Capítulo 16 - Liberdade
Tassi não pode acreditar no que via, toda vez que Carlos usava aquele artefato do diabo estranho, havia um som bem alto e algo parecia atingir a barreira de Jorge. Seus olhos acreditavam na velocidade dos ataques da arma, mas logo Carlos parou de usar a arma, e os escudos de Jorge pareciam intactos. Isso não durou muito, ele pegou o outro artefato no chão e voltou aos ataques. Nesse meio Jairo até parecia que iria atacar Carlos, mas para isso teria que sair da proteção, e com isso poderia ser alvo da arma. Com a outra arma em mãos, conseguiu quebrar uma barreira de Jorge e com isso matá-lo, mas Tassi notou algo impressionante, apenas a barreira da gema de defesa foi quebrada, já a barreira da gema da defesa divina ficou intacta!
“Isso é impossível, para ter passado pela barreira de defesa divina significa que aquilo que atingiu Jorge não continha magia! Se tivesse a barreira de defesa divina teria parado o ataque. Mas como é possível, fazer um ataque a distância com esse poder sem magia? E não só isso, a barreira de defesa foi quebrada muito facilmente! Mesmo um guerreiro habilidoso demoraria pelo menos meia hora para quebrar uma barreira dessas! Pela história que me disse de ser de outro mundo, me deu a entender que era louco, mas parece que estava falando a verdade, nenhuma arma assim pode ser desse mundo.”
Ficou chocada por alguns segundos, mas logo se recuperou ao ver que Jairo estava atacando e acertando Carlos.
“Pelo visto não consegue atacar infinitamente com essa arma, por isso precisa pegar mais delas. Mas Jairo também deve ter notado isso. Preciso dar uma abertura para Carlos!”
Tassi pegou uma pedra que estava por perto e foi correndo em direção a Jairo e atirou a pedra o acertando na cabeça. O que deu tempo para Carlos, mas não muito pois, iria dar outra laçada em Carlos. Tassi até tentou achar outra pedra, mas Pedro atacou Jairo primeiro e com isso Carlos deu fim a Jairo.
“Pelo visto Pedro finalmente escolheu um lado, apesar de que sempre soube que estava do nosso lado. Apenas queria uma vida melhor para o Juquinha, e não acreditava que poderíamos ser livres, mas acho que agora não tem como negar a realidade em sua frente.”
Sem perder tempo, começou a eliminar os capatazes um por um. Vendo que alguns capatazes estavam indo na direção dos artefatos do diabo, começou a correr em direção as armas e as pegou e as entregou e se juntou à luta.
Depois de um tempo a luta havia acabado foi até Carlos que estava sentando se recuperando.
— Você realmente não é um guerreiro, mas mesmo assim você matou todos eles, você cumpriu o que disse, libertou todos nós! Serei eternamente grata por isso. Agora vá ao padre e peça para te passar alguma pomada, tenho certeza que vai te ajudar com isso.
Estava com muita dor no braço, apenas olhou para cima para o rosto com olhos cor de esmeralde e disse:
— Ainda não somos livres, temos que sair daqui. Podem aparecer capitães do mato ou algo assim. Além disso, não quero os escravos que foram libertos descontem seu ódio em pessoas inocentes, como os homens livres e a mulher do senhor do engenho.
— Entendo, mas não se preocupe, vou cuidar disso. Sei como a Alice sofria na mão daquele verme, também falo com a Tia Vera sabia. Além disso, a maioria das pessoas daqui sabem quem merece seu ódio, claro, nem todo mundo é perfeito. Agora vá se tratar.
— Obrigado. Tenho mais um pedido, vá na casa do senhor do engenho e pegue todos os artefatos e livros que tem e cuide das armas para mim.
— Farei isso, agora pode ir.
Sem perder tempo foi para a capela e Tassi começou a pegar as armas e munições, juntou tudo debaixo da árvore. Então foi até perto de Pedro que parecia perdido.
— Agora você não tem mais escolha, vai ter que nós ajudar a sair daqui.
— É que foi tudo tão repentino, quando vi meu corpo agiu. Não sei se fiz o certo, ajudei a matar uma pessoa, será que um homem de Deus deveria ter feito isso?
— Infelizmente isso não sei, mas agora você deve se preocupar com seu filho. Aqui não terá mais um futuro, venha com nós para o quilombo lá seu filho terá uma vida boa.
Pedro suspirou e disse: — Tudo bem, o que preciso fazer?
Tassi apontou para o monte de armas e munições debaixo da árvore: — Apenas cuide para ninguém pegar aqueles artefatos do diabo. Apesar de que apenas Carlos deve saber como usar eles.
Depois de falar isso entrou na casa-grande, dentro da casa viu a senhora Alice num canto da cozinha assustada. Tia Vera estava do lado dela, e ao ver a mulher entrando na casa, perguntou:
— O que foram aqueles barulhos altos, o que aconteceu lá fora?
— Carlos matou o senhor do engenho, e também começou a matar vários capatazes e os que sobraram foram mortos por nós. Com todos os capatazes mortos, somos livres agora!
Alice pode ouvir o que Tassi disse em seu rosto poderia se ver uma mistura de emoções, alívio, ansiedade, medo, felicidade, mas dentre essas emoções que sentia não havia tristeza.
Alice olhou para Tia Vera e disse: — O que eu vou fazer agora? —, após estas palavras saírem de sua boca começou a chorar.
Tia Vera ao ver isso não sabia o que falar, apenas a abraçou. Mas Tassi não era tão amigável assim: — Chorar não vai adiantar nada! Agora você é livre também, aposto que o velho deve ter algum dinheiro guardado, pegue o dinheiro e saia daqui com seu filho! E nunca mais compre mais nenhum escravo!
Após falar isso, nem esperou uma resposta, apenas começou a subir as escadas, mas antes de chegar ao segundo andar se virou e disse: — Ah, quase me esqueci, vamos pegar várias coisas dessa casa, digamos que será o nosso pagamento por tanto trabalho durante todos estes anos. E Tia Vera, nem pense em ir com ela, você tem um neto e também precisa trabalhar menos. — Depois de falar isso chegou ao segundo andar, enquanto as mulheres conversavam no primeiro andar.
— Tassi tem razão, você pode pegar o dinheiro e ir morar com um dos seus filhos que moram na cidade.
Alice parou de chorar, enxugou as lágrimas e disse: — Tem razão, e posso vender esse lugar imundo.
Alice abriu a boca para falar algo, mas fechou, e ficou em silêncio por um tempo antes de abraçar Tia Vera: — Obrigado por tudo que você fez por mim Vera, cuide de seu neto, seja livre, porque também serei.
Tia Vera não respondeu nada, apenas começou a chorar. Alice soltou ela de seus braços e começou a subir as escadas e foi para seu quarto preparar suas coisas. Seu filho de dez anos estava lá brincando com uns brinquedos no chão, sempre foi uma criança mais caseira que se perdia em seu mundinho apesar do caos acontecendo fora do seu mundo, o que era muito bom quando seu marido ficava violento.
Tassi havia enchido um saco de livros do escritório de Jorge, quando viu Tia Vera ainda parada na cozinha.
— Não fique para aí, me ajude a levar essas coisas para onde Pedro está.
— É que apenas, nunca imaginei que esse dia chegaria. Se ao menos tivesse chegado quando era mais nova, nem sei o que fazer.
— Como disse, me ajuda com essas coisas, esses livros são pesados e tem muitos deles.
— Ha ha ha, você é sempre tão prática não é mesmo. Tem razão, vou te ajudar.
Ambas saíram da casa grande e se depararam com uma multidão de pessoas ao redor da casa vendo o que aconteceu. Alguns escravos estavam festejando, dançando capoeira. Também havia alguns homens livres vendo a situação, mas se mantinham mais afastados.
Quando Tassi saiu da casa-grande, um dos escravos que ficava na moenda se aproximou.
— Tassi você realmente matou o seu Jorge, seremos todos livres então?
Tassi olhou para ele de forma confusa e falou bem alto — Quem matou Jorge foi Carlos, e graças a isso seremos todos livres!
Ao ouvir isso alguns escravos caíram de joelhos e começaram a chorar outros gritaram — Finalmente liberdade! — Enquanto os escravos estavam eufóricos, os homens livres estavam preocupados, mas nenhum deles se atreveria a fazer ou falar qualquer coisa.
Logo após sair de casa, Alice apareceu com malas em uma mão e segurando a mão de seu filho com a outra mão. Ao ver os homens livres ao longe gritou: — Eu preciso que alguém me arrume uma carroça para me levar a cidade, vou pagar bem!
Todo mundo ficou meio surpreso em ouvir isso, nunca tinha ouvido a patroa falar tão alto e com tanta determinação. Infelizmente alguns escravos olharam para Alice com um olhar meio malicioso, o que irritou Tassi.
— Ouçam bem, Carlos foi a pessoa que nós deu liberdade, e me disse que qualquer um que fazer qualquer coisa contra Alica ou algum homem livre terá o mesmo fim que Jorge!
— Além disso, ainda não somos totalmente livres, temos que nós preparar para sairmos daqui antes que os capitães do mato apareçam, vamos ao Quilombo da Jabuticaba, onde poderemos viver sem sermos perseguidos!
Alice, ficou surpresa com essas falas, e se sentiu um pouco mal por dentro, e resolveu falar: — Obrigada, e sinto muito por nunca ter impedido meu marido de fazer as coisas que fez a você.
Tassi ignorou a fala de Alice e apenas voltou ao seu trabalho.
Carlos estava na capela sendo tratado pela sua ferida no braço e dando as boas novas para o padre Antônio, que estava chocado com as notícias, mas não condenava Carlos, pois em sua mente não era pecado lutar contra um tirano. Não era uma mentalidade que muitos padres compartilhavam com ele, o que o fazia único nesse sentido, mas não tão único pois havia alguém na cidade sagrada que provavelmente pensava o mesmo, era não outra senão a própria papisa.
Quando saiu, Antônio foi junto com ele para falar com a Alice. Quando os dois chegaram lá, ela estava terminando de carregar uma carroça com suas coisas e Tassi havia terminado de pegar os artefatos e outros itens.
Ao verem Carlos os escravos, ou melhor dizendo, ex escravos não paravam de agradecê-lo, o que fez até ficar sem jeito, mas logo ele se recompôs e se aproximou de Tassi.
— Pegou tudo ?
— Sim.
“Eu deveria ter pedido para pegar mais coisas além dos artefatos. Tem mais coisas úteis naquela casa além dos artefatos”
— E aquelas poções de verificação se uma pessoa é capaz de usar pedras mágicas?
— Tá falando dos testes de proficiências mágicas? Peguei.
— Eu havia esquecido o nome disso, obrigado por pegar, e quando ao seu cajado mágico? Ele é bem útil.
— Peguei ele, assim como o chicote do Jairo, também peguei comida para a viagem tá tudo certo, só me ajude a carregar tudo para podermos sair daqui logo. Também peguei roupas para usarmos no lugar desses trapos velhos, e a Tia Vera também pegou muito açúcar e coisas da cozinha, ela e Alice dividiram as coisas.
— Que bom que você é esperta, e obrigado por me ajudar na luta contra o Jairo.
Enquanto isso, Antônio falava com Alice, que estava colocando suas coisas numa carroça mais afastada da multidão: — O que você vai fazer agora?
— Vou sair daqui, não existe nada nessa terra para mim.
— Entendo, que bom que você está decidida, minha senhora, mas seria bom ir com você, é melhor ter alguém para te acompanhar. A estrada é perigosa e ninguém se atreveria a mexer com um padre por essas bandas.
— Obrigado padre, mas não precisa fazer isso se for atrapalhar seu trabalho.
— Não se preocupe com isso. As pessoas que mais precisavam de mim vão sair, e também preciso ir na cidade sagrada relatar o ocorrido. Apesar de achar o que eles fizeram justo, eu ainda sou membro da igreja e preciso relatar o que ocorre, mas não se preocupe, a papisa é uma pessoa bondosa e vai entender a situação então nada vai acontecer com essas pessoas.
— Não me importo o que vai acontecer com eles, só me importo com a Tia Vera, espero que seja feliz.
Não muito tempo depois, o grupo de pessoas começou a partir em busca de uma nova vida.
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