Capítulo 357: A Cópia

O conteúdo do papel não tinha pé nem cabeça, parecendo esconder algumas metáforas ambíguas. Olhando de perto, só se sentia uma estranheza. Mesmo um erudito tão experiente e conhecedor como Morris, que leu as frases repetidamente, não conseguiu encontrar nenhuma pista.

O que eram os Reis Perdidos? O que era o Clã Abandonado? E o que eram as pessoas nas cinzas e a “proteção” mencionada repetidamente nesses parágrafos?

Duncan franziu a testa, seu olhar varrendo as marcas de tinta ligeiramente borradas pela água. Certas palavras ali lhe traziam algumas associações, mas era difícil formar um pensamento coerente. Ele apenas sentia vagamente… que aquilo não parecia ser apenas um delírio. Nos parágrafos que se assemelhavam a um registro religioso, parecia que se contava algo relacionado a esta “era do mar profundo”.

Ou, talvez, algo anterior à era do mar profundo.

“Esta é a caligrafia do Corvo?”, Vanna ergueu a cabeça de repente, olhando para Nemo ao lado.

“É a caligrafia dele”, Nemo se agachou para identificar e assentiu com certeza. “Ele sempre alongava o último traço no final de uma frase, um hábito que ninguém mais tinha.”

“Em que ele acreditava?”, Vanna perguntou novamente. “Além da fé ortodoxa, ele teve contato com alguma outra orientação espiritual? Não necessariamente uma fé herege. Sociedades secretas e ordens de estudo ascéticas como essas também contam.”

“Ele era um devoto seguidor do deus da morte, desde pequeno. Além da igreja de Bartok, nunca o vi frequentar nenhuma outra assembleia”, disse Nemo, pensativo. “Quanto a sociedades secretas e ordens de estudo… isso é ainda mais improvável. Como a cabeça dele poderia participar de algo assim? Um cara que precisou de três anos de recuperação para se formar no ensino médio público. Mesmo que ele quisesse entrar nessas ordens, eles teriam que aceitá-lo!”

“…Um fiel devoto da ortodoxia, que nunca teve contato com nenhuma outra orientação espiritual além da fé nos deuses verdadeiros… isso é interessante”, Vanna olhou para o papel nas mãos de Morris, curvando o dedo e apoiando o queixo, pensativa. “O estilo de escrita aqui obviamente carrega traços da era das cidades-estado clássicas ou da era das trevas anterior, e é uma típica ‘escrita sagrada’. Algo assim não é algo que uma pessoa que mal se formou no ensino médio público possa imaginar do nada. E o ‘Corvo’ ainda o mantinha junto ao corpo, o que mostra que ele se importava muito com o que estava neste papel.”

Duncan não falou, ele estava pensando em silêncio. De repente, ele teve uma ideia: “Então, é possível que ele tenha copiado isso de algum lugar.”

“Copiado?”, Nemo ficou surpreso por um momento e então também entendeu. “O senhor quer dizer que o Corvo pode ter entrado acidentalmente em algum lugar, e o que está neste papel… é uma ‘pista’ que ele copiou de lá?”

“Talvez ele mesmo não soubesse o significado do que copiou, mas era a informação mais suspeita e digna de nota que ele viu lá”, Duncan assentiu lentamente. “E, infelizmente, talvez tenha sido ao copiar essas coisas que ele atraiu a morte.”

“Entrou acidentalmente em algum lugar…”, Vanna se levantou lentamente, de braços cruzados, e disse, pensativa. “Então este lugar deve ter sido completamente desconhecido para o ‘Corvo’, e o ambiente talvez fosse bastante bizarro, a ponto de a pessoa não conseguir julgar onde estava em pouco tempo, e só pudesse registrar apressadamente o que via para servir de pista. Por outro lado, ele pode ter sido descoberto e morto logo após copiar, e por isso não teve tempo de explorar os arredores. Caso contrário, ele teria a oportunidade de registrar mais informações características para descrever o ambiente que viu.”

Dizendo isso, ela olhou para o corpo afogado, franzindo levemente a testa.

“Aonde ele foi? E como foi trazido de volta? Um cadáver encharcado, movê-lo certamente deixaria rastros…”

Nemo ergueu a cabeça, olhando ao redor.

No corredor seco do esgoto, não havia nenhum traço deixado pelo arrastar do corpo.

“Talvez devêssemos seguir a rota de patrulha habitual do Corvo e procurar mais a fundo. Ele pode ter deixado rastros antes de entrar acidentalmente naquele lugar”, disse Morris, olhando para as profundezas do corredor à frente. “Ele costumava ir nesta direção?”

“Sim”, Nemo assentiu. “Este corredor leva em direção ao Distrito Superior, mas há um trecho no meio com iluminação instável, ocasionalmente envolto em escuridão. Embora a escuridão por um curto período não seja um grande problema, ainda podem aparecer algumas… coisas não muito boas, então é preciso patrulhar com frequência para detectar as sombras recém-nascidas a tempo.”

“Então vamos dar uma olhada. Ir o mais rápido possível talvez nos ajude a encontrar pistas”, Duncan assentiu. “Se realmente houver algo que saiu de lá, podemos resolver de uma vez por todas.”

Ninguém se opôs.

O grupo se despediu temporariamente do corpo do Corvo, preparando-se para explorar mais a fundo o corredor do esgoto. E antes de passarem pelo corpo do jovem, Nemo e o Velho Fantasma baixaram a cabeça em uníssono.

“Espere por nós aqui, voltaremos para buscá-lo”, disse Nemo.

O Velho Fantasma se curvou e, de algum lugar, tirou um amuleto triangular e o colocou no peito do Corvo: “Não saia correndo, garoto.”

Duncan observou a cena em silêncio, esperando que Nemo e o Velho Fantasma se despedissem, antes de se virar e liderar a equipe para a frente.

“Quando voltarmos, contaremos ao Capitão Tyrian o que aconteceu aqui”, disse Vanna de repente no caminho. “Aquele jovem não morrerá em vão.”

“Obrigado”, disse Nemo em voz baixa, seu humor claramente abalado, uma tristeza e desânimo persistentes o envolviam. “Aquele garoto… na verdade, nunca fez nada de extraordinário na vida, mas desta vez ele será lembrado pelo Capitão Tyrian e pelo Capitão Duncan. Acho que isso também pode ser considerado uma honra.”

“Ele tinha família?”, Morris também quebrou o silêncio, perguntando em voz baixa.

“Família? Já se foi há muito tempo. Ele cresceu em um orfanato e, quando saiu aos dezesseis anos, tornou-se meu aprendiz”, Nemo balançou a cabeça. “Segundo a diretora do orfanato, o garoto foi encontrado na rua, em uma lata de lixo na esquina. Quando o encontraram, ele era do tamanho de um corvo da cabeça aos pés…”

“Bebê abandonado”, o Velho Fantasma resmungou, com uma voz que parecia conter raiva. “Quando a Rainha ainda estava aqui, ela nunca permitiria que algo assim acontecesse. Abandonar um bebê dava cadeia! Mas agora as pessoas se degeneraram a ponto de jogar crianças em latas de lixo… Aquele garoto teve sorte. Quando ele veio do orfanato para cá, era muito magro, parecia um macaco aos dezesseis anos. Eu vivia preocupado que ele pegasse um resfriado e morresse no inverno, mas ele sobreviveu… sobreviveu…”

O velho parou de repente, como se tivesse engasgado, e então balançou a cabeça com desânimo: “Afinal, ele não sobreviveu.”

A atmosfera no grupo estava excepcionalmente pesada. Até mesmo a geralmente lenta Alice sentiu a atmosfera opressiva. Ela ergueu a cabeça confusa, olhou ao redor e finalmente se aproximou do Velho Fantasma, hesitante, como se quisesse consolá-lo: “Você… não fique triste.”

O Velho Fantasma ergueu a cabeça, olhou para Alice com sua peruca e véu e ficou atônito por um momento, depois fungou com força: “Rainha, a senhora tem que cuidar disso…”

Alice olhou para o velho à sua frente, sem saber o que fazer.

Mas logo, seu constrangimento foi quebrado — o grupo parou de repente.

O corredor à frente estava envolto em uma luz fraca. Duas lamparinas a gás, aparentemente com defeito, estavam embutidas na parede, e a luz que emitiam mal conseguia dissipar a escuridão profunda. Vanna ergueu a cabeça e olhou para o chão na divisa entre a luz e a escuridão, sua expressão tornando-se gradualmente séria.

“Ali… há uma pessoa caída.”

Ela disse com a voz baixa.

Uma figura de aparência um tanto magra estava caída ao lado do canal de drenagem na beira do corredor, imóvel. A fraca luz da lamparina a gás, turva devido à má circulação de ar, iluminava o familiar casaco grosso e azul.

O grupo chegou ao lado do corpo caído e, ao ver o rosto da pessoa, Duncan não sentiu a menor surpresa — era o Corvo.

No entanto, ao contrário de Duncan e dos outros que já esperavam por isso, Nemo e o Velho Fantasma ficaram apenas chocados ao ver aquele rosto, e até mesmo um pouco aterrorizados.

“Corvo?!”, a voz de Nemo tremeu um pouco. Ele olhou boquiaberto para a pessoa no chão e, inconscientemente, deu meio passo para trás. “Isso… como…”

“É uma cópia”, Duncan interrompeu calmamente a exclamação de Nemo. À primeira vista, ele confirmou que o corpo à sua frente era uma cópia formada por “Primal” — porque ao redor do “cadáver”, uma pequena quantidade de uma substância preta e viscosa já começara a aparecer, indicando claramente que seu processo de desintegração já havia começado.

Parecia haver diferenças entre as cópias. Embora todas fossem formadas por “Primal”, algumas podiam se mover na cidade-estado por dez a quinze dias, enquanto outras se desintegravam ao serem transportadas para o cemitério. E esta “cópia” à sua frente… sua velocidade de desintegração parecia ser ainda mais rápida.

Desde o desaparecimento do Corvo até agora, haviam se passado apenas algumas horas.

Duncan pensou rapidamente:

‘Se o Corvo realmente entrou acidentalmente em um lugar perigoso e bizarro — como um covil dos Aniquiladores — e copiou aquela suspeita “narrativa em escrita sagrada”, então a sua duplicação… também deve ter começado lá.

‘E agora, sua duplicata está caída nesta área, onde ele costumava patrulhar.

‘A direção está certa.

‘Talvez, a origem da duplicata esteja aqui perto!’