— E é bem aqui.

    Uma porta com um “37” em bronze foi aberta, dando passagem a um cômodo claro, pintado de amarelo pela luz do corredor. No corredor estava uma garota de cabelos grisalhos e orelhas pontudas, junto de um garoto de chifres de cervo e olhos onde a esclera é preta e a íris branca, eram Evellyn e Niko. Sem nem mesmo esperar mais um segundo, Evellyn passou pela porta.

    — Essa é a minha casa, Niko. Pode se sentir à vontade aqui.

    Niko entrou enquanto observava em volta. Em meio disso, Evellyn fechou a porta do apartamento e tirou sua mochila das costas, colocando-a no chão.

    Ele estava em uma sala de estar branca, à sua esquerda havia uma estante de livros branca, à frente, três cadeiras de madeira maciça com belas curvas e estofamento vermelho, uma pequena mesa clássica com um caderno em cima e uma larga janela com os vidros fechados e as cortinas abertas, com uma mesa de jantar esbelta à sua frente. 

    Na direita, um belo sofá branco com almofadas volumosas, um corredor extenso e a entrada da cozinha. De onde Niko observava, havia alguns armários, um grande balcão com uma pia, um fogão a lenha e alguns barris. Além disso, no chão havia um tapete grande de tons terrosos e dourados, com padrões geométricos e florais, e nas paredes, quadros de flores e paisagens. A combinação dos quadros e do tapete trazia um toque sofisticado e charmoso ao ambiente onde estavam.

    — Então, o que achou? — perguntou a garota com entusiasmo. Ela parecia muito animada em saber a opinião de Niko sobre sua casa.

    — A sala é bem bonita. Gostei dos quadros.

    — Que bom que gostou! Se quiser ver o resto da casa, pode ficar à vontade, afinal, você praticamente já mora aqui.

    Ouvindo que Niko poderia explorar a casa, seu espírito curioso e aventureiro despertou, decidindo ver todos os cômodos do apartamento de Evellyn.

    O ser curioso foi para o corredor, que dava acesso a dois cômodos da casa. No chão havia um tapete como na sala, a diferença mais notável é que era mais largo, se estendendo por toda a passagem. 

    Nas paredes havia alguns quadros de paisagens, assim como na sala de estar. O único quadro que se diferenciava dos outros era um quadro que tinha três pessoas, mais especificamente um homem adulto de terno, uma mulher, também adulta, de vestido e uma criança, todos em pé, compartilhando uma grande semelhança que eram suas orelhas pontudas. Niko estava observando atentamente a foto de moldura elegante até que olhou para Evellyn, que estava o seguindo, com um leve sorriso no rosto.

    — É uma foto minha e dos meus pais. Eu lembro que naquele dia eu fiquei reclamando que demorava muito para a foto ser tirada.

    Após a fala da elfa, o garoto decidiu entrar no primeiro cômodo do corredor. Aquele cômodo era o quarto de Evellyn. Sua cama estava bem ao lado da janela, tinha três travesseiros e uma cabeceira de metal. Próximo à cama havia uma mesa branca, com uma luminária em cima e uma muleta ao lado. À esquerda havia um grande armário de madeira maciça escura e maçanetas de prata. Já à direita havia uma escrivaninha de madeira com uma máquina de escrever e alguns papéis. Ao lado, havia uma porta, chamando a atenção de Niko, que, sem hesitar, resolveu entrar nela.

    Atrás da porta estava o banheiro. Era bem simples, tinha um piso xadrez, uma pia com um armário embaixo, um vaso sanitário, produtos de limpeza e uma banheira com chuveiro onde havia um sabonete, bucha e produtos de cabelo em suas bordas. No banheiro também tinha uma porta, desta vez entre o vaso e a pia. A curiosidade chamou novamente por Niko, que abriu a porta, levando o garoto novamente ao corredor, aquele era o último cômodo da casa.

    — O que achou?

    — A casa é bem legal. Você não tem muitas visitas? Perguntou o que achei da casa duas vezes já.

    — N-não é que eu tenha poucas visitas, eu só gosto de saber a opinião dos outros. Só isso. — disse a garota, envergonhada, mas tentando agir de maneira casual.

    — Se quiser, você pode dormir no sofá. Já que eu não tenho mais uma cama para te emprestar, sem contar que seria bem estranho a gente dormir na mesma cama também.

    Naquele momento, Niko pensou em algo: quando ele tivesse sua própria cama, ele não poderia colocá-la na parede como Evellyn fez, porque seus chifres não o deixariam dormir normalmente. Ele teria então que deixar sua cama um pouco mais para baixo. Quer dizer, ele até poderia colocar a cama que nem a de Evellyn, encostada entre duas paredes, porém teria que dormir para o lado oposto…

    — Niko, você ouviu o que eu disse?

    — Ah, eu ouvi sim, que eu posso dormir no sofá.

    — Uhum.

    Niko então se lembrou de algo graças à oferta bondosa de Evellyn, algo que o deixou confuso, bem confuso. Ele ainda não havia entendido algo. Algo que estava pensando desde quando acabaram a caçada e foram em direção à capital. Algo que o deixou mais confuso ainda quando recebeu parte do pagamento de Evellyn e que estava gritando na cabeça de Niko agora pouco.

    — Até agora eu não entendi o porquê de você estar me ajudando tanto. Me dar parte do seu pagamento, me deixar morar aqui… Isso não faz sentido. A gente se conhece há menos de um dia e, ainda por cima, você não deve nada a mim. Não faz sentido…

    — E precisa fazer?

    Niko era uma pessoa muito lógica. Para ele, tudo que acontecia precisava de um motivo para acontecer. A soma de um por um é dois, isso é um fato, mas esse pensamento de Niko foi parcialmente quebrado depois desse comentário de Evellyn. Ele, antes, que estava confuso e olhando para o chão, ficou surpreso e olhou bem nos olhos de Evellyn.

    — Nem tudo precisa fazer sentido, às vezes as coisas só acontecem e não tem explicação para isso. Como eu disse antes, eu quero te ajudar porque eu quero te ajudar. Um fim em seu próprio meio. Eu não me importo que eu não te deva nada ou coisa do tipo, eu só quero te ajudar, então, só aceita essa ajuda. Pode ser?

    — Tudo bem… pode ser.

    Niko ainda não havia acreditado nessa resposta, mas depois de duas vezes ter escutado a mesma coisa, ele somente aceitou aquilo. Evellyn se espreguiçou, logo depois dizendo:

    — Certo, então. Eu preciso fazer umas coisinhas aqui. Eu tenho um Áxis, é um livrinho de história e geografia, você pode lê-lo enquanto isso. Acho que você vai gostar, além de que saber esse tipo de coisa é importante, é claro.

    Niko concordou silenciosamente, assim os dois foram para a sala. Evellyn entregou a Niko o Áxis. O livro é de tamanho médio, mas bem grosso, chegava facilmente a seiscentas páginas, algo que não poderia ser chamado de “livrinho”.

    Na introdução, falava o que era o livro.  O Áxis é um livro escrito a cada quinhentos anos (atualmente estando em sua 5ª edição), por grandes historiadores visando informar sobre a história, geografia e política do mundo no ano de 4500, uma diferença de dois anos e alguns dias desde o dia de hoje. 

    Niko começou a ler o primeiro capítulo, que era uma introdução ao ano de 4500. Uma breve descrição das principais características do mundo no ano de 4500, destacando as mudanças mais significativas em relação ao presente, resumo dos principais avanços tecnológicos que moldaram a sociedade atual e uma descrição das principais mudanças nas estruturas sociais e econômicas.

    A segunda era sobre os continentes e geografia do mundo, se tinha os continentes de Zyuelm, continente ao oeste e onde Niko estava, o continente de Ocelia, ao leste e maior continente do mundo, e de Devitte ao norte, uma grande península quadriculada de bioma de deserto. Estavam escritas as informações dos continentes junto de alguns mapas informativos de política, biomas, entre vários outros, que Niko ficou observando atentamente por vários minutos.

    Enquanto Niko lia sobre o primeiro capítulo, Evellyn estava tomando banho e, quando saiu, Niko acabou de iniciar a leitura sobre os continentes. Ela estava com outra roupa, desta vez mais casual. Tinha um longo casaco e calça preta, junto de um cachecol cinza, e estava usando aquela muleta que estava em seu quarto. Agora, sem as luvas cobrindo suas mãos, era possível ver algumas cicatrizes em suas mãos e dedos.

    — Essa roupa ficou boa em você, mas por que a muleta?

    — Ah, esqueci de te falar.

    Evellyn se sentou na cadeira ao lado de Niko, apoiou a muleta na parede e levantou uma perna de sua calça até a altura próxima do joelho. No momento em que Evellyn se sentou, Niko recebeu a resposta sem mesmo Evellyn falar.

    — Eu não tenho uma parte da minha perna esquerda. Mais especificamente, a minha canela. Legal, né?

    — Isso não parece ser muito legal não. Desculpa pela pergunta, Evellyn.

    — Tem problema não, bobo. Eu não ligo para isso.

    — Você perdeu na guerra?

    — …É, foi lá mesmo…

    Vendo o quão desconfortável Evellyn ficou com aquela pergunta, Niko até foi se desculpar, mas a voz não saía de sua garganta. Ele estava tão envergonhado que nem foi capaz de fazer isso, logo só ficou calado, voltando a ler o Áxis, enquanto tentava se esquecer daquilo.

    Assim, Evellyn pegou o caderno que estava em cima da pequena mesa e começou a escrever algo nele. A rua em que Evellyn, e consequentemente agora Niko, morava era bem silenciosa e pacífica. Era de se esperar, eles estavam bem distantes do centro da cidade e das áreas comerciais. Esse silêncio todo ajudará Niko a ler o Áxis até que…

    — Ahh, finalmente acabei.

    Evellyn deu um grande suspiro e colocou o caderno na mesinha novamente, agora, junto de uma caneta.

    — O quê?

    — Minha agenda, objetivos futuros e anotações pessoais. Já que você apareceu do nada, eu tive que mudar bastante coisa. Ah, eu tenho que te levar em um lugar. — disse a garota enquanto se levantava, seguindo em direção ao seu quarto.

    Após um minuto, ela estava de volta, agora com sua prótese novamente. Ela chegou perto da porta, a abrindo.

    — Ah, e lembra de trazer todo seu dinheiro.

    Após essas palavras, Niko pegou um marcador de páginas que estava ao seu lado, colocando-o na página em que parou de ler, a página 54. Se levantou e seguiu Evellyn.

    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (1 votos)

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.

    Nota