Capítulo 92 - A Verdade
As duas figuras mascaradas estavam diante de Niko. A figura da esquerda tinha uma estatura baixa e aparência feminina, pouco mais alta que ele. Vestia um uniforme tático preto junto de uma saia irregular. Ela usava um capuz que cobria a maior parte do rosto, escondendo os cabelos prateados que se dividiam em dois e a máscara de tecido que usava.
Já a da direita parecia ser de um homem, mais alto, com cerca de um metro e oitenta. Também vestia roupas negras, mas bem mais refinadas, parecendo de uso profissional, diferente do estilo improvisado da companheira. No cinto, carregava duas armas de fogo — uma em cada lado. E sobre o rosto, usava uma máscara de pano preta com uma caveira branca estampada. Ele parecia a própria personificação do anonimato e da violência.
Seja quem fosse aqueles dois, era evidente que estavam ligados ao ghoul. Talvez até fossem os responsáveis pela explosão de momentos atrás. Niko mantinha a contagem mental desde o início do encontro.
Dez segundos. Dez segundos se passaram e nenhum deles havia feito um único movimento agressivo. Se não fosse pela respiração e movimentação sutil do braços, ele teria acreditado que eram estátuas.
Mas o albocerno não podia se dar ao luxo de esperar. A cada segundo que perdia ali, Brigitte podia estar em risco. Ainda assim, ignorar os dois seria suicídio. Ele precisava encontrar uma forma de sair daquela situação com rapidez e inteligência. E vivo.
Mas havia algo que o incomodava profundamente: por que eles não atacaram ainda? Estariam apenas ganhando tempo? Ou preparando algo? O silêncio era incômodo, denso. Sem respostas, Niko se precaveu. Firmou a foice com a mão direita e, com a esquerda, puxou discretamente a pistola sob o manto, mantendo-a escondida, mas pronta para atirar caso precisasse.
— Primeiramente, uma apresentação seria adequada para iniciarmos este encontro. — disse o homem à direita, com um tom respeitosamente formal.
— De fato, de fato. Um momento tão especial exige boas maneiras e certa elegância. — completou a da esquerda, com uma entonação tão formal quanto..
Niko recuou o rosto. “Apresentação? Encontro especial?”, pensou ele. A abordagem era estranha. Não esperava isso, não conseguia entender. Aqueles eram seus inimigos, sem dúvida — mas por que aquele tom formal? Estavam encenando? Era uma armadilha?
— Meu nome é Väinö. — cumprimentou a figura maior, dando uma pequena reverência.
— E eu sou Dahlia. — cumprimentou a figura menor, repetindo o gesto com leveza.
Mesmo confuso e com a mente tomada por perguntas, Niko não baixou a guarda. Muito pelo contrário, intensificou-a. Vasculhou o ambiente com o olhar em busca de armadilhas, prestou atenção nos sons ao redor, no ar em seu rosto — qualquer coisa que pudesse explicar aquela abordagem absurda.
Após a reverência, os dois voltaram à postura ereta, como marionetes voltando à pose inicial após concluírem uma cena de teatro.
— E você? Qual é o seu nome? — perguntou Väinö.
Niko hesitou por um instante. Revelar seu nome? Algo dentro dele dizia que deveria falar. Além disso, enquanto estivessem bloqueando seu caminho, ele jamais alcançaria Brigitte. A melhor opção era jogar o jogo deles — por enquanto.
— Niko. Meu nome é Niko.
— Tem certeza disso?
A pergunta cortou o ar como uma lâmina. Niko sentiu o peso dela. Primeiro a abordagem pacífica, agora aquilo. “Tem certeza?”. Se dissesse que sim estaria mentindo. O nome “Niko” não era seu verdadeiro nome, sua verdadeira identidade. Era um presente de Evelyn, dado no dia em que se conheceram. Antes disso, não existia “Niko”, existia somente um fantasma sem nome. E antes do fantasma sem nome, não havia nada. Nenhuma lembrança. Nada
— O que você quer dizer com isso?
— Quero dizer que esse não é seu verdadeiro nome. Estou errado?
Não, ele não estava errado. Mesmo assim, Niko não respondeu.
O garoto apenas bufou. Estava desconfortável. Um suor frio escorreu pela testa. Um arrepio subiu por sua espinha, mas nunca chegou a se manifestar por completo. Aquele homem sabia demais. Sobre ele. Sobre um passado que nem ele conhecia. Que nem se lembrava.
— Vou considerar isso como uma confirmação. — continuou Väinö, com calma. — A essa altura, você deve desconfiar que exista alguma relação entre nós. Somente não sabe como ela é. Mas quer saber. Quer entender qual é essa conexão.
— E o que te faz pensar isso?
— Sua sede de respostas. Você poderia muito bem ter levado uma vida comum após aquele dia. Mas não levou. Não quis levar. Procurou por pistas. Se envolveu em tudo isso. Presenciou a morte diversas vezes e mesmo assim continuou a procurar pelo seu passado. Você quer saber quem é de verdade. E tudo o que tem agora são perguntas sem respostas. Você quer tê-las.
O arrepio finalmente veio. Cortante. A respiração ficou mais pesada. O corpo de Niko tremia levemente. Aquele homem o lia como se fosse um livro aberto. Seus objetivos, dúvidas, sua própria origem. O que mais ele sabia?
“Quem é ele?”
— Você realmente é alguém bem quieto, mas eu sei exatamente o que você deseja. — continuou Väinö, com um tom quase gentil. — Nós somos uma organização revolucionária. E você foi um de nós. Um membro da Skarshyn.
O nome bateu como um trovão. Niko sentiu a garganta secar por um momento. Skarshyn? Ele fazia parte daquilo? A ideia parecia absurda. Não havia nenhuma lembrança, nenhum eco do passado confirmava aquilo. Mas e se fosse verdade? Teria mesmo como ser?
— Eu não acredito nisso. Você está mentindo. — disse ele, tentando manter a firmeza na voz.
— Estou sendo completamente honesto com você. Não tenho razão para mentir. Você fez parte da nossa organização. Isso é a verdade
— Tem alguma prova?
— …Infelizmente, não. Mas juro que falo a verdade.
Niko estreitou os olhos, observando cada gesto de Väinö. O homem parecia calmo demais para alguém que afirmava algo tão inacreditável. Dahlia, ao lado, ainda permanecia imóvel, quase etérea.
— E espera que eu simplesmente acredite nisso? Que tipo de idiota você acha que eu sou?
— Idiota, não. Mas um homem buscando por respostas. Você quer saber de onde veio. Quer descobrir quem realmente é. Porque até agora você não tem nenhuma resposta. Zero.
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