Hora da Recomendação, leiam Fagulha das Estrelas. O autor, P.R.R Assunção, tem me ajudado com algumas coisas, então deem uma força a ele ^^ (comentem também lá, comentários ajudam muito)
Talvez passe a usar mais esse espaço para recomendar outras obras (novels ou outras coisas que eu achar interessante ^^)
Capítulo 110: Que Coincidência
Na cidade-estado de Pland, dentro de um antiquário no Distrito Inferior, Duncan estava sentado atrás do balcão segurando um jornal local, parecendo folhear distraidamente o conteúdo impresso.
De repente, ele piscou duas vezes, seu olhar antes disperso voltou a se focar. Então, ele olhou para o jornal em suas mãos e, com indiferença, virou-o de cabeça para baixo.
Na manchete da primeira página, estava estampado um dos grandes acontecimentos recentes da cidade-estado: Sua Graça, o Bispo Valentine da Catedral do Mar Profundo1, em breve realizaria uma grande cerimônia de oração. Durante o evento, mais de dez igrejas pela cidade fariam soar seus sinos e acionariam seus apitos a vapor para invocar o poder da Deusa da Tempestade, trazendo bênçãos para a cidade.
Como um prelúdio para essa cerimônia, na noite anterior, o Governador Dante Wayne expressou seus cumprimentos à catedral e enviou um presente…
Na capa do jornal, havia uma imagem impressa do governador da cidade-estado — um homem de meia-idade com uma expressão severa, cabelos grisalhos e uma figura alta e magra. O que mais chamava atenção, no entanto, era a cicatriz impressionante em seu rosto e o fato de um olho mecânico ter substituído seu olho original.
Aquela era, sem dúvida, uma marca deixada por algum acidente fatal.
O olhar de Duncan percorreu lentamente a página do jornal, mas sua mente evocou a imagem da jovem Inquisidora Vanna — a mesma inquisidora cujo rosto também carregava uma cicatriz perto dos olhos. Embora a marca não comprometesse sua visão, ainda era bastante evidente.
Ele se lembrou das informações que havia coletado recentemente:
O governador da cidade-estado, Dante Wayne, era tio da inquisidora Vanna Wayne. Acreditava-se que as cicatrizes em seus rostos fossem resultados do mesmo incidente — um ocorrido há onze anos, quando um vazamento industrial e um motim de cultistas abalaram o Sexto Distrito, próximo ao Distrito da Encruzilhada. Naquele evento, Dante Wayne e Vanna Wayne foram atacados pelos insurgentes e saíram com cicatrizes permanentes. Esse incidente também os tornou defensores ferrenhos da Igreja do Mar Profundo, levando-os a combater ativamente atividades heréticas na cidade-estado…
Essas informações não eram segredo em Pland — estavam tanto nos registros oficiais quanto nas histórias populares. No Distrito Inferior, qualquer um que perguntasse ouviria essas mesmas histórias.
De novo onze anos atrás. De novo no Sexto Distrito. Um ‘vazamento industrial’…
Sem dizer uma palavra, Duncan virou a página do jornal, enquanto sua mente organizava e conectava as inúmeras pistas que ele vinha coletando recentemente.
O Fragmento do Sol, o incêndio nas memórias de Nina, os pesadelos recorrentes dela, o incidente que marcaram Vanna e Dante, e aquela estranha garota chamada Shirley, que parecia estar investigando a verdade por conta própria… Tudo girava em torno do evento de onze anos atrás, o ‘vazamento industrial’ no Sexto Distrito.
Agora, os Cultistas do Sol começaram a se agitar novamente pela cidade, e por trás deles, havia o chamado ‘Deus Sol’ — uma entidade em chamas, semelhante a um deus profano.
E essa coisa… ainda estava pedindo ajuda.
Duncan ainda não tinha intenção de lidar diretamente com aquele Deus Sol, mas estava preocupado que esse fogo sem nome, ardendo silenciosamente na escuridão, acabasse alcançando Nina.
Desde cedo, a pomba já havia sido enviada para patrulhar a cidade-estado em busca de pistas sobre cultistas e ainda estava vagando por aí. Nina, por sua vez, estava no andar de cima arrumando seus livros, se preparando para sair para a escola. Do lado de fora da loja, as ruas começavam a ganhar vida—o som de carruagens e pedestres enchia o ar, trazendo um senso vibrante de energia e movimento.
De repente, passos leves ecoaram na escada. O velho piso de madeira rangeu suavemente, e então Nina apareceu correndo no campo de visão de Duncan. Ela carregava sua mochila em uma mão e, na outra, segurava um pão, provavelmente seu almoço.
“Tio! Estou indo para a escola!”
“Vai com calma, não precisa correr. Ainda é cedo.” Duncan lançou um olhar de leve repreensão para a garota, mas logo se lembrou de algo. “Ah, hoje é o dia da visita ao museu?”
“Sim! Combinei com uma colega!” Nina virou-se com um sorriso radiante. “Não vou voltar para almoçar, vou direto com minha amiga para o museu. O senhor vai ter que se virar com o almoço!”
“Entendido, entendido.” Duncan acenou com a mão e reforçou: “Vá devagar, tome cuidado com os carros no caminho…”
“Sim, sim! Até mais, tio!”
Com um grito animado, passos apressados e o som do sino da porta tilintando, Nina desapareceu de sua vista.
Ela atravessou a rua em frente ao antiquário e correu rapidamente em direção à luz matinal de Pland.
Duncan a observou partir, recordando-se da última ‘visita domiciliar’ que teve com o professor dela—o senhor Morris—e das coisas que ele lhe contou.
Nina tinha poucos amigos na escola. A maioria dos colegas não se aproximava muito dela.
Mas, ainda que tivesse poucos amigos, parecia que havia ao menos uma ou duas pessoas com quem se dava bem. Alguém havia a convidado para ir ao museu, e pelo jeito, ela estava bastante animada com isso. Isso, sem dúvida, era um bom sinal.
Ontem, ele já havia se informado sobre essa colega—era uma garota tranquila que também morava no Distrito Inferior. Elas tinham se tornado amigas recentemente e pareciam se dar bem.
Duncan então colocou o jornal de lado.
Nina já havia saído para a escola e só voltaria à noite. Além disso, sendo um dia de semana, era improvável que houvesse muito movimento no antiquário.
Ficar na loja parecia um desperdício de tempo. Talvez fosse uma boa ideia dar uma volta pela cidade e, ao mesmo tempo… investigar algumas coisas.
Duncan concentrou-se em sua mente, percebendo a localização atual de Ai, e ordenou mentalmente à pomba que continuasse sua patrulha. Depois, vestiu seu casaco, pendurou a placa de ‘Fechado Temporariamente’ na porta, trancou a loja e seguiu em direção à estação de ônibus mais próxima.
A estação estava lotada. Naquele horário, as pessoas se aglomeravam para pegar o transporte rumo ao trabalho ou à escola. Misturado à multidão, Duncan se aproximou do letreiro da estação, observando o mapa das rotas.
Seus olhos pousaram sobre uma linha específica, onde um destino estava claramente impresso:
〖Sexto Distrito〗
O local registrado oficialmente como palco do ‘vazamento industrial’.
Duncan desviou o olhar e esperou pacientemente entre as pessoas. Ônibus iam e vinham, várias das grandes carroças a vapor levaram parte dos passageiros da plataforma. Foi só depois de um longo tempo que um veículo mais velho, balançando levemente, surgiu no fim da estrada. No letreiro acima do para-brisa, estava o número da linha que ele esperava.
Duncan entrou no ônibus junto com a multidão.
O interior estava abarrotado. Trabalhadores apressados ocupavam todos os assentos e até mesmo os espaços nos corredores. Duncan se espremeu próximo à porta traseira, esperando pacientemente que o veículo começasse a se mover.
O motor a vapor soltou um ruído áspero e cansado quando o ônibus sobrecarregado finalmente deu partida.
Enquanto isso, o cobrador tentava se esgueirar por entre a massa compacta de passageiros, chamando pelas tarifas e distribuindo bilhetes. Seu uniforme azul-escuro estava tão apertado entre os corpos que parecia deformado.
“Sexto Distrito.” Duncan sorriu amigavelmente ao cobrador.
No entanto, o homem, esmagado entre os passageiros, ficou visivelmente surpreso ao ouvir o destino de Duncan. Como se não tivesse entendido direito, piscou algumas vezes antes de perguntar:
“Hã? Pra onde você disse que vai?”
Duncan franziu ligeiramente a testa.
“Sexto Distrito—vi no mapa da linha. Este ônibus não vai para lá?”
O cobrador hesitou por um instante e então levantou a cabeça, confirmando a rota no painel adesivado da cabine. Só então pareceu ‘acordar’ e assentiu apressadamente:
“Ah, sim, sim! Claro que vai… É que quase ninguém vai pra lá, eu até tinha esquecido… São quatro pesos.”
Quase ninguém vai para o Sexto Distrito? O acidente foi há onze anos… A área ao redor da fábrica ainda não foi reconstruída?
Duncan sentiu um leve desconforto com essa informação, mas manteve a expressão neutra. Pegou seu bilhete e observou enquanto o cobrador voltava a se lançar na multidão como um guerreiro tentando atravessar um campo de batalha caótico.
Agora, tudo o que restava era esperar silenciosamente até o ônibus chegar ao destino.
Mas, de repente, Duncan sentiu como se um olhar tivesse sido lançado em sua direção.
Foi algo muito breve, como se alguém tivesse apenas passado os olhos por ele sem querer e rapidamente desviado o olhar. No entanto, os sentidos de Duncan eram afiados—ele não apenas percebeu que aquele olhar estava diretamente direcionado a ele, mas também captou, no instante em que a pessoa desviou, um traço sutil de… medo e evasão.
Isso atiçou sua curiosidade.
Seguindo seu instinto, ele virou a cabeça e olhou em direção à fonte daquele olhar.
No instante seguinte, no meio dos passageiros apertados na parte traseira do ônibus, ele viu uma pequena silhueta tentando recuar desesperadamente.
Ele viu aquela figura—e aquela figura também o viu.
Assim que os olhares se encontraram, a pessoa congelou no lugar. Seu corpo ficou completamente rígido, como se até mesmo a ideia de continuar se escondendo tivesse sido abandonada.
Era uma garota vestida com um vestido preto, de altura semelhante à de Nina. No pescoço, usava um colar peculiar, ao qual estava preso um pequeno sino.
Era Shirley.
Duncan ergueu uma sobrancelha, surpreso. Jamais teria imaginado que as coisas se encaixariam de maneira tão coincidente.
Sem hesitar, ele começou a empurrar-se através da multidão na direção dela.
A essa altura, Shirley já estava completamente imóvel. Seu rosto demonstrava tensão e pavor, e seus olhos não desviavam de Duncan nem por um segundo. Ela não só não tentou fugir, como parecia nem mesmo ousar virar a cabeça.
Duncan se aproximou lentamente até ficar cara a cara com ela. Então, abriu um sorriso amigável e cumprimentou:
“Nos encontramos de novo—indo para a escola a essa hora?”
Shirley fez um esforço sobre-humano para esboçar um sorriso. Embora antes tivesse falado descaradamente para o Cão sobre ‘se agarrar à perna de um grande figurão’, agora que tinha plena consciência de quão assustador Duncan realmente era, seu sorriso parecia mais um choro forçado.
“O-Olá…”
- Acho que é importante frisar isso, tem duas Catedrais citadas nas histórias até agora, ambas eu havia traduzido anteriormente como Grande Catedral da Tempestade, o que estava errado. Catedral do Mar Profundo é a que está presente em Pland (e provavelmente em outras cidades-estado), existe sempre apenas uma em uma cidade-estado. Catedral da Tempestade se refere ao núcleo da igreja do Mar Profundo, onde reside a Suma Pontífice, que foi descrita como uma arca que sempre está em movimento pelo mar profundo, existe apenas uma no mundo. Simplificando Catedral da Tempestade › Catedral do Mar Profundo › Igreja do Mar Profundo. Já corrigi em todos os capítulos que elas apareceram anteriormente.[↩]
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