Capítulo 2431 - Portões da Cidade
A última parada que Aiko decidiu fazer foi nos arredores da cidade, longe do lago.
Ela e o Pequeno Ling viajavam em uma carruagem aberta puxada por um Eco, com o cocheiro sentado no banco, em uma pose relaxada. O menino olhava ao redor com curiosidade, tendo passado a maior parte da vida perto do lago — a rua que seguiam era uma das principais vias de Bastion, cortando todo o caminho da costa até os portões da cidade. Havia muitas paisagens fascinantes.
Os portões em si não eram muito impressionantes, na verdade, não havia portão algum, apenas um amplo espaço aberto onde as caravanas que partiam se reuniam antes de embarcar na perigosa jornada através dos confins terríveis do Reino dos Sonhos, e onde as caravanas maltratadas que chegavam paravam.
Algumas das caravanas transportavam colonos, outras, cargas. Destas últimas, algumas eram carregadas com recursos necessários que o Domínio fornecia às cidades periféricas do Leste, enquanto outras pertenciam a comerciantes empreendedores. Atender as caravanas era uma indústria por si só.
Assim, um bazar animado cresceu ao redor do portão, com inúmeras barracas, inúmeras hospedarias e lojas de todos os tipos. Na verdade, o Bazar era uma pequena cidade por si só, com muitas pessoas morando ali permanentemente.
Em ambos os lados do portão inexistente, muros altos separavam Bastion da vastidão selvagem além. Os muros eram altos, mas também não muito impressionantes. Na verdade, eram pouco mais que montes de terra compactada — isso porque a construção ainda estava em andamento, e esta era apenas uma medida temporária.
Bastion era uma vasta cidade do Domínio e, além disso, situava-se no Reino dos Sonhos — que poderia ter sido colonizado por humanos, mas não domesticado. Como resultado, protegê-lo foi uma tarefa titânica. A construção da muralha da cidade era de suma importância, mas estava levando tempo.
Os humanos não eram estranhos à construção de grandes barreiras ao redor de suas cidades, mas este não era o mundo desperto, com sua tecnologia sofisticada e infraestrutura expansiva. Construir qualquer coisa no Reino dos Sonhos era muito mais difícil porque as pessoas não tinham máquinas potentes, fábricas automatizadas e enormes fundições. Em vez disso, porém, eles tinham Despertos, Mestres e Santos — razão pela qual construir um muro ao redor de uma cidade tão extensa quanto Bastion era sequer possível.
No entanto, não havia dois Despertos iguais, então as muralhas de Bastion eram um tanto peculiares. Algumas seções haviam sido construídas com terra compactada, outras com pedra, outras com madeira ou metal. Algumas eram até compostas por muitos troncos de árvores imponentes que haviam se fundido, enquanto outras eram feitas de espinhos e silvas.
Um pequeno exército de Despertos patrulhava as muralhas dia e noite, e um exército maior de construtores ainda trabalhava duro para transformá-las em uma fortificação inexpugnável.
“Uau.”
O pequeno Ling observou a visão animada do bazar com os olhos arregalados.
“Tanta gente! E aqueles Ecos! Uau!”
Desembarcando da carruagem, Aiko ofereceu-lhe a mão e sorriu.
“Muitos aromas, não é? Não se empolgue.”
O menino cheirou o ar algumas vezes e sorriu.
“Que delícia! Que delícia, que delícia, que delícia! Tia Aiko, podemos comer?”
Ela assentiu seriamente.
“Claro! Daqui a pouco.”
Com isso, ela olhou ao redor do bazar. Enquanto o Pequeno Ling estava ocupado buscando o aroma mais delicioso, Aiko se virou para o cocheiro e apontou para um dos prédios próximos.
“Uma pousada nova? Desde quando ela existe?”
O cocheiro balançou a cabeça.
“Aquele não é uma pousada.”
Aiko lançou-lhe um olhar estranho.
O homem era extremamente bonito e se portava com uma postura galante — era bastante estranho ver alguém tão distinto conduzindo uma carruagem Eco, para dizer o mínimo. Ela emitiu um sinal mental. Bem, é claro que o motorista era bonito, galante e sonhador. Afinal, ele era o Mestre Quentin.
Aiko sabia que, se algo acontecesse, o Pequeno Ling seria capaz de se defender melhor do que ela. Nada se comparava à força de um Transcendente, criança ou não, enquanto ela era uma mísera Desperta. Ainda assim, ela não levaria o precioso filho de Effie para a cidade sem proteção confiável.
Então, Quentin foi rebaixado a cocheiro por um dia, levando-os por Bastion desde a manhã. É claro que o homem não reclamou. Lembrando a si mesma que ele já tinha dono, Aiko reprimiu o impulso de piscar para ele e ergueu uma sobrancelha.
“Oh?”
Quentin assentiu.
“É uma igreja.”
Ela franziu a testa ligeiramente.
“Você quer dizer uma daquelas salas de meditação estranhas onde as pessoas definitivamente não rezam para Nephis?”
Ele riu baixinho.
“Não, esta é uma igreja de verdade. Igreja da Lua, ou algo assim. É um cultozinho. Esses caras também são, em sua maioria, inofensivos. Costumavam ser um bando de andarilhos, viajando com caravanas e oferecendo bênçãos por viagens seguras. Mas as coisas parecem estar melhorando para eles, considerando que conseguiram comprar este prédio.”
Aiko piscou algumas vezes.
“Igreja da Lua? Eles adoram o Deus das Bestas? O morto?”
Quentin balançou a cabeça.
“Não, eles só adoram a lua. Na minha opinião, viajar e guiar pessoas é mais uma coisa do Deus da Tempestade. Mas eu não sou muito versado em religiões, então o que eu sei?”
Aiko estudou a modesta igreja, que não parecia mais opulenta do que as pousadas ao redor, e franziu os lábios.
“Que pena. Eu estava de olho naquele lugar. Meu Deus, esses esquisitões crescem mesmo como cogumelos. De onde eles vêm, afinal? Nunca tinha ouvido falar de cultos antes.”
Quentin assentiu.
“O governo costumava ser rigoroso com isso. Além disso, não é fácil reunir zelo religioso em um mundo onde os deuses estão mortos e o Feitiço do Pesadelo existe. Mas as coisas são diferentes agora. Lady Nephis estava certa em compartilhar a verdade sobre o destino que aguarda a Terra com o povo, mas nem todos conseguem suportar o peso da verdade. Então, as pessoas estão recorrendo a todos os tipos de coisas para acalmar seu medo.”
“É verdade.”
Ele se virou e olhou para a silhueta distante da Ilha de Marfim flutuando alto no céu acima da cidade.
“A maioria está se voltando para a Chama Imortal. Por que acreditar em qualquer outra coisa se existe uma deusa literal olhando por você lá de cima?”
Aiko assentiu.
“Bem, ou um semideus excêntrico olhando para você das sombras.”
Ela lançou um longo olhar para Quentin.
“Ainda assim. Esta Igreja da Lua. Você fez algum relatório sobre isso?”
Ele sorriu fracamente.
“Há tantas seitas pequenas surgindo aqui e ali hoje em dia que é impossível fazer um relatório individual sobre cada uma delas. Mas estamos compilando informações para fazer um relatório em lote depois do solstício, quando as coisas se acalmarem um pouco.”
Aiko assentiu novamente.
“Ótimo. Quero saber tudo o que há para saber sobre esses ‘cultistas inofensivos’. Você sabe o que está em jogo.”
Quentin a estudou por um momento e então suspirou.
“Lady Aiko. Sabe, seria muito mais fácil para nós se soubéssemos exatamente o que estamos procurando.”
Ela balançou a cabeça e desviou o olhar.
“Algumas coisas são perigosas demais para serem descobertas. E algumas se tornam ainda mais perigosas quanto mais pessoas as conhecem. Há um motivo para o Chefe manter todo mundo no escuro, então confie no julgamento dele.”
Aiko sabia mais do que a maioria, mas nem mesmo ela tinha sido informada de tudo. A ameaça que a Estrela da Mudança e o Senhor das Sombras pareciam tão cautelosos era aparentemente de um tipo que jamais deveria ser mencionado em voz alta.
“Tia Aiko! Olha! Olha!”
O pequeno Ling puxou a mão dela, apontando para a estrada animadamente. Lá, uma caravana destruída se aproximava da cidade.
Aiko sorriu levemente.

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