Índice de Capítulo

    Hora da Recomendação, leiam Fagulha das Estrelas. O autor, P.R.R Assunção, tem me ajudado com algumas coisas, então deem uma força a ele ^^ (comentem também lá, comentários ajudam muito)

    Talvez passe a usar mais esse espaço para recomendar outras obras (novels ou outras coisas que eu achar interessante ^^)

    Fogo. Fogo por toda parte. Ou então, o cenário desolado das cinzas que restaram após as chamas consumirem tudo. A catedral destruída pelo fogo. A torre do relógio destruída pelo fogo. A própria cidade-estado parecia ter sido reduzida às cinzas.

    Ventos abrasadores cortavam a praça em ruínas da catedral, erguendo redemoinhos de cinzas no ar. Faíscas tênues caíam da velha torre do relógio, enquanto bandeiras carbonizadas pendiam frouxas, despencando ao sabor do vento.

    Uma figura alta, vestida com uma armadura leve, pisou na praça. Em sua mão, uma imensa espada larga arrastava faíscas no chão escaldante.

    As pontas do cabelo de Vanna já estavam chamuscadas pelo calor opressivo. Sua armadura apresentava diversos danos, e algumas das aberturas ainda deixavam à mostra feridas sangrando — os músculos sob a carne se contorciam, iniciando um processo lento de regeneração.

    Ela segurava a espada com a mão direita. Na esquerda, empunhava uma enorme metralhadora rotativa. Uma caixa de munição pesada estava presa às suas costas — a metralhadora fora arrancada de um andador a vapor parcialmente destruído que encontrou durante a passagem por um arsenal. Estava funcionando bem o suficiente.

    O vento quente trouxe consigo o cheiro acre das cinzas. Vanna semicerrou os olhos enquanto encarava as ruas à distância, onde colunas de fumaça e reflexos avermelhados se erguiam.

    Nesta ‘linha histórica’, toda a cidade de Pland havia sido consumida pelas chamas.

    O incêndio começou em 1889, alastrando-se silenciosamente por onze anos. Até que, enfim, consumiu a cidade inteira. E nesse processo de queima lenta, a cidade-estado foi selada em um estado de ruína.

    Até mesmo os poderes da Deusa da Tempestade estavam sendo severamente distorcidos e interferidos — quanto mais tempo Vanna permanecia ali, mais difícil se tornava sentir a brisa reconfortante do mar.

    Destruir uma cidade-estado com fogo não era difícil. Mas fazê-lo sem que uma divindade percebesse… era algo totalmente diferente. Aqueles hereges haviam explorado uma brecha na história, e muito provavelmente interferiram na percepção divina com a autoridade do Sol Negro.

    Mas… onde estavam esses hereges?

    Um sussurro baixo e rouco ecoou de repente entre as sombras de um prédio próximo. Aquele sussurro carregava uma energia profana e maliciosa. À sua volta, as sombras se condensavam no ar, dando origem a ilusões perturbadoras.

    Mas Vanna sequer virou os olhos para a direção das sombras ou do sussurro. Em vez disso, levantou casualmente a metralhadora rotativa com a mão esquerda e apertou o gatilho — mirando uma direção que, à primeira vista, parecia vazia.

    Uma rajada ensurdecedora explodiu sobre a praça. Cartuchos dourados de munição choveram como granizo. As labaredas da arma varreram o ar, e, então, uma figura alta e esguia apareceu subitamente — forçada a se revelar pela fúria das balas.

    Escondida antes nas frestas entre luz e sombra, a criatura só teve tempo de erguer um guarda-chuva negro e vários tentáculos para tentar conter o impacto da rajada. E nesse breve instante de defesa…

    A tempestade rugiu.

    Vanna lançou a espada com força. Revestida pelo poder da tempestade, a lâmina voou e atravessou o monstro, arremessando-o a dez metros de distância e cravando-o com violência no chão.

    Mas ela nem sequer olhou para o inimigo que acabara de perfurar. Girou o corpo num movimento ágil, avançou de lado e agarrou, com uma só mão, um poste de luz deformado pelo calor. Então, com força sobre-humana, golpeou com o aço retorcido em direção ao flanco.

    O segundo atacante oculto foi atingido em cheio pelo poste de luz e lançado ao chão. Sua cabeça horrenda, parecida com uma flor de carne e sangue, se despedaçou, reduzindo-se a uma massa disforme. O resto do corpo se contorcia violentamente no chão, até que Vanna girou a metralhadora rotativa, disparando contra os restos com uma rajada de balas abrasadoras, como uma tempestade de fogo.

    “Duplas de emboscada furtiva… Então é só isso que vocês têm como tática?”

    Vanna murmurou, jogando de lado o poste agora retorcido e inútil. Em seguida, fez um gesto com a mão livre, e sua espada da tempestade voltou voando para sua mão. Ela a fincou ao lado do corpo, apoiando-se nela, enquanto a outra mão permanecia segurando a metralhadora — ainda apontada, como uma sentença, para a pilha de carne monstruosa no chão.

    Poucos segundos depois, ela franziu o cenho.

    “Sem regeneração?”

    A jovem Inquisidora se abaixou, examinando os restos — outrora pertencentes a uma Prole do Sol — agora largados no chão. Não havia qualquer sinal de regeneração. Pelo contrário, o tecido estava ressecando e perdendo vitalidade rapidamente, transformando-se, diante de seus olhos, em um monte de carvão seco e encolhido.

    Mas por quê? Por que aquelas sobras perderam a capacidade de regenerar? Teria o corpo original enfraquecido subitamente? Ou aquelas partes foram severamente danificadas por alguma outra razão?

    Confusa e em alerta, Vanna observou atentamente, até que de repente ergueu os olhos — como se tivesse sentido algo — e fixou o olhar num beco próximo.

    Uma chama fluida e esverdeada surgiu na escuridão. Num instante, espalhou-se pela borda da praça, se alastrando com rapidez. Então, como se tivesse sentido algo, investiu contra os restos da criatura abatida!

    Chamas. Devorando. Crescendo.

    Diante de Vanna, o fogo verde consumiu os pedaços sem vida da Prole do Sol, como um predador saboreando a presa conquistada.

    O olhar da jovem Inquisidora se estreitou num instante. Observava as chamas com extrema cautela, pensamentos e suposições colidindo em turbilhão dentro de sua mente. No entanto, aquele fogo esmeralda parecia ignorá-la completamente — apenas circulava pela praça, vasculhando cantos e sombras, antes de escorrer para mais longe.

    Vanna ficou olhando, pensativa, enquanto as chamas se afastavam. E então, com passos decididos, voltou a caminhar rumo às profundezas da cidade-estado.


    Uma tempestade desabava com fúria. A cortina d’água parecia ligar céu e terra, e a chuva pesada que caía das nuvens carregadas lembrava uma conspiração oculta, gestada por anos, finalmente vindo à tona para purificar a cidade-estado de Pland.

    E quando nem mesmo a força da chuva conseguiu deter os passos de Morris… foi o destino que voltou a agir — seu carro finalmente quebrou.

    O velho historiador desistiu imediatamente da ideia de fazer o motor pegar. Sabia que a força que tentava impedi-lo só se intensificaria daqui em diante. O Pregador do Fim já havia lançado sobre ele uma sentença em algum momento desconhecido. Essa maldição não permitiria que o carro fosse consertado.

    Mas a ‘sentença’ dos Pregadores do Fim não era uma maldição absoluta. Em geral, sua atuação era limitada a influenciar ou interferir em eventos — e quanto maior a duração ou o alcance dessa influência, maior a energia necessária… e maior o desgaste que isso causava.

    Ele não podia parar — não sob aquela tempestade.

    Morris abriu a porta do carro. Um vento cortante e a chuva fria lhe atingiram o rosto ao mesmo tempo, encharcando-o completamente em questão de segundos e quase o fazendo perder o equilíbrio.

    Mas o velho apenas segurou o chapéu com uma mão, apertou firme a bengala com a outra e avançou, passo a passo, em meio à cortina de água que envolvia tudo à frente.

    Ele não usava guarda-chuva — não faria sentido algum, com o tempo daquele jeito.

    Já estava perto da loja de antiguidades, a menos de meio quarteirão. Em dias de tempo razoável, seria possível até enxergar a placa da loja dali.

    Mas naquele instante, tudo o que via era uma massa cinzenta de chuva, e, nas laterais da rua, algumas poucas lojas de portas e janelas bem fechadas.

    Morris avançava com dificuldade pela tempestade. Não sabia ao certo quanto tempo havia caminhado, até que finalmente avistou aquela fachada familiar surgindo diante de seus olhos.

    Seu corpo reagiu por instinto, acelerando o passo.

    A maldição lançada pelo Pregador do Fim parecia enfim ter perdido força. O vento que soprava contra ele tornava-se mais fraco. O frio, embora presente, já não doía como antes. E a chuva, ainda densa, já não lhe atingia como pedras esmagadoras.

    Faltando apenas alguns passos para alcançar a loja, Morris ouviu uma voz soar em seu ouvido — clara e repentina:

    “Pare! Você vai se arrepender!

    “A salvação não está adiante… Pland será devorada por outro desastre!

    “A história está prestes a ser substituída… O que você quer salvar não é mais a realidade verdadeira, mas um eco de um caminho errado…”

    Morris não parou.

    Correu os últimos metros, e praticamente arrombou a porta com o ombro.

    No mesmo instante, a voz em seus ouvidos cessou — sumiu como se jamais tivesse existido.

    O vento frio e a chuva torrencial ficaram para trás, barrados pela porta fechada.

    Morris entrou cambaleando, molhado da cabeça aos pés, pingando no piso de madeira. O calor e a luz do ambiente interno o deixaram momentaneamente atordoado.

    Do andar de cima, ouviam-se vozes — duas garotas conversando. Uma delas era Nina:

    “Tá chovendo muito lá fora!”

    “Pois é, começou do nada… Ainda bem que seguimos o conselho do seu tio e voltamos mais cedo.”

    “Mas meu cabelo tá todo molhado… Shirley, me ajuda a secar atrás!”

    Morris balançou a cabeça, tentando dissipar o torpor causado pelo frio e pela tempestade. Quando recuperou a clareza, ergueu o olhar em direção ao balcão.

    Sob a luz morna da loja, uma mulher de cabelos loiros, vestindo um elaborado vestido longo roxo-escuro, estava sentada calmamente atrás do balcão. Ela o observava com curiosidade.

    Era uma mulher belíssima — mas Morris não se deteve em sua aparência.

    O que chamou sua atenção foi a aura de serenidade e graça quase sobrenatural que a envolvia, além da atmosfera de mistério silencioso que parecia envolvê-la por completo.

    Ela não parecia sentada numa loja do Distrito Inferior, mas sim em um jardim palaciano, imperturbável, observando aquele visitante molhado e aflito com a tranquilidade de uma nobreza intocável.

    Morris teve a súbita impressão de perceber algo… não humano naquela mulher. Mas, no instante seguinte, reprimiu completamente qualquer tentativa de percepção.

    Havia uma ‘recém-chegada’ na loja do Sr. Duncan — uma que ele nunca vira antes. Mas fosse qual fosse sua natureza, era absolutamente imprudente tentar sondá-la.

    Então, a voz dela soou, acolhedora:

    “Está chovendo muito lá fora, senhor… precisa de ajuda?”

    “Sr. Duncan… estou procurando o Sr. Duncan”, respondeu Morris, ainda atônito. “É muito importante! Ele não está na loja?”

    “Está sim”, disse a mulher, sorrindo com gentileza. “Disse que a pressão estava um pouco alta, então foi descansar no segundo andar.”

    Morris piscou, confuso:

    “Pressão… alta?”

    A mulher atrás do balcão balançou a cabeça com um suspiro leve:

    “Também não entendi muito bem — depois que terminamos de conversar sobre história e falsificações, o humor dele mudou completamente.”

    História e falsificações?!

    O coração de Morris deu um salto. Estava prestes a fazer mais perguntas quando ouviu passos descendo a escada, seguidos pela voz do Sr. Duncan:

    “Alice, temos visita?”

    “Sim, Sr. Duncan! Um senhor bem velhinho que a gente não conhece!”

    Morris ergueu os olhos. Lá estava Duncan, parado na escada, metade do corpo iluminado pela luz, a outra metade imersa em sombras.

    Ele o encarava com uma expressão de surpresa e curiosidade.

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