Capítulo 128 - Ajudando um Amigo
Vê se pode uma dessas, colocaram aquele tapado na equipe. Aparentemente, o critério agora é saber repetir o óbvio com convicção. Little Girl saiu da Guilda de Aventureiros bufando — e nem tentou esconder o mau humor.
Ela caminhou pelas ruas do reino com o cenho franzido, amaldiçoando mentalmente os deuses da incompetência. Precisava de uma válvula de escape. Nada melhor do que açúcar, gordura e culpa.
Seguiu direto para a confeitaria mais próxima.
Assim que entrou, foi atropelada pelo cheiro de açúcar queimando, baunilha e alguma coisa que lembrava infância e irresponsabilidade. Atrás do balcão estava Sandra — coberta de glacê, segurando uma tigela de massa do tamanho de um barril e com uma expressão de quem estava prestes a gritar com o mundo.
— Sandra! — exclamou a pequena maga, marchando até ela como quem invade uma fortaleza. — Tens algo doce e absurdamente calórico para me dar? Estou carente.
Sandra levantou o olhar. Claramente não esperava visitas.
— Little Girl?! Que sorte a minha!
Little Girl estreitou os olhos. Quando alguém dizia “que sorte” logo depois de vê-la, era sinal de problema.
— O que estás fazendo aí? — perguntou, encarando a massa que parecia tentar fugir da tigela.
— O que parece? Estou me afogando em trabalho. Pegamos um pedido gigante pra uma festa. Meu irmão, gênio que é, decidiu que podia fazer a entrega sozinho mesmo doente. Resultado: tropeçou, espalhou tudo no chão e agora está de cama.
Ela deu um suspiro que parecia vir dos ossos.
— E agora vais ter de refazer tudo? — perguntou Little Girl, já sabendo a resposta.
— Exato. Minha mãe está viajando, meu irmão parece um zumbi e sobrou tudo pra mim.
A pequena maga começou a calcular as rotas de fuga, mas não foi rápida o bastante. Sandra levantou o rosto e a olhou como quem encontra uma tábua de salvação no meio do naufrágio.
— Mas tu estás aqui!
Little Girl deu um passo pra trás. Alerta máximo.
— E… e daí? Não sei cozinhar. Nunca nem fritei um ovo. Posso fazer bolas de fogo, mas acho que não é isso que estás procurando.
— Só preciso que mexas a massa. Não é física quântica, é biscoito. Por favor!
Sandra ajoelhou-se no chão como uma sacerdotisa desesperada implorando aos céus por socorro. Tudo muito dramático.
Little Girl bufou, resignada.
— Tá… Certo. Mas se esses biscoitos saírem do forno e me atacarem, a culpa é tua.
— És uma amiga maravilhosa!
— Hmph.
Seguiram-se minutos que pareceram horas, cheios de açúcar, farinha e caos. Mas, milagre dos milagres, conseguiram preencher quatro caixas enormes antes do cliente aparecer.
Sandra praticamente desabou no balcão. Parecia que tinha vencido uma guerra.
— Obrigada! Se não fosse por ti, estaria chorando no chão da cozinha agora.
Little Girl olhou para o próprio braço. Estava coberto de alguma coisa pegajosa. Provavelmente doce. Talvez perigosa.
— Não tens de agradecer. Mas sim, preciso de um banho.
Sandra percebeu o estado lamentável da amiga e apontou para o andar de cima.
— O banheiro é teu. Vai, antes que fiques colada no chão.
Little Girl subiu. No espelho, viu o que já suspeitava: parecia que tinha lutado com um monstro feito de massa de biscoito. E perdido.
Tomou banho, lavou as roupas com o sabão que encontrou e usou uma relíquia mágica que soprava ar quente — útil, embora barulhenta. Quando voltou, mais apresentável, encontrou Sandra limpando os últimos vestígios da batalha.
As caixas tinham sumido.
— Já vieram buscar?
— Vieram.
— Quatro caixas gigantes? Quantas pessoas?
— Duas. Uma garota toda arrumada — parecia uma princesa. E um cara vestido como se fosse para a guerra.
— Casal. Aposto.
— Tinham essa vibe. Bem próximos. Fiquei até com inveja.
— Invejosa? Ele era bonito?
— Nem tanto. Falei “invejosa” porque todas as minhas amigas já estão namorando. Sou a única encalhada.
Little Girl inclinou a cabeça, estudando-a como um alquimista analisa uma poção instável.
— Quantos anos tu tens, mesmo?
— Vinte e cinco.
Pausa. Uma longa pausa.
— Estás quase na idade em que ninguém mais te quererá.
— O quê?!
Sandra parecia ter levado uma estocada no coração.
— Que tipo de criança diz isso?! Homens gostam de mulheres maduras!
— Mais velha, com certeza. Madura? Hmm… tenho dúvidas.
— Aaaah! — Sandra gemeu, afundando o rosto nas mãos.
Little Girl suspirou, subiu na ponta dos pés e deu três tapinhas nas costas da amiga.
— Calma. Vais encontrar alguém bonito e legal. Que goste de doces, de preferência.
Sandra fungou, tentando sorrir.
— Obrigada…
Adultos. Às vezes eram piores que crianças.
Little Girl tinha onze anos, era uma aventureira registrada — a mais jovem do reino.
Não tinha família. Não aceitava ordens.
Era uma vida solitária, difícil e perigosa.
Mas era a vida dela. E isso bastava.
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