Múltiplos passos ecoavam no túnel subterrâneo em que o trio entrou. O estreito caminho por onde os três estavam passando no momento, e que Niko estava com o pescoço inclinado para frente, dado que seus longos chifres não deixavam ele passar da mesma maneira que as duas garotas, era completamente escuro. Evellyn liderava o grupo com a lanterna, iluminando o pouco do caminho que a chama amarela conseguia.

    Após alguns instantes caminhando, a elfa encontrou enfim o que parecia ser o final do túnel.

    — Eu acho que a gente chegou no final do caminho, gente. — anunciou ela aos outros dois.

    Atravessando o outro lado do corredor, eles chegaram a um espaço ligeiramente mais aberto. Antes, no túnel, o ambiente era mais estreito e os três mal cabiam lá, e tinham que andar em fila, já agora, podiam ficar lado a lado. Todos ficaram aliviados com o novo ambiente, principalmente Niko, que não iria mais sofrer com aquela dor no pescoço de antes, podendo ficar com a sua postura normal.

    Brigitte se esticou ao sair do túnel, fazendo suas costas estalarem um pouco, dando um suspiro em seguida.

    — Ainda bem que a gente não vai mais ficar naquele lugar apertado. Mercias ols Anlxus.

    — Realmente está bem melhor agora. — comentou Niko. — Mas onde a gente está agora?

    Olhando ao redor, era possível ver longos caminhos à frente, com alguns suportes de madeira presos nas paredes e no teto. No chão, havia linhas de metal, semelhantes a trilhos.

    — Parece que é uma mina… — disse Evellyn. — Ah, lembra que aquele homem disse que tinha um sistema de minas perto da vila? Acho que a gente chegou nele.

    Niko olhou ao redor, analisando os detalhes do lugar. A estrutura de madeira era velha, com algumas vigas já meio apodrecidas pelo tempo. Os trilhos no chão estavam enferrujados, cobertos por uma fina camada de poeira e terra acumulada ao longo dos anos.

    — Se isso realmente for uma mina abandonada, ela deve ter várias saídas e caminhos interligados. — comentou ele, cruzando os braços. — Se o invasor veio daqui, ele pode estar em qualquer lugar. Isso se ainda estiver aqui.

    Evellyn passou a mão na parede de pedra fria, observando as pequenas rachaduras na estrutura.

    — Talvez essa mina tenha sido construída durante a guerra. Muitos lugares como esse foram desativados depois que o conflito acabou. É um bo- não, é um ótimo esconderijo.

    — Então é bom a gente começar a procurar pelo nosso invasor o mais rápido possível. — falou Brigitte.

    — O problema é que a gente não sabe por onde começar. Essas minas podem se estender por quilômetros.

    Brigitte olhou para os túneis infinitos à frente, impaciente por não estar fazendo nada.

    — Bom, ficar parados aqui não vai ajudar. Acho que vou dar uma olhada mais à frente.

    — Tem certeza disso? — perguntou o albocerno inclinando a cabeça.

    — Claro! Eu consigo voltar num instante!

    — Então é melhor levar isso com você. — Niko tirou de seu manto uma adaga e uma lanterna de mão, estendendo-a para Brigitte. — Depois de uns minutos eu posso usar o Portal para você voltar para nós mais facilmente.

    A Puorvilliana piscou algumas vezes, então pegou os objetos com um sorriso no rosto, guardando a arma em seu bolso e ligando a lanterna de mão, fazendo-a iluminar os corredores das minas, apontando a luz para um dos túneis, escolhendo aquele para começar a busca.

    — Certo. Já volto!

    Assim, ela disparou pelo corredor em alta velocidade, desaparecendo na escuridão, com somente o eco de seus passos distorcidos pela alta velocidade podendo serem ouvidos pela dupla. Com Brigitte saindo, Evellyn suspirou, passando a mão no rosto.

    — Ainda fico impressionada com o quão rápida essa garota é.

    A garota então se apoiou nas paredes geladas da caverna artificial, com a mão direita em seu bolso e a esquerda segurando a lanterna. Depois de uma breve bufada, ela soltou suas forças, se sentando e colocando a lanterna no chão empoeirado.

    — Será que foi uma boa o plano dela? Alguém pode atacar ela. E se for alguém forte como a Hyandra?

    Niko abaixou os olhos por um instante, pensando na pergunta de Evellyn. Então, se lembrou de quem estavam falando, estavam falando de Brigitte, alguém de grande força física e de espírito ainda maior.

    — Aquela garota é forte. Acredito que ela vai ficar bem. E mesmo se algo der errado eu ainda posso puxar ela pelo Portal.

    — Hum, acho que você não teria dito isso alguns dias atrás.

    — Também acho… — respondeu ele enquanto se sentava ao lado da amiga.

    — Então finalmente confia nela?

    — Confiar não é bem a palavra. Mas… eu já passei tempo o suficiente com ela para saber que não é uma espiã ou alguém ruim.

    — Isso quer dizer que ela finalmente subiu no seu ranking pessoal de confiança?

    — Algo assim. — respondeu o garoto olhando de lado para Evellyn.

    — Ela ficaria feliz em saber disso.

    Então o silêncio veio, contaminando os tuneis durante alguns poucos minutos. Evellyn ergueu a lanterna do chão, iluminando melhor as vigas de madeira que sustentavam o teto da mina. Algumas estavam rachadas, outras cobertas por marcas antigas de picaretas e ferrugem.

    — Eu conheço esse tipo de construção. — disse ela, ainda sentada, passando os dedos por uma das vigas. — Essas minas provavelmente foram escavadas durante a guerra.

    — Você tem certeza?

    — Sim. — Evellyn assentiu. — Quando eu servi, vi mapas de túneis assim. Muitas cidades cavaram passagens subterrâneas para mover suprimentos ou proteger civis dos bombardeios. Algumas minas antigas foram reabertas às pressas e depois simplesmente abandonadas quando não eram mais necessárias.

    — Então esse lugar deve ter sido um desses túneis de transporte.

    — Uhum.

    Niko olhou ao redor, analisando a estrutura com mais atenção, percebendo agora que havia toda uma história por trás daquilo. Um lugar que pessoas iam e vinham antes, mas agora…

    — Engraçado… na época, um lugar desses podia decidir o destino de uma batalha. Agora, está apodrecendo debaixo da terra sem ninguém lembrar mais dele. — comentou a elfa.

    O albocerno permaneceu em silêncio por um momento, processando as palavras da garota.

    — As coisas mudam. — disse Niko.

    — É. Mudam mesmo.

    Terminada a conversa, Niko e Evellyn ficaram em silêncio. O garoto ficou de olhos fechados, pensando em algumas coisas que o incomodavam, enquanto isso, e elfa ficou somente olhando a chama queimar dentro da lanterna metálica.

    — Evellyn, acha que eu já devia usar o Po

    Antes que Niko pudesse terminar sua frase, um estrondo ecoou sobre a mina como um trovão subterrâneo. O som parecia que tinha entrado no peito dos dois, seguido por um choque seco que fez as vigas de madeira rangerem, parecendo que se romperiam a qualquer momento. Niko e Evellyn ficaram completamente assustados, não sabendo quem ou o que teria produzido aquilo.

    — O que foi isso?! — falou Evellyn, com os olhos arregalados.

    Depois daquele ataque, a primeira coisa que Niko pode pensar era em Brigitte. Será que a garota estava bem? Ela foi atingida por aquilo? Será que ela corre algum perigo? Por que o garoto estava se perguntando sobre isso? CLARO QUE ELA ESTAVA EM APUROS! AQUELA IDEIA DE DEIXAR ELA SOZINHA FOI HORRÍVEL!

    Niko ativou sua Alma. Esperou. Nada. Tentou de novo. Silêncio. Um arrepio subiu sua espinha. A faca… sumiu?

    — O quê? Droga!

    — O que foi, Niko?

    — Eu não consigo usar o Portal da faca que deixei com a Brigitte!

    Sem a marca de Alma, não teria como trazer a garota de volta, isso significava que teriam de agir de outra maneira para trazer Brigitte de volta para o grupo. 

    — A gente precisa agir logo. Ela pode estar correndo perigo agora!

    Ele não podia ficar naquele local sem fazer nada enquanto sua companheira estava com a vida em risco. As pernas do albocerno se mexeram sozinhas, indo em direção à escuridão por puro instinto.

    — Ei! Espera! — Evellyn gritou, mas ele não ouviu. Ou melhor, ouviu, mas não conseguia parar.

    A garota estava seguindo Niko, enquanto ele passava pelos corredores estreitos e escuros, onde, mesmo com a única fonte de luz ali estando longe dele, conseguia ver tudo com exatidão. Seu coração batia forte, seu corpo ficou frio e suas mãos estavam tremendo. Ele não sabia para onde estava indo, só sabia que tinha que chegar até Brigitte.

    Ele virou um corredor, depois outro corredor e outro novamente. Para onde ela tinha ido? Para onde estava indo? Aonde de fato ele teria que ir?

    — Niko, espera um pouco! A gente nem sabe onde é para ir! — Evellyn gritou atrás dele.

    Naquele instante, Niko percebeu que seria inútil agir sem um plano. Ele sabia disso desde o começo da corrida, mas aquele estrondo foi tão assustador que ele não agiu racionalmente, estava com medo, medo em relação ao que estava acontecendo com Brigitte e medo do que ele e Evellyn teriam de enfrentar.

    Niko freou o passo, os pés deslizando sobre a poeira acumulada no chão da mina. Ele respirava rápido, os pulmões queimando pela corrida sem sentido. Evellyn parou próxima a ele, ofegante.

    — A gente precisa de um plano primeiro, correr de um lado para o outro não vai adiantar nada. — disse ela.

    Niko apertou os punhos. O silêncio ao redor deles parecia errado, estava incomodando-o. Nenhum som além do gotejar distante de água pingando das paredes.

    — Tem razão. — disse Niko. — Onde será que el-

    Antes que pudesse terminar a frase, algo o derrubou. O impacto ecoou pelo túnel. O peso esmagava seu peito. Garras rasparam contra sua roupa, quase perfurando a pele. Algo rápido, feroz e animal.

    A luz fraca da lanterna de Evellyn iluminou uma máscara branca de grandes olhos, fria e lisa como porcelana, com pequenas rachaduras nos cantos e uma boca cerrilhada que podia abrir e fechar. O brilho escarlate dos olhos por trás da máscara reluziu nas aberturas, quando os olhos do agressor se encontraram com os olhos de Niko. A boca cerrilhada da máscara abriu, mostrando uma parte da verdadeira face daquilo. O ghoul.

    — Sai de cima dele!

    Evellyn criou um enorme porrete de gelo, deixando a lanterna cair e atacando o monstro com força no momento em que abriu a boca. O ghoul foi lançado em direção à escuridão da caverna, fazendo uma acrobacia impressionante, usando suas garras para ficar de joelhos, enquanto Niko se levantou e pegou sua foice, se preparando para o combate.

    O ghoul logo se levantou, encarando os dois na escuridão. Ele usava um casaco longo de couro negro, um colete por debaixo e luvas de couro bem ajustadas às suas garras negras. Mesmo sendo um monstro, ele passava um ar de nobreza sombria.

    — Isso me trouxe algumas lembranças. A única coisa de diferente é que naquela época você não tinha essa elfa ao seu lado. — disse a criatura.

    Aquela fala deixou Niko curioso. “Naquela época? Como assim?”. Mas antes que pudesse continuar pensando naquilo, ouviu de Evellyn, com o ar ficando mais frio ao redor:

    — Niko, vá atrás da Brigitte. Eu seguro esse desgraçado aqui.

    Niko hesitou por um instante, estando vidrado com os olhos vermelhos do ghoul que brilhavam na escuridão. A presença da criatura era sufocante, quase paralisante, mas ele sabia que Evellyn estava falando sério.

    — Você tem certeza?

    — Vai logo! Ela precisa de mais ajuda do que eu!

    Niko não queria deixar Evellyn para trás, aquilo parecia ser forte o bastante para derrotar Evellyn. Mas, se permanecer ali, Brigitte continuaria em perigo e, considerando o quão poderosa foi aquela explosão, ela estava correndo um grande risco de vida agora.

    Niko apertou os punhos. Seu instinto gritava para ficar e ajudar, mas o tempo estava contra ele. Ele lançou um último olhar para Evellyn, que estava olhando de canto para o garoto, enquanto mantinha a postura firme e confiante. Deu um suspiro e voltou a correr pelas sombras, agora, sem a garota para o seguir.

    O ghoul emitiu um som, entre um grunhido e um suspiro, enquanto inclinava um pouco a cabeça. Sua voz era estranhamente normal, mas, ao mesmo tempo, distorcida, como se houvesse algo viscoso no final de sua língua.

    — Então você vai ser minha adversária?

    — Pode apostar que sim. — respondeu a elfa de prontidão, sorrindo e girando o porrete na mão.

    O ghoul abriu um sorriso invisível por trás da máscara.

    — Vou adorar roer seus ossos depois dessa luta.

    O garoto continuou seguindo os escuros corredores da caverna, procurando por qualquer vestígio de que estaria próximo de Brigitte. Sua respiração pesava enquanto seus passos ecoavam pela mina. Foi então que avistou algo, um brilho, vindo de longe. Ele esperava encontrar Brigitte, com a lanterna de mão que Niko tinha dado, mas ao chegar mais perto da luz encontrou duas figuras, de roupas e máscaras parecidas com a do ghoul. Observando-o sem fazer nenhum movimento ou emitir algum som.

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