Prólogo - O Louco
Era uma manhã fria. A neve cobria quase completamente uma densa floresta. Ao sul, havia uma cadeia de grandes montanhas se estendendo até o leste, enquanto ao norte uma floresta seguia sem fim, até onde os olhos não conseguiam mais enxergar. O céu brilhava com uma luz pálida e azulada, que contrastava com o solo ainda escuro — não totalmente, pois a claridade se filtrava pelas folhas escuras das árvores, mesmo que com pouco intensidade.
No meio desse ambiente calmo e aparentemente inóspito, havia um ser pálido, envolto em um manto negro, encostado a uma árvore — talvez dormindo. Seu corpo imóvel se destacava na paisagem silenciosa. Tinha a aparência jovem, próxima a de um adolescente, com cabelos brancos, médios, e grandes chifres de cervo saindo do topo de sua cabeça.
Quando o fantasma acordou, seus estranhos e curiosos olhos foram revelados ao mundo. As escleras eram negras como a noite e as íris grandes, dilatadas, e completamente brancas, como a lua cheia.
O garoto despertou com calma, seus olhos estavam fixos no ambiente coberto de neve, olhando cada parte da floresta com curiosidade. Acima, entre os galhos, avistou uma ave de plumagem macia, nos tons do inverno: marrom, cinza e branco. Seus olhos eram largos, amarelos e atentos. Era uma coruja.
A ave o observava fixamente, como se estivesse o estudando. Os olhares se cruzaram — e, em seguida, a ave levantou voo silenciosamente, sumindo por entre as árvores.
Incentivado pela coruja, o fantasma de chifres começou a se levantar, ansioso por sair daquele lugar gelado e entediante. Ao se mover, ouviu um som metálico abafado vindo de dentro do manto. E a neve acumulada sobre suas roupas e cabeça deslizou e caiu quando se sacudiu.
Ao olhar para o lado direito, notou um instrumento longo no chão. Abaixou-se, emitindo novamente aquele som metálico. Era uma grande foice — com uma lâmina tão larga que poderia arrancar sua cabeça com um único golpe.
Ele aproximou o rosto da lâmina espelhada, vendo seu reflexo surgir em meio ao metal. “Esse sou eu…”, pensou, analisando seu rosto por completo com muita atenção. Quando estava satisfeito com o próprio reflexo, percebeu algo fixo as suas costas e, após fazer uma rápida ligação de pontos, guardou a arma na bainha.
Sentindo-se incomodado com o som vindo de seu manto, o ser decidiu investigar a razão do barulho. Com o braço esquerdo levantado para o lado, percebeu, apesar da dificuldade por conta da falta de luz, espécies de pedaços de madeira — dezenas deles — todos com um estranho símbolo de círculo e linha, cada um guardado em um bolso próprio.
O ser sem nome puxou um desses objetos estranhos para ver o que de fato eram: eram facas, com no máximo quinze centímetros de lâmina e um formato incomum.
Ele então guardou a arma no mesmo bolso de onde a tirou. Acreditando ter investigado tudo que podia, caminhou por alguns segundos para frente, até acabar entrando em uma estrada de terra, agora coberta pela neve, completamente vazia. De um lado, ele observou árvores altas cobertas de neve; do outro, viu cadeias de montanhas.
No momento em que olhou para as montanhas, uma luz amarela intensa cobriu sua visão. Por reflexo, colocou o braço diante do rosto para se proteger daquele clarão. Havia amanhecido.
Acostumando-se com a luz do dia, o fantasma abaixou seu braço e olhou, inspirado, para o nascer do sol. Afinal, era um novo dia — um dia que começou e nunca mais voltaria. Ele precisava aproveitá-lo ao máximo possível.
O garoto então se virou para trás, esperou um pouco, e começou a andar, seguindo o caminho em direção ao norte, aonde iria até onde o destino o levasse.
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