Hora da Recomendação, leiam Fagulha das Estrelas. O autor, P.R.R Assunção, tem me ajudado com algumas coisas, então deem uma força a ele ^^ (comentem também lá, comentários ajudam muito)
Talvez passe a usar mais esse espaço para recomendar outras obras (novels ou outras coisas que eu achar interessante ^^)
Capítulo 149: Por Trás do Véu
A igreja comunitária, que por fora parecia abandonada há incontáveis anos, estava iluminada por dentro, limpa e bem cuidada. No entanto, aos olhos de Duncan, essa cena luminosa se sobrepunha nitidamente a outra realidade—uma visão arruinada, como se fosse um ‘fato alternativo’.
Isso lhe deu uma sensação estranha, como se essa pequena igreja fosse um ‘espaço errado’ sobreposto à realidade, ou um local esquecido, preso em uma fenda do tempo. Duas histórias completamente opostas se encontraram ali, mas a igreja permaneceu no ponto de interseção, seu tempo paralisado desde então.
Ela não foi destruída, nem sobreviveu ao grande incêndio.
Então… a irmã que guardava esta igreja sozinha sabia de algo?
“Já faz muito tempo desde a última visita a esta igreja”, a freira, vestida com uma túnica sacerdotal preta, repetiu suavemente. Ela ergueu a cabeça com um sorriso, mas seu olhar parecia atravessar Shirley e Duncan, que estavam diante dela. “De onde vocês vieram? Rostos desconhecidos… Vocês não são moradores daqui, certo?”
O cenário à frente era brilhante e acolhedor, mas sob o olhar sorridente da freira, Shirley instintivamente encolheu o pescoço. Um arrepio percorreu sua espinha, e ela murmurou nervosamente para Duncan:
“Eu… eu tenho a sensação de que este lugar é estranho… Por fora, parece tão decadente, mas por dentro…”
Duncan não respondeu, apenas deu um tapinha de leve no ombro de Shirley. Pelo comportamento da garota, ele já suspeitava que ela só conseguia ver um dos ‘lados’ da igreja—provavelmente o intacto. Mas, no momento, ele não sabia como explicar sua hipótese para ela. Se ele chamasse o Cão agora, com os seus ‘olhos’, provavelmente conseguiria enxergar a verdadeira natureza deste lugar.
No entanto, até entender melhor quem era aquela freira à sua frente, era melhor não permitir que Shirley invocasse Cão de forma precipitada.
“Estamos apenas de passagem”, Duncan respondeu com expressão inalterada, sua voz calma, como se fosse um visitante comum da igreja. “Você vive aqui o tempo todo?”
“Eu? Sempre vivi nesta igreja”, a freira assentiu levemente. “Estou sempre aqui rezando… Rezando para a grandiosa existência.”
“Mas as pessoas do bairro dizem que a freira desta igreja raramente aparece”, Duncan continuou, observando atentamente a reação dela. “Dizem que esta igreja esteve negligenciada por muito tempo, parecendo abandonada.”
A freira ouviu as palavras de Duncan em silêncio, sem demonstrar nenhuma reação intensa, como se sua mente estivesse permanentemente em paz.
Ela apenas esboçou um leve sorriso.
“Oh, é mesmo? Mas eu sempre estive aqui… Talvez eles simplesmente tenham se esquecido dos dias de oração e, por isso, pensaram que a igreja estava fechada.”
Duncan não expressou sua opinião, mas já havia confirmado que o problema não se restringia apenas à igreja—todo o Sexto Distrito estava errado.
Essa igreja abandonada ficava no interior do distrito e, só de olhar para ela por fora, era evidente que estava deserta há mais de uma década! Para as pessoas comuns deste mundo, igrejas não eram apenas locais de conforto espiritual—elas serviam para manter a segurança da região, afastando forças malignas após o anoitecer, além de serem refúgios para aqueles atormentados por problemas mentais ou pesadelos… E ainda assim, um local tão essencial permaneceu abandonado por onze anos, sem que os moradores do Sexto Distrito achassem isso estranho? Tudo o que diziam era um mero “a freira raramente aparecia”?
Pense nisso: se um bairro ficasse sem água e eletricidade por onze anos inteiros, e seus moradores não vissem nada de anormal nisso, apenas dando de ombros e dizendo “o pessoal da companhia de serviços não tem vindo trabalhar ultimamente”, que tipo de situação absurda seria essa?
Quanto à freira dentro da igreja… Duncan ainda não conseguia determinar a verdadeira natureza daquela figura, que às vezes se revelava a ele como cinzas humanoides. No entanto, pelo menos durante essa breve conversa, ele pôde sentir que ela… não parecia hostil.
Na verdade, não apenas não demonstrava hostilidade, como seu estado mental parecia extremamente peculiar—não era totalmente irracional, mas também estava longe de ser completamente lúcida.
Duncan lançou algumas perguntas indiretas, às quais a freira respondeu com tranquilidade, sem hesitação. E essa serenidade em si… era um sinal de sua inconsciência.
Porque, em circunstâncias normais, se um estranho entrasse numa igreja e começasse a bombardear a freira de plantão com uma série de perguntas desconexas, ela, no mínimo, deveria achar a situação estranha.
Ela ainda possuía razão—mas muito pouca.
“Vocês gostariam de fazer uma oração? Ou talvez precisem de algum tipo de purificação espiritual?”
A freira perguntou com um sorriso gentil, sua voz suave como uma brisa.
“Obrigado, mas não será necessário.” Duncan balançou a cabeça e, em seguida, olhou ao redor, como se casualmente perguntasse:
“A propósito, onde estão os Guardiões desta igreja?”
Cada igreja deveria ter Guardiões em sua proteção. Mesmo a menor igreja comunitária nos distritos mais pobres contava com uma guarnição capaz de lidar com ameaças comuns. Esta igreja não deveria ser uma exceção.
“Os Guardiões… eles estão descansando dentro da igreja. Só aparecem depois que anoitece.” A freira manteve o sorriso inalterado. “O senhor está procurando por eles por algum motivo?”
Duncan não respondeu. Apenas deixou seu olhar deslizar lentamente sobre os bancos ao lado da freira.
Em sua visão, a cena iluminada e bem cuidada da igreja se sobrepunha a um outro cenário, como se fossem fotogramas em um filme—um cenário onde o fogo já havia consumido tudo, deixando apenas cinzas e ruínas desmoronadas. E nesse outro plano sobreposto… havia corpos carbonizados.
“Os Guardiões estão descansando ali?” Duncan levantou a mão e apontou para um ponto não muito distante.
Aos olhos de Shirley, porém, ali só havia duas fileiras de bancos vazios.
A freira hesitou por um instante, depois olhou na direção indicada. Após um breve silêncio, respondeu suavemente:
“Shh… Eles estão dormindo.”
Duncan assentiu e então perguntou casualmente:
“Podemos dar uma olhada ao redor?”
“Mas é claro, a igreja está aberta para visitação.” A freira acenou levemente com a cabeça. “Fiquem à vontade, eu preciso continuar minhas orações. Se precisarem de algo, podem me chamar.”
Depois de dizer isso, aquela estranha freira realmente se virou e caminhou em direção à estátua da deusa, deixando Duncan e Shirley sozinhos.
Somente quando a freira se afastou, Shirley finalmente soltou um suspiro longo, aliviada. Por um momento, ela nem se importou em temer Duncan—o ambiente da igreja já era inquietante o suficiente. Até mesmo Cão, oculto no espaço espiritual, estava inquieto. Uma sensação opressiva e sinistra atravessava o vínculo mental entre eles, fazendo com que Shirley, instintivamente, se aproximasse de Duncan.
“Isto… o que está acontecendo neste lugar?” Shirley murmurou, sua voz tensa. “Essa freira me dá arrepios… Ela parece normal, mas ao mesmo tempo, há algo profundamente errado com ela…”
“Aqui parece haver duas igrejas”, Duncan respondeu em um tom baixo, explicando de maneira simples e direta. “Uma que já foi consumida pelas chamas, e outra que permanece intacta. Ambas coexistem, sobrepostas neste espaço e tempo. E a freira dentro da igreja… não está nem viva, nem morta.”
Shirley ficou paralisada por um momento. Levou quase meio minuto até que, em meio à confusão e espanto, ela finalmente murmurasse em voz baixa:
“O que isso quer dizer?”
Duncan lançou um olhar para ela.
“Você devia ler mais… Se não conseguir, eu posso te ensinar.”
Sem esperar pela resposta de Shirley, ele simplesmente começou a caminhar para o interior da igreja.
A freira havia dito que a igreja estava aberta para visitação—então, naturalmente, ele faria questão de ‘explorá-la’ à vontade.
Shirley hesitou por um instante antes de apressar o passo para segui-lo. Os dois atravessaram as fileiras de bancos organizadamente dispostas e passaram pelo altar e pela estátua da Deusa da Tempestade.
A freira silenciosa já estava ajoelhada diante da estátua, as mãos pousadas suavemente sobre o peito, murmurando suas preces com devoção. Era como se tivesse esquecido completamente a presença dos visitantes. Como se, nos últimos onze anos, nunca tivesse se movido daquele lugar, mantendo sua oração ininterrupta.
Duncan piscou. No instante seguinte, a freira se transformou novamente—dessa vez, em uma figura humanoide feita de cinzas trêmulas, empilhadas ao lado do altar queimado. Fragmentos de luz, semelhantes a folhas caindo, filtravam-se pelo teto escuro, brilhando fracamente.
Um súbito pressentimento atravessou Duncan. Ele ergueu a cabeça, voltando o olhar para a estátua da Deusa da Tempestade.
A estátua, vestida com longas vestes, permanecia erguida sobre o altar, imponente e serena. No entanto, algo estava errado—uma rachadura sinistra cruzava sua cabeça!
Por um breve instante, Duncan enxergou a verdade oculta no coração das duas igrejas sobrepostas. Ele viu claramente que, no lugar onde deveria estar a cabeça da deusa, havia uma fenda sombria e caótica. Dentro dela, um brilho indistinto e enevoado oscilava, como uma pupila monstruosa e deformada. No fundo desse olho horizontal e alienígena, refletia-se uma paisagem que não deveria existir neste mundo. A ‘aura sagrada’ que deveria envolver a estátua havia se dissipado completamente, e o que restava naquela escultura de pedra não era nada além de frio e vazio absoluto!
Então, no instante seguinte, aquela visão aterradora desapareceu.
A estátua de Gomona voltou a se erguer sobre o altar, seu semblante imponente irradiando uma presença reconfortante e solene, inspirando respeito e reverência.
A freira, ainda ajoelhada diante da estátua, de repente abriu os olhos.
Ela virou levemente a cabeça e, com um olhar calmo, fitou Duncan.
“O senhor deseja orar à deusa?”
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