Voltando para o canavial, Carlos se deparou com uma mulher com uma máscara no rosto e um F marcado na testa, esta era a Tassi que segurava um cajado de madeira com uma gema marrom incrustada na madeira na parte de cima do cajado e acima desta gema, havia uma pequena gema verde.

    Lentamente ela foi indo ao meio do canavial e fincou o cajado no chão, após fazer este movimento os pés de cana de açúcar começaram a crescer visivelmente o que deixou Carlos pensando: “Magia é mesmo incrível!” até que o capataz Jairo deu uma chicotada no ar fazendo um estalo que o tirou de seu transe.

    — Pare de ficar olhando com cara de besta! Vá cortar as cana de açúcar logo!

    Com isso se recuperou e começou a trabalhar até as uma da tarde quando Jairo o mandou ir para a casa do senhor do engenho.

    Chegando na casa do senhor do engenho viu a Tia Vera na cozinha e sorriu ao vê-la e ela sorriu de volta.

    Subiu as escadas e foi para a sala do senhor do engenho. Dentro da sala Jorge estava sentado com uns livros e artefatos do diabo sobre a mesa. Pedro estava ao seu lado fazendo vento com abanador, o que fazia com que a sala ficasse fresquinha ao contrário do lado de fora onde estava quente.

    — Já que sabe tanto sobre esses artefatos, quero que me fale deles. Nesse fim do mundo não tem muito o que fazer, por isso coleciono esses artefatos além dos livros do diabo. Me pergunto que tipo de magia usaram para fazer os livros, pois os desenhos dos livros são muito realistas e as estatuetas que têm possuem cores tão vivas, por exemplo essa aqui.

    Jorge então tirou uma figure de anime da gaveta a figure era de uma menina peituda e ruiva, ao vê-la seus olhos arregalaram pois conhecia bem essas personagem, por conta disso teve que usar todas as suas forças para não cair na gargalhada.

    — Mas nunca entendi o uso deles, aliás até ontem achei que não tinham uso, mas você me surpreendeu com aquele artefato que solta fogo. Depois fiquei usando aquele artefato, mas depois de um tempo o fogo parou de acender, porque isso aconteceu? E quanto a essa estatueta aqui para que serve?

    Jorge olhava a estatueta, admirando cada detalhe, depois voltou seu olhar para Carlos esperando uma explicação. Como não queria ter que explicar o que seria uma figure de anime então bolou uma desculpa.

    — Como disse ontem só invoco esses materiais. Sei apenas o uso de alguns deles, mas não sei para que todos servem. Creio que esta estatueta que você segura deve ser que nem nossas imagens de santos, acredito que veneram elas da mesma forma.

    Jorge não parecia ter acreditado na resposta que ouviu, apenas continuou olhando para a figure de anime.

    — E quanto ao isqueiro, se usa o líquido que ficava dentro do artefato para fazer o fogo, depois que o líquido acaba o isqueiro perde a utilidade.

    Esta resposta o agradou mais.

    — Entendo, faz sentido, o fogo precisa de um combustível, apenas o fogo de uma gema mágica que não precisa de nada além da mana do adepto da gema.

    “Que interessante, então se usa a magia do próprio corpo para ativar as gemas mágicas.”

    — E quanto a esses livros aqui, não estão escritos em português como os outros, consegue entender o idioma destes livros?

    Olhando melhor para os livros conseguiu facilmente identificar o idioma, estavam com títulos em inglês “1001 Inventions That Changed The World” em sua capa havia uma lâmpada e o outro era ”Guns and History” na capa havia mosquetes e armas de pederneiras. Ao ver o título dos livros, seus olhos chegaram a brilhar.

    “‘1001 invenções que mudaram o mundo’, quero muito esse livro ainda mais porque vou ter que reinventar muitas coisas que estão aí. O outro é mais importante ainda, porque até agora não vi nenhuma arma de fogo, além daquela de meu mundo, apenas vi armas mágicas. Se eu puder fazer alguma arma de fogo, poderia ser muito útil, afinal não dá pra ficar dependendo desses artefatos do diabo. Apesar de que… No momento ambos são inúteis para mim, pois não passo de um escravo…”

    “Mas se fugir daqui, tenho que me certificar de levar toda a coleção desse velho. Ainda bem que sei ler inglês. Porém é melhor fingir ignorância, ainda mais porque talvez ele se interesse por esses livros e entenda o real uso de uma arma de fogo.”

    — Infelizmente não sei ler a língua desses livros, mas me parece ser inglês.

    “Nem sei se o inglês daqui é o mesmo que o do meu mundo, porém, se o português é, então dá para assumir que seja o mesmo caso para o inglês.”

    Com essa resposta suspirou, desapontado, pois o primeiro livro tinha tantas máquinas e engenhos malucos que o interessavam muito.

    “Tudo bem, já é um milagre um preto saber ler, estava esperando demais mesmo.”

    Enquanto os dois conversavam mais um pouco. Alguém bateu na porta.

    —Seu Jorge, o comerciante ambulante chegou, já amarrou o burrinho dele na árvore perto do lago e está te esperando.

    Carlos nem precisava ver quem era, pois reconheceu a voz na hora. Era do Jairo o capataz que o deixou machucado na sua perna .

    “Não aguento mais ouvir a voz desse verme, está em todo lugar! Esse daí vai ser outro que vou matar se conseguir uma arma, não acredito em olho por olho, dente por dente, mas nessa época e nesse mundo não tem muito o que fazer. Ainda bem que pelo menos a notícia é boa para mim.”

    Ele não foi o único a ficar animado com a notícia, Jorge também ficou bem animado com a notícia, estava sorrindo de orelha a orelha. Nem parecia um velho ranzinza dono de escravos.

    — Vamos, você irá junto comigo, quero ver mesmo se entende dos artefatos do diabo, o Francisco sempre trás alguns artefatos do diabo para mim. Se conseguir explicar o uso de pelo menos alguns deles, então talvez possa pensar em comprar os itens necessários para a sua suposta invocação.

    Jorge saiu na frente e Carlos o seguia não muito atrás, Pedro também ia junto com eles. Logo chegaram onde o comerciante estava. Mas não foram os primeiros, a mulher do senhor do engenho já estava ali, junto com a Tia Vera conversando com o comerciante, um homem baixinho, gordinho, parecia ter uns 30 anos de idade.

    O comerciante estava na sombra, perto de um burrinho com uma carroça amarrado em uma árvore. Assim que viu o senhor do engenho abriu um belo sorriso, Carlos não deixou de notar que aquele sorriso parecia muito falso, mais falso do que um sorriso de operador de caixa de supermercado.

    — Bom dia Seu Jorge a sua esposa já escolheu muitas coisas para comprar, talvez alguma dessas coisas lhe interesse também como café, carne seca, farinha de trigo, queijo e a mais nova novidade, cacau em pó, dá para fazer um bebida com ele, o governador da capitania de Pernambuco ama está bebida—

    Antes que o comerciante pudesse continuar, acabou sendo interrompido.

    — Franscisco, você me conhece a tempos, você sabe que não ligo para nada disso. Apenas anote o que minha mulher pegou e pago depois. Agora me diga o que você trouxe de bom mesmo.

    — Claro meu senhor, consegui uns artefatos do diabo, escondi eles num saco dentro da farinha para que ninguém percebesse.

    Enquanto a Vera e a esposa do senhor do engenho olhavam curiosas para o cacau em pó. Jorge olhava com expectativa para Francisco que tirava um saco de dentro da farinha. Depois tirou algumas coisas do saco.

    Primeiro tirou um livro com letras verdes em caixa alta escrito “Plantas do Brasil” e também retirou duas pedras lisas em formato de meia lua. Carlos logo reconheceu as pedras, eram ímãs, provavelmente deveriam ter pertencido a algum eletrodoméstico. Vendo elas lembrou um pouco da sua infância, já que gostava de brincar com imãs que conseguia achar num lixão perto de casa. Por conta da sua animação, acabou falando:

    — Ímãs, fazia tempo que não via eles.

    Tanto Francisco como Jorge ficaram meio chocados por reconhecer os artefatos do diabo.

    — Quem te deu permissão para falar? Mas já que abriu sua boca imunda, me explique o que é esse tal de ímã, se você explicar bem pode escapar de levar uma chicotadas por me desrespeitar!

    “Putz, eu e minha boca grande. Mas não preciso me afobar, esta pode ser uma oportunidade demonstrar meu conhecimentos de ‘invocador de artefatos do diabo’”

    — Desculpe o desrespeito, meu senhor, apenas acho estes artefatos muito interessantes. São ímãs, basicamente todo ímã tem um polo positivo e outro negativo, o lado positivo atrai o negativo e os mesmo lados se repelem, se eu puder pegar posso demonstrar que fica mais fácil de entender.

    Francisco demonstrou surpresa ao ouvir, não entendeu a parte de lado positivo e negativo, mas entendeu a parte de se repelirerem e atraírem.

    “Que droga, estava esperando impressionar esse velho com esses artefatos, para então cobrar um preço enorme por eles. Mas agora que outra pessoa sabe como eles funcionam, e já viu outro desse em algum lugar, quer dizer que não posso vender eles como se fossem únicos no mundo. Não acredito que um escravo tenha visto um desses nesse fim de mundo, se pudesse venderia para outra pessoa que nunca tivesse visto eles, infelizmente este é o único velho fissurado neles. A igreja até me paga por coletar esses artefatos e para queimarem, mas o preço é muito baixo… Enfim, não adianta chorar sobre o leite derramado.”

    De forma relutante Francisco entregou os ímãs.

    — Pode pegar sim, este são itens bem especiais.

    Os imãs estavam grudados um no outro e com eles em mãos começou a explicar:

    — Como pode ver, estão grudados um no outro, posso apenas pegar um lado dele que o outro continua grudado, mas se inverter, vão se repelir.

    Dito isso, inverteu um dos imãs e inverteu de lado e usou sua força para aproximá-los, mas o campo magnético dos ímãs não deixava isso acontecer. Vendo isso o senhor do engenho ficou embasbacado, logo aproximou as mãos para pegar os imãs e tentou fazer o mesmo e para a sua surpresa eles realmente se repeliam.

    “Existe magia nesse mundo e os ímãs que te deixam impressionado? Além disso, tenho certeza que existem imãs nesse mundo, claro eles não devem ser tão lisos assim nem terem esse formato, mas existem. Apesar de que devem ser muito raros, eu mesmo nunca vi um imã na natureza, e acho que um imã de bússola também deve ser raro de se achar.”

    A esposa do senhor do engenho se aproximou de Jorge, sem mostrar nenhum interesse no novo brinquedo do seu marido e disse:

    — Já peguei o que a gente precisava, depois pague esse bom senhor.

    O senhor do engenho parecia que estava enfeitiçado pelos imãs e mal deu bola para a sua mulher

    — Sim, sim, Alice meu amor.

    Alice rolou os olhos ao ouvir a resposta de seu marido.

    — Vera vá levando as coisas para dentro de casa, Pedro ajude-a também.

    Pedro e Vera começaram a levar as coisas para dentro da casa-grande.

    —Então meu senhor, vai querer comprar esses artefatos do diabo? 

    —Eu quero!

    Sem perder tempo, Jorge tirou as moedas de seu bolso e as entregou para o comerciante que começou a contar-las enquanto falava quanto deu o total de tudo.

    Não demorou muito para levarem todas as coisas para a casa-grande. O comerciante também já havia terminado de contar as moedas e Jorge já estava querendo voltar para casa para examinar melhor os artefatos do diabo em seu quarto fresquinho quando Carlos se lembrou de algo.

    “Putz tenho que pedir pelas balas e armas. Tenho que avisar o senhor do engenho, não sei se vai aceitar, mas não custa pedir, apesar de que talvez me custe umas chicotadas.”

    — Senhor Jorge, sobre os artefatos de invocação…

    Jorge olhou com desdém para Carlos, mas parou e refletiu um pouco.

     “Bom, entender, ele entende dos artefatos do diabo, só tenho que descobrir da onde tirou esses conhecimentos. Então acho que posso dar uma chance para essa tal invocação.”

    — Espera um pouco Francisco, tem uma coisa que gostaria de pedir antes de você ir.

    — O meu escravo aqui diz que consegue invocar artefatos do diabo. Mas para fazer isso, precisa de uns certos artefatos para realizar a invocação… Falando assim até que parece que vai fazer alguma macumba… De qualquer forma será que você não poderia conseguir eles na sua próxima visita, vou pagar três vezes mais do que normalmente pago.

    O comerciante olhou de forma bem cética para Carlos, então olhou de novo para o senhor do engenho.

    — Então que artefatos de invocação seriam esses?

    — Meu escravo vai lhe explicar bem o que são esses objetos.

    “Que droga, seria melhor se a gente não tivesse deixado a arma lá no escritório. Bom com um graveto e no chão acho que consigo fazer um desenho do que seja, finalmente meus anos jogando gartic vão valer a pena.”

    — É mais fácil mostrar como são.

    Com um graveto na mão que achou no chão começou a desenhar na terra uma pistola.

    — Primeiro seria esse artefato aqui, ele é preto e a maior parte dele é de ferro, tem vários tipos quanto mais tipos puder trazer melhor.

    Depois desenhou as balas.

    — O segundo tipo é esse daqui, são bem pequenos, cada tipo desse combina com um tipo específico do primeiro, qualquer um dos dois é inútil sem o outro, e precisa de bem mais desses daqui.

    — Acho que já te vendi algum desses no passado, não é mesmo senhor?

    O senhor do engenho concordou com a cabeça.

    — Isso mesmo, só que precisa de mais, isso ou eu teria que vender meu terreno para comprar gemas mágicas, claro, isso segundo o método de invocação desse meu escravo.

    — Entendo, vou ver se eu consigo algum desses artefatos. Não garanto nada, mas é sempre bom o senhor me esperar com um saco de moedas.

    — Hahahaha você nem tenta esconder né, tudo bem.

    “Isso! Pelo menos alguma coisa está dando certo nessa nova vida, logo, logo terei uma arma em mãos e então poderei dizer adeus a esta vida de escravo!”

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