Capítulo 278: Arranjo Razoável

A noite caía lentamente, a fria Criação do Mundo já estava alta no céu noturno. Sob seu brilho pálido, toda a cidade-estado mergulhou no silêncio.

No segundo andar da loja de antiguidades do Distrito Inferior, Duncan estava parado em frente à pequena janela no final do corredor, observando em silêncio as ruas quietas lá fora, os telhados que subiam e desciam sob o brilho frio, e as tubulações e válvulas que cruzavam a cidade sobre eles.

Em outra visão distante, ele podia ver o Banido atravessando o Mar Infinito de ondas agitadas, navegando para o norte durante a noite, perseguindo a direção do Névoa do Mar.

E aqui, ele observava a cidade-estado inteira, usando sua “percepção” onipresente para escanear cada canto de Pland.

Ele ergueu ligeiramente o olhar e viu que aquela “névoa” invisível ainda flutuava sobre a cidade.

A “fumaça” semelhante a uma “alma”, liberada pela Catedral da Tempestade, parou de se expandir depois que a noite caiu. Agora, sua escala era suficiente para cobrir três quartos da cidade de Pland. Elas flutuavam e ondulavam lentamente no céu noturno como um véu fino, como se…

Passeassem tranquilamente pelo céu noturno.

Duncan desviou o olhar do céu e focou sua atenção na enorme sombra na borda da cidade.

Era onde a Catedral da Tempestade estava ancorada.

A gigantesca Arca da Peregrinação se agarrava ao porto sudeste de Pland como uma nuvem escura. Na percepção de Duncan, ele podia sentir claramente o contorno desse enorme indivíduo, mas não conseguia aprofundar seu olhar curioso no interior da catedral.

O interior daquela catedral era para ele como um buraco negro, vazio e escuro.

Os navios comuns atracados no porto não conseguiam bloquear sua percepção — a uma distância suficientemente próxima de Pland, nada podia escapar desse seu “toque”. Mas agora, aquela catedral era claramente uma exceção.

‘Isso se deve à “proteção” da Deusa Gomona? Ou a uma tecnologia de proteção especial da Igreja do Mar Profundo?’

Duncan estava um pouco curioso sobre isso, mas não tomou nenhuma atitude drástica. Embora ele tenha considerado se queimar a catedral com sua chama verde poderia romper suas defesas, foi apenas um pensamento passageiro. Afinal, não havia inimizade, não havia necessidade de incendiar a casa de alguém apenas para satisfazer sua própria curiosidade.

Nesse momento, o coração de Duncan se moveu. Ele rapidamente retirou sua percepção da Catedral da Tempestade e ergueu a cabeça na direção do Distrito Superior.

Ele olhou pensativamente para a colina que se erguia acima dos arredores, para a catedral de Pland que se erguia na noite.

Nas alturas da Catedral de Pland, uma sala de descanso estava bem iluminada. A Papisa Helena acendeu uma vela cerimonial misturada com especiarias e colocou o castiçal em frente a um espelho de corpo inteiro no canto. Só então ela inclinou levemente a cabeça para olhar para Vanna, que estava de pé ao seu lado há algum tempo.

“Ouvi dizer que a primeira vez que você o viu em um sonho, sua primeira reação foi um golpe saltado. O que você estava pensando na época?”

Um traço de constrangimento apareceu no rosto de Vanna: “Naquela hora… não pensei muito.”

“Quando você diz ‘não pensei muito’, geralmente significa ‘não pensei em nada'”, Helena riu. “Na verdade, isso é muito bom. Guerreiros excelentes geralmente deixam a ação ultrapassar o pensamento, o que é muito útil ao enfrentar hereges e males. Afinal, o ‘pensamento’ em si pode facilmente se tornar nossa vulnerabilidade.”

“…Mas eu só fico feliz que minha ação imprudente na época não tenha resultado em nenhuma consequência”, Vanna suspirou, impotente. “Em retrospecto, ele parece não ter se importado com a minha ‘ofensa’.”

“Ele não se importa. Eles não se importam”, Helena suspirou suavemente. “As existências superiores se preocupam com coisas maiores e de longo prazo… a boa notícia é que as coisas com as quais eles se preocupam também incluem, de uma forma ou de outra, a nossa sobrevivência.”

Vanna não respondeu por um momento. Helena então olhou para a “inquisidora” que não era mais uma inquisidora com um sorriso enigmático: “Vanna, você deve ter muitas perguntas a fazer.”

“Eu quero saber… qual é o seu arranjo para mim”, Vanna hesitou por um momento, mas finalmente falou. “Vossa Santidade removeu secretamente meu posto de inquisidora e não nomeou um novo guardião para a cidade. Estou um pouco perdida, não sei como devo cumprir meus deveres daqui para frente.”

Helena ouviu em silêncio, sem qualquer sinal de surpresa no rosto. Depois que Vanna terminou de falar, a Papisa, que parecia ainda muito jovem, apenas sorriu e se virou para olhar pela janela.

Através da vidraça com grades de ferro forjado, podia-se ver as ruas da cidade-estado iluminadas por inúmeras lâmpadas a gás, pacíficas e tranquilas.

“Uma noite muito calma, Vanna”, disse a Papisa. “Quantos incidentes de contaminação transcendente ou invasão maligna você acha que os guardas noturnos de hoje relatarão?”

Vanna ficou surpresa e disse, um pouco hesitante: “…Não tenho certeza. A cidade-estado tem estado relativamente segura estes dias, sem relatos de incidentes, mas…”

“Zero”, a Papisa a interrompeu. “Os incidentes desta noite serão zero. Assim como ontem e anteontem. E amanhã será o mesmo.”

Vanna abriu a boca.

“Vocês obviamente também notaram isso, mas ainda não ousaram tirar uma conclusão, certo?”, Helena riu. “Uma cidade cujo perigo noturno desapareceu. Mesmo na escuridão temporária após as lâmpadas a gás se apagarem, nenhuma sombra mais se prolifera. A joia mais brilhante do Mar Infinito, agora faz jus ao seu nome.”

Vanna finalmente começou a entender: “O que Vossa Santidade quer dizer é…”

“Fenômeno—Pland”, Helena assentiu levemente. “Dentro deste grande fenômeno, parece que nenhum fenômeno de ‘contaminação’ transcendente, além do próprio ‘Fenômeno—Pland’, pode ser gerado.”

“Essa é a sua conclusão baseada em observação?”

“Você acha que eu vim aqui apenas para receber a ‘admiração’ dos cidadãos nas ruas e as saudações dos clérigos e oficiais na catedral?”, Helena olhou para Vanna com um sorriso enigmático. “Eu tenho minhas próprias maneiras de observar e julgar as mudanças que ocorreram nesta cidade-estado.”

Vanna ficou de boca aberta. Ela parecia ter inúmeras coisas a dizer, mas de repente não sabia por onde começar. Pensamentos confusos e desordenados enchiam sua cabeça. Ela sentia que o que estava acontecendo mais uma vez excedia sua visão de mundo, a ponto de sua lógica habitual não conseguir encontrar uma maneira de continuar a conversa. Depois de um tempo que pareceu uma eternidade, ela soltou: “Então… Pland não precisa mais de um inquisidor?”

“Não tenho certeza”, a resposta de Helena surpreendeu Vanna. A Papisa balançou a cabeça, aparentemente também incerta. “Porque algo assim realmente nunca aconteceu antes. Mas pelo menos uma coisa é certa: enquanto a natureza do Fenômeno—Pland não mudar, você de fato não precisará mais trabalhar como antes. Os deveres dos guardiões da cidade-estado também mudarão muito.”

Dizendo isso, Helena fez uma pausa e acrescentou enquanto pensava: “Mas mesmo assim, a cidade-estado ainda precisa da proteção de seus guardiões. No momento, só posso confirmar que ‘fenômenos de contaminação transcendente em estado natural’ não ocorrerão dentro do Fenômeno—Pland. Mas as ameaças que enfrentamos não se limitam a fenômenos naturais. Hereges, proles antigas, criações malignas… aqueles loucos que querem ativamente destruir a ordem da civilização não se comportarão porque Pland se tornou um fenômeno.”

“Mas, no geral, uma coisa é certa: Pland se tornou mais segura.”

Helena parou, olhando calmamente nos olhos de Vanna. Depois de alguns segundos, ela continuou com uma voz suave: “Vanna, estamos trilhando um caminho muito novo. Nenhuma cidade-estado, nenhuma igreja jamais enfrentou uma situação como esta.”

“Por outro lado, nosso mundo… parece também estar passando por algumas mudanças perturbadoras. Seja a ‘falha’ do Fenômeno 001 ou as atividades do Banido, tudo está quebrando o frágil equilíbrio mantido pelas cidades-estado nos últimos mil anos. Nessas circunstâncias, a Deusa só concedeu revelações muito limitadas… só posso agir com base nessas revelações limitadas.”

“Vanna, você tem um talento imenso, e esse talento deve ser usado em… lugares mais valiosos. Pland está agora em seu estado mais seguro, mas imagino que você não seja alguém que se entrega ao conforto, certo?”

Ao ouvir as palavras da Papisa, Vanna instintivamente endireitou o corpo: “Estou pronta a qualquer momento para sacrificar tudo pela fé e pela justiça!”

“Sacrificar tudo?”

“Claro, sacrificar tudo!”

“Fazer qualquer coisa sem hesitação?”

“Desde que seja a vontade da Deusa!”

“Incluindo ir para o Banido?”

“Incluindo ir…”

Vanna falou alto instintivamente, mas travou depois de apenas algumas palavras, quase perdendo o fôlego. Dois segundos depois, ela olhou atônita para a Papisa à sua frente: “O que… Vossa Santidade acabou de dizer?”

“Eu disse agora mesmo que nosso mundo está passando por muitas mudanças perturbadoras, e entre todas essas mudanças, o Banido é, pelo menos, o único que mostrou a possibilidade de comunicação e uma tendência benevolente”, disse Helena com seriedade. “Precisamos estabelecer um canal de comunicação estável com o mestre do Banido, e de preferência um com certo caráter oficial. Você pode se considerar uma enviada especial, ou pode se considerar uma ‘refém’. Claro, pessoalmente, sugiro que você adote a primeira interpretação, mas a forma como você pensa sobre isso fica a seu critério.”

Vanna ouviu, boquiaberta. Só quando a Papisa terminou de falar é que ela finalmente encontrou uma oportunidade de falar: “Mas… mas… mas isso é razoável? Ir para o Banido… é o conceito que eu estou entendendo? Isso é possível?!”

Helena olhou em silêncio para a jovem “inquisidora” um tanto desnorteada, já esperando essa reação. Muito tempo depois, ela finalmente falou com um sorriso no rosto: “Razoável.”