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    — Então é esse o sujeito que vai me ajudar? — Jake lançou um olhar de desdém para o homem à sua frente, sem disfarçar o desgosto na voz.  

    Denzel, o Assassino das Sombras. Um elfo negro conhecido em Infra por ser letal e quase invisível. Ele havia sido contratado por Salazar, o Intocável, para auxiliar Jake em um “negócio” envolvendo os nobres corruptos do reino. Clientes, como Jake insistia em chamá-los.  

    Jake já havia começado a estabelecer contatos. Algumas cartas, algumas reuniões discretas, e o plano estava ganhando forma. Mas ainda faltava algo crucial: um lugar. 

    Um espaço seguro, longe dos olhos curiosos, onde os jogos de azar – estritamente proibidos no reino dos elfos – poderiam florescer sob a proteção do sigilo.  

    Relutante, Jake tomou uma decisão drástica. Demitiu os empregados que cuidavam da casa de seus pais, eliminando potenciais testemunhas externas, e transformou o lugar. O lar que seus pais tinham tanto orgulho agora era um antro de ilegalidade. Jake sabia que eles teriam vergonha do que ele estava fazendo.  

    Mas eles não estavam ali. Então, que diferença fazia?  

    — Esse é mesmo o maior assassino de Infra? — Jake perguntou, sua incredulidade escancarada no tom de voz e na expressão.  

    — Haaa… Não acredita? Por que não testa por si mesmo? — Salazar, encostado casualmente em sua cadeira, sinalizou com a cabeça para Denzel.  

    Antes que Jake pudesse reagir, Denzel desapareceu. Não andou. Não correu. Apenas se desfez em um borrão de movimento.  

    — Mas o quê…?! — A exclamação de Jake morreu no ar quando ele sentiu algo gelado encostar em seu pescoço.  

    Uma lâmina.  

    Ele congelou, seu corpo inteiro paralisado pelo toque frio e pela ameaça implícita.  

    — Fica quietinho. Não quero te cortar sem querer. — Denzel sussurrou, a voz baixa e afiada como a lâmina que segurava.  

    Jake estalou os dentes, irritado consigo mesmo. Ele odiava se sentir impotente, mas era exatamente isso que estava acontecendo. Totalmente subjugado, ele percebeu que estava na presença de alguém muito acima de sua própria capacidade.  

    Denzel não era apenas bom. Ele era excepcional.

    Jake tinha uma percepção superior à maioria dos elfos, mas isso não significava nada agora. Ele sequer viu o assassino se aproximar. A sensação da lâmina contra sua garganta era um lembrete doloroso de que, por mais talentoso que fosse, ele ainda estava a anos-luz do nível de Denzel.  

    E isso, mais do que qualquer coisa, o incomodava profundamente. 

    — Acho que já provaram seu ponto… — Jack murmurou, sua voz quase inaudível.  

    Denzel afastou a lâmina, seus movimentos precisos como uma dança ensaiada, antes de guardar a arma com a mesma calma calculada.  

    — Peço perdão por isso. Era a maneira mais eficiente de demonstrar minha utilidade.  

    Jack lançou um olhar rápido, pesado, mas ficou em silêncio. Ele balançou a cabeça para Salazar.  

    — Como eu disse antes, minha casa será a base provisória para suas… atividades ilegais. Não me importa o que façam, desde que seja discreto e fora do radar. Não tenho medo de ser preso, mas não vou permitir que isso aconteça antes de encontrar e matar Tiko. 

    Salazar sorriu, aquele sorriso que nunca alcançava os olhos.  

    — Entendido. Pode confiar, manteremos tudo sob controle. Aliás, falando em atividades… muitos elfos não gostariam de algo mais… relaxante?

    Jack arqueou uma sobrancelha, irritado.  

    — Do que você está falando, Salazar?  

    — Mulheres, Jack. Elfas negras. Acho que podemos incluir um serviço… especial. Muitos elfos ricos pagariam por isso. 

    A ideia foi um soco invisível. Prostituição. Um crime ainda mais arriscado no Reino dos Elfos, onde a sociedade controlava cada detalhe da vida de seus cidadãos. Jack conhecia bem a cidade e suas regras rígidas. Não era apenas moralmente repugnante para ele — era suicida.  

    — Você quer traficar elfas negras? Para dentro da cidade? Como, exatamente, pretende fazer isso sem ser pego?

    — Ah, Jack, isso é problema seu, não meu. Você é o cara da cidade grande, lembra? Sempre tem uma solução brilhante para essas coisas. Salazar riu, mas o tom era mais desafiador do que brincalhão.  

    — Não acho que minha casa seja adequada para algo assim.  

    A irritação na voz de Jack era impossível de ignorar.  

    — Como é que é? Você não disse que faria qualquer coisa para matar seu irmão? Ou isso era só da boca para fora? 

    Jack fechou o punho com força. A raiva queimava em seus olhos como brasas vivas.  

    — O quê?! Que droga você disse?  

    Chien, o braço direito de Salazar, deu um passo à frente. Sua presença era pesada, como uma sombra que engolia o ambiente.  

    — Fique no seu lugar. 

    Salazar deu de ombros, o sorriso ainda presente.  

    — Jack, são apenas negócios, lembra? Nada pessoal.

    O confronto foi curto, mas intenso. Jack saiu da base de Salazar com a mandíbula cerrada, um gosto amargo na boca. Denzel o seguia a alguns passos de distância, silencioso como uma sombra.  

    Do lado de fora, Jack puxou o capuz sobre a cabeça. Era uma precaução necessária; qualquer elfo que ousasse pisar em Infra estava pedindo por problemas.  

    — Está irritado? — Denzel perguntou, sua voz neutra, quase desinteressada.  

    Jack não respondeu. Não olhou. Não reagiu. Mas a irritação era palpável, uma tempestade prestes a explodir.  

    Sua casa, o lugar onde cresceu, agora seria um antro de atividades ilegais. E, pior, um prostíbulo. Por mais que sua vingança contra Tiko fosse sua prioridade, aquilo o corroía.  

    Ele continuou andando, o peso do mundo em seus ombros. Denzel apenas o observava, incapaz — ou talvez apenas relutante — de oferecer consolo. Afinal, seu trabalho era vigiar e ajudar na busca por Tiko, nada mais. 

    Denzel não foi escolhido por acaso. Para Salazar, ele era a peça ideal por três razões.

    A primeira era simples: experiência. Denzel já havia cruzado os limites entre Infra e as cidades dos elfos mais de uma vez. Mesmo sendo um elfo negro, conhecia as nuances e os perigos de lidar com aquele ambiente hostil. Caso algo desse errado, ele sabia como se virar.

    A segunda razão era sua habilidade. Não era exagero dizer que Denzel era um dos mais habilidosos de Infra. Salazar mesmo já havia tentado contratá-lo no passado, mas Denzel recusara, preferindo manter-se independente. 

    Ainda assim, firmaram um acordo de não agressão, algo que o assassino aproveitava para sobreviver quando não conseguia trabalhos suficientes.

    Por último, e talvez mais importante para Salazar: ele não tinha nada a perder. Denzel não era um membro oficial da organização, apenas um terceirizado. Se algo desse errado e ele fosse capturado ou morto, os negócios de Salazar continuariam intactos. 

    A mesma lógica impedia que Chien, seu braço direito, fosse enviado. Perder Chien seria um golpe, mas Denzel? Apenas um risco calculado.

    Denzel, é claro, sabia de tudo isso. Salazar jogava xadrez com peças descartáveis, e ele não era ingênuo. Ainda assim, sua confiança em suas habilidades era inabalável. 

    Ele não se via como uma vítima de apostas alheias, mas como alguém que sempre encontrava uma saída. Afinal, era assim que sobrevivia em Infra: confiando mais na lâmina e no instinto do que na sorte ou na palavra de outros.

    Os dois seguiram pelas ruas estreitas e imundas de Infra, sentindo o peso do lugar nas sombras que os cercavam. Foi então que Denzel, sempre atento, murmurou o suficiente para que Jack ouvisse:  

    — Cinco? Não, quatro.  

    Eles não diminuíram o ritmo, mantendo a postura relaxada enquanto avançavam em direção ao portão da cidade. Atravessaram-no sem maiores complicações, mas a sensação de serem observados não os abandonava. Quando chegaram ao estacionamento, Jack apontou para a carruagem à frente.  

    — Bonita carruagem… esses cavalos são Elmorazes? — perguntou Denzel, observando os animais enquanto Jack subia.  

    Jack hesitou por um momento, o cérebro trabalhando para processar o que aquilo significava. Quando a realização finalmente o atingiu, estalou a língua em frustração.  

    Elmorazes são uma raça de cavalos que apenas pessoas com muito dinheiro poderiam ter. 

    — Vamos logo. Não podemos perder mais tempo aqui.  

    Denzel permaneceu imóvel, os olhos fixos na entrada da garagem. 

    — Acho que eles têm outros planos.  

    Jack seguiu o olhar do companheiro e viu seis figuras bloqueando o caminho. Os homens formavam uma barreira humana, todos elfos negros, vestidos com roupas simples, nada elegantes, mas discretas. As armas que carregavam, no entanto, eram qualquer coisa menos sutis.  

    — Droga… — Jack murmurou, puxando o arco com uma rapidez surpreendente. Uma flecha já estava pronta, apontada para um dos homens na frente.  

    — Interessante… — Denzel comentou, com uma sobrancelha levantada. A habilidade de Jack com o arco o pegara desprevenido. Até onde sabia, elfos de cidades viviam vidas tranquilas, longe da violência. Mas este? Este parecia saber o que estava fazendo. Uma dúvida atravessou sua mente: Será que ele é mesmo só um filho de nobre qualquer?  

    Os seis homens avançaram devagar, confiantes. Não havia pressa em seus movimentos. Dois deles empunhavam adagas, o brilho de um líquido escorrendo pelas lâminas era inconfundível: veneno. 

    Outros dois carregavam espadas curtas, suas posturas indicavam que sabiam exatamente como usá-las.  

    Os últimos dois homens mantinham arcos firmemente erguidos, um mirando em Denzel e o outro em Jack. Apesar da tensão no ar, ninguém fez o primeiro movimento. Estava claro que eles queriam conversar.  

    — Sou o líder desse pequeno grupo. Vamos simplificar as coisas: queremos todo o dinheiro que vocês têm. — disse um dos homens com espada curta, sua voz casual, mas firme.  

    Jack não segurou a língua.  

    — Quem diria que ladrõezinhos imundos sabiam conversar, hein?  

    Denzel franziu o cenho. Idiota. Essa era a única palavra que passava pela sua cabeça. Jack claramente não entendia que, em situações de combate com inimigos desconhecidos, o melhor era observar, aprender e esperar pelo momento certo. 

    Mesmo com sua habilidade de sobrevivência, era óbvio que ele não tinha noção alguma sobre verdadeira estratégia de combate.  

    Os ladrões pareciam concordar. Mantinham a posição, avaliando os dois, provavelmente tentando medir suas capacidades antes de se comprometerem com um ataque.  

    — Se vocês tiveram coragem de nos encurralar aqui, sabendo que esse lugar tem um acordo de proteção com Salazar, devem estar ligados a algum grupo maior dentro de Infra. Então, para quem vocês trabalham? — perguntou Denzel, ignorando o sarcasmo de Jack.  

    A informação era mais importante. Mesmo se os homens não respondessem, suas reações, gestos ou hesitações poderiam revelar algo. Ele sabia que aquela garagem específica estava sob proteção de Salazar, o homem que praticamente regia Infra. 

    Qualquer tentativa de roubo ali era uma violação direta das regras, o que significava que esses homens eram algo mais do que bandidos comuns.  

    Jack, sendo de fora, não entenderia a complexidade disso. Mas Denzel entendia. Ele cresceu naquele lugar, sabia como as coisas funcionavam.  

    Foi então que ele ouviu o estalo da corda do arco de Jack sendo tensionada.  

    — Não! — Denzel gritou, sua voz cortando o ar.  

    Jack parou, confuso, e olhou para ele, mas antes que pudesse perguntar por quê, Denzel moveu-se como um relâmpago. Sua mão disparou para frente, agarrando uma flecha que vinha diretamente na direção de seu rosto.  

    — O-o quê…? — Jack murmurou, surpreso.  

    Antes que pudesse reagir, Denzel empurrou-o com força para trás da carruagem.  

    — Atrás dela, agora! — ordenou.  

    Outra flecha passou zunindo, atingindo a lateral da carruagem. Jack e Denzel estavam agora escondidos, protegidos pela cobertura.  

    — Por que você me impediu?! — Jack perguntou, a frustração evidente em sua voz.  

    — Porque você não pode sair atacando sem pensar, seu idiota! — Denzel retrucou, os olhos estreitos.  

    Ele puxou suas katar, as lâminas gêmeas refletindo a luz fraca da garagem. 

    Apesar de confiante em suas habilidades de combate, Denzel sabia que proteger alguém era algo completamente diferente. Ele nunca teve que lutar com o objetivo de garantir a segurança de outra pessoa. E agora, sua missão dependia disso.  

    Ele respirou fundo, organizando seus pensamentos. Qual é a vitória aqui? Quando trabalhava como assassino, a resposta era simples: matar o alvo. Mas agora, proteger Jack era o objetivo.  

    — Fique aqui e não faça nada. Eu cuido disso. — Denzel disse, sua voz firme.  

    — O quê? Está brincando? Eu vou te dar cobertura! — Jack rebateu. 

    — Claro que não. Dá pra ver que você nunca lutou de verdade. Suas ações impulsivas vão nos matar. Fique aqui.  

    Jack hesitou, a raiva fervendo nele, mas acabou desviando o olhar. Ele sabia que Denzel estava certo.  

    Certificando-se de que Jack ficaria na cobertura, Denzel tirou seu capuz, revelando o rosto. Ele se ergueu devagar, saindo de trás da carruagem. A tensão no ar ficou ainda mais palpável. Hora de acabar com isso.

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