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    Duncan não esperava que uma pergunta feita por acaso resultasse em uma revelação tão importante sobre o Banido. Embora já tivesse ouvido Cão descrever a temível reputação que a embarcação possuía nas Profundezas Abissais, ele nunca imaginou que essa reputação tivesse sido construída de uma forma tão… brutal.

    Um navio fantasma oscilando incessantemente entre o Subespaço e o mundo real, como um projétil disparado repetidamente entre o topo de um prédio e seus alicerces. Cada impacto perfurava os ‘andares’ do Plano Espiritual e das Profundezas Abissais, obliterando tudo ao seu redor e arrastando para o Subespaço qualquer entidade que tivesse o azar de cruzar seu caminho… E, pelo que parecia, isso não foi um evento de curta duração.

    Agora ficava fácil entender por que até mesmo um demônio abissal como Cão carregava esse medo em seus ossos. Afinal, se um desastre imprevisível e apocalíptico passasse repetidas vezes pelo seu território, reduzindo tudo a pó, e um dia parasse do nada… para depois surgir um capitão sorridente descendo do convés e lhe dando um tapinha amigável no ombro… quem não sentiria um arrepio na espinha?

    Mesmo que Cão não tivesse tendões nas pernas, ele ainda encontraria um jeito de tremer.

    Afinal… só porque o Banido estava ancorado no mundo real agora, quem garantia que um certo capitão-fantasma não decidiria um dia ‘dar um pulinho’ no Subespaço para uma visita?

    No entanto, por mais absurda que fosse a história do Banido, o que mais incomodava Duncan era a condição daquela embarcação e do verdadeiro Capitão Duncan na época dos incidentes.

    Aquele ‘tremor dimensional’ entre o Subespaço e a realidade havia sido intencional? Ou teria sido o resultado de um naufrágio descontrolado? O Cabeça de Bode sabia o que estava acontecendo na época?

    Se tudo isso tivesse sido feito de propósito, qual era o objetivo do ‘Capitão Duncan’ e do Cabeça de Bode? Mas se a explicação fosse uma completa perda de controle…

    Então o problema era ainda maior.

    O Banido poderia perder o controle de novo?

    Até agora, o navio sempre foi o maior trunfo de Duncan, sua base segura e seu próprio corpo. Ele passou todo esse tempo explorando e dominando a embarcação para garantir sua estabilidade. Mas se havia uma possibilidade de que todo o navio estivesse, na verdade, instável, e que a qualquer momento ele pudesse simplesmente se lançar de volta ao Subespaço…

    O quanto, de fato, ele controlava aquele navio?

    Se o Banido começasse a acelerar rumo ao Subespaço como um louco, Duncan seria capaz de segurá-lo?

    Talvez a calmaria atual do navio, navegando estável pelo Mar Infinito, fosse apenas um equilíbrio temporário. E, na realidade, seu estado ‘natural’ fosse o puro caos.

    Esse pensamento cresceu como uma sombra em sua mente, trazendo uma inquietação que ele não conseguia afastar.

    Mas o que o incomodava ainda mais era a porta localizada no porão do Banido, aquela que levava ao Subespaço—e, mais especificamente, a reação do Cabeça de Bode quando soube que a porta havia se entreaberto.

    Isso parecia confirmar suas preocupações.

    O Banido não era estável.

    O chamado do Subespaço para aquela embarcação nunca cessou, nem por um instante.

    Duncan inalou discretamente, forçando-se a recuperar a calma.

    Por mais que refletisse, ele simplesmente não tinha conhecimento ou poder suficientes para lidar com o Subespaço—seu entendimento do domínio místico ainda era limitado.

    Se ele quisesse adquirir mais informações sobre o Subespaço, interagir com eventos sobrenaturais seria um caminho. E, diante dele, havia um ponto de investigação perfeito: essa igreja—uma igreja que possivelmente já havia sido invadida pelo Subespaço.

    ‘Vamos focar nisso por enquanto.’ Duncan balançou a cabeça, afastando seus pensamentos sobre o Banido. ‘Se algo do Subespaço realmente invadiu este Santuário Subterrâneo, então o que aconteceu aqui há onze anos pode ter sido ainda mais complicado do que todos imaginavam.’

    Ele ergueu os olhos para a porta que antes estava lacrada.

    “A freira se sacrificou para bloquear a saída, provavelmente tentando impedir que algo escapasse do santuário. Mas… uma simples porta poderia realmente conter um invasor do Subespaço?”

    “A infiltração do Subespaço depende da situação”, Cão respondeu pensativo. “Na maioria dos casos, o mundo real é protegido pelos deuses—tá, eu não gosto deles, mas admito que a realidade está muito bem protegida. O Subespaço dificilmente pode exercer influência direta sobre este mundo. Quando algo consegue se infiltrar, geralmente não é o corpo real, mas sim uma projeção, uma contaminação… ou até mesmo uma ilusão gerada a partir da mente humana.”

    Cão estava no meio de sua explicação quando, de repente, parou de falar.

    Seus olhos vazios brilharam com um terror repentino enquanto ele olhava fixamente para Duncan.

    Afinal, aos olhos de um demônio abissal, o ‘homem’ que estava diante dele não era um simples humano. Dentro do corpo de Duncan, redemoinhos de luz e sombras giravam em um padrão caótico. Aquele brilho lunático, insano o suficiente para enlouquecer qualquer criatura, emergia sem cessar de dentro dele.

    Esse capitão fantasma que havia retornado do Subespaço…

    Porra, ele mesmo é a maior invasão do Subespaço que este lugar já viu!

    “Continue. O que acontece quando o Subespaço invade?”

    A ‘personificação da invasão do Subespaço’ olhou para Cão com um semblante curioso, inclinando a cabeça para ouvi-lo.

    Cão engoliu em seco, sem ousar piscar.

    “Eu… eu quero dizer, em circunstâncias normais, a invasão do Subespaço pode ser contida pelas instalações sagradas de uma igreja…” Cão engoliu em seco, esforçando-se para explicar a um próprio invasor do Subespaço como essas invasões funcionavam. “E como o que invade nunca é o corpo real, basta cortar o canal de entrada que qualquer projeção, contaminação ou resquício do Subespaço se dissipará rapidamente…”

    Ele fez uma pausa, antes de concluir, com um tom um pouco mais tenso:

    “Claro, o preço para fazer isso pode ser… extremamente alto.”

    “Entendi.” Duncan assentiu, como se finalmente compreendesse o funcionamento do processo. Quando voltou a olhar para a freira caída no chão, sua expressão carregava ainda mais respeito do que antes. “Ela deve ter dado tudo de si para conter aquele desastre.”

    “Mas ela falhou, não é?” A voz de Shirley soou ao lado deles. Desde que Duncan e Cão começaram a discutir conceitos tão abstratos quanto aterrorizantes, ela não havia encontrado nenhuma oportunidade de interromper. “Afinal, o incêndio de onze anos atrás ainda aconteceu…”

    “O incêndio de onze anos atrás foi causado pelo Fragmento do Sol”, Duncan balançou a cabeça. “Mas aqui, nesta igreja, encontramos indícios de algo que parece vir do Subespaço. Ainda não sabemos como essas duas coisas se conectam.”

    Enquanto falava, sua expressão mudou sutilmente. Pensativo, ele caminhou lentamente para o centro do Santuário Subterrâneo, parando diante da estátua da deusa.

    “Mas… agora fiquei curioso sobre uma coisa.”

    Ele ergueu o olhar para a estátua da Deusa da Tempestade, Gomona. Diferente da estátua no andar superior da igreja, essa parecia completamente intacta—nenhum sinal de rachaduras ou dano visível.

    “O que te deixou curioso?” Shirley seguiu-o, lançando um olhar desconfiado para a estátua enquanto sussurrava.

    “A Deusa da Tempestade”, Duncan levantou a mão, apontando para a estátua. “O santuário foi invadido, a clériga foi morta, e lá em cima só restou uma espécie de eco residual, uma sombra que se prende a preces infinitas… Mas onde estava a deusa? Como algo assim pôde acontecer dentro de um de seus templos sem que houvesse qualquer reação? No mínimo… ela deveria ter alertado os outros fiéis, certo?”

    “Eu não entendo muito sobre os deuses”, Cão murmurou, franzindo o focinho. “Mas isso realmente parece estranho. Os deuses podem não ter uma conexão direta com o mundo mortal, mas eles se importam com seus templos. Esses lugares são como ‘âncoras’ que os ligam ao mundo físico. Agora, uma dessas âncoras simplesmente desapareceu sem que ninguém percebesse? E por onze anos inteiros, sem qualquer movimentação? Isso… definitivamente não faz sentido.”

    Duncan ponderou por um momento. Então, ergueu a mão direita.

    Na ponta de seu dedo, uma pequena chama verde surgiu do nada, lançando um brilho espectral sobre a estátua.

    As correntes chacoalharam quando Cão deu dois passos rápidos para trás.

    “Você… o que pretende fazer?”

    “Quando em dúvida, um pouco de fogo ajuda”, Duncan sorriu. “Vai que queima algo escondido e faz aparecer.”

    Cão se assustou imediatamente. Quase abriu a boca para lembrar Duncan que estavam no Santuário Subterrâneo—fazer isso poderia atrair a atenção direta de Gomona. Mas antes que pudesse falar, engoliu as palavras.

    Afinal, considerando o estado em que esse lugar já estava, quem podia dizer se ainda restava qualquer resquício da ‘santidade’ original? Além disso, o chefe estava apenas… cumprindo seu papel como um bom invasor do Subespaço. Não fazia sentido questioná-lo agora!

    Ainda assim, sem chamar atenção, Cão recuou um pouco mais e puxou Shirley consigo.

    Se um raio divino realmente caísse do nada, o chefe poderia até sobreviver… mas ele e Shirley com certeza não aguentariam.

    Duncan percebeu o movimento de Cão, mas não se importou.

    Claro, ele não queria atrair o olhar da deusa para si. Mas desde o momento em que havia examinado a igreja principal, ele já tinha certeza de que este ‘santuário’ havia sido completamente corrompido. Até a estátua lá em cima estava tomada por energia do Subespaço. Considerando que esse fenômeno havia permanecido oculto por onze anos, parecia evidente que qualquer conexão entre esse local e a Deusa da Tempestade já havia sido cortada há muito tempo.

    Agora, o que antes era sagrado estava abandonado—e tomado pela escuridão.

    A chama espiritual queimava silenciosamente, pingando no chão como gotas de água. Suas chamas enevoadas se espalharam rapidamente pelo Santuário Subterrâneo, cobrindo o ambiente em um piscar de olhos.

    Mas então, sem alarde, as chamas se extinguiram sozinhas.

    Shirley e Cão trocaram olhares. Após um longo silêncio, Shirley finalmente perguntou, cautelosa:
    “Você… encontrou alguma coisa?”

    Duncan olhou para a chama verde que ainda dançava na ponta de seus dedos e depois para o santuário, agora mergulhado em um silêncio absoluto.

    Aqui… realmente não havia nada?

    Ou talvez… a chama não fosse forte o suficiente para revelar o que estava escondido?

    Ele franziu a testa. Foi nesse momento que ouviu algo.

    Um murmúrio—tão leve que parecia uma alucinação.

    “Quem está aí?”

    Duncan congelou. Seus olhos se arregalaram.

    A voz era fraca, quase indistinta, mas sem dúvida real.

    Instantaneamente, ele ergueu a cabeça e olhou na direção de onde veio o som.

    A estátua de Gomona continuava parada ali, imóvel na escuridão.

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