Capítulo 62 - A Mansão II
A mulher formal continuou descendo a escadaria. Seus passos ressoavam com elegância por entre os lustres e colunas. Ao alcançar o último degrau, parou diante dos três. Já parecia alta à distância, mas, frente a frente, Niko e Evelyn se surpreenderam: Hyandra chegava até os chifres de Niko. Devia estar próxima dos dois metros.
— Esta noite está verdadeiramente bela, não concordam? — disse ela, voltando os olhos para cima. — A lua está em seu estágio crescente. Eu adoro esse formato levemente afiado nas extremidades… lembra-me uma lâmina recém-forjada.
Sua voz era suave, quase poética. Niko e Evelyn seguiram o olhar da mulher e notaram uma grande janela circular acima deles, por onde se via o céu estrelado da noite.
— Logo acima da lua… Norvën, a constelação do Caminhante. — continuou ela. — Seus três pontos principais formam a trilha de quem não pertence a lugar algum. Alguns dizem que os que se identificam com ela estão destinados a vagar eternamente… outros acreditam que ela guia seu destino com precisão.
Ela fez uma pausa, como se estivesse à deriva em pensamentos distantes. Seus olhos então mudaram de direção.
— E ali… Veythara. A coroa estilhaçada. — disse com um sorriso de canto. — Suas estrelas formam uma coroa de cinco pontas. Quando uma delas treme, dizem que um governante está prestes a cair… ou que um novo poder está para surgir.
Hyandra então riu, com discrição, como quem se envergonha da própria imaginação.
— Mas claro… são apenas histórias. O céu não dita nosso destino. Só o observa em silêncio…
Niko achou curioso que essas fossem as primeiras palavras de alguém tão misteriosa e imponente. Parecia até mesmo uma abertura informal.
A mulher enfim baixou o olhar, focando em Niko com um sorriso leve. Seu único olho vermelho era intenso, mas não hostil.
— Vocês devem ser Niko e Evelyn. Gregory falou muito bem de vocês. Disse que seriam perfeitos para o trabalho. E agora, vendo que conseguiram concluir a missão em menos de um dia… vejo que ele estava certo.
— Aqui está o colar, senhora. — disse Niko, retirando o objeto do manto e estendendo-o.
— Ah, sim. Muito obrigada. — disse ela, pegando o colar e olhando-o rapidamente antes de guardá-lo no paletó. — E não precisa de tanta formalidade. Pode me chamar apenas de Hyandra. Afinal, é o meu nome.
Niko assentiu levemente, em sinal de respeito.
— Desculpa perguntar, mas… onde está o pagamento? — questionou Evelyn, direta.
— Ah, claro. Mil perdões. — respondeu Hyandra, tirando um envelope dobrado do bolso. — O pagamento está em cheque. Bem aqui.
Evelyn pegou o papel e o examinou. Não estava acostumada com pagamentos em cheque, então virou o envelope de um lado para o outro e o ergueu em direção aos candelabros para enxergar melhor os detalhes, analisando se havia qualquer coisa suspeita. Não encontrou nada.
— Bom… acho que o contrato se encerra aqui, então. Obrigada por tudo. Se quiser nossos serviços de novo, é só ligar para o número que deixei no contrato. — disse ela, já se virando. — Tchau, tchau.
Os dois começaram a se afastar, indo em direção à saída. Mas então…
— Esperem!
Hyandra deu um passo à frente, com o braço estendido, e sua expressão demonstrava um leve nervosismo — quase sentimental.
— Q-quer dizer… que tipo de anfitriã eu seria se deixasse meus convidados saírem assim, sem mais nem menos? Deixem-me ao menos oferecer um jantar. O que acham?
— Um jantar não parece nada mal… especialmente num lugar como esse. — disse Evelyn, animada. — O que acha, Niko?
A proposta era tentadora demais para recusar.
— Eu aceito. — respondeu o garoto, de prontidão.
— Ótimo! — disse Hyandra, aproximando as mãos em frente ao peito, sorridente. — Gregory, leve nossos convidados até a sala de jantar. Eu os alcançarei em breve.
— Como desejar, minha Lady. — disse o mordomo, com uma breve reverência. — Sigam-me, por favor.
Ele caminhou na direção esquerda do salão, e Niko e Evelyn o acompanharam. Passaram por uma nova ala da mansão — um corredor amplo com janelas à esquerda, que revelavam o jardim interno. Podiam ver fontes, esculturas e bancos de pedra, todos delicadamente cobertos de neve.
— Esse lugar é gigante. Quantas pessoas moram aqui? — perguntou Evelyn.
— Apenas eu e minha Lady. Raramente temos convidados. — respondeu Gregory.
A resposta caiu como um cubo de gelo em um copo d’água. Niko e Evelyn se entreolharam brevemente. Aquela mansão imensa, decorada com tantos detalhes, parecia… vazia demais.
— Então você faz toda a limpeza da casa sozinho? — perguntou Niko.
— Sim. A responsabilidade pelos serviços domésticos é minha. Incluindo as refeições. Minha Lady, por outro lado, dedica-se à administração de seus negócios e investimentos.
— Negócios? Ela é dona de alguma empresa? Porque, sinceramente, nunca ouvi falar dela antes. — questionou Evelyn, casualmente.
Gregory parou por meio segundo, como se tivesse se ofendido. Voltou-se ligeiramente para a garota e a encarou com um olhar cortante e gélido.
— Minha Lady é uma acionista e investidora. Ela possui participações discretas em corporações de altíssimo nível. Prefere agir pelas sombras. Enquanto alguns buscam prestígio, ela busca influência real e silenciosa.
Evelyn engoliu em seco. A forma como Gregory respondeu deixou claro que aquele assunto estava encerrado.
— Então por que uma mansão tão grande, se só vocês dois vivem aqui? — arriscou Niko.
Gregory caminhou mais alguns passos antes de responder, sem virar o rosto.
— …Desculpem, não possuo essa informação.
O silêncio voltou a dominar o corredor, desta vez carregado por uma aura de dúvida.
Por fim, Gregory parou diante de uma porta de carvalho escuro, ornada com entalhes elegantes. A abriu com um gesto firme e silencioso.
Do outro lado, estava a sala de jantar. Era um cômodo retangular e simétrico, luxuoso até nos mínimos detalhes. Um longo lustre central iluminava a mesa comprida de madeira escura, decorada com candelabros dourados e castiçais alinhados com precisão.
As cadeiras, altas e estofadas com tecido rubro, formavam uma fileira quase cerimonial — com quatorze assentos no total. Havia pinturas belas nas paredes e cortinas pesadas nas janelas, que impedia a saída da luz dourada.
— Por favor, acomodem-se. O jantar será servido em breve. — disse Gregory, fazendo um gesto polido.
Niko e Evelyn olharam para todas as direções, ainda absorvendo a magnitude do lugar, antes de se dirigirem aos assentos.
Os dois então se acomodaram nas cadeiras altas, sentindo o estofado preencher o formato de seus corpos. Gregory, com a mesma discrição impecável de sempre, fez uma breve reverência e se retirou do salão, fechando a pesada porta de carvalho atrás de si com um leve clique.
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