre mais o seu rosto para mim.
— Muito obrigada.
Eu não podia ver seu rosto, mas observei uma única gota caindo silenciosamente no chão, como uma manifestação solitária de sua emoção. Não sabia quem era esse indivíduo destemido que se atrevia a desafiar minha mãe, mas estava claro que ele nutria um profundo ressentimento contra ela. E eu não os perdoaria jamais.
— Tome — disse, enquanto permanecia imóvel na mesma posição.
— O que é isso?
— Castiel mandou entregar, são roupas para o casamento.
— Não vou.
— Izumi? — Ui perguntou enquanto se aproximava. — Obrigado senhora, deixa que eu trato disso. — ela pegou o pacote com as supostas roupas.
— Sim.
Aquela mulher partiu enquanto tentava desviar o rosto de mim. Talvez ela cumprisse realmente o que eu dissesse. Ui olhou para mim e agarrou-me pela gola da minha camisa, puxando-me para casa. E então, desceu o meu calção.
— Ei, o que diabos achas que ás fazendo? — perguntei enquanto apertava os olhos.
— Eu vou te vestir, nós vamos juntos para o casamento. Rápido, senão vamos nos atrasar! — gritou, tentando tirar minha camisa.
— Pare, não tenho nada a ganhar com isso.
— Quê? Vais perder o casamento do teu pai?
— Ele não é o meu pai.
— É sim, ele que te criou.
— Não, foi minha mãe.
— Não vai deixar eu tirar sua camisa? — perguntou antes de encher as bochechas.
— Não vais me convencer com essa careta.
— Eu não estou fazendo careta!
— Dane-se, eu não vou ver um bando de humanos felizes.
— Há! Sim, Izumi. Tens razão, eles vão ficar felizes sem você lá — concordou, esboçando um rosto que acabara de pensar em algo.
— Vejo que tás entendendo.
— Mas imagina se tivesses lá. Eles iam ficar tristes! — declarou e logo em seguida sorriu com os olhos.
— Tens razão.
Às vezes, as pessoas me davam boas ideias. Se eu não fosse, aquele velho teria aproveitado o seu casamento e viveria feliz. Mas se eu ficasse lá, a festa azedaria e tudo se tornaria um desastre.
Ui, você é uma génia!
— Vamos, vamos acabar com aquele casamento.
— Sim, maridão!
— Nunca mais fale isso.
— Sim, esposão!
— …
Ela conseguia me desanimar de uma forma diferente. Talvez eu devesse ficar em casa e aproveitar para treinar mais, mas já havia decidido acabar com aquele casamento. Vesti aquelas roupas estranhas, o que as pessoas chamavam de terno. O meu era uma combinação de preto, branco e amarelo. Pelo menos, eles sabiam do meu gosto. O casaco e calça eram pretos, a camisa branca e a gravata amarela.
Prontamente, aparecemos perto de uma igreja, enquanto Ui se enrolava nos meus braços. Me perguntei se eu entrasse lá, a igreja talvez me negasse. Vamos ver, talvez ela se queime perante minha perversidade.
Entrei e avistei Castiel lá no fundo. Mas essa sensação que eu estava sentindo em meu corpo era diferente. Eu podia sentir algo fluindo em mim, mas era fraco. Eu não sabia o que era. Continuei persistindo, mas não dava em nada. Então, decidi ignorar por enquanto.
Olhando ao redor, não havia muitas pessoas ali, a maioria delas eu já tinha visto uma vez, exceto por algumas pessoas negras. Max lá na frente me chamou e Ui me arrastou para lá, e sentamos.
O velho estava um pouco diferente do habitual. Normalmente, ele tinha o rosto de alguém convencido, mas estranhamente estava bem nervoso. Será que o casamento deixava as pessoas tensas assim?
Já fazia um tempo desde que eu tinha visto aquelas duas pessoas, primeiro essa mulher com os seios caídos e a secretária do velho. Aquela mulher mostrava um rosto normal para as pessoas, mas eu sabia que por dentro ela estava emanando energia negativa para os outros. Acho que ela foi a única pessoa com quem simpatizei quando percebi que sua frustração era dirigida a todos.
— Izumi, o nosso pai está diferente.
— Ele não é o meu pai.
Ele olhou para mim e com um sorriso exclamou: — Fazia tempo que não o via tão feliz. A última vez foi quando ele te reencontrou.
— Quê?
— Ele não demostra, mas o nosso pai nos ama demais.
— …
Decidi não responder, pois não fazia sentido. Aquele velhote me amar? Impossível. Mesmo que eu não soubesse que sentimento ele emanava por mim, eu negaria até a morte que ele me amava.
Depois de um tempo, a noiva apareceu. Era uma mulher que eu desconhecia, mas incrivelmente se parecia um pouco com a minha mãe.
O casamento cruelmente correu bem. Não era o que eu esperava que acontecesse, mas fazer o quê, né? Ui, como sempre, andou comigo por aí. E de repente, velho se aproximou de mim com sua mulher.
— Izumi, essa é Kata. Minha esposa.
Ela olhou para mim e sorriu: Prazer, Sou Kata. Castiel me falou bastante de você.
— Tanto faz. Não me interessa.
— Você me lembra Idalme.
— Não me compare com aquela peito caído.
— Peito caído? — questionou enquanto olhava para peitos flácidos. — Bem, acho que eles são bem firmes.
— Tem certeza? Eu consigo sentir a maldade neles.
Falando nessa mulher, senti que ela estava emanando alguma maldade para mim e para Max. Isso me lembrou do início da nossa jornada, era bem igual a isso.
— Me lembras dos meus alunos, espero que nos demos bem, Izumi — argumentou, sorrindo novamente para mim enquanto estendia a mão em minha direção.
Olhei para sua mão e pensei em como essa mulher não emanava nenhuma energia negativa. Sua energia me lembrava a minha mãe, algo acolhedor. Ela citou alunos? Talvez seja isso, ela protege os seus filhos, como minha mãe me protegia.
Não sei o que deu em mim, mas segurei sua mão por um breve instante e depois soltei, surpreso. Virei as costas e saí.
— Ele é tão fofo.
— Sim, muito fofo. Gostou dele?
— Sim.
Malditos, parem de falar de mim comigo por perto, eu posso ouvir tudo.
Mas o que era isso que deu em mim? Algo estava estranho, e aquela energia sinistra circulando em mim começou a crescer mais.
O casamento terminou e fui para casa, Ui foi junto comigo. Com essa nova energia que estava circulando dentro de mim, de repente parou. Não sei como, mas parou quando saí da igreja. Talvez lá tivesse algo. Com essa ideia, decidi ficar mais um tempo na cidade para tentar destravar essa energia.
Me esperem destemidos, estou ficando mais forte!
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