Capítulo 5 - A Conversa II
Sua mente acelerou. Mesmo não entendendo, algo havia acontecido. Sentiu euforia e confusão. Euforia, pois, agora sabia que tinha alguma espécie de Alma e confusão porque não entendia como ela funcionava.
Niko, curioso, arremessou novamente a arma branca — desta vez perto da fogueira, que crepitava alto com um cheiro de madeira queimada. Fechou os olhos, visualizou novamente a mesma esfera de energia, e fez com que pulsasse com mais força agora.
No mesmo instante, apareceu ao lado de Evelyn.
— WHOAH! — gritou ela, batendo a cabeça na árvore de susto. — Niko! Você me assustou! Como você fez isso? Será que essa é a sua Alma?
Niko não respondeu de imediato. Ainda estava pensando no que aconteceu. Aos poucos, sua mente começava a conectar os pontos. Ele podia se mover até o local onde a faca caísse instantaneamente. Praticamente se teleportar. A lâmina, com o símbolo, era o foco. Ele não só podia se mover — podia mover objetos. Decidiu que chamaria essa habilidade de “portal”.
— Acho que sim. Vo-
— Como funciona isso? Como você conseguiu aparecer do nada do meu lado?! Como?! Como?!? — perguntou ela, esperando uma resposta do garoto com os olhos brilhando de emoção, quase pulando de ansiedade.
— Eu jogo uma faca e apareço no lugar que lancei ela.
— Aff… que resposta sem graça. — murmurou Evelyn, cruzando os braços e se inclinando pra trás, decepcionada.
Niko revirou os olhos, aborrecido com a resposta abusada de Evelyn. Mas seguiu o fluxo da conversa. Ainda tinha muitas dúvidas.
— Você disse que tinha “o sangue da família Gélis”, certo? E eu? Qual é a minha família?
O garoto sentia uma curiosidade gritante em relação ao próprio passado — queria saber de onde veio, quem havia sido, se teve amigos ou uma família. Quando ouviu que seu sangue talvez pudesse oferecer uma pista, não hesitou: agarrou aquela oportunidade com força, como se fosse a única coisa que importava no mundo.
— Eu não conheço ninguém que também consiga desaparecer e reaparecer em um piscar de olhos… então você deve ser é um Independente.
— O que é isso?
— Basicamente, alguém que tem Alma ganha ela de duas maneiras. A primeira é por família — que é o meu caso e é o caso da maioria das pessoas. Já o outro é quando a Alma da pessoa ignora essa relação sanguínea e cria um novo tipo de Alma, que, se tiver descendentes — e muita sorte — se torna uma nova família. Menos de um por cento das pessoas que tem Alma são Independentes. Pode se considerar sortudo.
A esperança que Niko agarrou se despedaçou em suas mãos como pó. Diferente do que Evelyn disse, ele não tinha sorte nenhuma nisso. Niko queria respostas sobre seu passado, e o fato de ser um Independente dificultava ainda mais essa busca.
— Evelyn… tem alguma ideia do porquê eu perdi minhas memórias?
— Você tem algum formigamento ou marca brilhante no corpo? Ou alguma sensação estranha quando usa sua Alma?
— Não.
— Então, eu não faço a menor ideia do porquê. Tenho certeza de que você não está com nenhum problema de saúde. Você é jovem e não tem nenhum ferimento aparente. Pode ser algo relacionado a algum trauma cerebral tão forte que você perdeu as suas memórias, mas se fosse isso, você estaria provavelmente machucado, então, teoria descartada.
O garoto pensou que já estava no fundo do poço quando soube que não conseguiria encontrar sua família pela Alma, e não podia descer mais. Mas quando ouviu que Evelyn não tinha nenhuma ideia da perda de suas memórias, pareceu que o chão abaixo de si se rachou e o puxou para ainda mais para baixo, afogando-o dentro na água do poço escuro.
— Eu só tenho mais uma pergunta, Evelyn.
— Pode falar.
— Que dia, mês e ano são?
— Hoje é dia trinta e sete do mês de Dubvi do ano de 4502. Comecinho do inverno.
Todas as suas perguntas foram respondidas no momento. Agora, Niko acreditava saber sobre o mínimo de como sobreviver naquele mundo.
— Eu me sinto um pouco culpado…
— Ué? Por quê?
— Você me salvou quando estava prestes a ser envenenado, me deu comida e respondeu todas as minhas perguntas. Você me ajudou de verdade e não pediu nada em troca. Eu te agradeço. De verdade.
Enquanto Niko agradecia à moça de cabelos brancos, ela estava sorrindo, deixando sua presa saltada à mostra, enquanto dava umas risadinhas bem suspeitas. Apoiou uma perna em cima do joelho, reclinou na árvore e apoiou os braços atrás da cabeça. Aquela era uma posição de alguém convencido.
— E quem disse que eu não iria pedir nada em troca, hein?
— …?
— Já que tá me devendo, pode pagar com uma tarefa simples.
Niko não se importava em pagar a dívida que tinha com Evelyn. Mas do jeito que ela falava o deixava um pouco irritado. Aquilo estava começando a deixar ele arrependido de ter dito aquilo.
— Eu pensei que você não fosse pedir nada…
— Eu tenho cara de quem faz caridade? — retrucou ela, com um sorriso debochado. — Gosto de ganhar o máximo de dinheiro com o mínimo de esforço. E, já que você tá por aqui… vai caçar o lufador por mim. Pode ser? Só avisando que eu estou procurando por um há dois dias. Eles são bem difíceis de encontrar, ao menos se não quiser que eles te encontrem primeiro. Quanto mais cedo você começar, mais rápido vai acabar e mais rápido eu vou ganhar meu dinheiro.
Ele subestimou a ganância da mulher. O título que ela carregava não era à toa. Aquela maldita elfa colocou alguém que praticamente nasceu hoje para caçar um animal, que ela mesma disse ser muito perigoso.
— Mas esse animal não é muito perigoso?
— Nah, eu confio que você dá conta. Sua Alma é perfeita pra esse tipo de coisa. Se der ruim, é só aparecer de novo no acampamento. — o sorriso irritante dela se alargou, com os olhos cobertos por sombra, que aumentava mais ainda sua aura maligna. Era quase demoníaco.
— Você é mesmo uma mercenária.
— Eu sei disso. Muito obrigada! — respondeu com deboche, dando um sorriso largo na direção do garoto.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.