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    A luz da manhã atravessava a janela da sala do Clube de Literatura, espalhando uma luz suave sobre as estantes cheias de livros e a mesa redonda onde eu, Rintarou, Mai e Taro estávamos sentados.

    Papéis em branco estavam misturados com os cadernos abertos diante de nós, acompanhados por algumas canetas pela mesa e a fumaça de um copo de chá que Mai tinha trazido da sala dos professores. Do corredor, vinham sons abafados — passos apressados, vozes animadas, o barulho distante da banda do Clube de Música ensaiando.

    A escola inteira parecia vibrar com os preparativos para o Festival Escolar.

    Rintarou ajustou os óculos, olhando pra uma folha em branco como se ela fosse responder sozinha. 

    — Então… “Branca de Neve” — começou ele, a voz calma, mas com um tom de quem sabia que a tarefa não ia ser simples. — Por onde começamos?

    Taro, que normalmente apenas dormia no clube, estava ao redor da mesa, mas pronto para ajudar também.

    — Pelo começo, óbvio. A Rainha Má olhando pro espelho, né?

    Mai franziu a testa, folheando um livro de contos antigos que trouxe pra referência. O papel já estava gasto nas bordas de tanto ela mexer.

    — Sim, mas não dá pra deixar igual ao original — disse ela, parando numa página amarelada. — Tem que ter algo nosso, ou vai ficar chato pra todo mundo…

    Peguei meu caderno, sentindo o peso leve dele nas mãos enquanto olhava pras linhas vazias. Escrever um roteiro não era tão diferente assim de uma história, mas saber que a Yuki e a Sasaki iriam usar aquilo no palco… parecia que tinha mais gente olhando para o que a gente escrevia do que o normal.

    — Talvez a Rainha Má possa ser mais engraçada do que o normal — sugeri, rabiscando uma ideia solta no canto da página. — Tipo… ela fica tentando penteados ridículos pra se achar mais bonita que a Branca de Neve, ou algo do tipo.

    — Isso parece bom. E o espelho podia zoar ela de volta, algo como, “Desculpa, Majestade, mas esse laço tá horrendo.” — Taro murmurou baixo, enquanto Mai quase cuspiu o chá.

    Rintarou levantou uma sobrancelha, mas um leve sorriso surgiu no canto da boca dele enquanto anotava.

    — Uma Rainha Má cômica… pode funcionar — disse ele, a voz seca. — A Yuki e a Sasaki já vão carregar o drama da peça, então um pouco de humor no começo ajuda a equilibrar no geral.

    Mai assentiu, ainda com os olhos no livro.

    — Mas a gente precisa decidir como ela vai envenenar a maçã — apontou ela, séria. — Não pode ser só “aqui, toma uma maçã”. Tem que ter um motivo pra Branca de Neve aceitar.

    — Não é só dizer que é um presente importante? — sugeri, coçando a nuca. — Tipo, “Trouxe isso do pomar real, experimenta”.

    — Isso parece muito óbvio, teríamos que adicionar um motivo melhor… — Taro murmurou, a cabeça apoiada nos braços, a caneta quase escorregando da mão.

    — É só teatro, Taro — retrucou Mai, revirando os olhos, mas com um sorriso contido. — Não precisamos complicar tudo, um pequeno motivo já é suficiente.

    Rintarou rabiscou mais algumas linhas, pensativo.

    — Certo. A Rainha Má engraçada, o espelho sarcástico, e a maçã como um presente falso. Tá começando a parecer uma peça de verdade.

    Enquanto discutíamos, o resto da turma já tinha se espalhado pela escola e além. Durante o intervalo, ouvi Seiji junto de Akira e outros, gritando no corredor sobre ir para as lojas do bairro comprar materiais pros cenários, tábuas de madeira, latas de tinta e alguns rolos de tecido barato que alguém disse que “dá pro gasto”.

    O som das risadas deles e uma discussão alta sobre se o castelo devia ser cinza ou marrom ainda ecoava na minha cabeça. Aiko também tinha passado na sala mais cedo, o caderno dela cheio de esboços rabiscados com lápis coloridos.

    — A Yuki vai ficar perfeita de Branca de Neve, e a Sasaki também — disse ela, os olhos brilhando enquanto segurava um desenho de um vestido extravagante. — O Clube de Costura já tá medindo elas!

    Eu só assenti, tentando não pensar muito em ver a Yuki num vestido de princesa, enquanto desviava o olhar.

    Sabia que se pensasse muito nisso eu não conseguiria mais focar no roteiro.

    Continuamos focando nas ideias para a peça após isso.

    O sol já estava mais baixo quando a porta da sala se abriu devagar, rangendo levemente. Kaori entrou, os ombros caídos e os cabelos bagunçados caindo sobre o rosto. Ela parecia completamente derrotada.

    A mochila escorregou do ombro dela e caiu no chão fazendo barulho, ela deu um chute leve nela antes de se jogar numa cadeira vazia perto da janela.

    — Mai… me dá um pouco desse chá, por favor — murmurou ela, a voz rouca de quem tava no limite. — Eu tô morrendo por causa da minha turma.

    Mai ergueu uma sobrancelha, sem tirar os olhos do livro.

    — O Maid Café? — perguntou, quase como se já soubesse a resposta. Kaori assentiu, esfregando os olhos com as costas da mão.

    — Os garotos não param de discutir sobre os uniformes e as comidas — disse ela, o tom carregado de desgosto. — E ainda tenho que ajudar a montar mesas, lixar tudo… Tudo isso pra usar uma saia idiota no final! — Ela deixou a cabeça cair na mesa, o som abafado do impacto ecoando pela sala.

    Taro ergueu a cabeça dos braços levemente, enquanto bocejava.

    — Pelo menos… vocês vão atrair um monte de gente — disse, coçando a nuca.

    — …Isso não me deixa feliz — resmungou ela, esticando o braço pra pegar o copo de chá da Mai. Deu um gole longo e deixou a cabeça cair de novo.

    Rintarou ajustou os óculos, ignorando o drama dela como se fosse só algo normal do dia a dia.

    — Onde o Takumi anda? — perguntou, a caneta ainda na mão. Kaori bufou, afundando ainda mais na cadeira.

    — Não sei. Acho que ele tá fazendo uma casa assombrada com a turma dele? Ou é… — Ela fez um gesto vago com a mão, os olhos quase fechados. — Tô cansada demais pra lembrar… me deixa descansar em paz agora.

    Olhei pra ela, segurando um riso enquanto rabiscava outra linha no caderno. Se o Maid Café já estava deixando a Kaori nesse estado, a nossa turma teria que dar o nosso melhor para competir com eles.

    No fim da tarde, a porta se abriu de novo. Dessa vez, era Yuki, o uniforme um pouco amassado de tanto correr entre as tarefas de representante, mas ainda com aquele ar calmo que parecia segurar tudo no lugar.

    Mesmo que ela fosse a protagonista, da peça ainda tinha que cumprir com seus papéis de representante enquanto o roteiro não estivesse pronto.

    Sasaki vinha logo atrás dela, andando timidamente com as mãos atrás das costas, os olhos baixos como se quisesse evitar chamar muita atenção.

    — Olá, pessoal. Como tá indo o roteiro? — perguntou Yuki, inclinando a cabeça com um sorriso curioso enquanto espiava os papéis bagunçados na mesa.

    Levantei o caderno, mostrando as primeiras páginas cheias de anotações tortas e riscadas.

    — Não muito ainda, mas tá começando a tomar forma — respondi, apontando pra uma linha rabiscada. — A Rainha Má vai ser mais engraçada do que má, por enquanto.

    — Engraçada? Hmmm, isso parece ótimo! — ela respondeu, o sorriso dela virando na minha direção, suave o bastante pra fazer meu coração errar uma batida por um instante.

    Sasaki ergueu o olhar por um instante, parecendo hesitar antes de falar num tom baixo.

    — Já… tem algo sobre o príncipe?

    Rintarou ajustou os óculos, folheando calmamente as anotações à sua frente.

    — Não muito. Ainda estamos pensando nisso. Por enquanto, estamos ainda pensando nas cenas da Rainha Má.

    Yuki esfregou o braço com um gesto tímido, o sorriso dela ficando um pouco mais nervoso.

    — Espero que não tenha muita coisa difícil… Ainda não sei como vou desmaiar direito…

    Taro, largado na cadeira com os olhos semicerrados, deu um bocejo antes de murmurar algo.

    — Só precisa cair de lado e fingir que dormiu…

    A voz dele saiu tão arrastada que parecia estar cochilando no meio da frase. Mai revirou os olhos, sem nem levantar a cabeça do livro, e esticou o braço pra dar um tapa leve no braço dele.

    — Não ajuda desse jeito, Taro — retrucou ela, mas um sorriso pequeno escapou mesmo assim.

    Kaori, ainda jogada na cadeira toda derrotada, soltou um suspiro longo que parecia carregar todo o peso do festival.

    — Isso parece bom… — murmurou, a voz abafada contra a mesa. — Enquanto isso, vou estar servindo chá pra um monte de idiotas enquanto vocês fingem dormir no palco.

    Yuki riu baixo, o som leve tentando puxar o clima pra cima.

    — Pelo menos os figurinos da Aiko vão ficar bonitos. Ela disse que o vestido não deve demorar muito para ser feito.

    Kaori ergueu a cabeça só o bastante pra lançar um olhar azedo, os olhos semicerrados de exaustão.

    — …Que incrível. Enquanto isso, eu vou estar tropeçando numa saia que os garotos escolheram.

    — Parece que a gente tá competindo pra ver quem sofre mais no festival — falei, rindo levemente enquanto olhava pra o roteiro.

    — E parece que eu tô ganhando…! — Kaori respondeu, bufando alto.

    A sala caiu em risadas abafadas. Sasaki ficou quieta, mas um leve sorriso torto surgiu no rosto dela enquanto observava a confusão.

    Peguei meu caderno, sentindo o cansaço do dia pesar nos ombros, mas com uma pontada de animação ainda dentro do peito. Olhei pela janela. O céu estava iluminado de tons rosa e laranja, o sol descendo bem lentamente de trás dos prédios fora da escola.

    A turma ainda corria para algumas lojas do bairro, carregando tábuas e latas de tinta, enquanto o Clube de Costura pegava as medidas e cortava tecidos, e nós tentávamos dar vida à Branca de Neve com palavras rabiscadas.

    Era só o começo — um dia cheio de ideias soltas, discussões e um roteiro que ainda precisava de muito trabalho. Muito mesmo…

    Mas, olhando para as páginas na minha frente e ouvindo as risadas da sala, dava pra sentir o Festival Escolar ganhando forma, pedaço por pedaço.

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