O som das ondas quebrando contra a costa ainda ecoava na mente de Nix enquanto caminhava pela trilha estreita que a levaria de volta a Drakensberg. O vento frio chicoteava seu rosto, trazendo o cheiro salgado do mar misturado à umidade pesada que anunciava uma tempestade iminente.

    Ela apertava o passo, tentando afastar a imagem de Fallon parada na praia, os olhos confusos e feridos. O arrependimento era uma presença constante, um peso invisível que se agarrava a sua pele. Mas não podia voltar atrás. A cada passo, a escolha da irmã parecia mais distante, e a necessidade de se esconder se tornava sua única certeza.

    O Cais das Lágrimas estava irreconhecível. Nix se lançou ao céu, suas asas, agora feitas de névoa, ocultando-a entre as sombras das vielas. O vento sussurrava em seus ouvidos: “Monstro… Salvador… Monstro…”

    O coro não cessava.

    Nix aterrissou, o coração batendo contra as costelas, e encontrou quem procurava. Ali, diante de Kaelena, sentia-se pequena. Sentia-se fraca. A paladina permaneceu imóvel, a armadura prateada agora opaca, marcada por cicatrizes de batalhas recentes. Sua espada, porém, brilhava como se renovada.

    — Você está bem? — A voz de Nix saiu hesitante. Seus olhos turquesa cintilaram sob o capuz negro. — Ainda posso te chamar de amiga?

    Kaelena não sorriu. Seu rosto era uma máscara de dever, mas o olhar roxo traía alívio.

    — Eu te vi. No templo… o que você fez lá…

    Nix baixou a cabeça, sentindo o peito apertar.

    — Eu sei… — murmurou. — Eles me deram motivos.

    Kaelena cruzou os braços, sem pressa em responder. Estava avaliando-a.

    — Há muitas histórias sobre você. — Seu tom era neutro, sem acusação nem aprovação. — Algumas dizem que é uma assassina impiedosa. Outras, que é a filha do Caos. Algumas até afirmam que você só quer destruir tudo ao seu redor.

    Nix sentiu a raiva se misturar ao cansaço. O ar ao seu redor vibrou, a magia desordenada estalando no espaço vazio.

    — E você? — Sua voz saiu mais áspera do que pretendia. — O que acha?

    Kaelena manteve o olhar firme.

    — Eu acho que as histórias não importam tanto quanto as ações.

    Nix piscou, surpresa.

    — O que isso quer dizer?

    A paladina inclinou a cabeça ligeiramente.

    — Que ainda estou observando.

    O vento soprou forte entre elas, fazendo os mantos de Kaelena esvoaçarem. Nix fechou os punhos, tensa.

    — Você não tem medo de mim?

    Kaelena ergueu uma sobrancelha, como se a pergunta fosse absurda.

    — Eu tenho medo do que você pode se tornar. Mas não do que você é agora.

    Nix desviou o olhar para o horizonte, onde o Templo da Lua se erguia contra as nuvens pesadas.

    — Existe uma garota lá. Fallon. A “Santa da Lua”. — Seus punhos se cerraram. — Minha irmã.

    Kaelena assentiu levemente.

    — Sei quem ela é.

    — Quero que a proteja. — A voz de Nix saiu mais baixa, quase suplicante. — Quando eu estiver longe… quando o caos me consumir… alguém precisa garantir que ela não seja apenas mais uma vela apagada pelos desejos alheios.

    Kaelena estudou Nix por um longo momento.

    — Eu faço o que acredito ser certo, não o que me pedem.

    A resposta fez Nix encará-la com um misto de frustração e expectativa.

    — Isso quer dizer que não vai ajudá-la?

    — Isso quer dizer que, se eu acreditar que ela precisa de proteção, eu a protegerei.

    Nix abriu a boca para retrucar, mas parou. Algo na resposta de Kaelena a desarmou.

    — Então você nunca vai confiar em mim?

    Kaelena deu um passo à frente.

    — Se você quer que eu confie, me mostre quem você é. Não com palavras, nem com promessas. Mas com o que faz daqui para frente.

    O silêncio se instalou entre elas.

    Nix respirou fundo, tentando encontrar algo para dizer. Mas nada veio. Então, sem outra palavra, virou-se e se lançou ao céu.

    Kaelena observou até a figura desaparecer entre as nuvens carregadas de chuva.

    No Templo da Lua, distante, um cântico começou.

    A tempestade estava chegando.


    Ao alcançar os limites da cidade, o céu escureceu ainda mais, e as primeiras gotas de chuva começaram a cair. As ruas estavam quase desertas, com apenas alguns moradores correndo para se abrigar. Nix puxou o capuz da capa para cobrir o rosto, desejando passar despercebida.

    O porto de Drakensberg era pequeno, mas movimentado mesmo com o mau tempo. Barcos de pesca balançavam nas ondas agitadas, enquanto mercadores apressados protegiam suas mercadorias da chuva crescente. Nix aproximou-se de um velho marinheiro que estava amarrando as cordas de um barco simples.

    — Está indo para Karnor? — Ela perguntou, a voz rouca pelo cansaço.

    O homem olhou para ela, avaliando-a por um momento antes de assentir.

    — Partimos em uma hora, se o tempo permitir. Vai pagar quanto?

    — O suficiente. — Nix puxou algumas moedas do bolso, o suficiente para garantir sua passagem sem levantar suspeitas.

    O marinheiro deu de ombros, pegou o dinheiro e indicou o barco.

    — Suba quando estiver pronta.

    Ela agradeceu com um leve aceno e afastou-se, encontrando um canto próximo ao cais onde pudesse esperar. A chuva agora caía em torrentes, encharcando suas roupas e colando os fios curtos de cabelo em sua testa.


    Enquanto o céu desabava sobre ela, Nix deixou a mente vagar. Pensou em Zander, no olhar sereno que ele sempre tinha, mesmo nos momentos mais difíceis. Será que ele estava bem? Ela nem havia conseguido avisar ele no meio daquela confusão. Uma parte dela queria voltar, atravessar o mar e confirmar que ele estava seguro. Mas outra parte, a mais racional, sabia que sua presença só traria mais perigo para ele e para sua família.

    “Ele é forte,” ela pensou, tentando se convencer. “Eles todos são. E eu só… complico tudo.”

    As ondas batiam com força contra os pilares do cais, e o som preenchia o silêncio ao redor. Ela fechou os olhos por um momento, sentindo a água escorrer pelo rosto como se a chuva pudesse lavar não apenas a sujeira da estrada, mas também a culpa que carregava.

    Quando finalmente o marinheiro a chamou para embarcar, Nix levantou-se e caminhou até o barco, os passos pesados. Quando chegou a Karnor eram 6 da manhã e o sol começava a despertar.


    A mansão de Andréa Fae, geralmente repleta de cores e vida, parecia engolida por uma sombra pesada. As cortinas de veludo escuro bloqueavam o sol, e o ar, antes perfumado com o cheiro de flores e chá fresco, estava denso e parado.

    Nix entrou pela porta da frente, o som de seus passos ecoando pelos corredores silenciosos. Sua capa, ainda úmida da chuva, pingava no piso de mármore. O silêncio era sufocante, e algo dentro dela apertou o peito.

    Ao chegar à sala principal, encontrou Andréa sentada em uma poltrona perto da janela, as asas de borboleta, geralmente brilhantes e erguidas, agora pendiam inertes em suas costas. Seus olhos, normalmente radiantes, estavam avermelhados, fixos no chão.

    Ao lado dela, Panacéia se destacava, alta e elegante como sempre. Suas asas, semelhantes às de Andréa, eram maiores e mais opacas, com tons de azul profundo e preto. Apesar de sua postura ereta, havia uma rigidez em seus movimentos, como se a dor a tivesse petrificado. Panacéia, irmã mais velha de Andréa, era uma presença imponente. Conhecida por sua mente afiada e suas mãos habilidosas, ela dirigia uma das maiores companhias de construção naval do país, mas naquela manhã, não parecia uma líder poderosa. Parecia apenas uma irmã em luto. Morfeus estava encostado na lareira, os braços cruzados e a cauda imóvel. Suas orelhas de gato estavam abaixadas, e os olhos turquesa brilhavam com um misto de raiva e tristeza. Ele parecia estar à beira de explodir, mas se mantinha contido, talvez por respeito à dor das irmãs.

    Nix parou na entrada, o coração disparado.

    — O que aconteceu? — A voz dela quebrou o silêncio.

    Andréa ergueu o olhar lentamente, como se as palavras fossem um peso insuportável.

    — Zander morreu, Nix.

    A frase pareceu tirar o ar dos pulmões dela.

    — Não… isso… não pode ser. — A voz de Nix tremia. — Como?

    Morfeus foi o primeiro a responder, sua voz grave preenchendo o ambiente.

    — Foi no templo. Uma explosão. As runas colidiram e o equipamento explodiu quando foi ligado. Zander estava perto demais.

    — Eles estão dizendo que foi você. — completou Andréa.

    Nix sentiu as pernas fraquejarem.

    — O quê?! — Ela deu um passo para trás, os olhos arregalados. — Eu… eu não fiz nada!

    Panacéia levantou-se lentamente, sua presença dominando a sala. Apesar da dor visível em seus olhos, havia uma firmeza em sua voz quando ela se aproximou de Nix.

    — Nós sabemos que não foi você, Nix. — Panacéia colocou as mãos firmes, mas gentis, nos ombros da irmã. — O templo precisa de um culpado. E você é o alvo mais conveniente.

    Nix respirou fundo, os pensamentos se atropelando. O templo sempre a temeu. Sempre buscou afastá-la. Mas… chegar a esse ponto?

    — Isso é um absurdo. — Seu tom estava mais controlado, mas os punhos cerrados revelavam sua fúria. — Eles querem jogar a morte dele em cima de mim só porque não podem admitir que erraram?

    Morfeus afastou-se da lareira, a cauda se movendo em irritação.

    — Foi um acidente. Eu estava lá. Eu vi o que aconteceu. Não foi culpa sua.

    — Então por que eles dizem que foi? — Nix murmurou, a raiva fervilhando sob a pele. — Eles sabem a verdade. Mas escolhem mentir.

    Andréa suspirou, passando a mão pelos cabelos.

    — Porque é mais fácil apontar um dedo do que aceitar a própria falha.

    Nix fechou os olhos por um instante, forçando-se a conter a raiva que queimava em seu peito. Mas era inútil. Ela queria gritar, queria revidar, queria ir até o templo e exigir que dissessem a verdade.

    Mas Zander continuaria morto. E nada mudaria isso.

    Sem uma palavra, virou-se e subiu as escadas, ignorando os chamados da família.


    Naquela noite, Panacéia encontrou Morfeus na oficina ao lado da mansão, um espaço onde ele costumava se refugiar para organizar os pensamentos. Ele estava sentado em um banco, a cauda enrolada ao redor das pernas, os olhos fixos em uma peça de metal em suas mãos.

    — Ela não vai deixar isso passar. — Disse Panacéia, cruzando os braços.

    — Eu sei. — Respondeu ele, a voz baixa.

    — Você deveria ter contado antes. Sobre o que viu no templo.

    Morfeus levantou os olhos para ela, os traços felinos contraídos em frustração.

    — Ela não estava pronta. Ainda não está.

    Panacéia suspirou, suas asas tremendo ligeiramente.

    — Você sempre tenta protegê-la. Mas, às vezes, ela precisa enfrentar as coisas por conta própria.

    — Eu só… não quero perdê-la também.

    Panacéia aproximou-se, colocando uma mão no ombro dele.

    — Ninguém quer. Mas, Morfeus, nós somos a família dela. E família é o que vai mantê-la de pé, mesmo quando ela se sentir sozinha.

    Morfeus assentiu lentamente, mas o peso em seus ombros não diminuiu. Ambos sabiam que as feridas de Nix eram profundas demais para serem curadas tão facilmente.


    O dia do enterro amanheceu com um céu encoberto, nuvens cinzentas pairando pesadas como o peso no coração de todos ali. Uma chuva fina caía constante, espalhando o cheiro de terra molhada pelo jardim da mansão Fae.

    O caixão de Zander repousava no centro do jardim, rodeado por flores brancas que brilhavam suavemente sob a luz pálida do dia. As cadeiras estavam dispostas ao redor, ocupadas por convidados em silêncio. Os murmúrios baixos se misturavam ao som da chuva, criando uma melodia melancólica.

    Nix observava tudo de uma janela no andar superior, escondida atrás de uma cortina grossa. Seus olhos fixaram-se em Andréa, que estava ao lado do caixão, as asas de borboleta caídas, sem o brilho habitual. Ao lado dela, Panacéia mantinha-se ereta, mas havia algo tenso em sua postura. A expressão no rosto dela era de pura contenção, como se um fio invisível estivesse segurando suas emoções.

    Entre elas estava sua prima, Vênus, uma figura que parecia deslocada em meio à tragédia. A jovem dragão-de-komodo, com sua pele coberta por escamas esverdeadas e brilhantes, mantinha-se encolhida, como se quisesse desaparecer. Seus olhos castanhos, normalmente vivos, estavam inchados e marejados, enquanto soluços escapavam de sua garganta. Criada por Panacéia desde pequena, Vênus era a filha adotiva mais jovem da família, mas sua maturidade costumava surpreender a todos. Agora, porém, ela parecia tão vulnerável quanto qualquer outra pessoa presente.

    Nix sentiu o peito apertar ao vê-las ali, desmoronando sob o peso de uma tragédia que parecia inevitavelmente conectada a ela. Mas a pior parte era que ela não podia se juntar a eles, o templo já havia espalhado cartazes com seu rosto estampado por toda spades.

    O som de passos firmes sobre o cascalho atraiu sua atenção. O conselheiro Lafaiete surgiu entre os convidados, vestido de preto dos pés à cabeça. Sua postura era rígida, quase imponente, e ele avançou pelo jardim como se carregasse o próprio julgamento em suas mãos.

    Parou diante de Andréa, curvando-se levemente em um gesto de respeito. Sua voz grave quebrou o silêncio, cada palavra carregada de uma frieza calculada.

    — Marquesa Fae, prometo que trarei justiça para sua família. Encontrarei a filha do Caos e garantirei que ela pague pelo que fez.

    O silêncio que se seguiu era tão denso que parecia sufocar até mesmo o som da chuva. Andréa ergueu o olhar, mas sua expressão era uma máscara de contenção. Embora sua dor fosse evidente, ela manteve-se firme, recusando-se a dar qualquer resposta.

    E não era porque lhe faltavam palavras. Era porque qualquer resposta errada poderia custar mais do que ela podia pagar.

    Apesar do título de marquesa, sua posição nunca foi sólida como as dos outros nobres de Spades. A Casa Fae não subiu por linhagem ou tradição, mas sim por conquista—pirataria mascarada de política. O poder que detinham vinha da lealdade entre sua família e a rainha pirata Mirana Linddell, um vínculo que Lafaiete cobiçava.

    E ele sabia. Sabia que qualquer movimento precipitado de Andréa poderia abalar essa aliança. Que, ao defendê-la publicamente, ela daria a ele a desculpa perfeita para desacreditá-la.

    Ela apertou os punhos sob a mesa, mas manteve a postura impecável.

    Panacéia, por outro lado, não conseguiu esconder sua indignação.

    Ela deu um passo à frente, as asas tremulando ligeiramente, e sua voz cortou o ar como uma lâmina:

    — Conselheiro Lafaiete, minha família está de luto. Espero que a justiça que você procura seja baseada em fatos, não em superstições e rumores.

    Lafaiete ergueu uma sobrancelha, como se a interrupção o surpreendesse. Ele inclinou a cabeça em uma deferência superficial, mas o brilho em seus olhos traiu sua determinação em manter a narrativa que havia escolhido.

    — Naturalmente. O Reino de Spades sempre prezou por justiça, senhora Fae. — Seu olhar voltou para Andréa, perscrutador. — Espero que possamos trabalhar juntos para garantir que a verdade prevaleça.

    Cada palavra era um jogo. Um aviso disfarçado de cortesia.

    Andréa sustentou o olhar dele, controlada. Porque sabia que, no tabuleiro em que jogavam, uma peça mal posicionada poderia significar a ruína da Casa Fae.

    E Lafaiete estava apenas esperando ela tropeçar.

    Nix recuou da janela, o coração apertado como se as palavras de Lafaiete fossem uma sentença direta contra ela. Mesmo escondida, sentiu o peso do olhar público, o rótulo ecoando em sua mente: “filha do Caos.”

    Ela se afastou da janela, os passos pesados como chumbo, e subiu as escadas em silêncio. Cada palavra, cada olhar desconfiado do lado de fora, cravava-se em sua mente como uma lâmina afiada. Fechou-se em seu quarto, deixando o mundo lá fora continuar seu curso.

    Sozinha, a culpa crescia dentro dela, como uma tempestade que parecia impossível de conter.


    Mais tarde, quando a mansão estava mergulhada em silêncio, Nix escapou para os fundos da propriedade. O jardim ainda estava úmido da chuva recente, o cheiro de terra molhada misturando-se com a brisa salgada do mar. Ela encontrou Morfeus sob a grande figueira, a cauda felina enrolada em torno de si e as orelhas baixas em aparente introspecção.

    — Não consegue dormir? — Ele perguntou sem olhar para ela, sua voz grave cortando o som distante das ondas.

    Nix balançou a cabeça e sentou-se ao lado dele, puxando os joelhos contra o peito.

    — Eu não devia estar aqui. Tudo o que eu faço só piora as coisas.

    Morfeus virou-se para ela, os olhos refletindo a luz fraca da lua.

    — Você pertence a este lugar, Nixoria. Nós somos sua família.

    Ela balançou a cabeça, um nó apertando sua garganta.

    — Isso não muda o fato de que tudo o que eu toco vira caos. Eu não deveria ter ido ao templo.

    — Fugir não vai mudar nada, Nix. A culpa que você sente… Não é sua para carregar.

    Ela desviou o olhar, mordendo o lábio, mas antes que pudesse responder, o som de passos leves os interrompeu. Panacéia apareceu, vindo pela lateral da casa. Suas asas de borboleta reluziam suavemente sob a luz da varanda, os olhos firmes, mas calorosos.

    — Está tarde. Vocês dois deveriam estar descansando.

    Morfeus levantou-se com um leve aceno de cabeça para Panacéia.

    — Ela é toda sua. — Disse, antes de desaparecer na direção da casa.

    Panacéia se aproximou, observando Nix por um momento antes de se sentar ao lado dela.

    — Você sabe que eu e meus irmãos conversamos sobre você, não sabe? — Perguntou, sua voz baixa, mas direta.

    Nix franziu o cenho, olhando para Panacéia com cautela.

    — Conversaram sobre o quê?

    — Sobre o que aconteceu. Sobre como as coisas estão agora. — Panacéia cruzou as mãos sobre o colo, o olhar perdido por um momento no horizonte. — Andréa está preocupada. Morfeus também. Eles acham que talvez seja melhor para você… dar um tempo daqui.

    — Dar um tempo? — A expressão de Nix endureceu. — Então é isso? Vocês querem que eu vá embora?

    — Não é isso. — Panacéia respondeu rapidamente, virando-se para encará-la. — Nós queremos que você fique segura.

    Nix bufou, desviando o olhar.

    — Não importa onde eu esteja, as pessoas vão continuar me odiando. Eu sou o Caos, lembra?

    — Você não é o Caos. — A voz de Panacéia era firme, mas cheia de emoção. — Você é minha sobrinha. Você é família.

    Por um momento, Nix ficou em silêncio, mas a mágoa ainda estava evidente em seu rosto.

    — E o que vocês esperam que eu faça?

    Panacéia respirou fundo, escolhendo cuidadosamente as palavras.

    — Eu pensei que você pudesse vir comigo para o Cais das Lágrimas. Pelo menos por um tempo, até que as coisas se acalmem.

    — O Cais das Lágrimas? — Nix perguntou, desconfiada.

    — Sim. Tenho um estaleiro antigo lá, foi do meu pai, seu avô. — Panacéia deu um sorriso leve. — Sempre achei que você tinha talento para o ofício.

    Nix ficou quieta, processando a ideia.

    — Você quer que eu vá embora daqui e comece a construir barcos? — Ela perguntou, a descrença evidente em sua voz.

    — Quero que você tenha um lugar onde possa respirar. Onde possa trabalhar com as mãos e se afastar dessa loucura por um tempo. — Panacéia colocou uma mão no ombro de Nix. — E eu quero que você saiba que não está sozinha, mesmo que às vezes pareça.

    O silêncio que se seguiu foi pesado, mas não desconfortável. Nix finalmente murmurou:

    — Andréa e Morfeus concordaram com isso?

    — Eles não só concordaram, como sugeriram. — Panacéia respondeu com sinceridade. — Não estamos te mandando embora, Nix. Estamos te dando uma chance de recomeçar, de se encontrar. Nix olhou para a tia, sua expressão suavizando ligeiramente.

    — E se eu estragar tudo de novo?

    Panacéia sorriu, apertando levemente o ombro dela.

    — Então, vamos consertar. É isso que a família faz. Nix respirou fundo, sentindo o peso de suas dúvidas e medos ainda presentes, mas talvez um pouco menos esmagadores.

    — Tudo bem. Eu vou.

    Panacéia sorriu, levantando-se e estendendo a mão para Nix.

    — Amanhã cedo, então. Vamos começar essa nova etapa juntas.

    Nix hesitou antes de aceitar a mão da tia, levantando-se. Enquanto as duas voltavam para a mansão, ela não pôde deixar de sentir que, talvez, o Cais das Lágrimas fosse o lugar onde poderia encontrar um pouco de paz – ou, pelo menos, um começo.

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