Capítulo 81 - As Descobertas
O sol ainda nem havia surgido quando Evelyn desceu as escadas. Os últimos resquícios da madrugada ainda estavam à mostra pelas janelas, a noite em tons azulados e frios. Ela bocejou discretamente, enrolada em um cobertor, e caminhou até a lareira já quase extinta.
Niko estava na poltrona, sentado de lado com os cotovelos nos joelhos, os olhos estavam fixos nas janelas, procurando algum movimento estranho e os ouvidos atentos a qualquer som suspeito. Não parecia cansado — mas também não parecia pleno.
— Minha vez. — disse Evelyn, com voz ainda sonolenta.
Niko ergueu os olhos. Levantou-se sem dizer nada, ajeitando o manto nos ombros. Passou por ela devagar, como se qualquer passo mais forte pudesse acordar Brigitte, que ainda dormia encolhida no sofá, com o rosto semi-escondido entre a coberta e a almofada.
— Tá tudo bem? — perguntou Evelyn, já se acomodando na poltrona.
Niko hesitou por um segundo antes de responder:
— Por enquanto, sim.
Por um instante, houve silêncio. Ele começou a subir as escadas, mas parou no segundo degrau. Virou levemente o rosto, ainda sem encará-la completamente.
— …Obrigado pelo que me disse mais cedo.
Evelyn ergueu uma sobrancelha, surpresa.
— Você sempre agradece assim? De costas e murmurando?
Ele suspirou pelo nariz, com um sorrisinho quase imperceptível.
— Melhor do que nada.
Ela riu de leve, mas o silêncio voltou por um momento. Então, Evelyn se recostou na poltrona, com os olhos ainda fixos em Niko.
— Isso significa que você não leu o caderno?
Niko parou. A pergunta foi direta, mas sem tom de acusação. Era apenas uma dúvida que precisava ser respondida. Desceu novamente para o primeiro andar e se virou para a elfa. Ele não tentou mentir.
— Na verdade… eu li, sim. — disse, baixo. — Mas parei. Não li até o final.
Evelyn não respondeu de imediato. Apenas respirou fundo, como se processasse a resposta com mais calma do que gostaria.
— Ela era uma espiã?
— Não…
— Entendi.
Ela não parecia com raiva. Mas estava claramente desapontada — isso era nítido em seu olhar. A lareira soltou uma centelha e o vento lá fora parecia soprar mais forte. Depois de um instante, ela disse:
— Ela confia em você, sabia?
— Eu sei…
— Então retribui isso. Confia nela.
Ele apenas assentiu devagar. Não podia voltar no passado e consertar seu erro, mas agir no presente e construir um futuro melhor, sim.
— É o que eu vou fazer.
Assim, ele voltou as escadas, sem dizer mais nada.
***
O sol finalmente nasceu, sua luz suave começou a preencher os cômodos, tingindo de dourado as cortinas e o chão de madeira da casa de hóspedes. O cheiro do chá esquentando na chaleira, misturado ao de pão fresco, pairava na cozinha e na mesa de jantar.
Brigitte só acordou por volta do fim da manhã. Seus passos eram arrastados e lentos, a jaqueta ainda estava torta, e o cabelo, embora preso em um rabo de cavalo, não tinha mais as folhas presas de ontem.
— Booooom diaaa~~ — disse ela enquanto se espreguiçava, encostando na parede do corredor. — Quantas horas eu dormi?
Evelyn, sentada à mesa, fingiu olhar para um relógio imaginário.
— O suficiente pra eu pensar que você não acordaria mais.
Brigitte esfregou as mãos contra o rosto, sem nenhuma dignidade.
— Hm… eu tô acordada. De ser um milagre, então.
Niko estava perto do fogão, segurando uma tigela nas mãos e vendo algo esquentar no fogo. Esperando o momento certo para a sopa ficar pronta.
— Você ronca. — disse ele, direto, como se fosse um diagnóstico.
Brigitte arregalou os olhos, desacreditada.
— Eu quê?! É MENTIRA!
— Não é mentira. — respondeu ele, sem mudar o tom, colocando um pouco de sopa na tigela. — Você ronca mesmo. Muito alto.
Brigitte estreitou os olhos, ofendida com a afirmação sem fundamentos de Niko.
— Eu nunca ronquei na vida! — rebateu, cruzando os braços. — Uma heroína bonita como eu roncar? Impossível.
Brigitte foi até a mesa de jantar, puxou e jogou o corpo sobre a cadeira, deixando os braços caírem. Deu um longo suspiro quando as costas encontraram a parte fofinha de veludo da cadeira.
— Tá, esquece… o que tá acontecendo? Já tão decidindo o plano do dia sem mim?
Evelyn trocou um olhar com Niko antes de responder.
— Mais ou menos. Íamos te chamar em alguns minutos. Eu e Niko vamos conversar com os funcionários da fazenda. Alguns podem saber de algo. Ou mentir mal o bastante pra gente perceber.
— E eu? O que eu faço?
Niko colocou a tigela de sopa sobre a mesa, à frente da garota.
— Obrigada.
— Você já explorou toda a floresta ontem? — perguntou ele.
— Eu olhei bastante coisa… Se eu não me engano faltou a parte mais ao sudoeste, aquela parte da fazenda que não tem nada.
Brigitte pegou a colher, colocou um pouco da sopa vermelha no utensílio, soprando o vapor antes de provar. Fez um pequeno som de aprovação.
— Então você vai vasculhar lá hoje?
— Afirmativo, senhor. — disse ela com um ar teatral cansado, antes de engolir o segundo gole da sopa. — Vou cobrir cada mato, cada pedra e se tiver alguma minhoca suspeita, eu interrogo ela também.
Brigitte puxou seu caderninho do bolso, abrindo e anotando algo rapidamente.
— Vou encontrar pistas melhores que ontem. Prometo.
Ela fechou e guardou novamente o caderno. Comeu o resto da sopa rapidamente, se levantou, já indo em direção à porta, girando a maçaneta. Antes que pudesse sair, Niko disse:
— Brigitte.
Ela virou o rosto, surpresa.
— Obrigado. A gente nem estaria fazendo esse contrato se não fosse por você, e eu tô adorando fazer ele. Obrigado.
A garota congelou por um segundo. Um sorriso diferente apareceu — não o usual exagerado e performático, mas um pequeno, genuíno, meio desajeitado. Palavras não foram necessárias para demonstrar sua gratidão, ela apenas assentiu, feliz.
E então, sem dizer mais nada, saiu para o longo dia. A porta se fechou atrás dela com um clique leve, deixando o ambiente mais solitário.
Evelyn e Niko se entreolharam.
— E você achava que ela era uma espiã… — murmurou Evelyn, balançando a cabeça com um sorriso torto.
— Eu já mudei sobre isso. Você não vai deixar de pegar no meu pé, não?
— Uhm… naum.
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