Índice de Capítulo

    O veículo seguia em direção à fazenda por uma longa estrada coberta de neve. O céu, coberto por nuvens pesadas, pintava a paisagem em um cinza pálido e gelado. Niko permanecia na parte de trás da carroça, calado, enquanto Brigitte e Evelyn seguiam na frente. Mesmo com o clima depreciativo, a recruta se mantinha animada, com os cotovelos apoiados na lateral do veículo, observando o horizonte com empolgação.

    — Eu sinto que essa missão vai ser emocionante! Um mistério e três investigadores. — disse ela, sorrindo. — Vou escrever um conto sobre isso depois.

    — Um conto? — Evelyn levantou a sobrancelha.

    — Exatamente! É um bom jeito de deixar registradas as minhas aventuras. Uma boa heroína precisa de boas histórias pra contar.

    — Eu gostaria muito de saber como você vai transformar a morte de um boi numa trama fantástica. — comentou Evelyn, com um sorriso discreto, ajeitando o cachecol.

    Brigitte apontou um dedo para ela, determinada.

    — Toda grande história começa com um detalhe simples. Um assassinato pode parecer apenas um crime qualquer… até que você descobre que a vítima era um rei disfarçado! Um ataque sem rastros ou pegadas? Isso pode ser algo muito maior do que a gente imagina.

    — Eu duvido um pouco disso, mas… espero que você esteja certa.

    — Eu tenho certeza que estou!

    Niko, atrás das duas, desviou o olhar para o lado, observando as árvores por detrás da carroça. Não disse nada, apenas coçou o queixo levemente. Aquela empolgação descomplicada ainda o incomodava de forma que ele não sabia explicar.

    Após mais alguns minutos, a carroça virou em direção a uma cerca de madeira e seguiu até a entrada da Fazenda Ostrav. O terreno era amplo, com construções robustas rodeadas por terras vastas. À direita, havia um celeiro de madeira escura que se destacava contra a neve. Mais adiante, duas casas — uma menor e outra maior com uma chaminé que soltava um rastro de fumaça no céu pálido.

    A carroça parou diante do casarão de dois andares. Evelyn foi a primeira a descer, colocando a mochila nas costas com rapidez.

    — Certo. Aqui estamos.

    Brigitte saltou do veículo com um impulso leve, batendo as botas no solo gelado. Niko desceu em silêncio logo atrás, sem pressa. Seus olhos passearam atentamente pelo terreno. Mesmo ali, em uma fazenda aparentemente segura, ele já procurava por saídas, padrões e possíveis riscos.

    Antes que pudessem se aproximar da casa, a porta se abriu. Um rapaz magro, de cerca de dezessete anos, saiu. Tinha cabelos castanho-claros, roupas simples e um olhar desconfiado. Cruzou os braços à frente do corpo, tentando se impor.

    — Quem são v’ocês? — perguntou ele.

    O garoto tinha um sotaque levemente caipira e falava de forma hesitante. Parecia alguém introvertido, pouco acostumado a lidar com estranhos.

    — Somos os mercenários contratados para cuidar da morte do boi. — respondeu Evelyn com calma.

    O garoto passou a mão na nuca, bufou e acenou com a cabeça.

    — Esperem aqui.

    Assim, ele voltou para dentro da casa, deixando os três do lado de fora. Brigitte inclinou levemente a cabeça, confusa.

    — Ele não pareceu muito animado em nos ver… Será que fizemos algo de errado?

    — Eu espero que não. — murmurou Evelyn.

    — Acho que ele só não está acostumado com mercenários. — acrescentou Niko, sem alterar o tom.

    — É, é bem possível.

    Mesmo dizendo isso, ele continuou observando as expressões da garota com atenção. A preocupação dela parecia sincera. Talvez até demais.

    A porta se abriu novamente. Um homem de meia-idade saiu com passos firmes. Era alto, tinha os ombros largos e as mãos calejadas pelo trabalho bruto. Seu rosto tinha marcas do cansaço, e o olhar atento pesou sobre os três.

    — Então ocês são o pessoal que contratei. Entrem, precisamu conversar. — disse ele, com um sotaque interiorano bem mais forte que o do rapaz.

    — Agora sim, vamos falar de negócios. — falou a elfa mercenária, sorrindo.

    Ela entrou primeiro. Brigitte a seguiu, lançando olhares curiosos para tudo ao redor. Niko foi o último, lançando um rápido olhar ao céu nublado antes de fechar a porta atrás de si.

    O interior da casa era aconchegante. A sala de estar era ampla — tinha cerca de sete metros de altura e dois andares —, iluminada por um candelabro central, três sofás bem cuidados, pilares ornamentados, relógio de pêndulo e um grande tapete circular no centro.

    O trio observava o lugar com curiosidade e admiração, principalmente Brigitte, que parecia estar em outro mundo, estando em um lugar que nunca pensou que estaria, ficando com a boca aberta e olhos brilhando.

    Mesmo com a beleza do lugar, o fazendeiro não se deteve. Cruzou a sala sem cerimônia e guiou o grupo por um corredor com várias portas, até uma sala de jantar bem simples comparado à sala de estar. Havia uma chaleira no centro da mesa, ao lado de xícaras de cerâmica bem enfeitadas.

    O senhor Keller se sentou em uma das cadeiras, exatamente no centro e os três mercenários tomaram lugar diante dele.

    Ele pegou a chaleira e colocou um pouco da bebida de dentro em uma das xícaras, servindo-se.

    — Querem um pouco d’chá?

    — Sim, por favor. — responderam os três.

    O fazendeiro serviu as xícaras com um líquido rubro de aroma forte. Brigitte foi a primeira a provar, e um sorriso iluminou seu rosto.

    — Isso é bom!

    — Chá d’Tai Gyang. Cortesia da Companhia Comercial d’Huangzhi. Ajuda a manter o corpu aquecido nesses invernos rigorosu. — explicou Sigurd, antes de tomar um gole. Depois, pousou os braços sobre a mesa e olhou para Evelyn. — Agora, vamos falar de negócios.

    Evelyn colocou a xícara de lado e cruzou os braços, adotando uma postura mais séria.

    — Antes de tudo… vamos esclarecer os termos. Você quer que investiguemos a morte do boi, certo?

    — Não só isso. Quero que fiquem na fazenda por alguns dias. Até ter certeza d’que isso não vai se repeti. Se tem alguma coisa espreitando meus animais, preciso garantir que não vou perder mais nenhum.

    — Além da investigação, também faremos a segurança do local. — concluiu Niko.

    — Exatamente. — assentiu Sigurd. — Vão patrulhar à noite e investigar durante o dia. Conversem com os empregados, procurem pistas, façam o que precisar.

    — E a hospedagem? — perguntou Niko.

    — Ocês ficam na casa de hóspedes, atrás da minha. Não é luxuosa, mas é confortávi o bastante.

    — Isso parece ótimo! Eu nunca fiquei em uma fazenda antes! — disse Brigitte, animada.

    Niko observou o brilho nos olhos dela. Aquele entusiasmo parecia incansável. Ele tomou um gole do chá, sem tirar os olhos da garota, não dizendo nada.

    — O pagamento é dois mil Yzakel. Daqui a quatro dias. Se acharem o culpado, dou mil a mais. — completou Sigurd.

    Evelyn cruzou os braços e olhou para Niko e Brigitte.

    — Algum de vocês tem alguma objeção?

    Niko apenas negou com a cabeça. Brigitte fez o mesmo, mas com o indicador.

    — Então temos um acordo. — Evelyn voltou-se para Sigurd e estendeu a mão. — Vamos resolver isso.

    O fazendeiro apertou a mão dela com firmeza, firmando oficialmente o contrato.

    — Ótimo. Agora que iss’tá resolvido, vamos falar sobre o boi.

    Ele deu o último gole do chá, respirou fundo, e começou.

    — O animal foi encontrado morto ontí de manhã, no celeiro. O local tava trancado por dentro, sem sinal de invasão. Ninguém ouviu nada durante a noite toda.

    — Como estava o corpo? — perguntou Niko, firme.

    O fazendeiro respirou fundo antes de responder.

    — Quando recebi a notícia, achei que a morte foi natural. Mas… tinha ferimentos estranhos. Cortes fundos. E as duas patas traseiras estavam… arrancadas. Era como se algo tivesse devorado uma parte dele.

    — Alguma criatura selvagem? — sugeriu Brigitte.

    — Impossívi. O celeiro tava fechado e não tinha rastro nenhum. Foi algo mais do que bicho que fez iss’o.

    Enquanto isso, Evelyn apoiou os cotovelos na mesa, pensativa.

    — Por que não chamou a polícia?

    — Chamei. Mas eles disseru que não podiaum fazer nada. Como não houve roubo e não tinha parecid’o que uma pessoa fez iss’o, só registraram e foram embora. Pode acredita numa coisa dessas?

    — Alguém viu ou ouviu algo?

    — E quanto aos seus empregados? Alguém viu ou ouviu alguma coisa quando isso aconteceu?

    — Alguns disseru ter visto sombras perto do celeiro nos últimos dias, mas ninguém soube dizer o que era. E, sinceramente, pode muito bem ter sido só o vento balançando as árvores.

    — O corpo do animal ainda está lá?

    — Não. Eu mandei retira du celeiro. Tá guardadu numa sala separada.

    — Vamos precisar analisá-lo.

    — Claro, só deixe eu apresentá-los onde ocês vão fica primeiro.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 0% (0 votos)

    Nota