Hora da Recomendação, leiam Fagulha das Estrelas. O autor, P.R.R Assunção, tem me ajudado com algumas coisas, então deem uma força a ele ^^ (comentem também lá, comentários ajudam muito)
Talvez passe a usar mais esse espaço para recomendar outras obras (novels ou outras coisas que eu achar interessante ^^)
Capítulo 321: Um Dia de Neve
Uma pequena figura estava parada no portão do cemitério. Era uma menina de uns onze ou doze anos, vestindo um casaco de lã marrom-escuro, uma saia preta, botinhas de algodão quentes e luvas grossas. Ela parecia estar esperando no portão do cemitério há muito tempo. Começou a nevar na cidade-estado de Geada ao entardecer, e seu gorro de lã cinza já estava coberto de flocos de neve, com um leve vapor subindo na neve do crepúsculo.
A menina batia os pés no lugar e, de vez em quando, espiava a rampa do outro lado do cemitério. Quando o guarda apareceu, ela sorriu imediatamente e acenou com força.
“…Lá vem ela de novo.”
O velho guarda não pôde deixar de resmungar ao ver a menina, seu tom parecendo um pouco impaciente, mas mesmo assim apressou o passo e se aproximou dela.
“Anne”, o velho franziu a testa, olhando para a menina à sua frente. “Você veio sozinha de novo. Quantas vezes eu já te disse que o cemitério não é lugar para uma criança como você vir sozinha, especialmente perto do anoitecer.”
“Eu já falei com a mamãe”, respondeu a menina, chamada Anne, com um sorriso. “Ela disse que eu só preciso voltar para casa antes do toque de recolher.”
O velho guarda observou em silêncio a menina sorridente à sua frente.
A maioria das pessoas aqui não gostava dos guardas do cemitério, e muito menos de se aproximar deste lugar sinistro e perigoso. Mas a vida sempre tem surpresas — como uma menininha que não tinha medo dele.
“Vovô guarda, meu pai já chegou aqui?”, Anne ergueu a cabeça. Na neve que caía ao entardecer, ela olhava com expectativa para o velho de costas curvadas e roupas pretas à sua frente. Seus olhos turvos, que a maioria das pessoas temia, não a deixavam nervosa.
“…Não”, respondeu o velho guarda como de costume, sua voz fria e dura como o vento que soprava no cemitério. “Ele não virá hoje.”
Anne não ficou desapontada, apenas sorriu como sempre: “Então eu volto amanhã para perguntar.”
“Ele também não virá amanhã.”
Anne continuou olhando para cima: “Mas ele virá um dia, não é?”
Desta vez, o velho, sempre de atitude fria, finalmente ficou em silêncio por um momento. Só quando os flocos de neve caíram em suas sobrancelhas é que seus olhos turvos e escuros se moveram ligeiramente: “Os mortos acabarão se reunindo no cemitério e encontrarão a paz eterna do outro lado do portão — mas não necessariamente no cemitério deste mundo, e não necessariamente neste cemitério.”
“Oh”, respondeu Anne, mas pareceu não levar a sério. Ela apenas virou a cabeça, olhou para o portão de grades trancado e perguntou com curiosidade: “Posso entrar para dar uma olhada? Queria me aquecer perto do fogo na sua cabana…”
“Hoje não”, o velho balançou a cabeça. “O Cemitério Nº 3 está em uma situação especial, com guardas da igreja de plantão. Hoje não está aberto ao público. Você deveria ir para casa, menina.”
“…Tudo bem”, Anne assentiu, um pouco desapontada. Em seguida, ela remexeu em sua pequena bolsa e tirou um pacotinho embrulhado em papel pardo, entregando-o ao velho. “Então, isto é para o senhor. São biscoitos que a mamãe assou. Ela disse que eu não posso ficar sempre causando problemas.”
O velho olhou para o pacote nas mãos da menina, olhou para os flocos de neve em suas roupas.
Ele estendeu a mão, pegou os biscoitos e, em seguida, deu um tapinha no gorro de lã dela, sacudindo a neve: “Aceito. Volte para casa cedo.”
“Certo, vovô guarda.”
Anne sorriu e assentiu, ajeitou o cachecol e as luvas e começou a caminhar pelo caminho que levava à área residencial da cidade.
Mas quando ela mal havia dado alguns passos, o velho guarda se virou de repente: “Anne.”
“Hã?”
“Anne, você já tem doze anos”, o velho estava parado no crepúsculo, olhando calmamente nos olhos da menina. “Você ainda acredita nas coisas que eu te disse quando você tinha seis anos?”
A menina parou, olhando meio atordoada para o guarda do cemitério.
‘Todos os mortos virão para este cemitério. Não importa o quão dispersos eles tenham estado em vida, o salão de Bartok se tornará o lugar de sua reunião final.’
Esta frase estava escrita nos clássicos da igreja, mas adultos e crianças de seis anos sempre teriam interpretações diferentes da mesma máxima.
Anne, de doze anos, ficou parada por um longo tempo. O guarda do cemitério, de preto, permanecia como uma estátua de ferro fria e dura em frente ao portão alto e trancado. Flocos de neve finos dançavam entre eles, e o frio do inverno se espalhava pelo crepúsculo.
Mas, de repente, Anne sorriu e acenou para o velho, sorrindo: “Então, finja que eu vim especialmente para ver o senhor. A mamãe disse que os idosos precisam de alguém para conversar com frequência.”
A menina se virou e saiu correndo, flutuando como um pássaro leve pelo caminho que gradualmente se cobria de neve. Ela escorregou no final da rampa, mas se levantou imediatamente, bateu a neve e a poeira da saia e das calças térmicas e partiu rapidamente.
“…Idosos…”, o velho guarda observou a menina se afastar e, depois que ela se foi, resmungou: “Essa criança também ficou maliciosa.”
“Destruir a expectativa de uma criança é um pouco pior do que isso”, uma voz feminina jovem e ligeiramente rouca veio de repente do lado, interrompendo o resmungo do velho guarda. “Você não precisava ter dito aquilo. Uma criança de doze anos, ela já está entendendo gradualmente o que precisa entender. Às vezes, nós, adultos de coração duro, não precisamos revelar nenhuma verdade.”
O velho guarda se virou e viu Agatha, a “Guardiã do Portão”, vestida de preto e com bandagens sob as roupas, parada no portão do cemitério, que antes estava trancado e agora se encontrava aberto.
Ele balançou a cabeça: “Deixá-la continuar esperando que o pai seja enviado para este cemitério, e então ela vir sozinha para este lugar assustador neste dia frio e com neve?”
“Não é bom? Pelo menos, quando você estava falando com aquela criança, você parecia ter um pouco de calor.”
“…Isso não parece algo que uma Guardiã do Portão diria.”
Agatha balançou a cabeça, não disse nada e se virou, caminhando pelo caminho interno do cemitério.
O velho guarda a seguiu. Primeiro, ele se virou para trancar o portão, depois foi até sua cabana de guarda para guardar as compras e fazer a troca de turno com o guarda do dia. Só então ele foi para a área do necrotério do cemitério, onde encontrou a “Guardiã do Portão”, que já havia chegado.
Comparado com antes, o necrotério agora estava visivelmente mais vazio. A maioria das mesas de pedra estava vazia, com apenas alguns caixões simples em algumas plataformas nas bordas.
E ao redor dos poucos caixões, havia pelo menos dois guardas da igreja ao lado de cada plataforma. Bengalas pretas também eram vistas em todos os lugares nos espaços vazios entre as plataformas. As bengalas pretas eram o equipamento característico dos guardas da Igreja da Morte. Eles fincavam as bengalas no chão próximo e penduravam lanternas sagradas no topo, mantendo assim um “santuário” de pequena escala, que poderia efetivamente resistir às forças contaminantes de existências superiores.
O crepúsculo já estava profundo, e o dia de neve tornava o céu ainda mais escuro do que o normal a essa hora. No cemitério cada vez mais escuro, as lanternas penduradas nos topos das bengalas queimavam silenciosamente como fogo-fátuo, liberando uma atmosfera tranquila, mas sinistra.
“Fizemos muitos preparativos aqui, mas parece que aquele ‘visitante’ não tem intenção de retornar a este lugar a curto prazo”, disse Agatha casualmente quando o velho guarda apareceu. “O senhor confirma que o ‘visitante’ revelou a intenção de retornar?”
“Você deveria confiar nas técnicas de hipnose de um psiquiatra profissional”, o velho guarda deu de ombros e, após uma pausa, acrescentou: “Não me lembro da maioria das coisas que aconteceram naquele dia, e os zumbidos e ruídos estão gradualmente desaparecendo da minha mente, mas após várias sessões de hipnose, consigo me lembrar de algumas coisas… A mais clara delas é a intenção de retornar que o ‘visitante’ revelou antes de partir.”
Agatha ficou em silêncio por dois ou três segundos e, após refletir, disse em voz baixa: “Mas há outra possibilidade. Para uma existência superior como aquela, seu conceito de tempo é muito provavelmente diferente do dos mortais. A visita que ele mencionou poderia ser amanhã, daqui a alguns anos, ou mais provavelmente após a sua morte, contatando-o de uma forma que transcende a vida e a morte.”
“…Você não pode me desejar algo de bom?”
“Este é o resultado da discussão do conselho consultivo da cúria1.”
O velho guarda soltou um resmungo ambíguo, seu olhar varrendo os guardas de preto no cemitério e as lanternas queimando silenciosamente nos topos das bengalas.
“…Só espero que esses arranjos não irritem aquele ‘visitante’, que ele não os considere uma ofensa ou uma ‘armadilha’. Afinal, sabemos muito pouco sobre ele.”
“Todos esses arranjos são apenas para nossa autoproteção”, disse Agatha. “Afinal, embora o senhor diga que entrou em um estado de visão espiritual descontrolada por ter inalado muito incenso, nenhum de nós sabe se aquele ‘visitante’ tem a tendência de liberar contaminação mental ativamente. Para enfrentar um ser transcendente superior, precisamos, no mínimo, garantir nossa própria sanidade.”
O velho guarda não se comprometeu, apenas refletiu por um momento e de repente mudou de assunto: “As amostras que vocês levaram antes, alguma conclusão foi tirada da investigação?”
“O senhor está se referindo àqueles cultistas ou àquela pilha de ‘cadáver’ que derreteu em lama?”
“Ambos.”
“Sobre os cultistas, não há muito o que dizer. Lacaios do Culto da Aniquilação, seres transcendentes que já se fundiram profundamente com demônios. São poderosos, e um guarda da igreja comum correria grande perigo ao enfrentá-los. Infelizmente, aqueles hereges obviamente não tiveram sorte. E quanto àquela ‘lama’…”
Agatha parou aqui, sua expressão um pouco estranha.
“A ‘evolução’ dela, na verdade, ainda não parou. Até o momento em que saí da catedral, aquelas coisas ainda estavam constantemente apresentando novas formas e propriedades. Em um período recente, elas até apresentaram brevemente um estado semelhante a metal e rocha, dando a sensação… de algo que os cultistas da aniquilação frequentemente mencionam em suas heresias.”
O velho guarda franziu lentamente a testa: “Você quer dizer… ‘Primal’?”
“A essência verdadeira, a matéria mais pura e sagrada, a ‘Gota da Verdade’ concedida pelo Senhor das Profundezas ao mundo mortal — é assim que aquele grupo de hereges a descreve”, o tom de Agatha não escondia seu desgosto e sarcasmo. “Palavras bonitas, é realmente nojento que eles as usem.”
- A cúria é o conjunto de órgãos e pessoas que auxiliam no governo de uma diocese ou da Igreja como um todo.[↩]
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