Capítulo 05: Entrelaçados
A colossal sombra avançava com força esmagadora, e cada pessoa a bordo do Carvalho Branco testemunhou um momento que ficaria gravado em suas memórias para sempre.
Era um majestoso navio de guerra com três mastros, antigo e imponente. Em uma era em que embarcações a vapor já não eram novidade, aquele navio à vela, emergindo da névoa, parecia ter saído diretamente de uma pintura de um século atrás. Seus mastros erguiam-se altos, seus costados íngremes, e o casco de madeira negra ardia com uma chama verde espectral, como se fossem almas perdidas. As enormes velas se inflavam no vazio, cobertas por ilusões de gritos e camadas de fogo furioso — uma visão que, mesmo no perigoso Mar Infinito, só poderia ser encontrada nas lendas mais aterrorizantes de naufrágios.
“Estamos prestes a colidir!!!”
Um dos marinheiros gritou com desespero. Esses homens, endurecidos pela vida no mar e conhecidos por sua bravura e linguagem rude, perderam a compostura diante de tal visão aterradora. Alguns gritavam e corriam, procurando refúgio no convés. Outros se agarravam desesperadamente a qualquer coisa que pudessem segurar. Alguns, porém, caíram de joelhos em meio ao balanço e ao vento, murmurando orações fervorosas para a Deusa da Tempestade, Gormona, ou o Soberano da Morte, Bartok, com um fervor nunca antes visto.
No Mar Infinito, a bênção dos deuses havia enfraquecido ao longo do tempo, mas apenas esses dois deuses ainda ofereciam sua força igualmente a todos os seus filhos.
No entanto, nem todos os tripulantes sucumbiram ao pânico. O imediato do navio virou-se instintivamente para o único homem em quem ele confiava incondicionalmente: seu capitão. Ele sabia que, em meio às traiçoeiras águas do Mar Infinito, o destino de toda a tripulação muitas vezes recaía sobre a experiência de um capitão. Lawrence, que navegava os mares havia mais de trinta anos, podia já não ter a força de sua juventude, mas os anos de experiência podiam ser a única esperança para salvar a todos.
A embarcação que emergia da névoa não parecia ser um navio comum navegando no mundo real. Tudo nela indicava que era algo vindo do plano espiritual — ou de um lugar ainda mais profundo. Se aquilo fosse um fenômeno sobrenatural, talvez pudesse ser enfrentado com algum tipo de poder extraordinário.
Os velhos capitães que navegavam o Mar Infinito sabiam que, diante de fenômenos sobrenaturais, era necessário mais do que apenas coragem.
Mas o imediato viu apenas medo e choque no rosto do capitão.
O velho capitão segurava o leme com uma firmeza quase petrificada, parecendo alheio ao fato de que a sombra colossal já havia engolido completamente o Carvalho Branco. Seus olhos estavam fixos na silhueta do navio que avançava, seus músculos faciais rígidos como pedra. Finalmente, com grande esforço, ele conseguiu sussurrar algumas palavras, tão frias quanto o vento cortante do oceano:
“… É o Banido…”
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“O quê… Capitão?!” O imediato ficou paralisado ao ouvir o nome que o capitão murmurava. Assim como qualquer outro que trabalhava no Mar Infinito, ele já tinha ouvido marinheiros mais velhos, experientes — e supersticiosos — mencionarem esse nome. “O que… você disse?! Aquele é…”
“Banido!!!”
Como se não tivesse ouvido o imediato, o capitão Lawrence apertou o leme com ainda mais força e gritou, quase como se estivesse rugindo contra algo invisível. Quase ao mesmo tempo, o imponente casco do Banido finalmente atingiu a proa do Carvalho Branco.
Praticamente todos os marinheiros começaram a gritar.
A colisão esperada — um impacto que parecia inevitável — não aconteceu. Em vez disso, o colossal navio em chamas, o Banido, atravessou o Carvalho Branco como uma vasta e magnífica miragem. Suas chamas verdes e ilusões irromperam pelo convés, penetraram no casco grosso e nos corredores sombrios, lambendo as vigas e os pilares em chamas, enquanto passava como uma onda avassaladora.
Os marinheiros, com os olhos arregalados de pavor, observaram impotentes enquanto eram engolidos pela miragem do navio fantasma. Chamas verdes os rodeavam, queimando como uma rede de fogo. Era uma visão assombrosa, onde o real e o sobrenatural se entrelaçavam.
Lawrence também assistiu, impotente, enquanto o fogo se aproximava. Ele viu o imediato à sua frente ser consumido pela chama ilusória, transformando-se instantaneamente em um espírito translúcido. No corpo espiritual, ossos brilharam como madeira em chamas. Em seguida, ele olhou para o sacerdote perto do altar. As chamas que o consumiam oscilavam entre intensas e fracas, como se o deus a quem o sacerdote servia ainda estivesse tentando, em vão, protegê-lo do domínio do Banido.
Logo, as chamas alcançaram Lawrence. Ele viu seu corpo sofrer a mesma transformação. Uma sensação avassaladora de cansaço, submissão e terror o envolveu, enquanto seu amuleto marítimo reagia, alternando entre calor abrasador e um frescor reconfortante. Esse amuleto parecia ser a única coisa que mantinha sua sanidade enquanto ele ‘atravessava’ os corredores e os conveses do Banido.
O interior do navio fantasma era opressivo e sombrio. Lawrence viu pilares de madeira cobertos por cordas podres e cracas. Ele avistou um enorme porão de carga, cheio de objetos estranhos e perturbadores que deveriam estar enterrados nas profundezas do oceano. Passou também por uma cabine luxuosa, onde, sobre a mesa central, estava a cabeça de um bode feita de madeira.
A cabeça virou lentamente e olhou diretamente para Lawrence com olhos frios e indiferentes.
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Finalmente, Lawrence ergueu a cabeça com todas as forças que ainda possuía. Ele viu a figura junto ao leme. Alta e envolta em um uniforme náutico preto de estilo clássico, a figura parecia um governante assustador, exalando uma autoridade que dominava todas as chamas espectrais do navio. Até mesmo o mar profundo e o plano espiritual pareciam se curvar perante essa presença. Atrás dele, uma fenda parecia rasgar o horizonte.
Lawrence fechou os olhos, resignado. Ele sabia que agora fazia parte do Banido. O capitão desse navio assombroso precisava de sacrifícios para preencher seu vazio eterno.
Mas, no instante seguinte, Lawrence reuniu coragem e abriu os olhos novamente. Toda a sua bravura e loucura pareciam se concentrar nesses poucos segundos. Ele se lembrou de todo o conhecimento que havia obtido de livros e lendas e, com a maior sinceridade e calma que pôde reunir, olhou diretamente para o capitão aterrorizante do Banido.
“Você não precisa levar todos eles — leve-me e poupe minha tripulação.”
A figura imponente não respondeu imediatamente. Apenas lançou um olhar frio para Lawrence. Havia um traço de curiosidade naqueles olhos, como se ele estivesse intrigado por um simples capitão mortal ter ousado negociar com ele.
Lawrence finalmente não conseguiu mais conter sua fúria. Ele gritou com toda a força:
“Eles ainda têm famílias para sustentar!!”
Finalmente, o capitão do Banido reagiu. Ele fixou o olhar em Lawrence e pareceu dizer algo, mas um som alto de vento e ondas o interrompeu. No meio do ruído ensurdecedor, Lawrence só conseguiu captar fragmentos indistintos. Não pôde ouvir uma única palavra clara.
A resposta do Banido se perdeu no rugido das ondas.
O quê?! O vento está muito forte, eu não consigo ouvir!!”
No instante seguinte, um som ensurdecedor invadiu os ouvidos de Lawrence. Era uma mistura de ventania, o rugir das ondas e os gritos dos marinheiros do lado de fora. Pelo canto do olho, ele viu as chamas verdes recuarem rapidamente, enquanto os últimos resquícios da ilusão do Banido se dissipavam no ar como névoa.
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Lawrence inalou profundamente e percebeu, com surpresa, que suas mãos — anteriormente consumidas pelas chamas verdes — estavam de volta ao normal. Olhando ao redor, viu que os outros na cabine de comando também haviam retornado à forma de carne e osso. O sacerdote devoto estava caído ao lado do altar, ofegando pesadamente, enquanto murmurava repetidamente o nome da Deusa da Tempestade, Gormona. No incensário, a fumaça púrpura e negra, antes tão ameaçadora, começava a se dissipar, sendo substituída por uma névoa branca e pura que subia suavemente da cobertura de bronze.
Lawrence levou algum tempo para recuperar o fôlego. Ainda atordoado, ele olhou ao redor, como se fosse difícil acreditar que o pesadelo havia acabado. Só então ouviu a voz do imediato:
“Capitão! Aquele navio — o Banido foi embora!”
Lawrence, ainda em estado de choque, levou alguns segundos para reagir antes de murmurar para si mesmo:
“Ele realmente nos deixou ir?”
O imediato não entendeu:
“Capitão? O que o senhor disse?”
“O Capitão Duncan…” Lawrence balbuciou sem pensar. Mas, no instante seguinte, como se tivesse mencionado um nome proibido, ele deu um tapa no próprio rosto. Logo em seguida, levantou a cabeça abruptamente e olhou para o imediato:
“Verifique a tripulação! Agora! Veja se alguém está faltando!”
O imediato assentiu prontamente e estava prestes a sair quando Lawrence o chamou de volta:
“E veja se… há alguém a mais a bordo também!”
O imediato ficou parado por um instante, processando a ordem, e então seus olhos se encheram de um misto de alarme e terror. Respirando fundo, ele murmurou o nome da Deusa da Tempestade, Gormona, antes de sair correndo para o convés.
No Carvalho Branco, que ainda navegava no plano espiritual, o som do sino de reunião ecoou como o toque de uma sentença de morte.
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Capítulo revisado dia 24/01/2025.
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