Capítulo 56: Porão
Quando Duncan foi servido com o jantar, ele hesitou em experimentar a sopa de peixe feita por Alice. Sua relutância não se devia à falta de apetite, mas ao incidente inquietante em que a cabeça da Senhorita Boneca acidentalmente caiu na sopa fervente. Para Duncan, esse incidente não foi um mero acidente; trouxe à mente pensamentos sobre maldições e maus presságios.
Observando a hesitação de Duncan e a colher intocada ao lado de seu prato, a Senhorita Boneca parecia angustiada. Nervosa, segurando sua saia, ela reuniu coragem para perguntar, sua voz cheia de preocupação e medo: “Capitão, você está chateado comigo?”
Duncan, percebendo a tensão, mas querendo aliviá-la, se virou para a boneca angustiada e a tranquilizou: “Se houver algo te incomodando sobre o navio, por favor, não hesite em compartilhar…”
“Mas… eu não…” Alice interveio, claramente surpresa com sua resposta.
Tentando aliviar o clima, Duncan sugeriu: “Talvez seja melhor ficar longe da cozinha por um tempo?” Percebendo a tristeza nos olhos de Alice, ele rapidamente acrescentou: “Não, por favor, não me entenda mal. Eu valorizo seu esforço e boas intenções. Cozinhar é difícil e propenso a erros para quem não tem experiência. É melhor ir devagar e aprender com cada tentativa.”
O rosto de Alice se iluminou com as palavras de apoio de Duncan. Com renovado entusiasmo, ela perguntou: “Então… posso tentar cozinhar novamente depois?”
Duncan pensou por um momento, então assentiu e disse: “Só tome mais cuidado da próxima vez.”
Ele refletiu sobre Alice, muitas vezes vista como uma boneca ‘amaldiçoada’, e seu sincero desejo de encontrar seu papel no navio, o Esquecido. Ela queria ser útil, e Duncan sentiu que não era seu lugar impedi-la de se envolver na vida a bordo, para não parecer um tirano.
Ele decidiu que permitir que Alice ajudasse na cozinha, apesar de alguns contratempos, era mais seguro do que deixá-la lidar com cordas, âncoras ou bolas de canhão, onde os riscos eram significativamente maiores. Os perigos na cozinha eram menores em comparação.
Voltando sua atenção para a sopa de peixe ao lado dele, Duncan reconheceu internamente que o sabor era bastante comum. Dado as especiarias limitadas a bordo, o prato ainda era digno de elogios.
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O que mais Duncan poderia esperar realisticamente de dois seres que não tinham um verdadeiro entendimento das preferências culinárias humanas?
Antes que pudesse refletir mais, a voz de Alice suavemente interrompeu seus pensamentos: “Hum… Capitão, você gostaria que eu preparasse algo diferente para você? Eu aprendi a grelhar peixe e fazer filés de peixe frito com o Sr. Cabeça de Bode. Tenho alguns prontos na cozinha…”
“Não estou muito com fome”, Duncan respondeu, balançando a cabeça. Na realidade, seu corpo precisava de pouca comida. Ele mantinha uma rotina de comer três refeições por dia, principalmente para manter uma aparência de vida humana normal. A sopa que Alice fez mais cedo estava surpreendentemente saciante, o suficiente para afastar qualquer fome restante. Levantando-se da mesa, ele anunciou: “Acho que vou dar uma volta pelas cabines.”
“Você vai para as cabines?” Alice perguntou, sua voz cheia de surpresa. Sua expressão mudou quando um pensamento lhe ocorreu, e ela parecia preocupada enquanto perguntava timidamente: “Enquanto estiver lá, você poderia talvez verificar ‘abaixo’?”
“Abaixo?” Duncan repetiu, perplexo.
Alice esclareceu: “As cabines mais baixas — quer dizer, as áreas onde não sou permitida entrar. Sempre há esse som inquietante de rangido vindo de lá. Às vezes, até soa como sussurros debaixo das tábuas do chão. Você poderia investigar? Estou preocupada que algo estranho possa estar acontecendo lá embaixo…”
O comportamento ansioso da Senhorita Boneca e a sinceridade em sua voz despertaram a curiosidade de Duncan.
Os níveis inferiores do Banido ainda estavam praticamente inexplorados por ele!
Ao contrário dos convés superiores movimentados, os convés inferiores do navio tinham uma aura assustadora de perigo e mistério. Quando ele assumiu o comando, antes de dominar o fogo fantasma, ele havia explorado apenas alguns níveis mais profundos antes de decidir adiar a exploração. Ele tinha planejado retomar depois, mas as circunstâncias mudaram rapidamente.
De repente, uma voz rouca interrompeu seus pensamentos, vinda do Cabeça de Bode, que se escondia nas sombras: “Ah, parece que o porão é a parte mais profunda de um navio, normalmente está dando problema de novo. Capitão, por que não dá uma olhada pessoalmente?”
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Antes que Duncan pudesse responder, Cabeça de Bode, sem se importar com sua própria interrupção, continuou com entusiasmo: “Pense nisso, Capitão. Já faz um tempo desde que você verificou as cabines inferiores. O porão, submerso no Mar Sem Fim por tanto tempo, merece um pouco de atenção… Que tal levar sua lanterna? Está bem onde você deixou, atrás da porta… Você tem se preocupado tanto com as cabines superiores que a tripulação de baixo está ficando impaciente. As constantes reclamações estão me deixando nervoso. Como alguém que valoriza o silêncio, esses rangidos noturnos são tudo, menos reconfortantes…”
Duncan lançou um breve olhar silencioso para o Cabeça de Bode, fazendo-o imediatamente se calar.
Ouvir o desabafo do Cabeça de Bode só tornava a ideia de descer para as profundezas do navio ainda menos atraente. As palavras do Cabeça de Bode pintavam um quadro sombrio dos níveis inferiores, profundamente influenciados pelo Mar Sem Fim, sugerindo surpresas inesperadas para aqueles que ousassem se aventurar ali.
Apesar da tarefa assustadora à frente, a hesitação de Duncan foi breve. Ele sabia que precisava expandir sua exploração para todo o navio, o Banido, e confrontar isso mais cedo ou mais tarde era essencial. Não era de sua natureza ignorar ameaças potenciais apenas porque estavam fora de vista.
O Banido era um navio vasto, impressionantemente longo e equipado com uma disposição complexa de níveis e compartimentos em seu casco. Duncan estava intimamente familiarizado apenas com as seções superiores do navio — o convés principal, as cabines de alta posição, o armazenamento de munição logo abaixo do convés, as estações de artilharia, as instalações de armazenamento, os reservatórios de água doce e alguns dos quartos da tripulação. Essas áreas ficavam acima da linha da água; os espaços abaixo eram extensos, em grande parte inexplorados, e engolidos pela vastidão do Mar Sem Fim.
Apesar de sua familiaridade limitada com a totalidade do navio, Duncan havia sido nomeado seu capitão. O Banido se tornara sua fortaleza neste mundo estranho, servindo como seu principal centro de comando. Embora ele pudesse se dar ao luxo de negligenciar outros aspectos e permanecer ignorante sobre alguns detalhes, ele entendia o papel crítico que o navio desempenhava em sua sobrevivência. Agora, ao perceber toda a extensão das capacidades do navio, Duncan reconhecia que, em emergências graves, o Banido poderia realmente ser seu santuário salvador.
A persistente pressão do Cabeça de Bode sobre a necessidade de o capitão inspecionar o porão era algo que Duncan não podia mais ignorar. Ele havia negligenciado as cabines inferiores por muito tempo, e se essa negligência continuasse, o risco de um grande contratempo estava se tornando cada vez mais provável.
Motivado por essa percepção, Duncan levantou-se rapidamente de sua cadeira e se dirigiu à porta para pegar a lanterna, como Cabeça de Bode sugerira. A lanterna era um artefato único, uma peça antiga com uma estrutura prismática hexagonal de cobre, contendo uma cúpula de vidro que lhe dava uma aparência mística. No interior, um elemento semelhante a um pavio aumentava seu encanto enigmático.
Duncan optou por não expressar curiosidade nem buscar mais conselhos com Cabeça de Bode. Após um breve momento de silêncio reflexivo, ele tentou evocar o fogo fantasmagórico verde de dentro de si e direcioná-lo para a lanterna. Quase imediatamente, um vibrante feixe de chamas verdes surgiu dentro da cúpula, emitindo uma luz constante e distinta que iluminava a área próxima.
Onde a luz da lanterna alcançava, ela criava uma atmosfera assombrosa, porém calmante. Dentro dessa luz, Duncan experimentou uma peculiar sensação de paz e controle, como se pudesse sentir sutilmente sua influência se expandindo junto com a luz da lanterna, visualizando os detalhes intrincados de seu ambiente por onde a luz tocava.
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De repente, Ai, a pomba, voou até ele e pousou em seu ombro. Ela havia se transformado em sua forma espectral — não por esforço consciente de Duncan, mas aparentemente acionada espontaneamente pela luz da lanterna. Essa visão desencadeou uma enxurrada de pensamentos na mente de Duncan, levando-o a especular sobre os potenciais efeitos.
A lanterna parecia estender seu próprio poder para o ambiente, criando efetivamente um ‘campo de força’ que combinava funções de detecção, alerta e controle, tornando-a particularmente adequada para uma exploração prolongada em territórios desconhecidos ou perigosos.
“Capitão… posso acompanhá-lo?” Duncan se virou e viu Alice já atrás dele. A curiosa boneca estava examinando a lanterna atentamente, com expressão iluminada pela antecipação: “Ainda não explorei o nível inferior! O Sr. Cabeça de Bode disse que eu não posso descer sem a sua permissão…”
Duncan fez uma pausa por um momento para considerar o pedido dela. Após uma breve reflexão, ele assentiu em concordância, “Muito bem.”
Ele não tinha certeza total sobre o que poderia estar à espreita nos níveis mais baixos do navio, mas entendia que era parte do Banido. Dado seu recente comando, acreditava que o porão não apresentaria grandes perigos. Além disso, ter Alice ao seu lado poderia se provar vantajoso, pois ele poderia contar com sua ajuda, caso fosse necessário.
Na mesa de mapas, a enigmática cabeça de bode permaneceu em silêncio e sem resposta, sem fazer comentários sobre seus planos. De sua perspectiva, a ideia de o capitão inspecionar o Banido com uma assistente parecia completamente normal.
Fora da cabine do capitão, a noite já havia caído completamente, envolvendo tudo em escuridão. O brilho fantasmagórico da Criação do Mundo iluminava o oceano, lançando uma luz etérea sobre o convés abandonado do navio e as velas espectrais que se balançavam suavemente ao vento.
Equipado com sua lanterna, espada lateral e pistola de pederneira, Duncan, acompanhado de Alice, atravessou o convés deserto. Eles se dirigiram pelas duas cabines do convés superior e se aproximaram das escadas, chegando ao limite de suas explorações anteriores.
“Está terrivelmente escuro lá embaixo”, observou Alice, parada no topo das escadas, olhando inquieta para o vazio escuro adiante. “Não há nenhuma fonte de luz lá? O resto do navio é iluminado por essas lâmpadas de óleo que parecem queimar eternamente…”
“Há luz”, garantiu Duncan, erguendo a lanterna à altura dos olhos. A misteriosa chama verde dentro fornecia-lhe uma visão única das condições das cabines inferiores. “É só que as luzes aqui não são fontes de brilho, mas sim, elas lançam sombras.”
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“…Desculpe?” Alice olhou momentaneamente confusa, tentando entender o que ele queria dizer. “As luzes são… escuras?”
Duncan não respondeu verbalmente, mas continuou em frente, com a lanterna lançando um raio de luz através da escuridão. Ele fez um gesto para Alice segui-lo, lembrando-a calmamente, “Não se assuste; lembre-se, estamos bem abaixo da superfície do mar.”
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