Capítulo 28 - Pirita
De manhã Carlos foi visitar Quixotina, ainda estava se recuperando por conta de ter exaurido toda sua magia. Depois disso foi forçado a explicar como fez para na visão deles ter conseguido ressuscitá-la, depois de passar a manhã ensinando primeiros socorros para os guardas do quilombo, foi falar com Tassi para ter a ajuda dela para a continuar a produção de pólvora.
— Então qual nosso próximo passo?
Carlos suspirou já cansado pelo tanto de trabalho que teriam que fazer.
— Agora que conseguimos o salitre, precisamos purificá-lo para a produção de pólvora negra. Por sorte o livro que tenho sobre a história das armas de fogo fala de como foram feitos estes processos no passado.
— Segundo o livro, para purificarmos o salitre primeiro termos conseguir tanques de argila grandes para misturar o salitre com água, assim as impurezas ficam no fundo do tanque e a gente filtra a água. Vamos falar com o oleiro do mocambo para fazer isso para nós, já quanto o filtro, bom, vamos ter que ver com a tecelã do mocambo, além disso vamos precisar de uma panelona de ferro para ferver a mistura, então vamos pedir a Nia para fazer a panela. E enquanto os artesãos trabalham nisso a gente pode construir um local adequado para fazermos a purificação de salitre.
— Nossa, quanto trabalho, mas vale a pena para conseguirmos mais armas. Certo, então vamos fazer isso!
Depois de fazer esses pedidos aos artesãos da vila, os dois começaram a construir o local onde iriam purificar o salitre, a construção seria de barro e o telhado de palha como as demais construções, um dia iria começar a produzir cimento, mas está não era a prioridade no momento.
— Sabe, acho que poderiam me emprestar algum artefato mágico com gema da terra e de grama, mesmo que seja só uma arma mágica, também dá para ser usado para construir um simples barraco de terra. Quando estava no exército das Mino era responsável por construir nossos acampamentos. Agora que viram que você sabe mais coisas além das armas, como por exemplo, aquele ritual de ressurreição, então acho que podem nós dar mais apoio.
“Ainda bem, não to a fim de ficar mexendo com barro, mas como assim ritual de ressurreição? Parece que to fazendo magia negra em vez de uma simples massagem cardíaca.”
— Mas não da para usar aquele seu cajado?
— Não, ele apenas faz as plantas crescerem.
— Entendi então vamos agora mesmo falar com Aqua. Com a aprovação dela tenho certeza que podemos conseguir um artefato mágico de terra e um de grama, além de que temos que pedir permissão para construir o barraco.
Com sua permissão conseguiram armas mágicas, eram dois braceletes, ambos os braceletes eram prateados, mas um possuía uma gema verde e o outro uma gema marrom, Tassi colocou o bracelete com a gema de terra no braço esquerdo e o da gema verde no braço direito. Não poderiam usar os braceletes livremente, um guarda iria ficar de olho nos dois. Aqua também disse a Tassi que o barraco tinha que ficar meio afastado para as crianças não ficarem xeretando, disse para construir perto dos tocos de árvores onde eles fizeram o teste de armas antes. Quando chegaram lá e Carlos viu a planície com apenas mato e tocos, já imaginou ela no futuro como uma zona de produção de pólvora e quem sabe mais alguns outros produtos industriais.
Tassi escolhe um local, era na beirada da floresta, Carlos não entendeu porque teria que ser ali mas a mulher apenas respondeu dizendo.
— Logo você verá porquê tem que ser perto das árvores.
Se aproximou do local onde ficaria o barraco e pisou com seu pé esquerdo com força no chão ao mesmo tempo que levava com sua mão esquerda para frente, a mão estava fechada, parecia que estava socando o ar. A partir do seu pé uma parede de terra maciça se ergueu, era extremamente lisa e dura, Carlos imaginou que a terra ter ficado assim só poderia ter sido resultado de magia, afinal a terra que ele estava pisando não deveria ser tão dura assim, muito menos lisa, então mudou de local e repetiu o movimento formando as demais paredes do barraco. Depois foi no meio do barraco e ergueu uma coluna de terra.
Mas não parou por aí, se aproximou de uma árvore que estava sendo estrangulada por um cipó, pegou seu cajado de crescimento e com a outra mão tocou no cipó, a gema verde no bracelete do seu braço direito começou a brilhar e o cipó começou a subir para cima do barraco onde iria ficar o telhado de palha, o cipó foi se multiplicando e indo para diversos lados, subindo em cima de si mesmo, pareciam várias cobras brigando e se enrolando entre si, logo o cipó cobriu totalmente o barraco não deixando nem um feixe de luz entrar no barraco. O que demoraria semanas para ser feito, estava pronto em menos de uma hora.
Tassi olhou para Carlos que estava boquiaberto e ficou orgulhosa de si mesma.
“É nessas coisas que sou boa, se tivesse alguma arma mágica aquela cobrinha que enfrentamos ontem não teria tido nenhuma chance, quando era uma guerreira, era uma das melhores. “
Depois de pensar isso sentiu suas pernas bambearem e uma leve dor de cabeça.
“Droga, talvez tenha usado mana demais, mas valeu a pena para deixar esse daí com cara de idiota. Bateu uma fome também…”
— Agora que o barraco já está pronto podemos ir almoçar né.
Tirou seus braceletes e entregou para o guarda que também estava boquiaberto para o quão boa adepta de magia ela era. Carlos demorou um pouco para se recompor e dizer.
— Sim… Vamos almoçar.
“Se até o guarda ficou boquiaberto quer dizer o que fez não é tão comum assim. Como queria ter poderes assim também…”
Após o almoço levaram as cestas de salitre pro barraco de terra recém construído. Como eles ainda não tinham as ferramentas para refinar o salitre, tiveram apenas que deixar o salitre guardado.
No dia seguinte Carlos estava pensando em chamar outra pessoa para guia-los na caverna de pirita, originalmente iram chamar a Quixotina, mas ainda estava se recuperando, e desta vez não precisava ser alguém que usava gemas mágicas pois esta caverna ficava no centro do mocambo, não no meio da mata perigosa. Ouviu da Aqua que este mocambo originalmente se formou pois o povo do quilombo ia na caverna da montanha pegar gemas de fogo, por conta disso não teriam que andar em meio a mata, mas de qualquer forma iriam em uma caverna, o que é sempre perigoso, então seria bom pelo menos ter uma guia.
No fim resolveram perguntar para a Aqua por um guia, mas primeiro iriam pegar ferramentas adequadas para pegar pirita, e para isso foram visitar a ferreira do mocambo Nia, pois deveria ter algumas ferramentas para mineração.
Chegando na oficina, Nia estava trabalhando junto com seus aprendizes. Um aprendiz estava batendo no barril do mosquete que estava longe de ser redondo, Carlos se perguntava por que eles não usavam moldes para fazer a arma, já Nia estava ao lado da fornalha. Carlos e Tassi disseram bom dia para eles. Os aprendizes pararam um pouco para descansar e dar bom dia para eles, já Nia jogou umas gemas de fogo em baixo da fornalha e depois de alguns segundos as gemas começaram a soltar fogo, após fazer isso disse:
— Bom dia, no que posso ajudar vocês? No momento estou bem ocupada para atender mais outro pedido de vocês.
Nem processou o que disse direito pois ficou animado ao ver as gemas de fogo que se ativaram depois de um tempo, afinal se dá para controlar o tempo de ativação dessas pedras, facilmente poderia fazer uma bomba com a pólvora ativada a distância, seria uma armadilha perfeita e segura, bem mais prático do que fazer um caminho de pólvora!
Tassi vendo que ele se perdeu em pensamentos respondeu em seu lugar.
— Nós apenas viemos pegar umas picaretas de ferro, vamos pegar um mineral na mina da do mocambo.
Ao ouvir isso Nia não pode deixar de sorrir.
— Se for apenas isso, vocês vieram em boa hora. Não só tenho as picaretas como vou com vocês também, preciso pegar uma boa pedra de ouro dos tolos para fazer a faísca na sua arma de pederneira.
Ficaram animados com essa notícia, conseguiram matar dois coelhos com uma cajadada só.
— Ouro dos tolos, ou pirita é exatamente o que precisamos, adoraríamos ir com você, precisamos mesmo de alguém para identificar as veias de pirita.
— Excelente, vou pegar as coisas para minerarmos a pirita. Também estou curiosa para o que você vai usar essa tal pirita.
Logo Nia desapareceu por uma porta da oficina. Assim que saiu seus aprendizes que eram quatro no total começaram a encarar Carlos. Por sorte não demorou muito para ela voltar com umas três picaretas e um martelo, trouxe as ferramentas numa cesta de palha.
Logo saíram da oficina para ir na mina do mocambo, a caverna era pertinho, só tinha que subir um pouco a montanha.
— Acho que seus aprendizes não gostaram muito de mim, ficaram me olhando torto depois que você saiu.
— Ha ha ha, não liga para isso, devem estar com ciúmes que vou sair com outro homem. Eles devem estar achando que vou te fazer meu novo marido.
Tassi ficou surpresa com isso.
— Espera aí, quer dizer que são todos seus maridos?
— Exatamente, lindos e musculosos não são?
— Nia fez uma pausa e olhou maliciosamente para Carlos e continuou a falar.
Carlos por um segundo pensou sobre isso, olhou bem para ela.
— Ah, mas também me importo com a personalidade, se a pessoa for interessante, inteligente e extraordinária, ganha muitos pontinhos comigo.
“Não, não, o que você está pensando, tudo bem que estou na seca desde de que vim para cá, mas isso não quer dizer que queira casar e compartilhar minha mulher, deve ter alguma solteirona por aqui né, espero que sim.”
— Vamos apenas focar no nosso trabalho, não quero fazer uns quatro inimigos.
“Não acredito que recusei uma mulher, acho nunca que uma mulher deu em cima de mim tão descaradamente.”
Carlos então olhou para Nia, meio desconfortável, sorriu e tentou mudar de assunto.
— São realmente fortes, mas mesmo assim quem é a ferreira é você, porque isso?
Nia apenas parou, se virou para Carlos e apontou para seu próprio peito.
Nisso olhou para onde apontou e primeiro seu olhar foi para seus seios, mas depois notou um pequeno colar com uma gema vermelha.
“Uma gema da força, isso explica muita coisa.”
— Apesar de usar a gema da força não tenho tanta magia em meu corpo quanto Quixotina, além disso esse meu colar tem uma gema minúscula, então não me dá uma força sobre humana, apenas a força necessária para trabalhar na oficina.
“Então tamanho também influencia.”
— Queria perguntar mais uma coisa, quando você trabalhava pude ver que as gemas de fogo que você usou apenas pegaram fogo depois de um tempo.
— Ah aquilo, são as únicas gemas que conseguimos talhar no quilombo sem a ajuda de um artesão mágico. A Aqua possuía alguns conhecimentos sobre as gemas de fogo e passou para a gente e com isso conseguimos fazer algumas coisas com essas gemas, como fazer com que peguem fogo depois de um tempo, mas tirando isso não conseguimos fazer muito mais coisas com elas.
— Isso já poderia se tornar uma arma letal junto com a pólvora.
Enquanto conversavam mais um pouco, o pequeno grupo chegou na caverna. Logo adentraram a mina era menor que a caverna que eles haviam visitado outro dia, havia vigas de madeira nos lados suportando a mina, além de suportes para tochas. Dessa vez tanto Carlos quanto Tassi seguravam uma tocha e Nia ia na frente guiando eles. Não demorou muito chegaram em uma bifurcação.
— Se formos para a esquerda vamos parar numa veia de gemas do fogo, por isso essa caverna é conhecida como Caverna do Fogo, já a direita tem o mineral que vocês querem.
Seguindo a direita chegaram onde desejavam. Lá havia grande veias de minérios nas paredes. Até Carlos sem ser um especialista conseguia reconhecer que era uma veia de pirita por conta de seu brilho dourado, claro só conseguia chegar a essa conclusão porque de antemão já sabia o que iriam encontrar na caverna, se não soubesse disso até poderia achar que eram veias de ouro. Agora entendia porque se chamava ouro de tolos, qualquer um que não fosse especialista poderia facilmente confundir este dourado da pirita com o dourado do ouro.
— Chegamos, já que estamos aqui vou ajudar vocês a pegar pirita também. Até porque de qualquer forma tenho que pegar várias piritas até achar uma de boa qualidade para a arma de pederneira, como você disse antes naquele dia, tem que fazer uma boa faísca para acender a pólvora não é mesmo.
— Isso mesmo, lembrou certinho. Aliás isso me lembra, porque vocês não usam moldes para fazer as peças das armas?
— Infelizmente o ferro que temos não é de boa qualidade, então temos que bater muito neles para melhorar um pouquinho a qualidade deles, além disso tem peças muito intrincadas com ferro mais espesso e mais finos em partes dessas mesmas peças, como os frizzes e o cão, que precisam funcionar bem juntas, e um molde não é suficiente para conseguir fazer isso, por isso um trabalho de um ferreiro é essencial para isso.
Carlos pensou que no futuro os ferreiros não seriam mais necessários para fazer estas peças intrincadas, ainda mais se quiserem fazer a produção em massa dessas armas, mas guardou esses pensamentos para si mesmo.
Logo começaram o trabalho usando as picaretas para pegar a pirita e colocar nas cestas, Nia de vez em quando pegava um pedaço de pirita e batia com o martelo para ver quantas faíscas soltava. Para uma arma de pederneira, quanto mais faíscas soltasse melhor, depois de não muito tempo Nia achou uma pirita adequada, mas ainda continuou ajudando a pegar piritas.
Logo após meio dia o grupo terminou de coletar as piritas e saiu da caverna, todos mortos de fome.
— Sabe, essa pirita é composta de ferro e enxofre, infelizmente neste tempo não temos as ferramentas necessárias para extrair o ferro sem impurezas, só conseguir o enxofre já vai ser um trabalho árduo, mas quem sabe no futuro.
— É sério mesmo? Achei que essa pedra só era boa para fazer faísca, se você conseguir ferro para mim vou ficar agradecida, sempre falta ferro para gente, nós do quilombo trocamos os nossos alimentos com os pessoal da região, em troca de ferro e outros itens necessários. Claro que eles não são donos de escravos por isso comercializamos, mas mesmo assim também não possuem muitos recursos para poderem trocar com a gente, se conseguíssemos ferro por outro meio nem que seja pouco já ajudaria um monte.
Após descerem a montanha Nia entregou seu cesto de pirita e foi para a sua casa levando consigo apenas uma pirita que seria usada para a pederneira da arma, Tassi e Carlos levaram as cestas de pirita para os barracos onde iriam refinar o salitre e extrair o enxofre da pirita.
“Agora vem a parte difícil.”
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.