Hora da Recomendação, leiam Fagulha das Estrelas. O autor, P.R.R Assunção, tem me ajudado com algumas coisas, então deem uma força a ele ^^ (comentem também lá, comentários ajudam muito)
Talvez passe a usar mais esse espaço para recomendar outras obras (novels ou outras coisas que eu achar interessante ^^)
Capítulo 154: Arquivo
O responsável pelo arquivo era um velho sacerdote de idade avançada. Sua postura era encurvada, os poucos fios brancos de cabelo estavam desgrenhados, e ele usava um complexo conjunto de lentes composto por manoplas de latão e cristais lapidados. Além disso, seu corpo exalava um leve cheiro de óleo de máquina.
O velho sacerdote estava sentado atrás de uma mesa circular escura, concentrado em analisar um estranho mecanismo que lembrava um cubo mágico. Usando ferramentas delicadas, desmontava o cubo peça por peça, e a luz amarelada da lâmpada a gás refletia nas partes metálicas, fazendo-as brilhar suavemente.
Quando Vanna se aproximou, sua silhueta alta bloqueou parte da iluminação, chamando a atenção do sacerdote. Ele ergueu a cabeça, afastou as lentes diante dos olhos com os dedos e, ao reconhecer a visitante, abriu um sorriso.
“Oh, é a Inquisidora. Em que posso ajudá-la hoje?”
“Gostaria de acessar os registros de desastres ocorridos na cidade-estado por volta de 1889”, respondeu Vanna, acenando respeitosamente para o sacerdote.
“Registros de desastres de 1889?” O velho sacerdote murmurou enquanto tamborilava os dedos sobre uma seção da mesa.
Imediatamente, um leve som de engrenagens se fez ouvir sob a superfície da mesa. Logo, um painel retrátil deslizou de baixo, revelando um terminal mecânico repleto de manivelas, discos numerados e interruptores.
Com movimentos ágeis e experientes, o sacerdote começou a manipular os controles da engenhoca. Após inserir as informações necessárias, Vanna sentiu uma leve vibração no chão, acompanhada pelo característico ronco grave de uma máquina de grande porte em funcionamento. Sob o impulso de um núcleo a vapor, incontáveis engrenagens e hastes se colocaram em movimento.
Poucos instantes depois, um som metálico agudo—um ‘ding’—ecoou pelo ambiente, e uma tira de papel impresso emergiu do mecanismo à frente do sacerdote.
“Siga por esse corredor, vire à esquerda na terceira fileira de estantes e, ao final do caminho, vire à direita. Você verá uma prateleira iluminada—é ali. Os registros são diversos, qualquer evento que possa ser classificado como desastre foi catalogado, desde grandes calamidades até pequenos acidentes com vapor. Se precisar de ajuda, basta tocar o sino.”
Enquanto falava, o velho sacerdote entregou a tira de papel para Vanna—usando uma mão mecânica.
Sua prótese era feita de latão e possuía uma estrutura mecânica intrincada. No dorso da mão, havia uma pequena janela transparente, através da qual se podia ver um conjunto de engrenagens funcionando em sincronia.
Vanna imaginou que ele poderia ser um veterano da linha de frente, agora aposentado. No setor administrativo da Igreja da Mar Profundo, ex-soldados como ele não eram incomuns.
Seus corpos já estavam danificados, mas, através do sangue derramado e dos sacrifícios feitos, haviam demonstrado sua fé e lealdade. Com o auxílio de mecanismos a vapor ou próteses mágicas, eles podiam continuar servindo à Igreja, e muitos encontravam seu destino final em cargos relacionados à manutenção de arquivos e registros.
De certa forma, isso era uma forma de reconhecimento aos guerreiros. O setor de arquivos, um ambiente relativamente tranquilo e confortável, era um bom lugar para ‘aposentadoria’. Mas, ao mesmo tempo, era também um uso eficiente de seus talentos—embora seus corpos já não fossem aptos para batalhas contra hereges, suas vontades permaneciam firmes, e a guarda dos livros e registros… sempre exigira uma determinação inabalável.
Vanna sentiu um leve respeito surgir em seu coração. Pegou a tira de papel com ambas as mãos e inclinou levemente a cabeça.
“Obrigada.”
“Quando terminar, lembre-se de organizar os livros de volta no lugar. E não toque naqueles que não constam no catálogo”, advertiu o velho sacerdote, acenando com a mão. “Alguns desses livros estão ali há muito tempo. Melhor não mexer neles sem necessidade.”
Dito isso, ele retornou ao que estava fazendo, ignorando Vanna por completo.
Ela não se incomodou e seguiu em frente com a lista de livros em mãos, avançando pelo interior do arquivo.
Ao seu redor, imponentes estantes de livros se erguiam, tão altas que a palavra ‘grandioso’ era a única descrição possível. Eram tantas e tão bem organizadas que pareciam uma fileira de sentinelas milenares, observando do alto as pequenas figuras humanas que caminhavam abaixo.
O sistema de iluminação também era meticulosamente planejado: lâmpadas elétricas e lanternas a gás, dispostas com precisão, iluminavam perfeitamente o espaço entre as prateleiras. Nem mesmo os corredores mais profundos do arquivo estavam mergulhados em escuridão.
Pouco depois, Vanna encontrou a seção indicada pelo velho sacerdote—uma fileira de pequenas lâmpadas brilhava suavemente sobre a estante, marcando os volumes que ela podia consultar.
Os documentos estavam armazenados em prateleiras mais altas, mas, felizmente, sua estatura avantajada permitia que os alcançasse sem precisar de uma escada. Isso a fez soltar um leve suspiro de alívio—mover escadas em uma biblioteca deste tamanho seria uma tarefa nada agradável.
Inspirando fundo, ela localizou o início dos arquivos, retirou um dos volumes numerados e começou a folheá-lo rapidamente.
Ela buscava uma coisa muito específica: o incêndio de onze anos atrás.
Ou melhor, o incêndio que fora oficialmente registrado como um acidente de vazamento numa fábrica.
Na verdade, essa não era a primeira vez que Vanna investigava esse assunto.
Como Inquisidora, ela sempre teve uma sensibilidade aguçada para detectar ‘fenômenos incomuns’ — e isso incluía os eventos estranhos que ocorreram com ela mesma. Desde que percebeu que só ela se lembrava do incêndio de sua infância, fez algumas investigações por conta própria, tentando encontrar registros daquela tragédia.
Mas sua busca inicial foi superficial e infrutífera.
Na época, Vanna rapidamente deixou o assunto de lado.
Afinal, quando o incêndio aconteceu, ela tinha apenas doze anos — não era uma devota da deusa, nem possuía um intelecto particularmente excepcional. Era apenas uma criança assustada, sufocada pela fumaça tóxica. Seria realmente tão impossível que sua mente tivesse gravado uma memória errônea desse evento?
Convencida disso, após consultar alguns registros públicos, decidiu encerrar sua investigação.
Mas agora…
Agora, ela descobrira que havia outra pessoa em Pland que também se lembrava daquele incêndio.
A dúvida que havia enterrado no passado retornou com força total, trazendo consigo incontáveis especulações. Sua intuição como Inquisidora disparou, soando alarmes em sua mente.
Foi esse instinto que a fez rejeitar a sugestão de Heidi de ‘voltar à loja de antiguidades’ naquele momento. Em vez disso, manteve silêncio e esperou a oportunidade certa para agir.
E foi por isso que agora estava aqui — na biblioteca sagrada, sob a proteção da deusa — acessando os arquivos originais que nunca foram tornados públicos.
A razão era simples: essa história exalava perigo.
Apagar o incêndio dos registros poderia parecer algo simples na teoria, mas na prática isso significava alterar a memória coletiva de milhares de pessoas. O evento também estava diretamente ligado às ações destrutivas de cultistas na época. Se tudo isso foi manipulado por alguma força nos bastidores, essa entidade certamente não permitiria que alguém descobrisse a verdade.
A memória fragmentada que permaneceu em sua mente… A lembrança que resistiu na mente daquela menina chamada Nina… Essas ‘sobras’ poderiam ser falhas no plano de quem quer que estivesse por trás disso.
Talvez essa figura oculta ainda não tivesse percebido esses deslizes.
Mas, caso notasse…
Vanna não temia por si mesma. Mas Nina, seu tio… e aquela garota chamada Shirley eram apenas pessoas comuns.
Por isso, recusou a sugestão de Heidi e pediu que ela não mencionasse mais o assunto. Não queria alertar a entidade por trás disso — e, acima de tudo, precisava proteger aqueles que poderiam se tornar vítimas por simplesmente se lembrar da verdade.
Até que tivesse informações concretas, não demonstraria qualquer interesse incomum naquela loja de antiguidades.
Vanna folheava os registros, mas sua mente estava agitada.
E, por alguma razão…
Desde que começou a perceber a presença dessa sombra oculta, sentia uma sensação incômoda — como se fosse observada de algum lugar invisível.
Era um desconforto sutil, mas intenso.
A ideia de estar sob vigilância constante era como uma agulha pressionada contra sua pele, tornando impossível ignorá-la.
Isso a incomodava profundamente.
Vanna colocou de lado aquele arquivo e pegou outro volume próximo.
Ao mesmo tempo, sua mente revisitava os eventos recentes que haviam ocorrido na cidade-estado.
Nos últimos tempos, incontáveis hereges do Sol haviam sido capturados. Parecia que as medidas rigorosas tomadas pelo governo da cidade-estado finalmente estavam surtindo efeito, desencorajando os remanescentes do culto. Ou talvez os canais de infiltração desses fanáticos tivessem sido completamente eliminados. De qualquer forma, a presença dos hereges solares na cidade diminuiu consideravelmente, e as prisões subterrâneas das catedrais agora estavam lotadas.
Os propósitos dos cultistas já haviam sido revelados:
Eles estavam à procura de um ‘Fragmento do Sol’—algo que apareceu brevemente onze anos atrás e que, até hoje, pode estar oculto em algum lugar.
Fragmento do Sol…
O incêndio de onze anos atrás…
A ‘visão’ que Heidi testemunhou no museu…
A mão de Vanna parou no meio da página.
De repente, pistas que antes pareciam desconectadas começaram a se alinhar.
Enquanto revisava sua própria memória sobre aquele incêndio, cada detalhe se tornava cada vez mais evidente.
“Esses eventos estão conectados…” Vanna respirou fundo. “O incêndio de onze anos atrás definitivamente aconteceu.”
Ao pensar nisso, seus olhos passaram distraidamente por algumas palavras no arquivo:
〖… X de X, no distrito XX, ocorreu um grave caso de culto herege. Três famílias construíram altares dentro de suas residências, realizando rituais de sacrifício de sangue e orações a uma entidade desconhecida que não aparece em nenhum registro. O evento causou pânico generalizado e pesadelos recorrentes entre os moradores vizinhos. O ritual foi posteriormente denunciado e interrompido, mas as evidências encontradas no local não apontavam para nenhum deus profano ou espírito maligno conhecido…
Teoricamente, esse ritual não deveria ter efeito algum—parecia ser apenas a tentativa ignorante de fanáticos em busca de benefícios próprios. No entanto, o pânico coletivo e os pesadelos foram reais.
Investigações subsequentes confirmaram que aquela área de fato sofreu influência de forças sobrenaturais…〗
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