21 de agosto de 2023, segunda-feira.  

    Aki estava sentada na sua mesa no escritório, os dedos voando sobre o teclado enquanto redigia um relatório urgente. O som das teclas preenchia a ala silenciosa, ocasionalmente interrompido pelos cliques do mouse. Victor havia saído mais cedo, e ela precisava terminar o documento antes do prazo, que se aproximava rapidamente. 

    De repente, um aroma delicioso vindo da cozinha alcançou seu olfato, distraindo-a por um instante. Enquanto revisava o arquivo, Aki se pegou imaginando o que poderia estar sendo preparado. Talvez fosse algo para um evento, uma prática não tão comum, mas que acontecia ocasionalmente. 

    Era habitual que chefs ou cozinheiros dos bufês parceiros preparassem amostras dos pratos que seriam servidos em eventos importantes. Geralmente, isso acontecia na própria cozinha das empresas contratadas, mas de vez em quando, experimentações eram feitas ali mesmo, no escritório. 

    “Deve ser o chef da “B&K Buffet”, pensou, lembrando que estavam em vias de fechar uma parceria com eles. “A Yumi e o Kira sempre se dão bem nessa.”. Ela riu internamente, imaginando que era muita sorte poder trabalhar experimentando pratos preparados por chefs. 

    Após longos minutos, ela concluiu o relatório. 

    — Finalmente! — exclamou, animada, espreguiçando-se na cadeira. 

    Aki se levantou e caminhou em direção à saída. O escritório estava quase vazio; a maioria já havia saído para o almoço. Enquanto avançava pelo corredor silencioso, foi surpreendida por uma voz. 

    — Te achei! — Victor chamou, parando ao lado dela após um breve pique para alcançá-la. 

    — Oi, Victor! — disse ela, levando um pequeno susto. Seu coração disparou. — Achei que já estivesse almoçando. 

    Ela ajeitou uma mecha de cabelo atrás da orelha, tentando disfarçar o nervosismo. 

    — Estou no horário de almoço. — Ele respondeu com a expressão neutra de sempre. — Podemos almoçar juntos hoje de novo? 

    O convite deixou Aki com um frio na barriga. Não conseguia esconder a empolgação com a ideia. Da última vez que almoçaram juntos, ela aprendeu muito sobre ele. 

    — Claro! — respondeu, depois de alguns segundos. — Aonde vamos? 

    — Um lugar tranquilo — disse ele, quase automaticamente. — Um lugar barulhento atrapalharia a conversa. 

    Aki sorriu diante da justificativa e sugeriu que fossem a um café, que geralmente são locais calmos. Ele concordou, balançando a cabeça. 

    … 

    Enquanto caminhavam, ela notou que Victor carregava uma sacola. Ficou curiosa, mas decidiu não perguntar. 

    O silêncio durante a caminhada parecia normal, mas a incomodava levemente. Quando passaram por uma praça cercada de árvores, Victor sugeriu que atravessassem o local. No centro, um pequeno lago refletia a luz do sol, deixando a paisagem ainda mais agradável. Ele a convidou a sentar em um dos bancos. 

    Aki se surpreende com a proposta, imaginando que estavam caminhando para o café. Ainda assim, ela concorda e eles sentam em um dos bancos.  

    Victor abriu a sacola, revelando duas marmitas cuidadosamente preparadas. 

    — Trouxe isso.  

    Os olhos de Aki brilharam ao ver o conteúdo: onigiris e bolinhos fritos, dispostos de forma impecável em um recipiente quadrado. 

    — Você disse que adorava camarão, então fiz esses bolinhos pra gente comer — disse Victor, com um tom de empolgação sutil, embora sua expressão ainda estivesse neutra. 

    Aki percebeu a leve mudança e ponderou se era pela comida ou se ele estava mudando. Afastando seus pensamentos, ela se concentrou naquele momento. 

    O aroma ao desembalar a comida era delicioso. Estavam sob a sombra de uma árvore e o dia não estava muito quente, com uma brisa suave soprando hora ou outra. 

    — Muito obrigada! — A animação dela era evidente. — Você preparou tudo isso na empresa? 

    — Só fritei os bolinhos. O restante fiz em casa. 

    O esforço dele a deixou ainda mais contente. Aki pegou um dos bolinhos dourados e fumegantes. Assim que deu a primeira mordida, sentiu a crocância da casca e a suculência do recheio, encontrando-se num sabor intenso dentro da sua boca.  

    — Está delicioso! — disse ela, com os olhos brilhando. — Mal posso esperar para experimentar outras coisas que você faz. 

    — Vai ser um prazer — respondeu ele, desviando o olhar em direção ao lago. — Mas, na verdade, eu é que devo te agradecer. 

    Aki arqueou a sobrancelha, confusa. 

    — Agradecer? — Indagou. 

    Victor ficou em silêncio por alguns instantes antes de continuar. 

    — Quando eu te contei que não sorria há muito tempo, o que você pensou? 

    A pergunta a pegou de surpresa. 

    — Foi um choque — respondeu, depois de refletir alguns segundos. — Não consigo imaginar isso. 

    Ele suspirou, observando a paisagem em volta. 

    — Você já perdeu alguém importante? — perguntou, com a voz levemente trêmula. 

    Aki sentiu o peso da pergunta, mas tentou manter a compostura. Era evidente que aquelas palavras carregavam sentimentos fortes. 

    — Nunca passei por isso — admitiu, cabisbaixa. — Mas imagino que seja o pior sentimento do mundo. — Sua voz saiu quase falha. 

    — E você acha que isso seria motivo o suficiente para não querer mais viver? — perguntou ele, agora com os olhos marejados. Seu semblante transmitia nada além de tristeza.  

    O coração de Aki apertou ao ver a melancolia genuína em seus olhos. Desejava ver alguma emoção no rosto de Victor, além daquela expressão neutra de sempre, quase apático.  

    Ao contrário do que ela esperava, ao ver essa mudança de forma intensa, foi para uma expressão triste, melancólica. Ela suspirou internamente, tentando manter o foco. 

    — Sim — respondeu ela, quase sussurrando. 

    O silêncio tomou conta por alguns instantes, até que ela encontrou forças para falar novamente. 

    — Não sei o que aconteceu, mas acredito que, mesmo quando a vida nos derruba, precisamos juntar nossas forças e seguir em frente. 

    Ela fez uma breve pausa. 

    — Provavelmente, a pessoa que partiu gostaria que você continuasse vivendo da melhor forma possível. 

    Nem Aki entendia de onde tirou essas palavras. A amargura que sentiu no olhar de Victor havia lhe atingido de tal forma, que se sentia em pedaços por dentro. Ele não precisou falar muito para que ela entendesse uma coisa: Ela não fazia ideia do que havia acontecido com ele. 

    Mas isso não significava que ela simplesmente deixaria seu colega naquela situação. Pensou em inúmeras respostas que poderia dar, num curto espaço de tempo. No fim, decidiu apenas deixar as palavras saírem, seguindo seu coração. 

    Victor assentiu lentamente. 

    — Demorei muito tempo para perceber isso. Obrigado por me ouvir… e me desculpa por te envolver nisso. 

    Apesar de ter um bloqueio de sentimentos e ações, Victor realmente se sentiu agradecido à garota por ouvi-lo. A sua intenção desde o início era agradecê-la por fazer ele sorrir naquele dia, mas acabaram naquela situação. 

    Ele respira fundo, para se recompor. Eles já haviam comido e eles estavam em silêncio. 

    — Vamos voltar? — disse ele, após um instante, mais calmo. 

    — Claro. 

    Enquanto voltavam, a dúvida ainda pairava na mente de Aki: “Por que exatamente ele me agradeceu?” 

    … 

    25 de agosto de 2023, sexta-feira. 

    Após um longo dia de trabalho, Aki estava parada na porta da empresa, olhando para o céu cinzento enquanto os pingos de chuva caíam sem parar. Ela suspirou profundamente, lamentando por esquecer o guarda-chuva em casa e não ter trazido uma blusa de frio. Seus braços se arrepiaram com o vento gelado, e ela se encolheu um pouco, desejando estar em algum lugar quente e seco. 

    — Oi, Aki! — chamou uma voz familiar. 

    Ela se virou ligeiramente para confirmar quem era e sorriu ao ver Victor se aproximando. 

    — Oi, Victor! Eu não sabia que ainda estava aqui — disse ela, forçando um sorriso para disfarçar o desconforto do frio enquanto esfregava os braços. 

    — O chefe Akashi queria conversar comigo, então acabei ficando um pouco mais — explicou ele, parando ao lado dela. Com seu tom habitual, neutro e direto, ele perguntou: — Está frio hoje. Não trouxe nenhum agasalho? 

    — Infelizmente não. Esqueci o guarda-chuva e minha blusa de frio não secou a tempo. Pensei que hoje não faria tanto frio — respondeu, um tanto desanimada, enquanto desejava que o uniforme da empresa fosse menos exposto. 

    — Mas assim você pode acabar se resfriando — disse Victor, tirando a própria blusa de frio e estendendo-a para Aki. — Toma, veste isso. 

    Aki piscou surpresa, sentindo o rosto esquentar. Com um pequeno sorriso tímido, pegou a blusa e a colocou. O calor reconfortante do tecido aqueceu seu corpo imediatamente. Tentando não pensar na situação em que estava, ela pergunta: 

    — Você não está com frio? — Ela estava preocupada, enquanto o olhava ajeitar a gola da camisa polo do uniforme, que agora estava sem proteção. 

    — Não se preocupe. Não sou de sentir muito frio, então fico bem assim — respondeu ele, sem alterar a expressão calma. — Você mora perto? 

    — Uns quinze minutos andando — disse ela, apontando na direção de sua casa. 

    — Vamos, eu te acompanho até lá — propôs Victor, abrindo o guarda-chuva e chamando-a para se abrigar. 

    Aki hesitou por um instante, mas aceitou a oferta.  

    Caminharam juntos sob o guarda-chuva, e ela logo notou que Victor inclinava o objeto levemente para protegê-la melhor, deixando seu próprio ombro e lado esquerdo expostos à chuva. Não era um temporal, mas a água acumulava-se rapidamente em suas roupas. 

    Apesar de estarem conversando com mais frequência recentemente, inclusive, hora ou outra, ela conseguia uma resposta dele de algum assunto sem ser de trabalho durante o serviço, não esperava essa atitude. A cada passo que dava, sentia que não queria chegar em casa tão rápido, mas nem ela compreendia o motivo disso. 

    Aki observava o gesto silencioso dele e sentia o coração apertar. “Ele realmente é gentil…” Vários pensamentos invadiam sua cabeça, mas ela logo os afastava. O silêncio também lhe incomodava, embora não soubesse o que falar naquele momento. 

    Mesmo caminhando lado a lado, ela não conseguia evitar a timidez. Pensou em se aproximar mais, mas só a ideia já a fazia sentir as bochechas queimarem. O contato físico entre eles, mesmo que ocasional, era sempre breve. Qualquer coisa, além disso, parecia… complicada. 

    Quando chegaram à porta da casa onde Aki morava, ela virou-se para ele com um sorriso agradecido. 

    — Muito obrigada por tudo, Victor. De verdade. — Seus olhos brilhavam em gratidão. 

    — Não precisa agradecer — respondeu ele, ajustando o guarda-chuva. Uma rajada de vento gelado atravessou a rua, fazendo-o estremecer levemente, seguido por um espirro — Acho melhor eu ir para casa logo e tomar um banho quente. 

    Ele coçou brevemente o nariz, que ficou avermelhado.  

    — É melhor mesmo. Cuide-se para não pegar um resfriado — disse Aki, devolvendo a blusa para ele. 

    Victor aceitou a peça de roupa com um aceno de cabeça e se afastou, caminhando sob a chuva. Aki entrou em casa, mas não resistiu e foi até a janela, espiando-o enquanto ele se distanciava. 

    Sem perceber, um sorriso bobo formou-se em seus lábios. Ela sentia-se aquecida, mesmo que o frio lá fora continuasse. A gentileza de Victor, tão inesperada, a deixou sem jeito e com pensamentos diversos.  

    Começou a pensar em várias possibilidades e acabou se pegando pensando no que poderia ter acontecido com ele. Talvez tivesse perdido um ente querido, como um de seus pais, ou um irmão. Quem sabe, ele poderia ainda ter uma namorada no Brasil.  

    Ela não conseguia organizar direito no que pensava, então decidiu ir tomar um banho quente e ir dormir. Mas mesmo debaixo do chuveiro, sua cabeça ainda parecia que fervilhava com suposições. 

    “Victor… Você é mais do que apenas um rosto sério no escritório, não é?”  

    Ela se joga na cama, após se vestir com seu pijama, enquanto ainda pensava: “O que exatamente aconteceu?” 

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (5 votos)

    Nota