Índice de Capítulo

    Foi então que, de forma repentina, um barulho distante cortou a conversa ao meio. Um rangido de madeira, seguido de vozes masculinas abafadas.

    — A porta tava fechada. Cê não tinha deixado ela aberta mais cedo? — disse alguém, provavelmente um guarda, a poucos metros de onde o grupo estava.

    — Eu não lembro, tipo, sei lá. Isso importa mesmo? — respondeu o outro, mais cético.

    O trio congelou ao ouvir aqueles sons tão próximos deles. Niko imediatamente apagou a lanterna e fez um gesto brusco com a mão, ordenando silêncio e para escondessem o mais rápido possível. Evelyn rapidamente juntou os documentos espalhados pelo chão com os que já estavam nas suas mãos, enfiando-os de volta na pasta com movimentos ágeis, quase desesperados. 

    Brigitte se esgueirou para trás de uma estante enferrujada, pressionando as costas contra o metal frio. Evelyn correu para uma sala lateral e se encolheu atrás da porta. E Niko deslizou para baixo de uma mesa de arquivo, com o peito espremido contra o chão.

    O silêncio do trio era tão denso que só se ouvia o som dos próprios batimentos acelerados. Todos ali estavam tensos, firmes, mantendo os olhos fixos na porta. Niko estava segurando com força uma de suas facas, mas todos estavam prontos para reagir se preciso.

    — Tô te falando, tem alguma coisa estranha. Essa porta tava fechada. Eu tenho certeza. — insistiu o guarda de voz tensa.

    — O vento pode ter empurrado ela. Vai saber. — resmungou o outro, indiferente.

    Passos ecoaram pelo corredor, agora mais altos. Cada batida no concreto parecia mais alta do que deveria, como se o galpão amplificasse a ameaça. Niko prendeu a respiração, e Brigitte engoliu seco. O som parou. Eles estavam bem na frente da sala.

    — Então… você vai ficar parado aí mesmo ou o quê? — provocou o segundo guarda.

    O guarda desconfiado finalmente entrou. Seu casaco grosso passou pelo batente, e andou em passos curtos, varrendo cada canto do ambiente com desconfiança, sem dizer uma única palavra. Ele checou o armário já aberto, moveu a cadeira com a ponta do pé e se inclinou sobre a mesa. Depois caminhou até o painel falso. Parou ali. Agachou. Sua mão deslizou sobre a parede e bateu de leve os dedos. Ele franziu a testa.

    Sob a mesa, Niko estava em um turbilhão de pensamentos: “Será que a Evelyn deixou tudo certo com os documentos? Se ele abrir, vai notar algo suspeito? O que a gente vai fazer caso a gente precise atacar?”. Pensar em cada uma dessas coisas fazia sua cabeça doer. Pensar em futuros que eles foram descobertos fazia sua cabeça doer.

    Foi então que uma faísca surgiu na mente de Niko. Se ele tivesse deixado uma marca de Alma lá fora, momentos antes de ter entrado no pátio, nada disso teria acontecido. A raiva subiu por não ter pensado naquela opção antes. Se sentiu burro, idiota.

    Que saco!”, pensou.

    Mas o homem hesitou. Tocou mais uma vez, resmungou algo inaudível e se levantou.

    — Leo, não tem nada aqui. — disse o parceiro do lado de fora, impaciente. — Tipo, mesmo se alguém tivesse invadido, o que ele faria num setor abandonado da estação? Não tem nada aqui. — bufou. — Vamo logo, tá quase acabando meu turno.

    O guarda tenso pareceu ignorar o parceiro por um segundo. Ainda olhando a sala com certa desconfiança, como se sentisse que algo estava fora do lugar. Mas ele não tinha provas para sustentar seu desconforto. No fim, acabou cedendo, se virou e saiu da sala, fechando a porta em um estalo seco.

    O som das botas ecoou pelo corredor mais uma vez e, pouco a pouco, sumiu. O silêncio voltou a reinar no setor abandonado, dando fôlego ao trio.

    Niko soltou o ar preso nos pulmões e, ao tentar se levantar, bateu o chifre no alto da mesa, falando um “ah” baixinho. O som ecoou baixo, mas suficiente para Brigitte perceber e um sorriso genuíno surgir em seu rosto.

    — Isso foi por pouco. — sussurrou ele, massageando a cabeça e ligando novamente a lanterna de mão.

    Brigitte saiu de trás da estante, coberta de poeira. Bateu as mãos contra a roupa, soltando pequenas nuvens cinzentas.

    — Sim… eu já tava pronta pra atacar se encontrassem a gente. Será que eles fazem parte do esquema?

    Evelyn emergiu da saleta, entre séria e aliviada, fixando o olhar na porta.

    — Não sei. Mas aquele primeiro guarda… ele foi direto pra cá. Isso não pode ser coincidência.

    — Se têm funcionários corruptos aqui, significa que o esquema é maior do que pensávamos… — completou Brigitte.

    Niko coçou a nuca, irritado. A culpa que carregava antes agora se misturava com frustração. A cada nova camada revelada, tudo parecia mais impossível de se resolver. Até mesmo pensou na possibilidade de não conseguirem encontrar o dríade há tempo.

    Sacudiu a cabeça, afastando a dúvida. Pensar naquelas opções não ajudava, pelo contrário, somente trazia mais desesperança. Niko firmou os pés no chão, não deixando dúvida e incerteza o consumir. Precisava ser persistente agora, determinado.

    — Isso só prova que a gente não pode vacilar. — disse ele, ajustando o manto. — Agora que temos um nome… temos que sair daqui e agir antes que eles descubram que invadimos esse lugar.

    — Concordo. — disse Evelyn, já se dirigindo à saída em passos silenciosos. — Não vale a pena arriscar mais por hoje. O importante é que a gente conseguiu o que precisava.

    Ela abriu a porta devagar, espiando o corredor antes de avançar. Niko era o próximo. Quando ele estava para atravessar a porta, um som o impediu de continuar.

    — Niko… — disse Brigitte, hesitante.

    O garoto se virou. Ela estava alguns passos atrás, com o rosto iluminado pela lanterna que carregava.

    — Eu só queria dizer… que tenho certeza que vamos encontrar o garoto. — falou firme, erguendo os punhos cerrados contra o peito, quase como uma oração. — Eu acredito nisso. Eu sei que a gente se conhece a pouco tempo, mas você se esforçou pra me ajudar quando eu mais precisava… Eu sei que você não vai desistir de salvar o dríade. Então eu também não vou. — terminou com um grande sorriso no rosto.

    O albocerno a encarou por um instante. Aquilo era justamente o que ele precisava. Esperança. Um sopro leve que limpava a culpa que o sufocava. Um sorriso pequeno, mas sincero, brotou em seus lábios.

    — Obrigado. — disse, baixinho, antes de voltar a segui-las pelo corredor.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota