Capítulo 756: Os Viajantes
Na névoa densa, que parecia ter a substância de um fluido viscoso, o casco branco do Canção do Mar movia-se como um fantasma, parecendo prestes a desaparecer a qualquer momento naquela vastidão enevoada.
Em algum momento, o rugido do núcleo a vapor se transformou em um gemido estranho, baixo e cheio de ecos sobrepostos. As tubulações emitiam assovios agudos de tempos em tempos, entremeados por murmúrios que lembravam o falar de alguém em sonhos.
“As máquinas começaram a ficar possuídas…”, relatou o sacerdote técnico, retornando da casa de máquinas para a ponte de comando. “O efeito do incenso calmante está diminuindo cada vez mais.”
“Desconecte o eixo de força da Máquina Diferencial, todas as máquinas passarão para controle manual. Despressurize o núcleo a vapor para a zona amarela — substitua o catalisador de Ouro Fervente em duas horas”, ordenou a capitã com calma. “A rotação do pessoal na casa de máquinas será reduzida para uma vez a cada três horas.”
“Sim, capitã.” O sacerdote técnico baixou a cabeça. Por um breve instante, sua voz tornou-se excepcionalmente rouca e profunda, como se um grande buraco tivesse se aberto em seu peito, deixando o ar escapar descontroladamente de seus pulmões. No entanto, ninguém pareceu notar. O sacerdote partiu, e a capitã de rosto severo observou suas costas antes de desviar o olhar.
Pelo canto do olho, ela notou uma mancha de ferrugem aparecer no corrimão ao lado de seu assento. A marca de corrosão se expandiu lentamente, como o tempo voando, os anos se dissolvendo.
Mas, no instante seguinte, a ferrugem desapareceu como uma ilusão. Ela ficou perplexa por um momento e, antes que pudesse reagir, ouviu uma voz baixa e indistinta em sua mente, uma voz familiar, mas que causava um arrepio na espinha, sussurrando para ela:
“Ah… vocês chegaram… meus peixinhos… nadem, nadem… de volta para a correnteza…”
O som suave das ondas ecoou em seus ouvidos, e uma sensação gelada, como se estivesse submersa na água do mar, percorreu sua pele. A capitã sentiu-se tonta, mas de repente, despertou desse transe.
Alguém gritava ao longe, era o imediato do navio: “Capitã! Há algo na névoa!”
A capitã recuperou a lucidez instantaneamente e virou-se para o lado da ponte. Seu olhar atravessou a ampla cabine e, de repente, ela viu um brilho esverdeado emergindo gradualmente na névoa, como uma besta colossal se aproximando lentamente. O contorno do brilho se solidificou pouco a pouco, desenhando a silhueta de outro navio diante de seus olhos.
Um navio de tamanho impressionante, com uma proa imponente e velas translúcidas, surgiu da névoa. Apareceu pela popa, ágil como o vento, alcançando sem esforço o Canção do Mar, que operava com seu núcleo a vapor em potência máxima. Ele estava sempre envolto em uma vaga “distorção”, o que impedia a visualização de detalhes em seu convés, mas a capitã do Canção do Mar reconheceu instantaneamente as características marcantes da grande embarcação.
“É o Banido!” exclamou a capitã, chocada. “Como ele apareceu aqui!?”
“Aquele navio chegou!”, “O Banido!?”, “Ele não estava em Porto Brisa?!”, “Está se aproximando!”
Vários gritos de surpresa ecoaram na ponte, e o imediato correu para o lado da capitã: “Capitã, aquele navio está se aproximando de nós.”
“… Façam sinais de luz, perguntem suas intenções”, ordenou a capitã após um momento de reflexão. “Todos em alerta, pressurizem a caldeira da capela. Estamos na fronteira, não confiem cegamente em nada que virem. Pode não ser o ‘Banido’ que conhecemos.”
O imediato acatou a ordem imediatamente, e os conjuntos de luzes no costado do Canção do Mar começaram a emitir uma série de sinais. A luz forte e intermitente perfurou a névoa espessa, um chamado silencioso nestas águas desconhecidas da fronteira.
Todos na ponte observavam, extremamente tensos, a silhueta do grande navio que se aproximava na névoa, mas que, a uma certa distância, se tornava cada vez mais etérea e indistinta, como um fantasma. Depois de um tempo, a capitã viu de repente um brilho ofuscante perto da proa do Banido — uma luz que piscava na névoa, repetindo-se ritmicamente.
O navio fantasma realmente havia respondido aos sinais de luz e enviado uma comunicação?
Muitos olhos se fixaram na luz piscante. A capitã, observando o sinal luminoso, franziu a testa gradualmente. Momentos depois, o imediato se aproximou apressado: “Capitã, o Banido sinalizou em saudação… e nada mais.”
A capitã franziu a testa, seu rosto severo mostrando confusão pela primeira vez. Mas essa confusão foi logo interrompida: pelo canto do olho, ela notou que a grande silhueta do navio na névoa estava se afastando em alta velocidade.
As velas espirituais do Banido se inflaram, e ele acelerou silenciosamente na névoa. Em um piscar de olhos, ultrapassou o Canção do Mar, correndo em direção às águas desconhecidas mais distantes, sua enorme sombra desaparecendo rapidamente na névoa fluida.
“Aquela direção é…”, o imediato ao lado de repente se deu conta e exclamou em voz baixa. “Capitã, o ‘Banido’ foi na direção d’Ela!”
A capitã não respondeu. Ela apenas olhava para a frente, como se, no instante em que o “Banido” partiu, tivesse vislumbrado um destino distante através de uma fresta na névoa.
Um sussurro baixo e gentil ecoou em seus ouvidos:
“Peixinhos… vocês todos foram muito bem. Agora é hora de descansar, não tenham medo… toda alma cansada tem um lugar para retornar. Se não puderem voltar, aqui será o novo lar…”
Uma serenidade que parecia brotar da alma a envolveu. Com uma leve vibração em seu espírito, a capitã fechou lentamente os olhos: “…Por favor, testemunhe…”
Ela abriu os olhos abruptamente. Suas pupilas, cobertas por uma camada cinza-esbranquiçada de morte, pareciam refletir uma tempestade incessante: “… Testemunhe meu retorno. Minha missão ainda não terminou.”
Memórias fragmentadas ressurgiram subitamente em sua mente. A jornada perdida no fluxo do tempo desalinhado voltou à sua memória. Ela se lembrou do longo tempo após cruzar a fronteira, de todas as provações e da escuridão. Lembrou-se do mar perdido no fim da névoa, da ilha isolada e parada no tempo antigo, do templo colossal, do cemitério de bestas gigantes e do deus morto no templo — e de sua própria terra natal, agora envolta pela noite.
“…Vocês devem cruzar aquela fronteira… atravessar a linha crítica de seis milhas náuticas… Eles estão chamando o mundo mortal. Vão encontrá-los… levem nossa reverência e tragam de volta suas notícias…”
As instruções de Sua Santidade, Helena, ainda ecoavam em seus ouvidos, mas pareciam ter sido dadas séculos atrás; agora, restavam apenas impressões vagas.
A capitã balançou a cabeça e caminhou lentamente em direção ao leme. O uniforme de capitã, em algum momento, havia se desintegrado em trapos, e a ponte, antes limpa e brilhante, se transformara em uma ruína corroída pelo vento marinho e pelo tempo. Todas as luzes estavam apagadas, e uma névoa pegajosa entrava pelas janelas quebradas, espalhando-se pela ponte.
Estava tudo vazio, nenhum membro da tripulação à vista. Todos pareciam ter partido há muito tempo — ficaram ao lado da Senhora, naquele refúgio de paz eterna.
A capitã passou pelos postos vazios, caminhando aos tropeços por aquele navio que parecia ter vagado por séculos. Mas, de repente, ela notou uma figura se movendo perto da ponte de comando.
A figura ouviu o barulho e virou-se lentamente.
Era um ser ressequido e feio, como um cadáver que tinha sido desgastado pelo vento do mar por um século. Seu rosto estava enrugado e distorcido em uma aparência assustadora.
Era uma múmia horrenda — mas logo, a capitã reconheceu seu imediato.
A múmia falou, sua voz tão áspera quanto o atrito de pedras: “Capitã, bem-vinda de volta a este navio. Parece que sua hora de se aposentar ainda não chegou.”
“… Você também ficou”, disse a capitã. Só então ela percebeu que sua própria voz também havia se tornado igualmente áspera e terrível.
“Sim, ainda tenho trabalho a fazer”, resmungou o imediato. “Todos os outros descansaram, mas eu tive um sonho. No sonho, um navio fantasma com chamas verdes apareceu, e a senhora me mandou sinalizar para ele… Ah, e fui despertado por aquele sinal. Não gosto daquele navio — o Banido. Ele até quebrou a paz que me foi concedida… Aquelas malditas chamas verdes. Agora não posso mais descansar.”
A capitã não prestou atenção ao resmungo do imediato — embora tenha notado que ele parecia ter mudado muito, sua mente confusa a impedia de se concentrar nesses detalhes. Ela apenas se aproximou com dificuldade da ponte de comando, observando-o trabalhar. “Este navio ainda pode navegar?”
“Não”, o imediato virou a cabeça, abrindo um sorriso macabro. “O núcleo a vapor parou há muito tempo, e o casco abaixo está corroído, virou um monte de destroços. Não há mais propulsão.”
“… Então o que você está fazendo?”
“Movendo este navio, capitã”, disse o imediato lentamente. “Segure o leme, pense como um navio… ele se moverá, capitã. Mais cedo ou mais tarde, atravessaremos esta névoa sem fim e voltaremos para aquele maldito Mar Infinito…”
A capitã sentou-se lentamente, ouvindo o falatório do imediato. Depois de muito tempo, ela falou em voz baixa, como se para si mesma: “Então eu também devo encontrar algo para fazer.”
“Então sugiro que a senhora deixe alguns registros”, disse o imediato. “Não sei o que vai mudar quando cruzarmos aquela fronteira novamente, mas com certeza haverá mudanças. A senhora pode não ser mais a senhora, e eu posso me tornar outra coisa. Podemos nem nos lembrar de quem somos ou do que fizemos. Apenas as palavras sagradas podem deixar uma orientação valiosa…”
As palavras sagradas…
A capitã piscou lentamente, sua mente clareando um pouco mais. Após um momento de hesitação, ela finalmente estendeu a mão e tirou algo do bolso de seu casaco esfarrapado.
Era seu diário de bordo — todo capitão tinha um.
Ele também havia sido marcado pelo tempo, mas o papel, abençoado, resistira ao desgaste e à corrosão. As palavras ainda eram legíveis.
Ela baixou a cabeça, tirou um lápis de outro bolso e, lentamente, começou a registrar em uma nova página:
“Eu sou Kalani, capitã do Canção do Mar. Este é o meu registro durante a viagem de volta…”
“Nós A encontramos — cerca de meio século depois de cruzar a linha crítica de seis milhas náuticas.”

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