Quixotina ia na frente com uma tocha e Carlos seguia a trás procurando sinais de salitre, e por último ficava Tassi. Debaixo dos pés do grupo havia uma camada branca e em algumas partes onde essa camada era mais espessa o pé acabava deslizando como se a pessoa estivesse pisando em uma lama, a diferença era que essa “lama” era composta de fezes de morcegos. A esse ponto o cheiro era insuportável, nem mesmo Carlos estava aguentando o cheiro e estava apenas respirando pela boca para não ter que cheirar mais nada, mas ainda estava animado.

    — Isso é guano, é um ótimo fertilizante e também indica que pode ter salitre nas paredes da caverna, vamos ver.

    Quixotina foi apressadamente para as paredes da caverna para pegar logo esse tal salitre se estivesse ali para poder ir embora logo. Na parede da caverna havia vários cristais brancos e acinzentados formando uma crosta.

     — É isso, salitre! Vamos logo pegar o máximo que der e cair fora daqui.

    As duas não falaram nada, mas por dentro estavam super aliviadas. Todos colocaram cestas de palha no chão e pegaram facas para raspar o salitre das paredes da caverna. O salitre que descolava da parede era colocado nas cestas.

     “Agora que sabemos que tem salitre aqui, da próxima vez que viermos temos que trazer ferramentas adequadas. Porque ficar tirando salitre na faquinha não dá não, só peguei essas facas porque era isso que Nia tinha de disponível para nós, vou pedir para fazer outras ferramentas para coletar o salitre. Além disso, também precisamos de algo para cobrir a boca, sabia que iria feder, mas não achei que ia feder tanto, esse cheiro está insuportável e já to sentindo dor de cabeça. Pena que não vai dar para conseguir nenhuma máscara médica, o máximo que vou conseguir vai ser um pano para amarrar na cara.”

    Depois de um bom tempo o grupo conseguiu encher os cestos com salitre. O que seria o suficiente para criar um pouco de pólvora para o protótipo da arma, mas se quisesse mais salitre para demonstrar o uso da pólvora, teriam que voltar para pegar mais depois. Após juntarem suas coisas o pequeno grupo se virou para sair, mas quando Quixotina se virou para a saída, por uns segundos a luz da tocha iluminou uma parte que antes não estava iluminada na parede da caverna o que permitiu que Carlos visse o que parecia ser um cristal enorme refletindo a luz. O que o animou por um segundo pois poderia haver gemas mágicas ali, mas logo mudou de idéia pois já cumpriram a missão de hoje e além disso gemas mágicas podem ser muito úteis, mas apenas se forem talhadas por um artesão mágico. 

    Tassi também havia notando algo, mas não era nenhum cristal e sim o que parecia ser uma silhueta de algo na escuridão, mas logo abandonou essa idéia, não por achar que não tem nada ali e sim por estar se cagando de medo e apenas querer sair dali o mais rápido possível, e caso acontecesse qualquer coisa ela deixaria a cavaleira brutamontes resolver o problema e assim o grupo rapidamente saiu da caverna.

    Assim que voltaram para a luz novamente, os três suspiraram lentamente, deixando o ar limpo e puro entrar em seus pulmões e a luz do sol atingir as suas peles.

     — Ainda bem que deu tudo certo e que não acordamos os morcegos que estavam dormindo, eu não sei o que faria se eles se debandassem em massa.

    — O que? Morcegos? Não vi nenhum. — Disse Tassi confusa.

     — Sorte sua, se tivesse olhado para o teto teria visto centenas de morcegos dormindo, e pelo tanto de guano que tinha no chão deve haver mais ainda, já imaginou acabar pegando raiva de um deles, só de pensar nisso me dá um arrepio, ainda bem que tudo deu certo.

    Quixotina também havia olhado a colônia de morcegos no teto e sentia arrepios só de lembrar. Já Tassi ficou com cara de idiota ao notar que foi a única que não viu os morcegos. Mas se consolou dizendo a si mesma que era melhor que não tivesse visto os morcegos, senão ela poderia ter decidido sair correndo de lá!

    “Na próxima vez que vir aqui também só vou olhar para o chão e as paredes, e nem vou pensar em olhar para o fundo da caverna.”

    — Mas como assim pegar raiva, meu tio que é muito inteligente disse que essa é a doença do lobisomem, morcegos também dão ela? Não me diga que a pessoa vai virar um vampiro então? — Disse Quixotina.

    — Que? Não, nem vai virar lobisomem nem defunto, a pessoa apenas vai morrer, claro a não ser que tenha sido vacinada… Aqui não tem vacina né, então se alguém pegar raiva é morte certa.

    — Você diz coisas estranhas.

    — Olha quem fala, a senhorita Dom Quixotina de La Mancha, mas não ficou sabendo, vim de outro mundo.

    Apenas ficou quieta após ouvir isso. Os três começaram a descer a montanha em completo silêncio.

    — Sabe, acredito que ele veio de outro mundo também, e acho que com o tempo você também vai acreditar.

    Quxitona nem ouviu o que Tassi disse, apenas olhou para o céu preocupada.

    “Quanto tempo ficamos naquela caverna? Estava tudo tão escuro e o cheiro horrível fez parecer que ficamos lá uma eternidade, e talvez tenhamos ficado mais do que deveríamos, logo vai escurecer. ”

    — Já está bem tarde, vamos andar rápido, não quero descobrir o que está fazendo as pessoas desaparecerem na mata, claro que como cavaleira quero evitar mais desaparecimentos, mas não adianta tentar fazer algo sem estar preparada. Deve haver algum monstro nas redondezas. Vamos ter que apertar o passo na volta, se ficarmos perdidos a noite na mata morreremos. 

    Nenhum dos dois a questionou, apenas demonstraram preocupação e logo o pequeno grupo começou a acelerar o passo.

    O grupo estava na metade do caminho e Carlos estava extremamente cansado, usando todas as suas forças para a acompanhar as duas. Estava carregando a cesta de salitre cheia o que pesava muito.

    “Droga, preciso fazer mais exercícios, sabia que deveria ter começado a fazer academia. Agora é tarde demais, é melhor engolir meu orgulho e pedir para Quixotina levar a cesta, afinal usa a gema da força então não será um problema para. Se ficar carregando a cesta serei um peso.”

    — Quixotina poderia por favor levar minha cesta de salitre estou muito cansado mal to conseguindo acompanhar vocês.

     Questiona então parou e olhou para Carlos e viu como estava derretendo de suor. Não só ele como Tassi também.

    “Droga, deveria ter notado isso antes!”

     — Sinto muito, deveria ter notado antes que você estava cansado. Também posso levar a sua cesta Tassi.

    Tassi apesar de ser uma pessoa orgulhosa, sabia o que deveria ser feito em momentos de crise.

    — Obrigada.

    Pegou a cesta de Carlos e ia pegar a cesta de Tassi quando notou algo bem ao fundo deles, pode ver uma sombra negra em meio as as folhas verde escuro e olhos enormes alaranjados, mas ela não pode reconhecer o que era, só sabia que coisa boa não era.

     — Fiquem calmos, mas há algo nós seguindo, não sei o que é, pelo tamanho não deve ser amigável. Vocês têm que usar as suas forças para me seguirem se não, iremos morrer aqui. 

    Carlos apesar de não acreditar em monstros jamais iria contradizer alguém que vive nesse mundo, ainda mais alguém forte que nem ela. Tassi também estava sempre alerta e preparada para coisas assim. Logo o grupo começou a correr Quixotina corria no ritmo deles para não se perderem, ao mesmo tempo que carregava tudo nas costas e abria o caminho com sua espada. Também olhava para trás para ver a distância do monstro. Parecia que se aproximava um pouco, mas o quilombo não estava tão longe assim, e lá teria guardas e um lugar mais espaçoso para lutar.

    Enquanto Tassi corria, acabou pisando numa pedra solta que saiu do lugar, o que fez Tassi perder o equilíbrio e cair num pequeno barranco. Carlos até tentou pegar a mão dela, e conseguiu, mas não teve forças para impedir a queda dela. O que fez cair junto, mas no meio do ar conseguiu colocar em seus braços e virar para frente de modo que a cair iria absorver o impacto. Felizmente caiu num monte de lama e não se machucou muito. Quixotina até parou e tentou agarrar os dois, infelizmente mesmo com o poder da gema da força não deu para pegar os dois que caíram muito rapidamente. Na mesma hora largou as bolsas de salitre no chão e pegou a espada com suas duas mãos e pulou na frente dos dois que caíam e se preparou para a luta, pois o monstro se aproximava rapidamente.

    Carlos não acreditava no que via, em sua frente havia uma cobra gigante, a cabeça da cobra era do tamanho de um carro e o corpo era menos grosso que a cabeça, mas era tão longo que não dava para ver o fim dele, mas o que mais chamava a atenção da monstruosidade era entre seus olhos alaranjados,  um pouco acima havia uma gema na testa do monstro, a gema era da mesma cor que os olhos, porém possuía um laranja mais intenso e vibrante.

    — É um boitatá, os dois fiquem atrás de mim!

    “Boitatá? Não é uma cobra mitológica de fogo? Não, é melhor eu nem questionar, afinal não tem como uma cobra chegar a esse tamanho em meu mundo, mas como esse animal conseguiu nós seguir em completo silêncio sendo desse tamanho, além disso, espero que essa coisa na testa dele não seja uma gema mágica.”

    Tassi se apressou para pegar o revólver que trouxe consigo, entretanto, quando caiu no barranco deixou o revólver cair em algum lugar.

    “Droga, não acredito que perdi o revólver em uma hora dessas.”

    Quixotina não esperou o monstro atacar, apertou bem o cabo da sua espada e pulou na frente da besta ficando a centímetros da boca do animal, fez um ataque vertical cortando parte da boca do monstro.

    O boitatá vendo que esta não seria uma presa fácil, começou a incendiar o próprio corpo a partir da gema na testa. Seu corpo inteiro estava incandecente, apesar disso a mata ao redor não pegava fogo, apenas Quixotina sentia o calor escaldante vindo do monstro o que fez rapidamente recuar para trás, recuava enquanto atacava.

    Quixotina tentou acertar um golpe de cima para baixo na besta, o golpe aparentemente tinha errado, mas na realidade a ponta da espada formou uma linha branca fina que saiu da espada assim que terminou o golpe. A linha era tão fina quanto um fio de cabelo, só era perceptível vista de lado ou na diagonal pois deixava um rasto. O ataque foi em direção ao monstro que apesar do tamanho não era lento e conseguiu desviar parte do seu corpo, felizmente o monstro tinha um corpo muito longo e uma parte lateral seu corpo que estava ondulado foi atingida, onde a linha acertou as escamas duras do monstro, fazendo com que algumas escamas caíssem.

    — Não acredito você também usa a gema da luz e ainda tem uma espada da luz!? Até notei a gema branca em sua espada, mas não acreditei que fosse realmente uma gema da luz.

    — Sim, mas parece que não adiantou muito, o monstro ainda continua intacto. Por conta disso ainda não sei se teremos muita chance de sairmos todos vivos, quando vocês verem um brecha fujam.

    Quixotina fez mais cortes verticais e horizontais no ar formando mais linhas de luz que iam em direção ao monstro, que sempre desviava a cabeça. Os feixes de luz até atingiam o corpo do monstro, apenas para derrubar algumas escamas. Para piorar a situação, boitatá começava a andar em volta do grupo, cercando eles com seu imenso corpo.

    — Não, vocês duas estão nessa por minha causa, não vou abandonar ninguém! — Gritou Carlos.

    Tassi apesar de não falar nada, também não queria fugir e abandonar ninguém, ainda mais por que, se considerava culpada por estarem nessa situação. Por isso olhava para todos os lados tentando achar seu revólver, até que finalmente viu o revólver perto na frente do caminho que o boitatá estava percorrendo. Aproveitando que Quixotina estava ocupando o monstro, foi correndo e pulou bem na frente do monstro e pegou a arma. O monstro ao ver a presa bem na sua frente abriu a boca para engoli-la. Infelizmente o revólver não estava carregado pois ela tinha seguido o conselho de Carlos de nunca levar uma arma carregada.

    Tassi tentou pular para fora do caminho do monstro, mas apesar do tamanho o boitata era muito ágil e acelerou em direção a Tassi pronto para devorá-la. Na mesma hora um feixe de luz atingiu o olho do monstro, que fechou a boca e se virou para atacar Quixotina, aproveitando essa situação rapidamente carregou o revólver e o descarregou no monstro, que por seu imenso tamanho as balas não o afetavam tanto, mas ainda causavam um pequeno dano, as balas atravessavam as escamas e atingiam sua carne, com isso o monstro apagou suas chamas e se voltou para escuridão da mata. Tassi começou a recarregar o revólver para atirar de novo, quando Quixotina caiu no chão.

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