Hora da Recomendação, leiam Fagulha das Estrelas. O autor, P.R.R Assunção, tem me ajudado com algumas coisas, então deem uma força a ele ^^ (comentem também lá, comentários ajudam muito)
Talvez passe a usar mais esse espaço para recomendar outras obras (novels ou outras coisas que eu achar interessante ^^)
Capítulo 04: Travessia pelo Plano Espiritual
As chamas verdes queimavam intensamente no corpo de Duncan, transformando sua carne e ossos em um espírito translúcido. Com o leme do Banido em suas mãos, sua percepção parecia se espalhar junto com o fogo, conectando-se a toda a embarcação.
Afinal, o navio não precisava de uma tripulação.
O Banido podia zarpar sozinho. Bastava o capitão assumir o leme, e ele estava sempre pronto para partir.
Quando as chamas verdes irromperam, Duncan experimentou um breve momento de pânico. No entanto, suas experiências recentes com fenômenos sobrenaturais no navio o ajudaram a manter a calma. Durante os segundos cruciais, ele não soltou o leme.
Agora, ele finalmente entendeu que as chamas eram algum tipo de força que não lhe causava dano — pelo menos, por enquanto, parecia que essa energia estava ajudando-o a controlar o navio fantasma sob seus pés.
O rugido de aplausos e ondas que antes ecoava em sua mente começou a se dissipar. Duncan sentiu sua mente mais clara do que nunca. O Banido parecia uma extensão de seu corpo, transmitindo sensações indescritíveis. Embora não tivesse o conhecimento ou a experiência de um verdadeiro capitão, ele agora podia comandar o navio sozinho.
As velas espirituais translúcidas começaram a se inflar nos mastros, enquanto velas auxiliares ajustavam automaticamente seus ângulos. Apesar da turbulência nos ventos ao redor, as velas sobrenaturais pareciam capazes de extrair uma força consistente de todo o caos, estabilizando o gigantesco Banido, que finalmente deixou para trás sua deriva desorientada.
Duncan girou o leme, recebendo a reação clara do movimento em sua mente. Ele sentiu o casco maciço do navio começar a virar, na tentativa de escapar da vasta névoa à sua frente.
Mas o movimento era lento demais. A névoa continuava a se aproximar.
Através do tubo de cobre ao lado do leme, a voz aguda e ansiosa da cabeça de bode irrompeu:
“Alerta! Estamos nos aproximando do limite da realidade… Vamos cair no plano espiritual! Capitão, precisamos—”
“Já estou fazendo!” gritou Duncan, interrompendo a cabeça de bode. “Em vez de gritar, por que não pensa em algo útil?!”
Por um momento, a cabeça de bode ficou em silêncio. Duncan achou que ela finalmente tivesse parado, mas então o tubo ressoou novamente com uma voz rouca, aguda e estranhamente frenética:
“Vai, vai, vai! Força! Força! Força!”
Duncan: “……?”
Naquele instante, ele sentiu como se o mundo ao seu redor tivesse perdido todo o senso de realidade. Ele já havia aceitado os fenômenos sobrenaturais do navio, a presença das chamas verdes em seu corpo e até mesmo sua conexão com a embarcação. Mas nunca teria imaginado que a cabeça de bode, que já era estranha por natureza, poderia se comportar de maneira tão absurda…
No entanto, a névoa que se aproximava rapidamente não lhe deu tempo para refletir ou reclamar. Embora o Banido estivesse virando — em uma velocidade que podia até ser chamada de ‘drift’ para um navio de seu tamanho — a densa névoa parecia estar perseguindo-o deliberadamente. Ondas finas e translúcidas se espalhavam pelas bordas da névoa, envolvendo rapidamente o navio inteiro.
No momento em que a névoa tocou a superfície do mar, Duncan sentiu o ambiente ao seu redor mudar. A luz tornou-se mais escura e pesada, enquanto as águas azuladas adquiriram um tom negro, com incontáveis linhas finas e escuras emergindo da profundidade, como cabelos flutuando à deriva. Em questão de segundos, todo o oceano ao redor ficou completamente tingido de preto.
Na névoa densa, sombras vagas começaram a emergir, indistintas mas presentes.
“Caímos no plano espiritual!” A voz irritante e estranha da cabeça de bode finalmente parou de gritar “Força! Força! Força!” e, por algum motivo, agora parecia vir de muito longe. No entanto, sua mensagem ainda estava repleta de sussurros e murmúrios baixos e sinistros, como se muitas vozes cheias de malícia envolvessem Duncan.
“Mas o Banido ainda não afundou completamente — Capitão, mantenha o leme firme! Enquanto não afundarmos nas Profundezas Abissais, o Banido terá energia para manter o curso. Ainda podemos sair daqui!”
“Desde que eu saiba para onde ir!” Duncan gritou em resposta, sua voz misturando-se ao crepitar das chamas verdes, como se viesse diretamente das profundezas do inferno. “Eu perdi completamente o senso de direção!”
“Use sua intuição, Capitão, sua intuição!” A cabeça de bode gritou de volta pelo tubo de cobre. “Sua intuição é mais precisa que qualquer linha traçada no mapa!”
Duncan: “……”
Uma sensação de impotência tomou conta dele. Mas não tinha mais tempo ou energia para discutir com o ornamento bizarro. Já que a cabeça de bode insistia tanto em confiar em sua intuição, ele resolveu confiar no instinto.
Seguindo a sensação vaga que restava antes de a névoa começar a se espalhar, Duncan segurou firmemente o leme e girou-o com toda sua força na direção que acreditava ser correta.
O Banido emitiu uma série de ruídos inquietantes de suas profundezas, como se toda a estrutura estivesse rangendo. Com seu enorme corpo, o navio desenhou um arco impressionante na água negra, praticamente ‘derrapando’ sobre a superfície já manchada de sombras. Ventos fortes rugiram, a névoa se agitou, e no meio do caos, pelo canto do olho, Duncan percebeu algo se formando na névoa.
No instante seguinte, ele conseguiu ver claramente: era um navio.
Menor que o Banido, o navio branco tinha uma chaminé negra erguida no centro de sua estrutura. Ele havia surgido da névoa, e a curva traçada pelo Banido estava prestes a levá-lo diretamente contra essa embarcação — ou talvez fosse o navio menor que estava vindo direto para colidir com ele.
Duncan só conseguiu gritar mentalmente: ‘Mas que porra é essa? Uma corrida no plano espiritual deu errado?!’
Ele havia explorado esse mundo estranho por tanto tempo sem encontrar nenhum outro ser humano. Por que, justo agora, outro navio apareceu do nada? Qual era a probabilidade de dois navios colidirem dessa forma?
Enquanto isso, no outro navio:
O vento uivava, ondas gigantescas rugiam, e o Mar Infinito estava desencadeando todo o seu poder aterrorizante. No meio desse cenário de caos, o Carvalho Branco estava usando os últimos resquícios da força de seus motores a vapor para lutar contra o destino iminente.
Lawrence Creed, o capitão de cabelos grisalhos, estava na cabine de comando. Nem as grossas paredes de madeira nem as janelas reforçadas conseguiam oferecer qualquer sensação de segurança. Suas mãos seguravam firmemente o leme enquanto os sons de ranger e espasmos mecânicos do navio pareciam ecoar diretamente em sua mente através das engrenagens e eixos conectados.
Pelo amplo vidro da cabine, ele via as ondas monstruosas varrendo a lateral do navio. Mas o que realmente o aterrorizava era a névoa densa que subia à distância, cobrindo o mar e lançando relâmpagos negros em sua escuridão.
O Carvalho Branco era uma das embarcações a vapor mais avançadas de seu tempo. Mas, mesmo a tecnologia mais moderna só podia assegurar seu desempenho em mares ‘normais’. Agora, ele e sua tripulação enfrentavam o colapso da fronteira da realidade — uma desintegração do limite entre o mundo conhecido e o caos incontrolável que emergia do fundo do universo.
“Capitão! O sacerdote não vai aguentar por muito mais tempo!” O grito desesperado do primeiro imediato o despertou de seus pensamentos. Ele ouviu o tom rouco e ligeiramente confuso na voz do homem, um sinal do impacto mental que todos estavam enfrentando.
Olhando para frente, Lawrence viu o incensário no altar, de onde chamas púrpura e negras subiam. O sacerdote, vestido em seu manto azul-marinho, estava tremendo violentamente diante dele. Sangue escorria de seu nariz e boca, e seus olhos oscilavam entre a lucidez e a insanidade.
O coração de Lawrence afundou.
Ele sabia que o sacerdote ainda estava do lado da humanidade. Usava cada grama de sua fé pura e inabalável para resistir aos sussurros provenientes do ‘fundo do mundo’. Mas sua resistência estava no limite. A fumaça púrpura e negra do incensário era a prova de que o poder maligno já estava rompendo as orações do sacerdote.
Se o sacerdote caísse, cada mente sã a bordo poderia se tornar uma porta aberta para as Profundezas Abissais — ou, pior, para o subespaço.
“Capitão!” gritou o imediato novamente.
O grito do imediato veio novamente, mas Lawrence o interrompeu. O capitão de meia-idade tinha uma expressão de determinação inabalável em seu rosto:
“Desliguem temporariamente o farol do emblema sagrado. Vamos afundar no plano espiritual!”
O imediato ficou completamente atônito. Um homem que passara metade da vida no mar parecia incapaz de acreditar no que havia acabado de ouvir:
“Capitão?!”
“Afundar no plano espiritual — pelo menos assim, por dez minutos, podemos escapar da pior onda do colapso da fronteira. O sacerdote também terá uma chance de se recuperar”, Lawrence repetiu a ordem, desta vez com uma explicação adicional em um tom que não aceitava objeções. “Execute minha ordem.”
O imediato abriu a boca, parecendo prestes a protestar, mas, no momento seguinte, cerrou os dentes e respondeu:
“O senhor é o capitão!”
Os tripulantes começaram a executar rapidamente a ordem do capitão. Enquanto isso, Lawrence respirou fundo, sentindo o campo de proteção invisível ao redor do Carvalho Branco enfraquecer rapidamente. No fundo do navio, o farol do emblema sagrado estava sendo desligado, removendo a barreira mística que protegia a embarcação. Sem essa proteção, o navio começou a afundar lentamente na camada intermediária entre a realidade e as Profundezas Abissais: o plano espiritual.
Névoa começou a surgir ao redor do navio, e a água do mar ficou gradualmente tingida de preto.
Era perigoso, mas, historicamente, havia precedentes de navios que retornaram ao mundo real após entrarem no plano espiritual. Como membro da Associação de Exploradores, Lawrence havia lido incontáveis relatos e guias de sobrevivência escritos por aqueles que escaparam dessas situações.
Quão pior poderia ficar? Ele só precisava manter o Carvalho Branco no limite do plano espiritual, evitar a tempestade e usar a potência do avançado motor a vapor para realizar uma ‘manobra espiritual’ ousada. Com sorte, ele conseguiria trazer seus tripulantes de volta ao mundo real.
Depois, entregaria a maldita ‘Anomalia 099’ no porão ao governo de Prand e nunca mais se envolveria nos negócios obscuros das autoridades.
Não poderia piorar mais do que isso.
Lawrence se tranquilizou com esse pensamento.
Então, ele viu.
A superfície do mar escurecida ficou ainda mais sombria, e uma embarcação gigantesca emergiu repentinamente. Era um navio a vela, maior que o Carvalho Branco, com três mastros imponentes e um movimento tão resoluto quanto devastador. Ele atravessava o mar negro em um arco dramático, vindo diretamente na direção do Carvalho Branco.
O capitão Lawrence ficou imóvel, encarando incrédulo.
“… Merda.”
Capítulo revisado dia 23/01/2025.
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